Discurso durante a 207ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem pelo transcurso, no dia 24 do corrente, dos 150 anos de nascimento do poeta catarinense Cruz e Sousa.

Autor
Paulo Bauer (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SC)
Nome completo: Paulo Roberto Bauer
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem pelo transcurso, no dia 24 do corrente, dos 150 anos de nascimento do poeta catarinense Cruz e Sousa.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Inácio Arruda, Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 17/11/2011 - Página 47538
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ANIVERSARIO, POETA, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), ELOGIO, VIDA, OBRA LITERARIA.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco/PSDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.)- Sr. Presidente, nobres Srs. Senadores e Srªs Senadoras, na tarde hoje, quando nos encontramos em sessão, eu desejaria abordar vários assuntos que, sem dúvida nenhuma, mereceriam e devem merecer as atenções do Plenário desta Casa, dos seus integrantes e principalmente dos dirigentes do País, a nossa Presidente, o Vice-Presidente, os ministros. Mas, obviamente, teremos oportunidade para fazê-lo, a partir do momento em que usarmos da tribuna em outra ocasião e já está programada uma participação, um pronunciamento na tarde de amanhã e também teremos oportunidade de falar de questões da economia e outras mais no curso dos próximos dias, quando estaremos analisando várias proposições e vários textos de ordem legal que precisarão merecer a nossa análise e a nossa votação.

            Eu também poderia hoje aqui mencionar e registrar questões relacionadas à infraestrutura, a obras que meu Estado reivindica, principalmente no âmbito do Ministério dos Transportes e no Dnit. Mas não quero fazer menção a um assunto muito importante, que é a duplicação da BR-280, sem antes conhecer qual a nova data que o Ministro dos Transportes vai indicar para realização de uma audiência que ele mesmo havia marcado e ele mesmo suspendeu, anunciando sua transferência. Não temos a data ainda, mas espero que seja definida nos próximos dias, para, então, mais uma vez, discutirmos com o Ministro e com os técnicos do Ministério e do Dnit qual o cronograma previsto para a execução de uma obra tão importante.

            Na data de hoje, Sr. Presidente, Srs. Senadores e Senadoras, desejo aqui me manifestar a respeito e sobre um grande e ilustre catarinense. E o faço como ex-Secretário de Educação, Cultura e Desporto de Santa Catarina, no período do Governo de Vilson Kleinübing.

            Na qualidade de Secretário de Cultura, muitas vezes pude desenvolver ações que valorizaram essa figura, que enalteceram o seu trabalho e que permitiram que no meu Estado e também no Brasil a sua obra fosse aplaudida até o dia de hoje.

            Na condição de Secretário de Educação, agora no último período governamental sob o comando do Governador e hoje Senador Luiz Henrique, desenvolvi novamente ações que foram benéficas à educação no meu Estado, mas também foram muito positivas no sentido de que os catarinenses, principalmente os alunos da rede pública, pudessem conhecer um pouquinho mais da obra desse ilustre catarinense, uma vez que todos os alunos do ensino médio puderam ter contato com sua realização, com sua obra, tendo ela disponibilizada para utilização em seus domicílios, juntamente com seus familiares.

            Eu falo, Sr. Presidente, que, há 150 anos, exatamente no dia 24 de novembro de 1861, nascia João da Cruz e Sousa, na cidade de Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis, vindo a falecer 36 anos depois, em Minas Gerais, quando buscava tratamento para tuberculose.

            Tal qual tantos outros gênios, Cruz e Sousa acabou por não receber o devido reconhecimento em vida. Filho de escravos, mas criado pelos antigos donos de seus pais, acabou por ser uma das muitas vítimas de um Brasil que vivia os últimos anos do Império, saía da escravidão, mas que não viu a República ser capaz de realizar o sonho de redimir um povo que fora vítima de tão dura opressão.

            A República, pelo menos em seus primeiros anos, é marcada pelo signo da decepção, como, aliás, pode ser lido na obra de Lima Barreto, escritor negro de destaque nos primeiros anos do século XX.

            No caso de Cruz e Sousa, a decepção se mostra marcada pelo terrível gosto da impotência diante de um mundo hostil. Conhecedor de latim, grego e francês, viu as portas lhe serem fechadas repetidamente, tendo que se contentar com empregos humildes e, invariavelmente, abaixo de suas qualificações.

            A despeito dessas dificuldades em vida, Cruz e Sousa conseguiu se tornar representativo na literatura brasileira, com obra que se tornou marco para as futuras gerações.

