Pronunciamento de João Capiberibe em 29/11/2011
Discurso durante a 217ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Discurso de posse de S.Exa. no Senado Federal.
- Autor
- João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
- Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SENADO.
HOMENAGEM.:
- Discurso de posse de S.Exa. no Senado Federal.
- Publicação
- Publicação no DSF de 30/11/2011 - Página 50425
- Assunto
- Outros > SENADO. HOMENAGEM.
- Indexação
-
- APRESENTAÇÃO, HISTORIA, VIDA, POLITICA, ORADOR, AGRADECIMENTO, AUTORIDADE, PRESENÇA, POSSE, MANDATO, SENADOR, ESTADO DO AMAPA (AP), REGISTRO, PROPOSIÇÃO, PROJETO DE LEI, SENADO, REFERENCIA, VALOR, IMPOSTOS, SERVIÇO.
- HOMENAGEM, ORADOR, REFERENCIA, MORTE, MULHER, DEFENSOR, DIREITOS, HOMEM.
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado. Muitíssimo obrigado aos 130.411 cidadãos e cidadãs do Amapá, que, com seus votos, protagonizaram este momento, pondo fim ao meu segundo exílio político, que já durava seis anos.
Sr. Presidente do Senado Federal, Senador José Sarney, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, permitam-me saudar um bravo companheiro de longa jornada, meu Líder aqui nesta Casa, que se ombreou comigo nos momentos de extrema dificuldade, Senador Antonio Carlos Valadares. Estendo esta saudação a minha querida companheira de bancada, Senadora Lídice da Mata, e ao companheiro e amigo Senador Rodrigo Rollemberg.
O SR. PRESIDENTE (José Sarney. Bloco/PMDB - AP) - Senador João Capiberibe, com a licença de V. Exª, eu o interrompo para convidar para participar da Mesa o Governador do Estado do Amapá, que aqui se encontra presente, Dr. Camilo Capiberibe. (Palmas.)
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Obrigado, Senador.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Sugiro, Sr. Presidente, que V. Exª convide também o Governador Renato Casagrande, do PSB, que foi nosso colega no Senado, para também estar à Mesa.
O SR. PRESIDENTE (José Sarney. Bloco/PMDB - AP) - A solicitação de V. Exª é atendida com muito gosto pela Mesa.
Senador Casagrande (Palmas.)
O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Também gostaria de cumprimentar o Senador José Sarney e o Senador Randolfe Rodrigues, a quem me junto, a partir de agora, para compor a representação do meu querido Estado do Amapá.
Sinto-me feliz e honrado com tantas presenças ilustres neste momento tão decisivo da minha trajetória política. Com emoção, lembrando o grande guerreiro do povo Miguel Arraes, cumprimento o nosso vice-presidente do Partido Socialista Brasileiro, meu companheiro Roberto Amaral.
Aproveito para agradecer a presença dos governadores do nosso partido, meu companheiro Casagrande, do Espírito Santo, e Camilo Capiberibe, do Amapá.
Sobre Camilo Capiberibe, permitam-me um breve comentário. Porém, antes de fazê-lo, preciso respirar fundo para segurar a emoção. O jovem governador que se encontra nesta Mesa e que está aqui com sua companheira, sua esposa Cláudia e seus dois filhos, Cloé e Camilo, nasceu na longa noite do nosso primeiro exílio, quando eu e Janete, no dizer do poeta, errávamos cegos pelo continente.
Numa manhã ensolarada, coisa rara no outono santiaguino - quem conhece Santiago sabe que no outono é difícil uma manhã ensolarada -, Camilo veio ao mundo juntamente com sua irmã Luciana, que também está aqui presente ao lado de seu filho Thomas e de Diva. Nasceram no Chile de Pablo Neruda, Violeta Parra e do inesquecível companheiro Allende. Tanto Camilo como Luciana foram essenciais para que neste momento eu estivesse nesta tribuna relembrando o dia em que nasceram.
Vejo aqui neste plenário a Deputada Sandra Rosado, Líder da nossa Bancada na Câmara Federal, a quem cumprimento dizendo que não tenho palavras para traduzir nosso sentimento a cada vez que um Deputado ou uma Deputada subia àquela tribuna para dizer ao Brasil que nossa exclusão da vida pública era incompreensível, inaceitável. Essas manifestações não se limitavam aos nossos companheiros de Bancada; eram plurais, reflexo da diversidade política e ideológica daquela Casa. Assim é o Parlamento.
