Discurso durante a 225ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Balanço sobre os desempenhos do Congresso Nacional e do Poder Executivo; e outros assuntos.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. MANIFESTAÇÃO COLETIVA. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Balanço sobre os desempenhos do Congresso Nacional e do Poder Executivo; e outros assuntos.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 10/12/2011 - Página 53327
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. MANIFESTAÇÃO COLETIVA. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PODER, EXECUTIVO, NECESSIDADE, REFORMA ADMINISTRATIVA, OBJETIVO, REDISTRIBUIÇÃO, GASTOS PUBLICOS, GOVERNO FEDERAL, IMPORTANCIA, COMBATE, CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, PAIS.
  • REGISTRO, DIA INTERNACIONAL, LUTA, CORRUPÇÃO, COMENTARIO, IMPORTANCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, NECESSIDADE, COMBATE, IMPUNIDADE, ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, PAIS.
  • REGISTRO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, REALIZAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, DISTRITO FEDERAL (DF), OBJETIVO, COMBATE, CORRUPÇÃO, PAIS, NECESSIDADE, AUMENTO, CONSCIENTIZAÇÃO, POPULAÇÃO, BRASIL.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Senador Paulo Paim.

            Srªs e Srs. Senadores, estamos chegando ao final do primeiro ano desta legislatura e também do Governo Dilma Rousseff. Creio ser o nosso dever fazer o balanço sobre a performance do Congresso e o desempenho do Poder Executivo.

            As mudanças ocorreram? Os avanços foram alcançados? As reformas realizadas? O Congresso exerceu com eficiência a sua atribuição fiscalizadora? Enfim, cumprimos o nosso dever? Creio que devemos refletir sobre todas essas indagações.

            Lembro que hoje é um dia importante, é o Dia Internacional contra a Corrupção. Foi no dia 9 de dezembro de 2003, na cidade mexicana de Mérida, que foi assinada a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção. Num texto de 71 artigos, os Estados Partes, preocupados com a gravidade dos problemas e com as ameaças decorrentes da corrupção para a estabilidade e a segurança das sociedades, ao enfraquecer as instituições e os valores da democracia, da ética e da justiça e ao comprometer o desenvolvimento sustentável e o Estado de direito, pactuaram a mencionada Convenção.

            Portanto, hoje, deveríamos estar comemorando avanços no combate à corrupção e à impunidade, mas, lastimavelmente, não temos motivos para comemoração. Neste primeiro ano, tivemos um Congresso paralisado pelas mãos fortes do Poder Executivo, num sistema presidencialista implacável. Uma maioria esmagadora impossibilita até mesmo que a minoria exercite prerrogativa essencial de fiscalizar, já que estamos impedidos de nos utilizarmos daquele instituto essencial, que é o da comissão parlamentar de inquérito, que nos confere autoridade para aprofundar investigações com a quebra de sigilos bancário, fiscal e telefônico.

            Os escândalos aconteceram, e o Congresso não investigou. Houve quem desse um voto de confiança à Presidência da República. Vários Senadores dos mais credenciados, que adotam sempre uma postura republicana, acreditaram na hipótese de que se estivesse fazendo do lado de lá da rua, no Palácio do Planalto, uma faxina nos Ministérios. Sei que muitos se decepcionaram. Aliás, está presente o nosso querido Senador Cristovam Buarque, que foi um dos que empalmou essa bandeira e ofereceu voto de confiança a Presidente da República. Creio que eu poderia indagar dele agora, respeitosamente, se, ao final do ano, V. Exª acredita que houve faxina ou houve uma encenação, foi uma farsa, a faxina ocorreu ou não, as providências foram adotadas rigorosamente pela Presidência da República ou houve complacência, omissão e cumplicidade.

