Discurso durante a 211ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de correspondência enviada por S.Exa. à Presidenta Dilma, em que se posiciona contrariamente ao novo projeto de partilha dos royalties do petróleo brasileiro, em tramitação no Congresso Nacional.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • Registro de correspondência enviada por S.Exa. à Presidenta Dilma, em que se posiciona contrariamente ao novo projeto de partilha dos royalties do petróleo brasileiro, em tramitação no Congresso Nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/2011 - Página 48135
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • REGISTRO, LEITURA, CARTA, POSIÇÃO, CRITICA, ORADOR, REFERENCIA, PROJETO DE LEI, DISTRIBUIÇÃO, ROYALTIES, PRE-SAL, DESTINAÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, ocupo a tribuna, nesta tarde, para dar divulgação a uma correspondência pessoal que fiz a Excelentíssima Senhora Presidente da República Dilma Rousseff, no último dia 16 de novembro.

Senhora Presidenta, com a representação do Estado do Espírito Santo, a mim conferida pelo povo capixaba, por meio do mandato de Senador da República, venho à presença de Vossa Excelência para apresentar algumas considerações acerca da discussão envolvendo a redistribuição dos royalties de petróleo e gás natural entre os entes federados brasileiros, tendo em vista a preservação do pacto federativo e a justiça com as regiões produtoras, analisando em especial a situação do meu Estado.

As lideranças políticas capixabas são a favor de que todos os Estados e Municípios brasileiros sejam alcançados pela riqueza gerada com extração de petróleo e gás natural na camada do pré-sal, pois isto reforça os laços de solidariedade do pacto federativo. Contudo, não podem admitir que, afrontando-se a Constituição Brasileira, se adote medida de natureza retroativa, atingindo contratos já em andamento e, com isso, se venha a redistribuir recursos que são legalmente pertencentes aos entes federados produtores.

É importante lembrar, Senhora Presidenta, que a Constituição de 1988 no § 1º do art. 20 previu como receita originária dos Estados e Municípios participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural (…) ou compensação financeira por esta exploração. Por outro lado, na alínea b, do inciso X, do art. 155 ficou estabelecido que o ICMS não incidirá sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados (…), ou seja, aos Estados produtores cabe a receita de participação nos resultados da exploração e compensação financeira (royalties) e aos Estados não produtores o ICMS, que deixou de incidir na origem da produção e passou a incidir no destino, nos Estados consumidores.

Para além de a situação colocada na atualidade ser uma afronta à constitucionalidade e, na prática, prever a dissolução do pacto que nos mantém como nação federada, o que, por si só, bastaria para refutarmos o projeto de lei aprovado no Senado, não poderia deixar de ressaltar junto a Vossa Excelência o quão decepcionante e triste se coloca esse quadro junto aos cidadãos capixabas.

O Estado do Espírito Santo, com o seu povo e com a sua localização geográfica na região central da costa brasileira, sempre teve grande potencial de desenvolvimento, seja por promover a conexão do Brasil Central com o exterior, seja pela disponibilidade de recursos naturais. Contudo, em vários momentos da história, o seu processo de desenvolvimento foi prejudicado pela cobiça de outras regiões e por atos do Poder Central Colonial, Imperial e Republicano.

Recordo alguns fatos históricos para ilustrar o que afirmo acima.  

Em fins do século XVII e início do século XVIII, com a descoberta de ouro e diamantes na região de Minas Gerais, a Metrópole Colonial Portuguesa, como forma de garantir o controle sobre as riquezas minerais brasileiras, determinou que não fossem abertas vias de comunicação (estradas) que ligassem o Espírito Santo àquela região. Assim, foram limitadas as possibilidades de desenvolvimento do interior capixaba e todo o impacto positivo que adviria do trânsito dos minerais pelo nosso território foi desviado para o vizinho [e amigo Estado] Rio de Janeiro. Durante todo o século XVIII, o Espírito Santo permaneceu à margem do desenvolvimento nacional.

Ao longo do século XIX e até os anos sessenta do século XX, o Espírito Santo, de forma silenciosa e com muito trabalho dos negros e imigrantes europeus que para cá vieram, construiu uma sólida e democrática base econômica assentada na cafeicultura. No momento de maior vitalidade da atividade cafeeira, entre 1962 e 1967, devido à crise da cafeicultura brasileira, o Governo Federal, através do IBC, implementou a política de erradicação dos cafezais que exterminou aproximadamente 54% dos cafezais e colocou no desemprego grande número de capixabas. Mas, o Espírito Santo não se abateu, enfrentou as dificuldades e reergueu sua economia em novas bases, desenvolvendo, sobretudo, um parque industrial exportador que muito contribui com a geração de divisas para o desenvolvimento do Brasil.