Viva a democracia!
Muitíssimo obrigado, Deputada! (Palmas.)
Neste momento, no Senado da República, tanto na tribuna de honra quanto na galeria, meus conterrâneos me honram com suas presenças. Tenho certeza de que a maioria está incluída entre os 130.411 protagonistas desse momento. É uma tarefa difícil nomear cada um dos presentes. Só me resta dizer a vocês todos que me sinto extremamente feliz em encontrá-los neste evento histórico.
Bem sei que somos conseqüência de nossas escolhas, mas preciso de um nome entre os amapaenses que aqui estão para simbolizar todo esse sentimento e a esperança no que virá. Digo-lhes que sou um esfomeado e sedento de Justiça, portanto, elegi o nome de uma mulher corajosa, o da Procuradora-Geral de Justiça do Amapá, Ivana Cei, aqui entre nós, para saudar a todos os que de longe vieram testemunhar esse ato de fé democrática. (Palmas.)
Também aproveito para cumprimentar meus suplentes Ivanci Magno e Birinha Picanço.
Há seis anos, desta tribuna, dirigi-me a um Plenário atônito, atropelado pelos fatos. Estava eu sendo expurgado do mandato de Senador por decisão do Tribunal Superior Eleitoral. Lembro que a tensão e o odor de conspiração dominavam o ambiente. Hoje o clima é outro.
Olho e vejo algumas pessoas que testemunharam aquele acontecimento injusto do passado. Olhem só: quem estava lá agora está aqui. Lembro-me dela indignada e impotente diante da injustiça e a vejo hoje, sorridente e feliz, vendo a democracia triunfar. Falo da Deputada Luíza Erundina. (Palmas.)
Obrigado por esses anos todos de apoio e solidariedade!
Mas está faltando alguém nesse inventário de lembranças. Trata-se de uma linda mulher que, lá pelos anos 70, depois de varar a noite comigo lendo o Diário do Che, comprometeu-se definitivamente com sonhos e utopias. Mas nossa militância não foi longe. Logo caímos presos. Ela, no oitavo mês de gestação, os homens da ditadura não a perdoaram e a torturaram. Mas ela resistiu e nossa filha nasceu linda e saudável.
Meses depois, aproveitando um cochilo dos meus carcereiros, escapei da prisão. Juntos, os três, empreendemos uma fuga espetacular pelo rio Amazonas. Sem lenço e sem documentos, atravessamos a Bolívia e, depois, o Peru, até chegar ao Chile de Allende, onde, como já falei, nasceram seus irmãos Camilo e Luciana.
Aquela criança de tantas aventuras no passado hoje vive serenamente este momento de rara felicidade. Ali está Artionka, sentada com seu filho, Antônio, e o marido, Ronaldo.
Ainda que tenham usurpado seis anos de nossas vidas - lembro como se fosse hoje -, ela, minha companheira de vida e de luta, comovida, mas decidida, subiu a esta tribuna, perfilou-se ao meu lado, protegeu-me colocando sua mão direita no meu ombro esquerdo e assim permaneceu enquanto eu me dirigi ao plenário reafirmando a minha crença na política como instrumento de transformação da sociedade.
Naquele discurso, prometi retornar a esta Casa e a esta tribuna para o exercício daquilo em que acredito e que gosto de fazer. Aqui estou, e ela também.
Peço à Deputada Federal Janete Capiberibe que se aproxime. (Palmas.)
Vamos repetir a mesma cena de seis anos atrás, só que, desta vez, para dizer ao Brasil que aqui estamos para retomar a luta por um país justo, fraterno e de bem com a natureza. (Palmas.)
Fui Prefeito de Macapá, de 1989 a 1992, e Governador do Amapá por dois mandatos, de 1995 a 2002.
No período em que governei o Estado, por questões orçamentárias, tive algumas divergências com o Judiciário. Ainda assim, nunca fui condenado nem mesmo respondi processo por improbidade administrativa ou criminal. Tampouco carrego qualquer pendência com os Tribunais de Conta do Estado ou da União. Nas oportunidades em que a sociedade me conferiu gerir o seu dinheiro, eu o fiz com zelo e transparência.