            V. Exª tem o aparte, Senador Cristovam, com o maior prazer.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Muito obrigado, Senador Alvaro, por me dar o aparte imediatamente depois da pergunta, creio que o plenário ficaria muito melhor se pudéssemos ter esse tipo de trabalho. Quero dizer que, realmente, dei esse apoio, tanto que me neguei a assinar a CPI da corrupção, mas eu assinei a CPI meses depois; prova de que eu, realmente, senti que a faxina não estava indo adiante. Não me arrependo de, naquele momento, ter dado o voto de confiança, mas não posso deixar de manifestar uma frustração muito grande por ver que o processo não avançou como devia. E eu digo claramente como é que teria avançado, como é que eu sentiria ter avançado: no dia em que o Diário Oficial for capaz de dar o anúncio de uma demissão antes que a mídia o faça. E o que a gente vê é que todas as demissões ocorreram depois de dias, semanas até, de um desgaste provocado pela mídia e não por iniciativa do próprio Governo. Eu disse, diversas vezes, que gostaria de ver um dia o Diário Oficial “furar”, como se diz na linguagem do jornalismo, a mídia - e não o vi nenhuma vez. Então, até aqui o que houve não foi faxina, foi uma ação forçada pelos meios de comunicação que felizmente estão fazendo a fiscalização. Há excessos? Há, mas, pelo menos, eles existem para fazer a fiscalização. Eu falei, há pouco, sobre amanhã ser o dia do aniversário da Declaração dos Direitos Humanos e, naquela Declaração, não havia nada referente à corrupção. Anos depois, as nações avançaram e fizeram este dia que o senhor hoje traz aqui para comemorar. Mas minha resposta foi longa e eu posso dizer, com clareza, com uma palavra: não! Não estou satisfeito com a maneira como a faxina foi feita. E a prova concreta disso foi quando eu, meses depois de as assinaturas da CPI terem iniciado, eu me neguei a assinar; mas, depois, fui lá e a assinei. Finalmente, eu quero dizer que, quando eu a assinei, até pensei se não seria hora de a gente fazer uma Comissão da Verdade para a Corrupção. Do jeito que tem uma Comissão da Verdade para os crimes que foram cometidos contra a pessoa humana e a liberdade durante o regime militar, não seria o caso de a gente ter uma Comissão da Verdade para saber tudo o que acontece nos subterrâneos dos governos?

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Cristovam. Eu não esperava ouvir outra coisa de V. Exª. É a realidade. O Congresso não cumpriu seu dever na medida em que não instalou uma CPI para investigar a corrupção no Governo. Se nós estivéssemos vivendo no Congresso os momentos históricos que ele já viveu, certamente essa CPI já teria sido instalada. E nós teríamos oferecido uma notável contribuição, certamente, no combate à corrupção e à impunidade. Esse desequilíbrio na representação popular não faz bem a nenhuma instituição.

            O Governo tem aqui uma maioria esmagadora. No Senado, por exemplo, dos 81 Senadores, somos 10 do PSDB, 4 do DEM e 2 do PSOL. Os demais partidos integram a base de apoio ao Governo. Com exceção de 16 Senadores, os demais integram partidos aliados ao Governo. Constantemente, temos dissidências que contribuem para o esforço oposicionista, com o esforço oposicionista. Mas isso é aleatório, isso ocorre eventualmente, como ocorreu ainda anteontem, quando votamos a Emenda 29 e obtivemos 26 votos para que a União assumisse a responsabilidade de repassar 10% da sua receita para o serviço de saúde pública no País.

            Esse desequilíbrio da representação popular não é bom para o Governo, não é bom para a instituição parlamentar, não é bom para o País e não é bom para a democracia. Certamente, se tivéssemos uma representação equilibrada, teríamos reabilitado o Congresso em relação à imagem desgastada com que conclui mais um ano de atividade. Com uma representação equilibrada, certamente as aspirações da sociedade estariam presentes de forma mais acentuada nesta e na outra Casa do Congresso Nacional.

            Mas e o Poder Executivo, com todos os instrumentos disponíveis, com o Congresso dócil, apoiando todas as suas iniciativas, promoveu avanços? Do ponto de vista da oposição, foi um Governo claudicante, inseguro, indeciso, paralisado administrativamente, confuso, nervoso, tumultuado politicamente, assaltado por escândalos de corrupção que se sucederam de forma interminável durante os meses deste ano com a queda de vários ministros, acusados de corrupção. Esse é o cenário que vislumbramos, ao final do ano, como resultado.

            Um Governo que paralisou obras, até porque restou a ele pagar dívidas acumuladas no ano eleitoral. Em obras do PAC, obras de infraestrutura, R$16 bilhões pagos neste ano se referiam a despesas efetuadas no ano passado, ou seja, no ano eleitoral. Apenas R$5 bilhões foram aplicados em obras em execução neste ano de 2011. É o retrato da incompetência de gerenciamento, da desorganização administrativa, que obriga, sim, o Governo a lançar mão do expediente da desvinculação dos recursos da União para obter um cheque em branco de R$62 bilhões para, em mais um ano eleitoral, gastar, investir e aplicar da forma que melhor lhe aprouver. E o Orçamento vai-se transformando nessa peça de ficção desmoralizada que serve apenas para o deleite dos especialistas e para enfeite das nossas bibliotecas.

