Discurso durante a 214ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise da influência libanesa na cultura brasileira.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA CULTURAL.:
  • Análise da influência libanesa na cultura brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2011 - Página 48787
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • COMENTARIO, VISITA, IMPERADOR, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, LIBANO.
  • ANALISE, INFLUENCIA, POPULAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, LIBANO, REFERENCIA, CULTURA, BRASIL, RESULTADO, INTEGRAÇÃO, PAIS, INSTITUCIONALIZAÇÃO, COMERCIO.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, jovem Senador Lindbergh, eu aprendi a conhecer, a respeitar uma cara pintada num momento dos mais importantes da vida deste País.

            V. Exª é testemunha viva dessa quadra de 1964 até hoje, da qual ainda não saímos em caráter definitivo, mas que, com a participação da sociedade, nós podemos dizer que fizemos a nossa história. V. Exª, no Rio de Janeiro, liderando a mocidade dali e do Brasil, serviu de um estímulo muito grande a todos nós. Ali foi uma oportunidade. Se não fora os jovens na rua, o Congresso não teria feito o que fez. Ali, como nas Diretas Já, como agora na Ficha Limpa, foram os jovens, foi o povo que pressionou esta Casa, e esta Casa avançou.

            Aliás, eu não acho negativo isso. É uma grande qualidade essa de, graças a Deus, restar a nós a sensibilidade de aceitarmos a legítima pressão que vem da sociedade, como veio por parte, principalmente, dos jovens. Por isso, é uma alegria vê-lo aqui presidindo esta Casa . 

            A vida dá volta. Eu, quando entrei na vida pública, também fui presidente da junta da UNE, era um jovem. Mas vivi, como estudante, uma época mais tranquila do que a tua. Juscelino Presidente, uma maravilha, crescimento... Era uma fase, o Brasil explodindo. Até a vitória do Jânio Quadros! Parecia... Eu não votei no Jânio, votei no Lott, mas votei com raiva de votar no Lott, porque o Jânio era muito mais brilhante. O Lott era uma biografia muito bonita, ia para a tribuna e perdia voto, ficávamos com raiva, porque ele não dizia nada com nada e o que dizia era bobagem. Sete meses empolgantes com o Jânio, e aquela renúncia, e toda a loucura que veio depois.

            V. Exª tem uma missão importante. Eu estou saindo, estou indo para casa. Mas V. Exª está começando. E repare V. Exª, começando no Senado da República, tenho certeza, com um grande futuro.

            Sr. Presidente, meu amigo Paim, eu fico emocionado com os relatórios que o meu amigo Paim faz da sua atividade. Eu não sei como na sexta, sábado, domingo e segunda ele fez o que ele fez: percorreu não sei quantos mil quilômetros, percorreu não sei quantos Municípios, participou de não sei quantas solenidades.

            Eu sou admirador de V. Exª. Acho essa garra, essa coragem, essa bravura realmente muito positiva. E tenho certeza de que V. Exª tem um grande futuro.

             Nós já tivemos a primeira mulher presidente. O americano está tendo o primeiro negro presidente. Quem sabe não vai inverter? O Paim está aí, na espera.

            Eu estou aqui com tratamento dentário. Meu dentista é da maior competência, meu amigo, mas a gente sofre com dentista. Eu tinha que estar em São Paulo neste momento, mas estou impossibilitado de estar lá e venho a esta tribuna, falando devagar, pela obrigação de dizer aqui o que não posso dizer lá, em São Paulo.

            Daqui a pouco, às 20 horas, no Sesc Vila Mariana, em São Paulo, teremos a solenidade de abertura de comemoração dos 35 anos da visita do Imperador D. Pedro II ao Líbano.

            Você que está me assistindo na TV Senado já tinha ouvido falar nisso? Quantas pessoas tinham ouvido falar que, no século retrasado, D. Pedro II, numa caravana com mais de 200 brasileiros, visitou o Líbano?

            Vale lembrar que - estamos aqui o Ministro da Previdência, Senador Garibaldi - há poucos minutos o Senador Paim desta tribuna lhe fazia uma saudação, a mais profunda e a mais respeitosa: Governador, Senador, Ministro, com a mesma simplicidade. Parece até um Pedro Simon, que não é ninguém na vida!

