Discurso durante a 206ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a República Brasileira, por ocasião da comemoração, amanhã, do aniversário de sua proclamação.

Autor
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: Aloysio Nunes Ferreira Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Considerações sobre a República Brasileira, por ocasião da comemoração, amanhã, do aniversário de sua proclamação.
Publicação
Publicação no DSF de 15/11/2011 - Página 47128
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, PROCLAMAÇÃO, REPUBLICA, BRASIL, COMENTARIO, HISTORIA, TRANSFORMAÇÃO, POLITICA, SOCIEDADE.
  • CRITICA, GOVERNO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PROBLEMA, POLITICA PARTIDARIA, CORRUPÇÃO.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Srª Presidente, Srs. Senadores, como V. Exª...

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - Senador, estava aguardando a sua chegada para saudar também os visitantes que vão ouvir parte do seu pronunciamento. Quero agradecer a todos os visitantes que estão aqui acompanhando os trabalhos do Senado neste início de tarde de segunda-feira.

            Muito obrigada, Senador.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP) - Sejam bem-vindos.

            Como V. Exª, ainda há pouco, como o Senador Aníbal Diniz, tratarei, no discurso desta tarde, da comemoração do aniversário da República brasileira, que como todos sabemos, foi o resultado de um processo de luta política de um lado, de debate intelectual, confronto de projetos e também de uma situação de desmoronamento das instituições que sustentavam o Império, especialmente do trabalho escravo. Quando abolido o trabalho escravo, os dias do Império estavam contados.

            Houve profundas e intensas transformações, a partir da metade do século XIX, na economia da sociedade brasileira, desde o fim do tráfico à expansão do café, à introdução paulatina da força de trabalho livre, ao movimento de urbanização. O que levou também à luta de ideias que foram colocando aos poucos na ordem do dia da mudança de um regime político, regime imperial, dadas as características da monarquia brasileira, um rei que reinava e também governava, em razão do Poder Moderador, que a Constituição de 1824 lhe conferia, era um sistema infenso à dinâmica da sociedade e à movimentação da opinião pública. Pouco a pouco a sua legitimidade foi sendo corroída.

            Houve grandes esperanças no bojo da proclamação da República, esperança de transformação social, de transformação política, vinda de intelectuais engajados na luta política, como André Rebouças e Joaquim Nabuco. O impulso reformista que veio desse grande movimento de opinião, de luta política, que foi a luta pela abolição, a República chegou cercada de enormes esperanças, muitas delas infelizmente foram desmentidas pelos fatos, foram frustradas

            Aquele movimento que parecia trazer consigo uma força mudancista, impetuosa e irresistível foi, de alguma maneira, estancado com o episódio dramático da Guerra de Canudos. De lá para cá, nesse mais de um século tivemos períodos longos de autoritarismo, o chamado Estado Novo, uma ditadura instalada em 64, períodos em que o Brasil cresceu e se desenvolveu do ponto de vista econômico e no início do século XX até os anos 80.

            Como lembrou José Serra, em um artigo que está hoje no seu site, o Brasil cresceu como poucos países do mundo. Aliás, apenas o Japão conheceu o nível de desenvolvimento, de crescimento econômico igual ao experimentado pelo nosso País.

            No entanto, apesar das modificações políticas que vieram com a República e com as que vieram com a Revolução de 30, como a justiça eleitoral, o voto das mulheres, a Federação, a descentralização administrativa e política, houve, ao longo desse tempo, uma apropriação desses ideais de transformação profunda da sociedade e da política por forças que procuraram conduzi-la e contê-la, um pouco na expressão utilizada pelo personagem de Lampedusa, em seu romance O Leopardo “É preciso que tudo mude para que tudo permaneça como está”.

            Essa era a interpretação, aliás que se deu daquele episódio da política da vida italiana retratado no romance e depois no extraordinário filme baseado nele. Uma mudança, uma revolução sem revolução, mudança pelo alto, mudança contida pela elite, como se a elite política das classes dominantes tivesse sequestrado e se apropriado, desvirtuando-a na agenda dos de baixo, das classes subalternas

            Nós tivemos momentos brilhantes na República Brasileira. Os anos vinte foram anos radiosos: de transformação intelectual, do modernismo, da criação do Partido Comunista, em 1922; de aproximação de intelectuais com o povo, como nunca se havia visto na história intelectual brasileira. Mas, em 1930, depois de uma revolução vitoriosa, com base em bandeiras liberais que visavam instalar, sobretudo, o voto secreto, a verdade eleitoral, nós temos novamente o processo de captura desse movimento.

            O Partido Comunista Brasileiro se organiza com lideranças que vinham das greves operárias contemporâneas a Primeira Guerra Mundial. É o movimento autônomo, o movimento operário, político, que nasce da classe operária e visa afirmar a sua autonomia como ente político distinto. Mas no bojo da Revolução de 30 e, depois, no Estado Novo, o movimento operário é trazido para dentro do Estado Brasileiro; o movimento operário se estatiza, cria-se uma estrutura corporativa, representativa dos trabalhadores e, ao mesmo tempo, do patronato, absolutamente controlada de cima. E essa estrutura se mantém até hoje.