            O retrato deste Governo está nesta manifestação da Ministra Ideli. Leio O Globo, Gerson Camarotti:

Depois de passar três dias instalada no gabinete da liderança do Governo no Senado, a Ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, disse ao Globo que são "legítimas, justas e republicanas" as demandas dos senadores aliados, como liberação de emendas e indicação para cargos, nas negociações para garantir votos em projetos importantes para o Governo, [...] A Ministra admite que há "pedidos inadequados" e que esses não podem ser atendidos, como o de criação de um Tribunal Regional Federal em Minas.

            No caso acima, o pedido não foi atendido porque a iniciativa é privativa do Poder Judiciário. Caso contrário, certamente também esse pedido seria atendido, como os demais o foram, conforme atesta a própria Ministra, considerando isso legítimo, republicano. O balcão de negócios passou a ser republicano. Aliás, creio que essa generalização é uma ofensa a Senadores republicanos, que integram a base aliada, mas não participam dessa farra, desse festival de benesses, de benefícios. Aliás, receber benefício pessoal em razão de uma função pública que se exerce consubstancia corrupção passiva. Portanto, essa generalização é ofensiva. A Ministra foi infeliz ao fazer declarações dessa ordem, porque muitos dos Senadores que integram a base aliada do Governo certamente não merecem essa ofensa.

            A administração federal paralisou-se, sobretudo porque engordou excessivamente, e engordou para atender ao apetite fisiológico incomensurável de uma coalizão de forças políticas que transformam a Presidente da República em refém. Sim, o Governo precisou crescer. Não havia como atender às demandas. Na linha do raciocínio da Ministra, não havia como atender às demandas. O Governo foi criando Ministérios, secretarias, diretorias, departamentos, coordenadorias e cargos comissionados.

            Ainda nestes dias, neste final de ano... Na Comissão de Relações Exteriores, ainda ontem, cerca de 1,2 mil cargos foram criados. Há poucos dias, na Comissão de Constituição e Justiça, mais 26 cargos, criados para o Ministério do Esporte, num Governo que tem, na administração direta, mais de 23 mil cargos comissionados, contra 780 na Holanda e 800 na Alemanha.

            O crescimento das estruturas da administração federal elevou os gastos correntes. São estruturas paralelas, são ações superpostas, que consomem recursos públicos, comprometendo a capacidade de investimento produtivo do Estado brasileiro - e nós somos obrigados a ouvir que o Governo não tem fonte de recursos para atender à saúde pública. Ou será que a saúde dos interesses menores está à frente da saúde do povo, que deveria ser a suprema lei no País?

            De quando em vez, ouve-se: “É preciso adotar medidas para combater a crise internacional, que pode afetar a economia do nosso País.” Mas, quais foram as medidas? E as reformas, as grandes reformas? E os compromissos maiores da campanha eleitoral? Que reforma o atual Governo empreendeu?

            É bom dizer que, em 1995, em nove meses, cinco emendas constitucionais estavam promulgadas pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, e diziam respeito à ordem econômica. Foi a grande reforma que mudou o Brasil: a reforma do real, do plano da estabilidade econômica, da sustentabilidade financeira, da recuperação da competitividade da economia e da responsabilidade fiscal. Mudou o Brasil. Em nove meses, as cinco emendas estavam promulgadas pelo Congresso Nacional.

            Neste ano nada ocorreu em matéria de reforma. O Congresso instalou duas comissões, uma no Senado e outra na Câmara, para realizar a reforma política, e ela não aconteceu. Nesse presidencialismo de força, reforma de profundidade só ocorre se a Presidência da República liderar o processo. Quando não há interesse de quem preside o País, não há reforma possível no Congresso Nacional. Não houve interesse em relação à reforma política, em relação à reforma tributária. Afirmar que um cheque em branco ao Governo de R$62 bilhões enfrenta crise internacional é exigir demais da nossa ingenuidade! A reforma tributária, sim, poderia contribuir.