            Vale lembrar que D. Pedro II, em suas viagens ao exterior - Estados Unidos, Europa, França de um modo especial - e mesmo nas suas viagens ao interior do Brasil, tinha por método registrar todas as impressões sobre diferentes locais por onde andou, por onde transitou, e o seu diário se constitui hoje em uma das mais importantes fontes de informação para o conhecimento da nossa história no período imperial.

            Os documentos daquela viagem foram disponibilizados pelo Museu Imperial de Petrópolis e pela Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Os Correios promoverão, no mesmo ato, o lançamento do carimbo comemorativo à data e o público poderá também conhecer - muitos, pela primeira vez - a bandeira e a espada do Imperador, fornecidos pela Casa Imperial do Brasil.

            Haverá, ainda, exposição de fotos das cidades libanesas visitadas por D. Pedro II, além do lançamento do catálogo 130 anos de Imigração Libanesa no Brasil, do Senador Roberto Khatlab.

            Eu não poderei comparecer à solenidade, o que me entristece. Nós descendentes daquelas terras somos seguidores fantásticos da ciência e da religião. A ciência me impede de estar presente fisicamente, por motivos de saúde. A fé transporta a minha alma até lá, o que me deixa feliz por prestigiar, presenciar e participar da alegria de todos os amigos, tendo à frente a Srª Lody Brais, presidente da Associação Cultural Brasil-Líbano, coordenadora do encontro. Ela também, com essa feliz ideia, está contribuindo para a construção da nossa melhor história.

            D. Pedro II governou o Brasil durante meio século. É uma pena, e daí a grande importância desse evento, que tenhamos uma Nação não preocupada com a sua memória histórica, que não dá valor a essa memória. A história tem que se lembrada, não importa se comparada às plantações de joio ou às plantações de trigo: se de trigo, para servir como referência para os tempos que virão; se de joio. para que nunca mais se repita.

            Não há dúvida de que o reinado de D. Pedro II foi para o País um tempo de boas referências, um tempo viçoso de trigo. Eu não tenho dúvida também de que estamos vivendo um tempo de necessidade de voltar àquela história, para aquele tempo servir de espelho para os governos atuais, principalmente quando se fala de ética na política.

            D. Pedro II foi um exemplo emocionante de dignidade e de ética. Se discorrermos sobre D. Pedro II, numa concepção positivista de como ele era, chegaremos à conclusão normativista de como os atuais governantes deveriam ser novos D. Pedros II, que debutou o poder com 15 anos, preparado evidentemente, milimetricamente para a função.

            Era um tempo de grande agitação política que poderia ter escrito outra história para o País, mas, o que pode ser ainda mais importante, poderia ter comprometido a nossa geografia. Em diferentes pontos do Brasil, pipocavam movimentos de insurreição que, agora, mal frequentam os nossos livros escolares, mas que deveriam ser, hoje, elementos de discussão da nossa trajetória como Nação independente.

            D. Pedro II não se movia por ambições desmedidas nem pelas pompas do poder. Os relatos sobre a sua vida dão conta de um caráter sem qualquer mácula, movido pela melhor das definições de honestidade - se é que essa palavra necessite de qualquer outro sinônimo. Ele era honesto no trato da coisa pública. Não há nem mesmo uma mera insinuação sobre a sua conduta ética. Exerceu a política como sacerdócio e deixou o País rumo ao exílio aos 65 anos, deixando para trás um País íntegro na sua geografia e fortalecido na sua história. Aboliu a escravatura, construiu as bases para uma representação política mais democrática, via eleições, e deu sustentação para uma expressiva liberdade de imprensa.

            Os seus minuciosos relatos escritos retratam a hierarquia das suas convicções: primeiro, Deus; depois a humanidade, a Pátria, a família, os indivíduos. Exatamente nesta ordem: Deus, a humanidade, a Pátria, a família, os indivíduos.

            Ouso dizer que as críticas que se faz a D. Pedro, como governante, devem-se, contraditoriamente, às suas características como ser humano, à sua total falta de ambição pelas benesses do poderm, o que não é diferente no tratamento aos governantes nos nossos dias. A nossa história recente dá conta de personalidades políticas folclorizadas pela mídia e pelos historiadores exatamente porque não trilham o caminho da pompa e porque defendem a soberania nacional em um ambiente de pressão pela globalização.