            Penso Srª Presidente, que algumas das questões que afligem hoje a opinião pública relacionada à atuação do Ministério do Trabalho são devidas ainda a esse tipo de movimento, de captura desse impulso que vem de baixo pelo Estado. Nós tivemos raros momentos na vida brasileira em que o Brasil crescia e se desenvolvia do ponto de vista econômico e se diferenciava do ponto de vista social, tivemos paralelamente a isso um desenvolvimento político exuberante.

            Srª Presidente, Srs. Senadores, em minha opinião esse momento se inicia com a Constituição de 88; Constituição que surge de uma ampla conjugação de forças políticas, mas que traz no seu bojo, no seu seio, transformadas em normas do direito positivo, do direito constitucional, um elenco de reivindicações, de conquistas, de garantias para essas conquistas que dão a essa Constituição merecidamente o nome de Constituição Cidadã.

            Mais ainda, criaram-se condições de manifestação do povo, da sociedade civil, inéditas na nossa história constitucional. A titularidade da Ação Direta de Constitucionalidade que, no regime anterior, era privativa do Procurador-Geral da República e hoje são inúmeras as instâncias da sociedade civil e da política dotadas de titularidade para levar, perante o Supremo Tribunal Federal, a discussão e a decisão sobre a Constitucionalidade das leis; a iniciativa popular, que deu, entre outros frutos, a Lei da Ficha Limpa; a Ação Civil Pública para defender interesses difusos; a titularidade de associações para defender, a titulo próprio, o interesse dos seus associados; a Criação do Conselho Nacional de Justiça, entre outras.

            Tudo isso configura um conjunto de instituições que favoreceriam a expansão da cidadania, para dar à nossa República o seu verdadeiro significado, res publica, a coisa que é de todos, para romper o elitismo, que, ao longo dos anos, vem contendo a expansão da democracia no nosso País.

            Vejo, no entanto, Srª Presidente, que, nos dias de hoje, vivemos uma contradição provocada, em primeiro lugar pelo fato de, mais uma vez, na história brasileira, no governo do PT, no governo de um partido que nasce das lutas da sociedade civil, e dirigido por líder operário, mais uma vez, assistimos à captura dos anseios que vêm de baixo pelas forças do atraso e pelo elitismo.

            A incapacidade que tem o Partido dos Trabalhadores de mudar a forma de fazer política em nosso País, e, com isso, satisfazer as demandas e as aspirações que ele encarnou quando na Oposição e no momento da sua criação, leva a enorme frustração de cidadãos que vão muito além das fronteiras da influência política deste Partido.

            Confesso a V. Exª que quando o Presidente Lula chegou ao poder eu tinha a expectativa, como homem de esquerda que eu sou, que fosse feita realmente uma política inovadora.

            Vamos ver o que é possível, o que esse segmento da esquerda pode fazer no Governo, uma vez que no governo anterior, dirigido por intelectual que nasce das lutas da universidade, das lutas democráticas, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, as tarefas que tínhamos diante de nós eram tarefas que impediam de alguma forma de colocarmos o selo próprio da social democracia nas nossas políticas dada a profunda crise econômica, fiscal, política que vivíamos naquele momento, e o sintoma mais evidente e dramático era a hiperinflação.

            No entanto, esse governo, continuou com as coisas positivas, que iniciamos. A expansão do crédito, por exemplo, que trouxe para a participação no consumo mais conspícuo milhões e milhões de brasileiros; as políticas direcionadas de distribuição de renda foram muito positivas e contribuíram para que hoje tivéssemos uma ascensão de segmentos que foram secularmente excluídos dos benefícios da vida moderna.

            No entanto, do ponto de vista da política, Sr. Presidente, o PT não foi capaz de romper as amarras que continuam ainda hoje tolhendo a autonomia, a força ativa da cidadania na vida política e na vida social. Pelo contrário, além de ter mantido intacta a estrutura sindical herdada do Estado Novo, foi além,

            Ao oficializar a transferência do imposto sindical para as centrais sindicais, sem exigir a contrapartida da prestação de contas do que é extraído do bolso do trabalhador pela força do Governo e da lei, houve um movimento no sentido de trazer para dentro do Governo, para dentro do Estado, tolhendo a autonomia, o movimento estudantil, o movimento dos trabalhadores sem terra, os diferentes movimentos sociais, que foram, aos poucos, sendo engessados por barafunda de conselhos, de instâncias deliberativas, que fizeram deles braços do Estado, em vez de serem terrenos de expressão da liberdade e da criatividade da sociedade civil.