            Além das profundas mudanças políticas que o País atravessa nesses fins do século XIX, há também significativas transformações no campo das artes. É o momento em que o romantismo é superado, em que certa visão de mundo, com grande idealização do passado, é deixada para trás. É o momento da crítica, do assombro diante das novas tecnologias que surgem, bem como do ceticismo diante de uma sociedade em constante mutação. No romance, é o tempo de Machado de Assis, um subversor das regras estabelecidas. Na poesia, é o tempo de Cruz e Sousa, autor que supera o romantismo em busca de uma voz própria. Nas palavras do grande poeta pernambucano Manuel Bandeira, "não há na literatura brasileira gritos mais dilacerantes, suspiros mais profundos do que os de Cruz e Sousa", que produz "uma arte preciosa, requintada, difícil, cheia de matizes e de delicadeza..."

            O movimento artístico a que pertence, conhecido como simbolismo, se manifesta na música, na pintura e literatura, mas é na poesia que se mostra em sua inteireza, em todo o seu poder. Ainda segundo Manuel Bandeira, "Cruz e Sousa sentia nitidamente que a arte era um meio de abolir a fronteira que a sociedade colocava entre os filhos de escravos africanos e os filhos dos brancos livres". Era na poesia, pois, que Cruz e Sousa vislumbrava com inteireza a possibilidade de ser completamente livre.

            Mas, em uma sociedade conservadora, muito conservadora, seus versos, que ecoavam a vanguarda literária francesa, não eram inteiramente compreendidos porque inovavam, inventavam, criavam algo que, ainda nas palavras de Manuel Bandeira, combinavam "imprecisão de contornos e de vocabulário, um conceito mais musical do que plástico da forma e os estados mais crepusculares...", tornando possível dizer que Cruz e Sousa não é um autor que meramente antecede o moderno. Na verdade, trata-se não de um prenúncio, mas da plena realização da arte que virá a ser a arte do século XX: cheia de significados, símbolos e manifestações mais profundas da consciência.

            Mesmo que em relação à forma Cruz e Sousa ainda se atenha ao respeito dos aspectos mais tradicionais do verso, na busca de novos sentidos, sua obra implica genuína revolução, que prenuncia, por exemplo, as descobertas de Freud em relação ao inconsciente, ao lado desconhecido e oculto do homem.

            Não é por acaso que um importante simbolista francês define que "o poeta é um vidente por um longo, imenso e irracional desregramento de todos os sentidos".

            É exatamente assim que podemos definir Cruz e Sousa, um rompedor de barreiras artísticas. Como observa o crítico literário catarinense Lauro Junkes, “em Faróis e, sobretudo, em Últimos Sonetos, a poesia torna-se cada vez mais dramática, transparecendo o senso trágico da existência".

            Esse senso trágico da poesia também anda em paralelo com os dramas pessoais de sua vida. Seus últimos anos são marcados pela doença, pelas dificuldades financeiras crescentes, pelo falecimento precoce de alguns de seus filhos, pela loucura de sua esposa.

            Se a vida de Cruz e Sousa não foi aquela que ele se sentia destinado a viver, ela produziu, no entanto, um fabuloso legado na forma de obra poética de primeira grandeza não apenas em termos de Brasil.

            Aliás, esse meu entendimento sobre a importância de Cruz e Sousa não é de última hora. Lembro-me de que, quando Secretário de Educação, determinei a distribuição aos alunos do ensino médio da rede estadual de Santa Catarina de publicação denominada Broqueis e Faróis. Como o próprio nome já sugere, a publicação então distribuída reunia duas coletâneas poéticas: Broqueis, de 1893, e Faróis, de 1900, ambas do poeta catarinense. Tratava-se não apenas de uma homenagem a Cruz e Sousa. Tratava-se, acima de tudo, de levar aos alunos, a seus pais, tios, primos, amigos e a tantos outros a possibilidade de conhecer aquele poeta e parte da sua contribuição à literatura e à poesia do nosso querido Brasil.

            Entendo, então, que esses 150 anos do seu nascimento são, assim, momento oportuno para ler sua obra, com afinco, com apreço, com respeito. Lê-lo é a justa homenagem que podemos fazer ao maior poeta catarinense, ao poeta que orgulha Casildo Maldaner, ex-Governador e Senador da República, que tão bem representa meu Estado ao meu lado nesta Casa; que orgulha e honra Luiz Henrique da Silveira, um ex-Governador de Santa Catarina, que presta relevantes serviços ao País hoje como Senador e, sem dúvida, orgulha todos os catarinenses, homens públicos ou homens da iniciativa privada, empreendedores ou trabalhadores, professores ou meros apreciadores da literatura, aqueles que fazem hoje a nossa história e a nossa cultura acontecer.

            Todos nós temos muito orgulho desse ilustre catarinense, ilustre brasileiro, respeitado em todos os recantos do mundo e agora reverenciado por estar completando mais um momento importante da sua história, mesmo que já falecido há tantos anos.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - V. Exª me permite, Senador?