            Mas há o imediatismo. Os governos têm como horizonte temporal a exata duração do seu mandato. E quando se fala em reforma tributária há aquela preocupação: “Perderemos recursos num primeiro momento”. Se os governantes tivessem - e eu coloco no plural, porque são vários governos -, se os governos tivessem visão estratégica de futuro, certamente realizariam a reforma tributária, porque compreenderiam que, a médio e longo prazo, a economia ganharia dinamismo, a roda da economia giraria com mais força, o País produziria mais, e os brasileiros, pagando menos impostos, colocariam mais recursos nos cofres públicos do País.

            A receita cresceria como decorrência do crescimento econômico que se verificaria em razão da energização produzida pela redução das alíquotas dos impostos que hoje sobrecarregam os setores produtivos, esmagando-os, especialmente em alguns segmentos.

            Reformas, não. A reforma administrativa. De quando em vez se ouve alguma afirmação em torno de uma eventual reforma administrativa quando se fala em reforma do ministério, mas reforma não é substituir ministros. A grande reforma seria substituir o modelo, esse modelo promíscuo de loteamento dos cargos públicos, que puxa para baixo a qualidade da administração federal e abre portas para a corrupção, constituindo-se numa fábrica lubrificada de escândalos no Brasil. Quantos escândalos desde a posse do Presidente Lula! Quantos escândalos durante esses meses do Governo Dilma Rousseff, antes de completarmos um ano! Não basta substituir os ministros.

            É bom repetir neste final de ano: a Presidente ainda tem tempo de realizar uma reforma administrativa, cortando a gordura, eliminando a gordura, eliminando os paralelismos, reduzindo os gastos correntes para investir mais em educação, em saúde, em segurança pública, mas, sobretudo, tapando os buracos abertos pela corrupção. O dinheiro público que se esvai pelos ralos da corrupção falta para a saúde, para a educação, para a segurança, para a moradia, para atender às necessidades básicas da população pobre do País. São R$70 bilhões, segundo a Transparência Internacional, de prejuízo anualmente.

            Enfim, iniciamos hoje o discurso do balanço e vamos prosseguir nos próximos dias. O diagnóstico tem de ser feito. A cobrança é necessária. Os compromissos da campanha eleitoral estão sendo ignorados.

            Em relação à saúde pública, foi o que se confirmou nesta semana. Na campanha, o compromisso de que CPMF jamais; novo imposto nem pensar. O País está vivendo um momento de prosperidade, vai continuar se desenvolvendo, e nós vamos oferecer ao povo brasileiro saúde de qualidade. E o que verificamos nesta semana é a repetição do discurso anterior à campanha eleitoral. Não o discurso da campanha ufanista, mas o anterior: “Não temos recursos para atender à saúde pública no País”.

            Ignoraram o apelo candente dos prefeitos do País, das entidades comprometidas com a saúde pública. Ignoraram o apelo de brasileiros sofridos, que se amontoam em corredores de hospitais à espera da assistência, sem que ela chegue. E muitas vezes, antes dela, chega o fantasma da morte.

            Esse apelo foi ignorado. A dramaticidade do caos vai se avolumar até 2015. O que se impediu de repassar com a rejeição dos 10% chega a R$146 bilhões até o ano de 2015. Não dá para entender. Não há como entender.

            Os argumentos são inconsistentes. O Governo tem que ter competência para definir prioridades. Mas há alguém neste País que entende existir outra prioridade que se deva colocar à frente desta que é a saúde do nosso povo? Não pode existir.

            Os recursos sobram, na verdade, se combatêssemos a corrupção, se acabássemos com o superfaturamento das obras públicas. Aliás, é bom dizer sempre: seguramente seria possível fazer bem mais do que três vezes mais o que se faz com o mesmo dinheiro se as obras não fossem superfaturadas, se o Brasil não tivesse se tornado o paraíso do superfaturamento das obras, o céu na terra de muitos empreiteiros de obras públicas.

            Sr. Presidente, a indignação de muita gente neste País está renascendo. Nas ruas de Brasília, por exemplo, no dia 07 de setembro e, depois, em outubro, a Marcha contra a Corrupção demonstrou que está renascendo a capacidade de indignação do povo brasileiro, mas ainda é muito pouco. A indignação não tem o tamanho dos escândalos que explodem na Esplanada dos Ministérios. Este País precisa acordar mais. Este País precisa ser sacudido. A consciência cívica do povo brasileiro tem que ser sacudida. É preciso revitalizar a nossa capacidade de indignação.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/12/2011 - Página 53327