            E as notícias dos dias que correm, com casos frequentes, constantes, recorrentes, acabrunhantes de corrupção revelada nos órgãos do Governo, um depois do outro - a cada fim de semana, uma revelação -, são a pior herança que poderíamos deplorar nas vésperas da comemoração da proclamação da República. O Brasil não merece isso. A sequência de escândalos tem custo tremendo, de vários pontos de vista. Não me refiro apenas ao dinheiro que é desperdiçado, ao dinheiro que vai parar no bolso de políticos e de administradores corruptos e que poderiam estar sendo utilizados para atender as finalidades para as quais foram inscritos no Orçamento da União, ou seja, o serviço ao povo, o serviço público, a devolução, sob a forma de serviços, do imposto que o cidadão paga, para a res publica.

            Refiro-me também à forma de ocupação do Governo - como vem dizendo o nosso Líder Álvaro Dias -, que consiste na entrega de “capitanias hereditárias” para partidos e grupos políticos, sem exigir dos seus ocupantes o mínimo de qualificação profissional, de padrão ético, de comprovação da sua vida passada, de engajamento na defesa do interesse público, só poderia dar no que estamos vendo, só poderia redundar no que está acontecendo.

            Isso leva, além do desperdício do dinheiro que escorre pelos ralos da corrupção, à ineficiência, à paralisia, ao mau planejamento, a fatos como estes que foram apontados agora pela Senadora Ana Amélia, dos recursos destinados à política antidrogas, R$ 33 milhões no Orçamento deste ano, apenas R$ 4 milhões foram empenhados até o presente momento, e nós já estamos avançando pelo mês de novembro.

            O prejuízo é maior do que o prejuízo material, do que a falta de projetos, do que a paralisia de setores inteiros da Administração que lançam e relançam programas, mas que não consegue tirá-los do papel; leva à desmoralização da política, a ideia por parte da opinião pública de que todos são iguais, de que não vale a pena sair dos cuidados da sua vida particular, da sua vida privada para se dedicar à causa pública, desde que todos os políticos só disputam eleições e ocupam cargos para benefício próprio.

(Interrupção do som.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP) - Obrigado, Sr. Presidente.

            Essa é a ideia disseminada de forma dramática, que vem corroendo a autoridade e o laço de confiança que deve existir entre os cidadãos e as suas instituições representativas, vale dizer, a desvalorização da política.

            Eu espero, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que iniciativas que aqui ou ali vão pipocando, como estas que estão anunciadas para amanhã, em 35 cidades, movimentos contra a corrupção, que não são dirigidas por nenhum partido, não têm nenhum líder conhecido, mas são manifestações espontâneas do povo, de gente arregimentada pelo fato de ter ideias comuns, de que, na vida pública, as pessoas devem conservar o mesmo padrão de honestidade...

(Interrupção do som.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP) -... que cada homem de bem tem na sua vida privada; que isso consiga sacudir, consiga se espraiar como ondas de choque...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney. Bloco/PMDB - AP) - Peço licença a V. Exª para interrompê-lo, porque se encontram visitando a nossa Casa visitantes do Município de Governador Valadares.

            Então eu queria agradecer a visita de todos.

            Muito obrigado!

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP) - Bem-vindos!

            Já concluo, Sr. Presidente.

            Neste sentido, meu querido Senador Aníbal Diniz, V. Exª que falou com emoção e com a esperança do Congresso da Juventude do PT e da força da juventude, do apego que a juventude tem a idéias e a ideais.

            Quero dizer que fiquei triste quando li nos jornais e espero que os jornais não tenham retratado na íntegra as declarações do ex-ministro José Dirceu desvalorizando os movimentos pela ética que ocorrem no Brasil e que são tão fortes, tão importantes, tão promissores que mereciam melhor tratamento por alguém que tem a importância política dentro do seu partido e no país, que é o ex-ministro Dirceu.

            Tenho a impressão, nós que estamos examinando na Comissão de Constituição e Justiça um projeto de lei da Câmara que institui o Estatuto da Juventude, que cria três categorias de jovens. Os jovens adolescentes, os jovens jovens e os jovens adultos, que o ex-ministro José Dirceu falou para jovens velhos ou imaginou está se dirigindo.

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (José Sarney -Bloco/PMDB - AP) - A campainha é automática.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP) - Eu espero que a imprensa não tenha retratado na íntegra o discurso do ex- Ministro José Dirceu e nem do Presidente do Partido, meu querido amigo Rui Falcão, que vão na mesma linha. Desvalorizar os movimentos pela ética na política como se isso fosse algo da elite. Não é da elite não. Se fosse da elite não haveria nenhum problema, mas é cada vez mais do povo.

            E mais, o Governo do Presidente Lula, na sequência do Presidente Fernando Henrique, promoveu para cima, para níveis maiores de renda, pessoas que acabaram por se emancipar das exigências mais imediatas da reprodução da vida material.

            Criou-se uma classe média expandida que hoje é muito numerosa e muito ampla e que se orienta por valores éticos e democráticos que não devemos nos esquecer as vésperas da comemoração da era República.

            Muito Obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/11/2011 - Página 47128