            D. Pedro II deixou, íntegro, um País íntegro.

            Ele era, no poder e na vida, o que todos os governantes deveriam ser lá e cá no tempo: honesto.

            Ele é, na nossa história, uma referência perdida pela desmemória. Ele era um amante da arte, da ciência e do conhecimento.

            A sua simplicidade no ser não significava, nem para ele, nem para o País, a estagnação no tempo. Buscava, para a construção do Brasil, o melhor de sua época. Podemos dizer, portanto, que vivemos hoje um tempo cujas paredes se ergueram sob alicerces bem fundados na época de D. Pedro II. A formação do nosso povo, rica nas diferenças, inclusive e principalmente. É esse o contexto da sua viagem ao Líbano, que hoje é lembrada, com reverência, pelos 135 anos passados.

            D. Pedro II visitou o Líbano, portanto, em 1876. Viajou, como sempre, por conta própria, como em suas viagens a Paris, onde ele pegava empréstimos, inclusive bancários, para bancar as suas viagens. Não era dinheiro público, não era o dinheiro do tesouro, não era o dinheiro... Era a expensas própria.

            Aliás, lembro aqui as suas histórias do exílio, morando em um hotel de segunda categoria, em uma vida quase de classe média baixa, a impressão que ele deixou na história deste País. Nessas suas viagens, nessas suas peregrinações, dispensava o gasto público, embora a importância de sua presença em outras terras. Na linguagem atual, nunca utilizou "cartão corporativo". Essa sua viagem teve, sem dúvida, influência importante na vinda de libaneses para o Brasil. A sua maneira cativante de ser moldou decisões já propensas a deixar aquele País, tendo em vista as perseguições políticas e religiosas que aconteciam por lá. A viagem de D. Pedro abrindo as portas e convidando-os para este continente foi o fato determinante da vinda de muitos libaneses .

            Evidente que os conflitos, já existentes naquele tempo, motivaram a emigração em massa do povo libanês para outras terras. A América, em especial. Mas os registros históricos dão conta de que, ao descerem em terras americanas, os imigrantes tinham pouca noção geográfica de onde aportavam. Imaginavam muitos que se resumia a América aos Estados Unidos. Alguns historiadores contam que muitos libaneses ficaram espantados quando chegaram aos portos brasileiros e argentinos, imaginando terem vindo, na verdade, para a América do Norte.

            Daí a importância da viagem de D. Pedro II. Ele fez-se conhecer e mostrou um país de braços abertos para os povos que se propunham trabalhar na sua construção enquanto nação livre e democrática.

            Na chegada ao Brasil, os libaneses não tiveram grandes dificuldades de adaptação à nossa terra e à nossa gente. Existem estudos que dão conta de que até mesmo as brincadeiras infantis tinham muita similaridade. Muita similaridade! Já naquele tempo, o povo brasileiro tinha essa característica atual de convivência pacífica e de harmonia entre diferentes.

            Havia, também, um traço de união entre brasileiros e libaneses: a importância dos laços familiares no cultivo da árvore da vida. Talvez possa estar aí o melhor significado para o "cedro do Líbano", a árvore-símbolo daquele país: o emblema da bandeira do Líbano foi escolhido porque simboliza força e imortalidade. É muito comum ouvir-se a expressão "família libanesa", tal e qual se diz "família brasileira". Com a migração e com os laços de amizade que se estabeleceram, hoje há uma grande e extraordinária família unida, a família brasileira.

            Volto ao cedro do Líbano, tão bem expresso no texto da proclamação do Grande Líbano como Estado Independente, em 1920: "O cedro sempre verde é um povo sempre jovem, apesar de um passado cruel. Embora tenha sido oprimido, jamais conquistado. O cedro é o seu sinal de união. E, pela união, pode enfrentar a todos os ataques".

            Onde nasce um cedro do Líbano, é sinal de que, ali, a terra é fértil.

            Foi assim que nasceu a amizade entre os povos brasileiro e libanês. Em terra fértil. Forte e imortal.