            O SR. PAULO BAUER (Bloco/PSDB - SC) - Ouço, com muito prazer, o aparte que me solicita o nobre Senador Casildo Maldaner.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Ninguém melhor do que V. Exª, que foi Vice-Governador de Santa Catarina, Secretário de Estado da Educação no nosso Estado catarinense por várias vezes, em vários governos, principalmente no governo de Luiz Henrique da Silveira também, para, neste momento, representar os catarinenses todos aqui no Senado, homenageando esse grande e ilustre poeta, esse grande Cruz e Sousa, que honra Santa Catarina e o Brasil, como bem frisa V. Exª. É por isso que eu gostaria, neste aparte, de me congratular com V. Exª quando faz essa referência, quando fala ao Brasil, Senador Paulo Bauer, sobre um poeta, um expoente da literatura catarinense e brasileira, como o nosso Cruz e Sousa. Esse é o sentido do meu aparte, porque V. Exª fala por si, fala por nós, fala por Santa Catarina e fala pelo Brasil.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco/PSDB - SC) - Agradeço a V. Exª pelo aparte e, com certeza, Cruz e Souza, que hoje homenageamos pelo evento da passagem dos seus 150 anos de nascimento, é um ilustre brasileiro que orgulha a nós todos, como orgulha, sem dúvida nenhuma, o nosso Presidente que comanda essa sessão, Senador Anibal Diniz, orgulha o Senador Wellington Dias, orgulha o Senador Inácio Arruda, todos que aqui estão presentes, todos os que estão presentes na Casa no dia de hoje e que, sem dúvida, também consideram a cultura, a reverência àqueles que deram grande contribuição a ela como um patrimônio que precisa ser preservado e valorizado no País.

            Ouço com prazer V. Exª, nobre Senador Inácio Arruda.

            O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Senador Paulo Bauer, eu quero me associar a V. Exª no sesquicentenário de um dos maiores poetas brasileiros, negro, um lutador em defesa das causas libertárias do nosso País. Eu acho que fazer essa homenagem, destacar essa bela poesia dos negros brasileiros a partir de um negro de Santa Catarina que V. Exª traz ao debate, em discussão no Senado Federal. Então, eu quero me associar, lá do Ceará, da terra do Patativa do Assaré, um grande poeta popular, de figuras extraordinárias, também poetas do povo como o Cego Aderaldo, figuras extraordinárias. Gente desse tipo, gente talhada para defender a causa do seu povo e sobretudo a causa do nosso País, pois era assim que esses homens trataram. É por isso que um sesquicentenário desses jamais poderia deixar de ser lembrado e V. Exª faz muito bem, Senador Paulo Bauer.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco/PSDB - SC) - Eu agradeço o aparte de V. Exª e veja, Senador Inácio Arruda, que o meu Estado de Santa Catarina tem uma presença muito forte em sua colonização com a vinda de europeus, os imigrantes italianos, alemães, poloneses deram grande contribuição ao meu Estado, os portugueses, os espanhóis igualmente. E, curiosamente, ele é um Estado que teve uma presença mínima da raça negra na sua colonização. Houve uma presença muito pequena, mas, felizmente, essa presença, pequena do ponto de vista numérico, se tornou grande pela contribuição que muitos deram com o seu trabalho diário, com o seu trabalho nas lavouras, com o seu trabalho em toda a construção de Santa Catarina, mas também e principalmente através da sua contribuição na literatura, na cultura por meio do trabalho de Cruz e Souza que hoje aqui reverenciamos.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Peço um aparte a V. Exª.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco/PSDB - SC) - Ouço V. Exª, Senador Wellington Dias, com muito prazer.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Eu quero também me somar. Lembro-me, ainda estudante e me dedicando às escritas, aos belos poemas, quem sabe, boa parte em uma conjuntura muito na busca da liberdade, na busca da pauta brasileira, enfim. E eu queria aqui me somar a essa homenagem que V. Exª faz a Cruz e Souza, como brasileiro, como piauiense, enfim, também queria dizer do carinho com que todo o povo brasileiro tem pelo povo de Santa Catarina e, é claro, todo o orgulho que todos nós, brasileiros, temos pela força da poesia de Cruz e Souza. Muito obrigado.

            O SR. PAULO BAUER (Bloco/PSDB - SC) - Agradeço a V. Exª e concluo o meu pronunciamento, agradecendo à Presidência e a todos os que me emprestaram a sua audiência neste pronunciamento.

            Voltaremos oportunamente e, certamente, sempre que possível, enalteceremos o trabalho de Cruz e Souza em favor da cultura e da poesia brasileira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/11/2011 - Página 47538