Discurso durante a 227ª Sessão de Premiações e Condecorações, no Senado Federal

Concessão da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara aos agraciados em sua 2ª premiação.

Autor
Ana Rita (PT - Partido dos Trabalhadores/ES)
Nome completo: Ana Rita Esgario
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM, DIREITOS HUMANOS.:
  • Concessão da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara aos agraciados em sua 2ª premiação.
Publicação
Publicação no DSF de 14/12/2011 - Página 53523
Assunto
Outros > HOMENAGEM, DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, AUTORIDADE, SENADOR, PRESENÇA, SESSÃO ESPECIAL, CONCESSÃO, COMENDA, DIREITOS HUMANOS, ELOGIO, VIDA PUBLICA, BISPO, LUTA, DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS.

            A SRª ANA RITA (Bloco/PT - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, Deputadas, Deputados, homenageados e homenageadas, é com indisfarçável emoção que venho a esta tribuna, como presidenta do Conselho da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, homenagear sua memória através da entrega desta honraria a indivíduos, que como ele dedicam sua vida a defender uma sociedade mais humanista. Ainda que muito breves, espero que minhas palavras sejam capazes de externar a profunda admiração que sinto por todos os agraciados com a Comenda.

            Cada um a seu modo, com as peculiaridades que caracterizam a vida de cada pessoa, todos fizeram por merecer a homenagem que ora lhes prestamos. Todos eles construíram uma História da qual podem se orgulhar. São indivíduos que souberam, como poucos, vivenciar a excelsa experiência da contínua doação, da entrega desinteressada ao próximo, como autênticos instrumentos da justiça e mensageiros da paz.

            Não por outra razão, Sr. Presidente, essas pessoas fizeram por merecer uma comenda cujo patrono é a figura ímpar de Dom Hélder Câmara. Fisicamente franzino, o Padre Hélder Câmara - e padre, simplesmente padre, enfatizo, era o modo como ele estimava ser identificado - se agigantava na defesa dos pequeninos, dos que sofriam fome e sede de justiça, dos excluídos de todas as formas e latitudes.

            Na defesa da dignidade humana, Hélder Câmara jamais se apequenou. Na luta pela construção de uma sociedade justa e fraterna, assentada nas liberdades democráticas e robustecida pela mais genuína e imorredoura lição de cristianismo, nunca se acovardou perante os poderosos de plantão. Foi grande, sem ser arrogante. Foi sábio, sem ser pedante.

            Cerceado pelo autoritarismo implantado no Brasil em 1964, Dom Hélder transformou-se no eterno peregrino da liberdade a percorrer o mundo afora. Sua pregação, à maneira da voz bíblica "que clama no deserto", despertava consciências e estimulava a ira santa dos que não se conformam com a opressão e a intolerância.

            Dom Hélder ensinou-nos que "o deserto é fértil". Que não há solo tão árido que impeça a germinação da semente. Que não há noite tão densamente escura que proíba o romper da alvorada. Que não pode haver vida sem esperança. Que não pode haver dignidade humana sem o respeito aos direitos fundamentais. Mais que ensinamento, foi esse o compromisso de luta que Hélder Câmara nos legou.

            Ser digno da herança espiritual de Dom Hélder é não esmorecer, jamais, no embate contra a miséria material e moral. É não se esquecer, nunca, de que o ser humano só se realiza na liberdade, condição primeira para a busca da felicidade.

            Ser fiel ao legado de Dom Hélder é comprometer-se, sempre, com a defesa dos direitos humanos. Mais: é lutar para que esses direitos sejam respeitados em plenitude, sendo efetivamente materializados. Bem mais que uma posição retórica, trata-se de assumir esses direitos como inerentes à natureza humana, dela não podendo ser apartados em hipótese alguma.

            Que Dom Hélder viva em nós, em nossos pensamentos e em nossa ação. É assim que estaremos contribuindo para o florescimento de uma civilização de justiça e paz!

            E agora peço licença à Mesa e também a todos que nos acompanham porque eu gostaria de fazer um breve relato da vida das pessoas que foram escolhidas, sem desmerecer aos demais que aqui foram sugeridos pelos nossos Parlamentares, Senadores e Deputados, Senadoras e Deputadas, mas, como disse, gostaria de fazer um breve relato, um breve histórico sobre a vida dos nossos homenageados que irão receber a Comenda Dom Hélder Câmara.

            Quero aqui destacar o Ministro Carlos Ayres Britto.

            Nascido em Própria, no Sergipe, graduado em Direito pela Universidade Federal do Sergipe, Mestre e Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Grande parte de sua trajetória foi em sala de aula, formando aqueles que operariam o direito. Publicou inúmeros livros e artigos, sempre pautados no rigor conceitual da argumentação e na defesa intransigente do humanismo e da democracia.

            Sua atuação como Ministro do Supremo Tribunal Federal e toda sua história comprovam sua luta pela garantia dos direitos humanos e com a humanização do direito. Os votos proferidos naquela Corte Suprema são verdadeiras aulas, servindo como fonte de estudos para todos que se propõem a lutar pelos direitos humanos.

            No Supremo Tribunal Federal, tem se destacado por suas posições invariavelmente favoráveis aos direitos de cidadania e à defesa dos grupos mais vulneráveis.

            Também será homenageado aqui, hoje, Dom Eugênio Sales.

