Discurso durante a 221ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lamento pelo falecimento do Dr. Sócrates, jogador de futebol.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Lamento pelo falecimento do Dr. Sócrates, jogador de futebol.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/2011 - Página 51666
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, HOMENAGEM POSTUMA, MEDICO, ATLETA PROFISSIONAL, FUTEBOL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ELOGIO, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA.

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do revisor.) - Sr. Presidente, venho à tribuna neste começo de semana, uma semana em que certamente teremos a Casa cheia, tendo em vista as matérias que já constam da pauta dos trabalhos do Senado Federal, com a proximidade do fim do período legislativo, para lamentar e dividir, tenho certeza, com um grande número de brasileiros a perda desse brasileiro exemplar, figura muito querida para todos nós da política - eu, particularmente, tive o privilégio da convivência com ele, que me tratava com muito carinho, juntamente com o Presidente Lula, em muitas ocasiões -, que é o Dr. Sócrates. Ele nos deixa prematuramente aos 57 anos.

            Sei que o Brasil inteiro, nesse final de semana, ficou triste. Foi um fim de semana do esporte, de decisão de campeonato, de um time que sempre foi referência para o sucesso do jogador Sócrates, time que saiu campeão brasileiro, mas, mesmo assim, não tivemos a alegria como gostaríamos de ter tido, a alegria que o futebol nos propicia.

            A perda do Dr. Sócrates nos chocou a todos, até porque ele estava em processo de recuperação de uma cirrose hepática. Lamentavelmente, teve uma infecção, o que agravou ainda mais a situação, e ele, debilitado como estava, não sobreviveu. É uma perda que, tenho certeza, o Brasil inteiro chorou, lamentou.

            E nós aqui no Senado temos o dever de vir à tribuna e deixar registrado, porque ele, em muitos aspectos, ou em todos os aspectos, foi um brasileiro exemplar. Primeiro, mostrou uma afeição muito grande pelo estudo, na busca do conhecimento. Nascido no Pará, veio para o interior de São Paulo, foi lutar e estudar para alcançar a formação em um dos cursos mais difíceis, que é o de médico. V. Exª também sabe do que estou falando. E ele conciliou isto: a atenção especial aos estudos e à busca do conhecimento com o talento que carregava, que era o do esporte. Aliás, essa é uma das questões que ele sempre colocou muito bem. Ele ficava muito sentido ao ver a quantidade enorme de crianças no Brasil afora sonhando em ser um ídolo, sonhando em se destacar no esporte. Ele falava da dificuldade ainda presente dessas crianças, de só saberem se darão certo ou não quanto tiverem seus vinte anos. Muitas delas consumem suas vidas, aquele tempo precioso de vida, que não volta mais, nessa tentativa, e se esquecem dos estudos, esquecem-se, às vezes, das próprias famílias. E são milhares, senão milhões, que sofrem essa frustração.

            O Dr. Sócrates sempre dizia que esse não era um bom caminho; que as crianças deveriam estudar e, obviamente, desenvolver seu talento. Dando certo, poderiam virar ídolos de futebol, como ele.

            As lembranças que todos temos dele são as melhores, não só como atleta, mas como atleta cidadão. Uma das caracterizações que fazem dele é dizer que ele é um estilista do campo, um estilista do futebol. Acho que, se meu querido amigo Armando Nogueira estivesse ainda vivo - ele era fino nas frases e eficiente no uso de poucas letras e poucas palavras para distinguir com precisão a história de vida de alguém -, ele certamente faria o registro de que essa é uma boa tipificação para o Dr. Sócrates, pelo estilo dele, pela maneira como ele se comportava dentro e fora do campo.

            Mas ele associou a paixão de todos nós com a política, com a liberdade, com a democracia, quando procurou instalar a democracia corinthiana, que, no fundo, era uma maneira também de nos alertar e nos chamar para a luta por liberdade e por democracia no Brasil.