Por que, então, me custou tanto assumir este mandato de Senador da República, conquistado democraticamente em 2010 por sufrágio universal? Alguém desse plenário poderia me perguntar: se você nunca foi condenado, por que, então, o TSE o enquadrou na Lei da Ficha Limpa e lhe cassou o registro de candidato no dia 30 de setembro de 2010, a 48 horas da eleição? Tenho, sim - não posso omitir - duas condenações, ocorridas em momentos históricos diferentes e aparentemente antagônicos.
A primeira condenação ocorreu nos tempos sombrios de coturnos e baionetas. Em 1970, por ter as minhas convicções, por defender as minhas convicções, um Tribunal Militar me sentenciou a seis anos de prisão por atividades subversivas. Fiquei 11 meses preso. Um dia, como já disse, meus carcereiros cochilaram e, juntamente com Janete e Artionka, fomos bater no Chile de Salvador Allende.
Oito anos depois, a Lei da Anistia pôs fim ao nosso primeiro exílio e retornamos ao Brasil. Tempos depois, na democracia, com as feridas do passado já cicatrizadas, fui sentenciado por outro tribunal, o TSE - Tribunal Superior Eleitoral. Como única prova, e não sou eu que o digo, mas o que está escrito nos autos do processo e no acórdão, o depoimento de duas mulheres que me acusavam de lhes ter comprado os votos por R$26, pagos em duas parcelas, história rocambolesca que não resiste a uma busca simples no Google, mas suficiente para o TSE reformar o acórdão do TRE do Amapá, que havia nos declarado inocentes, e, por cinco votos a dois, cassou-me o mandato de Senador conquistado nas eleições de 2002.
Mas não só o meu: com a mesma acusação absurda, ceifaram o mandato de uma deputada federal, simplesmente por ter Capiberibe no nome. Janete, depois de consagrada nas urnas como a deputada federal mais votada à Câmara Federal nas eleições de 2002, também perdeu o seu mandato. Mas recuperou-o em 2006, voltando à Câmara como a mais votada. Em 2010, repetiu pela terceira vez a façanha.
Foi além, mostrou que um raio pode, sim, cair uma, duas, três vezes na mesma cabeça. Com base em uma lei aprovada por um Parlamento acuado, o TSE decidiu jogar para a plateia. Contrariando a Constituição, fez valer a Lei da Ficha Limpa, o que me impôs uma terceira cassação. Mas, dessa vez, como em algumas ocasiões em nossas vidas, eu e Janete escapamos por um triz.
Em 23 de março deste ano, o Supremo Tribunal Federal decidiu que essa lei, por ferir o art. 16 da Constituição Federal, não valeria para as eleições de 2010, quando me elegi Senador e Janete, Deputada Federal.
Depois, veio a longa espera para ver concretizada a decisão do STF. Uma enxurrada de recursos foram interpostos com o único fim de adiar este momento. Mas agora estamos aqui, em pleno gozo de nossos direitos políticos, começando um novo momento, dispostos a contribuir com nossa visão e experiência para uma sociedade mais justa, mais humana.
Sou militante, há 24 anos, do Partido Socialista Brasileiro - PSB. Todos os cargos eletivos que exerci foram conquistados pela bandeira socialista. Mas a vitória do ano passado foi excepcional. Fizemos a campanha, enfrentando terríveis adversidades, inteiramente na oposição, sem participação em qualquer esfera de governo e sem recursos financeiros. Acrescente-se que concorremos sub judice, prato cheio para nossos adversários. Ainda assim, o povo se manteve firme, sufragando nossos nomes. Agora é mais do que justo que exijam resultados de nossa atuação. Portanto, estamos aqui decididos a corresponder às expectativas do povo generoso do Amapá.
Se assim penso, não deve ser diferente o compromisso do Senador José Sarney, que representa esse povo, há 21 anos, nesta Casa, assim como o do Senador Randolfe Rodrigues, que obteve uma clara e inequívoca votação. Somos três Senadores com a mesma força política da bancada de qualquer outro Estado da Federação, mas nossas demandas são pequeninas. E podemos sempre argumentar, como estamos na foz do rio, que protegemos aquele grande rio e também vários milhões de hectares de florestas.