            Vindo da Cidade de Acari, no Rio Grande do Norte, graduado em Filosofia e Teologia. Tornou-se sacerdote em 1943. Seu grande legado para a sociedade brasileira é ser um dos criadores das Comunidades Eclesiais de Base e da Campanha da Fraternidade, que utilizam o espaço religioso para modificar a sociedade, para defender os direitos dos mais vulneráveis. Durante o período tenebroso das ditaduras militares na América latina, assumiu a defesa dos refugiados políticos. Por sua história dedicada a ações voltadas às mais nobres causas humanitárias, Dom Eugênio Sales também é um dos homenageados.

            Jair Krischke, gaúcho de Porto Alegre, nascido em 1938, logo se destacou pela luta em defesa dos perseguidos políticos nos diversos regimes ditatoriais sul-americanos. Fundou o Movimento de Justiça e Direitos Humanos, cujas ações salvaram da tortura, do desaparecimento e do extermínio cerca de 2 mil pessoas. Mesmo sob riscos e ameaças, nosso homenageado não se furtou em lutar pela defesa dos direitos humanos. Participou ativamente das campanhas da Anistia, libertação de presos políticos e das Diretas Já. Em 1984 atuou pela nova Constituinte, Reforma Agrária e pela revogação de leis de exceção. Criou o prêmio Direitos Humanos de Jornalismo e fundou, entre outros, O Movimento Popular Anti-Racismo, a Rede Brasileira de Educação em Direitos Humanos e do Movimento de Ex-Presos e Perseguidos Políticos do Rio Grande do Sul, Por sua história de luta e dignidade que também hoje conferimos a Jair Krischke a Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara.

            Dom Marcelo Pinto Cavalheira, nascido em Recife, em 1928, este nobre pernambucano é Mestre em Fiolosofia e em Teologia Dogmática pela Pontifícia Universidade Gregoriana - Roma/Itália. Dedicou sua vida a educação religiosa e a preparação de novos sacerdotes. Foi 1º Reitor do Seminário Regional do Nordeste; Assistente Eclesiástico da Ação Católica; Subsecretário do Regional Nordeste II da CNBB; Membro da Comissão Episcopal de Pastoral e, depois, Vice-Presidente da CNBB Nacional. Por sua vida dedicada ao ensinamento da caridade e do amor ao próximo, defendendo os mais vulneráveis de nossa sociedade também será homenageado Dom Marcelo Pinto Cavalheira com a Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara.

            Dom Tomas Balduino, nascido em Posse, no Estado de Goiás, em 1922. Cursou Filosofia em São Paulo e Teologia na França. Cursou Antropologia e Lingüística, além de aprender a língua indígena, quando foi nomeado para a Prelazia de Conceição do Araguaia, onde viveu de maneira determinante e combativa os primeiros conflitos com as grandes empresas agropecuárias, que invadiam terras indígenas, expulsavam famílias sertanejas e exploravam trabalho escravo. Sempre atuando em defesa dos mais pobres, o que caracterizava sua atuação sacerdotal. Por esta disposição na luta contra as injustiças, provocou a ira do governo militar e dos latifundiários da região, que perseguiram e assassinaram os líderes de trabalhadores por ele amparados, como o Movimento do Custo de Vida e a Companhia Nacional pela Reforma Agrária. Foi personagem fundamental na Criação do Conselho Indigenista Missionário e da Comissão Pastoral da Terra. Por sua presença generosa e determinada na luta em defesa dos direitos humanos e da cidadania dos povos indígenas e dos trabalhadores rurais sem terra é que Dom Tomás Balduíno receberá a Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara.

            Este ano, por deliberação do Conselho, decidimos instituir uma premiação in memoriam para prestigiar a memória daqueles que lutaram por uma sociedade mais justa e igualitária, reverenciando seu legado e sua luta. Portanto, será homenageado aqui hoje: Major-Brigadeiro Paulo César Fonteles De Lima.

            Nascido em Belém, no ano de 1949. Graduou-se em Ciência do Direito, iniciado na Universidade Federal do Pará e, tão logo ingressou na Universidade, já demonstrou liderança na luta contra a ditadura. Na década de 70, mudou-se para Brasília com a esposa e perfilou-se junto a outros estudantes na luta dos movimentos estudantis, sendo preso. Enquadrado pelo 447, que proibia estudantes depois de presos retornarem aos estudos por três anos, assim foi trabalhar na fazendo do irmão. Depois de cumprido esse período retornou à Universidade e, formado, passou a lutar na defesa dos camponeses. Lançou, juntamente com outros companheiros, o jornal Resistência, de combate à ditadura militar. Contribuiu com a Comissão Pastoral da Terra na defesa dos camponeses do Sul do Pará. Por conta desta atuação seu nome passa a constar de listas de marcados para morrer. Em 1982 foi eleito Deputado Estadual e, as ameaças continuavam. Usou seu mandato para denunciar os descalabros do governo militar e a contribuir com a luta campesina, estudantil e dos trabalhadores. Em 1987 as ameaças se concretizaram, e foi assassinado, os mandantes até hoje não foram levados a julgamento. Por sua vida dedicada pela defesa dos direitos humanos que o Senado concede ao Major-Brigadeiro Paulo César Fonteles de Lima o prêmio in memoriam, que será entregue a seu filho Paulo Fonteles de Lima Filho.

            Quero dizer aqui, com muita alegria, que juntamente com os demais Senadores que compuseram a Comissão, não foi fácil escolher esses nomes entre tantos outros indicados pelos nossos Parlamentares, Deputados Federais e Senadores, Deputadas e Senadoras. Mas acreditamos que, ao homenagearmos essas ilustres pessoas que aqui estão, estaremos também homenageando os demais, com muita satisfação e com muita alegria.

            Era isso, Sr. Presidente, era o que eu gostaria de dizer neste momento, como Presidente da Comissão que contribuiu nesse processo.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/12/2011 - Página 53523