Discurso durante a 224ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato de reunião realizada hoje na Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado Federal.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Relato de reunião realizada hoje na Comissão de Serviços de Infraestrutura do Senado Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 09/12/2011 - Página 52984
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, COMISSÃO DE SERVIÇOS DE INFRAESTRUTURA, SENADO, PARTICIPAÇÃO, MIRIAN BELCHIOR, MINISTERIO DO ORÇAMENTO E GESTÃO (MOG), OBJETIVO, DEBATE, RELAÇÃO, PROGRAMA DE GOVERNO, PROGRAMA DE ACELERAÇÃO DO CRESCIMENTO (PAC), DISCUSSÃO, LEGISLAÇÃO, TERRENO DE MARINHA, ENFITEUSE.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr.. Presidente desta sessão, Senador Lindbergh Farias, Senador Inácio Arruda, Senador Francisco Dornelles, Senador Paulo Paim, nós hoje fizemos uma produtiva, dinâmica e importante reunião na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal. Essa Comissão é muito bem dirigida pela Senadora Lúcia Vânia, que tem conduzido os trabalhos com muita disciplina dando à Comissão de Infraestruturaa possibilidade de acompanhar todos os investimentos e aspectos ligados à infraestrutura brasileira.

            Hoje, recebemos, na Comissão, a visita da Ministra Miriam Belchior. Ministra do Planejamento, que tem relevantes e importantes tarefas sob seu gerenciamento e sob sua coordenação. Coordena o Orçamento Geral da União e sua execução, coordena toda a política com os servidores públicos e também faz a gestão sobre o patrimônio da União.

            Foi uma importante oportunidade para que, juntos, pudéssemos aprofundar o debate a respeito do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC 1, o PAC 2, podendo detalhar, aprofundar melhor as virtudes e a importância desse programa, debatendo os gargalos pelo caminho, a necessidade de imprimirmos maior velocidade, sobretudo num tempo e numa conjuntura em que o PAC tem, sim, a meu juízo, toda a capacidade de contribuir com o aquecimento da nossa economia nesta quadra de conjuntura internacional de grande incerteza, com os principais países do mundo atravessando crises que nenhum de nós imaginava em vida viver e acompanhar.

            Mas foi também, meu caro Presidente Lindbergh, uma oportunidade para que nós pudéssemos debater com a Ministra Miriam Belchior um assunto que já trouxe à tribuna do Senado muitas vezes, até porque, na condição de seu Relator na Comissão de Constituição e Justiça, julgo que passou da hora de o Congresso Nacional e o Poder Executivo encontrarem um ponto de convergência para eliminarmos da pauta brasileira um assunto anacrônico, um assunto que não tem nenhum sentido e que tem causado muitos prejuízos a um conjunto muito grande de brasileiros.

            Refiro-me à legislação que envolve os chamados terrenos de marinha e a enfiteuse, que foram definidos pela primeira vez, de forma expressa na legislação brasileira, ainda no período imperial, em 1831, Senador Inácio Arruda. Terrenos de marinha que gravam moradores e trabalhadores da sua capital, Fortaleza.

            Posteriormente, já no século XX, em 1946, através de um decreto-lei que trata dos bens imóveis da União, estabeleceu-se o conceito legal de terrenos de marinha e acrescidos, que está em vigor até hoje. Portanto, nasce em 1831, ainda no período colonial que antecede à República, e, depois, é fortalecido em 1946, em vigor até os dias atuais. Nesse decreto foi criado também o instituto da enfiteuse administrativa, que é utilizada nos contratos com terrenos de marinha, através dos quais os imóveis públicos são cedidos a particular por meio dos regimes de aforamento e ocupação, ficando os terceiros com obrigação de pagamento de taxa anual de ocupação/foro e laudêmio no caso de transferência do imóvel para outra pessoa. Se em vida, um cidadão, uma família transferir esse imóvel por quatro, por cinco vezes, serão cinco vezes que essa taxa, que o laudêmio terá que ser cobrado.

            Sobre o regime enfitêutico, o eminente jurista Hely Lopes Meirelles sacramenta:

"Sempre acentuamos a inutilidade do regime enfitêutico e a sua inconveniência mesmo na prática administrativa (...). O aforamento é uma velharia que bem me merecia desaparecer de nossa legislação e, principalmente, da prática administrativa."

            São mais de 500 mil famílias, Presidente Lindbergh, em nosso País: no Rio de Janeiro, em Santa Catarina, em Florianópolis, no Ceará, em Fortaleza, em Belém. É verdade. É verdade. É um instituto medieval que vem do Império. É uma herança que nós mantivemos aqui dos portugueses, só que os portugueses a aboliram em Portugal e nós cultivamos até hoje essa prática inadequada. Portanto, mais de 500 mil famílias são oneradas com o pagamento de foro, taxa de ocupação e laudêmio por todo o País. E mais ainda: muitos, muitos brasileiros estão inscritos em dívida ativa da União devido a encargos não quitados por impossibilidade financeira e por não entenderem a origem das suas dívidas, uma vez que são portadores de registros legais dos seus imóveis, que foram adquiridos de terceiros há muitos anos e até mesmo décadas.