Confesso que, independente das divergências políticas e ideológicas que possamos ter, vamos trabalhar pelo Amapá acima de tudo. Não vou negar, é notório que existem diferenças com meu colega de bancada, Senador José Sarney. Mas devo admitir que, para atender às demandas do povo que nos elegeu, que nos mandou a esta Casa, isso não será um obstáculo. Vamos juntos definir um plano de ação da bancada e agir de forma articulada junto à Presidente Dilma e ao Governo Federal.
Garanto que é tudo o que o jovem Governador Camilo Capiberibe quer e precisa para retirar o Amapá da situação caótica em que encontrou sua infraestrutura e as finanças do Estado.
Neste dia de festa, mesmo sem me estender, não poderia deixar de registrar o passivo financeiro e ético deixado pela ação predatória de criminosos infiltrados em algumas siglas partidárias que governaram o Amapá ao longo de oito anos.
O Brasil certamente não esqueceu o que nos aconteceu. Tivemos nosso orçamento público saqueado por essas quadrilhas. Mesmo com a ação enérgica da Justiça, que no período determinou a prisão de cinco secretários de Saúde, de governadores, empresários e servidores públicos, não foi possível estancar a sangria. O Governador Camilo Capiberibe terminou recebendo um Estado dilapidado e falido, mas travaremos esse debate mais adiante aqui desta tribuna.
Na minha conta passagem por esta Casa, plantei uma semente que vicejou e virou uma árvore frondosa. Falo da Lei Complementar 131/2009, a Lei da Transparência. De nossa iniciativa, o projeto tramitou célere aqui neste plenário. Depois foi para a Câmara. A Deputada Janete Capiberibe se encarregou de articular sua tramitação e buscar apoio da sociedade civil. Depois de aprovado pelas comissões e com a chancela da OAB, da ABI, da Associação de Magistrados do Brasil, da CNBB, entre outros, o projeto chegou ao plenário, onde recebeu atenção especial de nosso Líder na Casa, que o levou à aprovação.
O Deputado líder que conduziu aquele processo com grande habilidade está entre nós. Trata-se do Senador Rodrigo Rollemberg, a quem agradeço, em meu nome e no de todos aqueles que querem um Brasil mais republicano e justo. (Palmas.)
A Lei da Transparência tornou obrigatória a exposição detalhada, em tempo real, das receitas e despesas de todos os entes públicos. Agora precisamos dar um passo adiante. Que tal jogarmos um balde de tinta branca nos fantasmas dos impostos indiretos? Para os revelarmos aos cidadãos e cidadãs, não diria todos os impostos, o que é impossível, e é por isso que todos os projetos que deram entrada aqui não tiveram sucesso. É impossível revelar todos os impostos que nós, consumidores brasileiros, pagamos. Mas pelo menos aqueles que incidem sobre produtos adquiridos nos shoppings, supermercados e postos de gasolina.
Pensando nisso, estou dando entrada num PLS, projeto de lei do Senado, propondo medida para informar os consumidores acerca de tributos que incidem sobre bens e serviços, conforme o inciso V do art. 150 da Constituição Federal. Essas duas leis se complementam. Hoje qualquer pessoa com acesso à Internet pode saber em que e como o Governo Federal ou o Governo do Amapá gastou o seu dinheiro. Falo de dois entes que têm todas as suas despesas detalhadas na Internet.
Amanhã, com a aprovação desse projeto, que chamo de “impostos às claras”, cidadãos e cidadãs finalmente irão saber o que pagam e quanto pagam de imposto. É verdade que, nesse projeto, estamos contemplando apenas cinco impostos, mas a ideia é construir uma proposta didática para que o cidadão possa, então, saber o que paga e quanto paga.
Encerro minhas palavras prestando uma homenagem, lembrando que há uma semana, o mundo perdia uma mulher cuja existência foi exemplar e relevante para a humanidade, refiro-me a Danielle Miterrand, que faleceu em Paris aos 87 anos.
Danielle dedicou a sua vida a causa dos deserdados e combateu todas as formas de pressão. Como militante, ela sempre assumiu um papel de primeiro plano em defesa dos direitos humanos. Eu e Janete a conhecemos em 1997; a partir daí, tornou-se nossa amiga e também do Amapá.
Por último, evoco a figura que está aqui presente conosco e que sempre esteve, o nosso grande líder e inesquecível Governador Miguel Arraes.
Muito obrigado. (Palmas.)