            V. Exª sempre teve compromisso com a redemocratização do Brasil, mas não era nada fácil, no começo dos anos 80, fazer essa luta. Da campanha das Diretas eu mesmo participei aqui no Congresso, como estudante, e foram momentos muito ricos. E quando atletas que são ídolos conseguem também nos ajudar a fazer os ajustes de que o País precisa, as correções de que o Brasil precisa, todos temos de agradecer, e foi esse o caso típico do Dr. Sócrates. Ele ajudou muito com suas posições, acompanhado de outras figuras emblemáticas do Corinthians, um dos times mais populares, e agora mais uma vez campeão. Meu time sequer foi para a Libertadores ou se classificou, que é o Botafogo, mas eu acompanhei e vi que, de alguma maneira, o destino quis assim.

            No dia da perda do Dr. Sócrates, o time que o fez conhecido mundo afora foi campeão brasileiro.

            Então, faço aqui este registro, dizendo também que o Dr. Sócrates, que nos ajudou tanto, deixou uma última lição: ele viveu tanto e tão bem a vida, que exagerou na dose - literalmente exagerou na dose. Mas, em entrevista ao Fantástico e falando, na semana passada, terça-feira, no SporTV, ele repetia mais uma maneira de cidadania e atleta, que era a de deixar o exemplo de que as pessoas têm que ajustar melhor o consumo de bebida alcoólica, para que não passem pelo que ele passou. O Dr. Sócrates deixou bem claro o que talvez tenha sido a sua última lição, seus últimos ensinamentos. Ele deixou bem claro para todos os jovens que ser atleta, ser ídolo é importante, que estudar é importante, mas que nós temos que reduzir o consumo de bebida alcoólica, nós temos que salvar vidas. Lamentavelmente, a dele não foi possível ser salva, exatamente pelos exageros que ele cometeu no consumo de bebida alcoólica, como ele mesmo assumiu.

            Mas aqui da tribuna do Senado eu queria passar a minha solidariedade, os nossos votos de pesar para toda a sua família, seu irmão Raí e seus outros irmãos. Sei que falo em nome de todos os petistas. Ele sempre teve uma relação muito próxima conosco. Eu me lembro bem de uma partida de futebol, ainda quando tínhamos como Presidente o Lula. Ele estava fazendo um filme e nós fizemos um jogo na Granja do Torto. Eu tive oportunidade de participar também. Já ali encontrávamos uma pessoa que estava sempre preocupada com o que acontecia no mundo, no Brasil, não só no esporte. Era um cidadão na plenitude do termo. Escrevia na revista Carta Capital - eu era um leitor assíduo -, e sempre havia sabedorias e ensinamentos no que ele falava, no que ele escrevia.

            Eu não poderia deixar de vir aqui, mesmo a agenda do Senado estando tão tomada com temas importantes como o do Código Florestal, de mais recursos e compromissos com a saúde, da Desvinculação das Despesas da União, do Orçamento e tantos outros temas que vão dominar o debate e as deliberações no Senado e na Câmara Federal, no caso, no Congresso. mas não poderia deixar de vir aqui hoje e prestar esta homenagem a esse grande brasileiro, Dr. Sócrates, a esse grande jogador, a essa grande figura humana.

            Quem dera que todos nós seguíssemos esse caminho do Dr. Sócrates, de nos preocuparmos com os outros, de nos preocuparmos com o aperfeiçoamento da sociedade, de nos preocuparmos com o nosso País, de nos preocuparmos com nossas crianças, de nos preocuparmos com a liberdade, de nos preocuparmos com a cidadania. Foi isso que fez durante a sua vida curta o Dr. Sócrates.

            Que Deus possa confortar sua família, seus familiares todos, seus amigos, e que o Brasil possa dar a devida atenção a essa história de vida brilhante dessa figura humana fantástica, conhecida como Dr. Sócrates.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/2011 - Página 51666