Recentemente, nos anos noventa, o Espírito Santo foi vítima da ação de maus cidadãos que afundaram o Estado na corrupção e destruíram a autoestima dos capixabas. Mais uma vez, a população reagiu à altura dos desafios daquele momento e, a partir da constituição de um Governo ético e com grande capacidade de gestão, foram reconstruídas as instituições, restaurada a ética e recuperadas as finanças públicas. Assim, tendo feito o que os capixabas denominam o dever de casa, preparamos o Estado para dar um salto no seu desenvolvimento, alavancado pela economia do petróleo e gás, que constitui um novo vetor de crescimento ou uma nova janela de oportunidades, mas que também requer um grande esforço do poder público para atender as novas demandas da população, especialmente dos mais pobres, que sabemos é a grande preocupação de Vossa Excelência.

As pesquisas petrolíferas no Espírito Santo foram iniciadas em 1957, a primeira descoberta se deu em 1969 e a produção começou em 1973, mas até poucos anos atrás a produção situava-se abaixo de 30 mil barris diários. Só nos últimos cinco anos, com o início da produção nas novas áreas descobertas no litoral capixaba, especialmente na camada do pré-sal, surgiram reais possibilidades de o Estado implementar um vigoroso ciclo de crescimento econômico e desenvolvimento social.

O Espírito Santo, Senhora Presidenta, pode ser referência para o Brasil em termos de políticas de distribuição e aplicação dos recursos de compensação financeira dos royalties de petróleo e gás natural. Desde junho de 2006, através de lei estadual, foi implantado o Fundo para a Redução das Desigualdades Regionais, composto por 30% dos royalties recebidos pelo Governo do Estado, que os distribui aos Municípios capixabas não produtores ou que recebam menos de 2% de royalties e menos de 10% da quota parte do ICMS. Esta distribuição se faz na razão inversa da participação do Município na quota parte do ICMS e na razão direta do tamanho da população. Esta lei beneficia 68 dos 78 municípios capixabas e estabelece que os recursos do fundo só podem ser aplicados em investimentos em áreas que promovam o desenvolvimento econômico e social.

Neste momento, como já aconteceu em outras conjunturas, está em curso mais uma iniciativa que pretende subtrair do Espírito Santo o direito de apropriar-se da riqueza que lhe cabe para promover o seu desenvolvimento, mesmo que com séculos de atraso com relação ao restante dos seus vizinhos.

Diante do exposto, apelo ao senso de compromisso de Vossa Excelência com a Constituição e o Pacto Federativo. Apelo, também, ao vosso senso de justiça perante os capixabas, os das atuais e das futuras gerações.  

A emenda Ibsen/Simon, aprovada pela Câmara dos Deputados, recebeu o veto do Presidente Lula por conter vícios de inconstitucionalidade. O novo projeto de lei aprovado pelo Senado Federal, de autoria do Senador Vital do Rêgo, com o objetivo de redistribuir os royalties de petróleo, contém os mesmos fundamentos e as mesmas inconstitucionalidades. Além de ferir a Constituição da República, agride o sistema federativo, pois a maioria dos Estados não produtores esmaga a minoria dos estados produtores, subtraindo-lhes direitos líquidos e certos e causando substancial perda de receitas. No Espírito Santo, Estado e Municípios perderão de 2012 a 2015, valor superior a R$ 3 bilhões.

Apelo, Senhora Presidenta, para que Vossa Excelência, com a autoridade e a responsabilidade do mandato que o povo brasileiro inteligentemente lhe concedeu, faça a mediação da negociação política no âmbito da Câmara dos Deputados. Apelo ainda para que, se fracassadas forem estas negociações, Vossa Excelência aponha um veto ao projeto de lei que venha a ser aprovado [pela Câmara].

Aproveito a oportunidade para solicitar a Vossa Excelência audiência coletiva a lideranças do nosso Estado, para que juntos possamos expressar nossa preocupação - fundamentada em dados [reais] concretos - com esse projeto de lei que é uma violência contra o povo capixaba, uma afronta à Constituição Federal e, consequentemente, ao Estado democrático de Direito.

            Essa é, pois, Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, a correspondência que enviei a Sua Excelência Presidente da República Dilma Rousseff, solicitando, em resumo, que ela possa coordenar, na Câmara, os entendimentos para que esse projeto possa ser aperfeiçoado, aprimorado e justiça seja feita ao meu Estado, o Espírito Santo. Mas não apenas ao meu Estado. Que também se eliminem os vícios da ilegalidade, os vícios que violam a Constituição Federal e o pacto federativo.

            Encerro, solicitando uma audiência a Sua Excelência a Presidente, para que lideranças capixabas possam pessoalmente relatar, com profundidade e detalhes, as preocupações que, neste momento, trazem grandes incertezas à população capixaba.

            Muito obrigado, Sr. Presidente. Muito obrigado, Srªs Senadoras e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/2011 - Página 48135