            Os libaneses que para aqui vieram mantiveram uma característica que lhes era própria nas terras de origem: a profunda capacidade comercial. A estabelecida ou a chamada "porta-a-porta". Neste último caso, há uma questão pouco estudada sobre a atividade comercial dos libaneses. Como "caixeiros-viajantes", eles se embrenhavam no mais interior do País, no nosso Brasil, nas áreas rurais dos centros considerados mais prósperos e em outras regiões mais distantes como o Centro-Oeste, e não se caracterizavam, apenas, como vendedores de mercadorias: eles se transformaram, com seus sotaques carregados, em fonte de informações para aqueles povos. Eles transmitiam às populações locais, principalmente as mais isoladas, o que acontecia na capital e no restante do País.

            No Rio Grande do Sul, na Revolução Farroupilha e em outros acontecimentos, como a Revolução de 30, eles eram...

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS) - ...eles eram os mascates, que levavam a orientação, de ponta a ponta, do que estava acontecendo; eram o elo de ligação [fora do microfone] entre brasileiros, que não tinham rádio, não tinham televisão, não tinham jornal, não tinham nada; eles é que faziam essa transmissão de orientação.

            Pode-se dizer, portanto, que os libaneses foram um elemento dos mais importantes para a integração do nosso País. Eram verdadeiros "bandeirantes da informação".

            Havia outra mão de direção, também, nessa troca de informações. O contato direto com as populações locais serviu como elemento de harmonia com os brasileiros.

            O Brasil, hoje, pela convivência entre os povos que aqui habitam, é uma verdadeira ONU. Ou, mais importante ainda, é o que a ONU pretende ser e um dia deverá ser: a verdadeira união entre os povos, sem guerras e sem outros conflitos de qualquer natureza que envolvam diferentes culturas, diferentes religiões, diferentes etnias. Difícil imaginar outro país onde reine tamanha harmonia entre os povos como o Brasil. Os que guerreiam lá fora vivem em paz aqui dentro.

            Temos aqui brasileiros de descendência italiana, brasileiros de descendência alemã, brasileiros de descendência asiática, brasileiros de descendência negra, brasileiros de descendência holandesa, brasileiros de descendência libanesa, entre tantos outros povos que para aqui vieram, aqui ficaram e aqui fizeram a constituição dessa verdadeira raça brasileira.

            Esses diferentes povos mantêm culturas de seus países de origem, mas, na essência do ser, são, agora, todos eles, brasileiros.

            No nosso caso, somos, aproximadamente, oito milhões de brasileiros de origem libanesa, duas vezes a população atual do Líbano. Portanto, o Líbano é, também, aqui!

            Mais do que isso: um Líbano de paz e de harmonia! Uma paz duradoura, que não se alcança, apenas, nas agitadas primaveras. Paz e harmonia que se fortalecem a partir de eventos como o de hoje, promovido pela Associação Cultural Brasil-Líbano, comandada pela nossa amiga Lody Brais.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS) - Encerro, Sr. Presidente.

            O SR. PRESIDENTE (Lindbergh Farias. Bloco/PT - RJ) - V. Exª fique à vontade.

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS) - Desde junho de 2010, com a promulgação da Lei n° 12.268, aprovada pelo Congresso Nacional, o dia 22 de novembro é dedicado, anualmente, à comunidade libanesa no Brasil. Louve-se a iniciativa da lei, porque a comunidade libanesa no Brasil também se dedica ao País todos os dias do ano.

            Sim, no dia 22 festejamos mais um aniversário do Libano, um pequeno país, uma grande nação. Sofreu nas mãos dos colonizadores, sofreu muito mais do que se poderia imaginar, mas mantém a sua dignidade e independência. Mantém a sua cultura, a sua história e a sua capacidade. Um país que, ao contrário dos seus vizinhos, tem no regime e na vida democrática o seu grande exemplo.

            É por isso, Sr. Presidente, que, desta vez, eu, que tantas vezes venho à tribuna abordar os assuntos tão complicados ou tão diferentes, venho agora, como um bom brasileiro, como Senador desta Casa, trazer a cultura daquilo que dizia o grande Darci Ribeiro: a raça brasileira. Sim, nós estamos vivendo a formação da raça brasileira. Aqui, o branco, o negro, o índio, aqui, a mistura de todas as nações, de todas as civilizações está fazendo surgir um grande povo, que é esse povo brasileiro.

            E é com alegria que, descendente de libaneses, digo: esses fazem parte desta grande Nação!

            Obrigado a V. Exª, bravo Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2011 - Página 48787