            Na minha capital, a cidade de Vitória, do meu queridíssimo Estado do Espírito Santo - eu tenho a honra de representá-lo no Senado e de falar em nome dos capixabas -, na capital do meu Estado, dois terços do território da cidade de Vitória são constituídos por terrenos de marinha e acrescidos, o que levou o competente Procurador da República, Dr. Carlos Fernando Mazzoco, a denominar a cidade de Vitória de o maior Condomínio da União em nosso País. Em várias outras cidades brasileiras o fenômeno se faz presente e se arrasta do Império até os dias atuais. Poderia citar a cidade de Belém, Recife, Salvador, Rio de Janeiro, Santos, Florianópolis, entre tantas outras cidades que são agravadas por esse tipo de legislação.

            Esse grande número de imóveis torna o trabalho da Secretaria de Patrimônio da União lento, ineficaz e gerador de muita angústia e de muito sofrimento para os cidadãos ocupantes desses imóveis, como atesta a manifestação, que passo a ler, do Juiz da 1a Vara de Execução Fiscal, da Justiça Federal do querido Estado do Espírito Santo, que represento aqui no Senado Federal.

            Diz o eminente magistrado:

Por fim, não posso me omitir de tecer comentários sobre a postura da GRPU/ES. O órgão em tela encontra-se em mora na prolação de uma decisão no processo administrativo de isenção. Tal processo tramita desde [pasmem!] 1941, ou seja, são cerca de 68 (sessenta e oito) anos sem que haja uma decisão administrativa.[atesta o magistrado, Senador Paim] Desde a apresentação [desse processo] do pedido administrativo, houve uma guerra mundial, quatro constituições foram [escritas e] promulgadas, um regime ditatorial militar se instaurou e foi extinto [...] [em nosso País], o homem foi à lua, a seleção brasileira sagrou-se campeã mundial de futebol por cinco vezes, aproximadamente quinze presidentes [da República] governaram o País. Uma criança que tenha nascido no dia da apresentação do processo administrativo provavelmente encontra-se aposentada ou em vias de se aposentar. Apesar de tal lapso temporal, a GRPU do Espírito Santo não conseguiu proferir uma decisão naquele processo administrativo. Tal fato [seguramente] não é isolado [do meu Espírito Santo]. Pela experiência que tenho como Magistrado Federal neste Estado, não tenho receio ao afirmar que as demandas envolvendo atos da GRPU/ES [assim como do Brasil afora] indicam graves falhas de controle primário de dados e de gestão. Tratam-se de cidadãos [brasileiros, trabalhadores] cobrados sem notificação prévia, de cidadãos responsabilizados por imóveis dos quais nunca foram proprietários e, o que me parece mais grave, a não cobrança em face de inúmeros imóveis que efetivamente são fatos geradores da "taxa" de marinha. Todas essas falhas associadas caracterizam, a meu ver, ato de improbidade administrativa por falta de gerenciamento adequado do órgão. Acredito que se uma inspeção operacional for efetivada, seriam identificados danos ao Erário e ilegalidades procedimentais diversas, enfim, constatar-se-ia a inobservância do princípio constitucional da eficiência por parte do órgão de controle do patrimônio da União neste Estado.

            A receita patrimonial da União, gerada a partir dos terrenos de marinha e seus acrescidos, se mostra desprezível frente ao gigantismo e à diversificação da receita pública federal. No ano de 2010, a receita oriunda dos terrenos de marinha atingiu a cifra de aproximadamente R$636 milhões, enquanto a receita federal total somou aproximadamente R$806 bilhões, portanto, menos de 1% dessa arrecadação. Se levarmos na ponta do lápis, se aferirmos com precisão, nós poderemos chegar à conclusão de que a manutenção da Secretaria do Patrimônio da União gera muito mais ônus do que receita para o Governo Federal.

            De modo, Sr. Presidente, que, na condição de relator desta matéria na Comissão de Constituição e Justiça, nós iniciamos hoje um debate, um debate franco, um debate aberto com a Ministra Miriam Belchior, que tem a responsabilidade de oferecer essas respostas.

            Fiquei pessoalmente muito feliz, porque pude receber o acolhimento por parte da Ministra Miriam Belchior, que concordou integralmente com a necessidade de nós incorporarmos uma revisão em toda essa anacrônica legislação que gera incerteza, que gera angústia, que gera sofrimento a um conjunto muito expressivo de capixabas, mas não apenas de capixabas, de brasileiros que necessitam de justiça.

            É em nome desses capixabas e desses brasileiros que nós estamos levantando mais uma vez a nossa voz na tribuna do Senado da República, para que nos próximos dias, assim como sinalizou a Ministra Miriam Belchior, nós possamos fazer uma reunião e criar um grande entendimento, uma grande convergência entre o Senado da República, o Congresso Nacional e o Poder Executivo na direção de aperfeiçoar e de retirar essa sobrecarga tributária injusta, ilegal e desonesta do povo brasileiro.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/12/2011 - Página 52984