Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Exposição histórica da festa do Carnaval; e outro assunto.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Exposição histórica da festa do Carnaval; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 11/02/2012 - Página 2152
Assunto
Outros > HOMENAGEM. MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • HOMENAGEM, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), REFERENCIA, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, REGISTRO, HISTORIA, POLITICA, ORADOR, PARTICIPAÇÃO, FUNDAÇÃO.
  • COMENTARIO, RELAÇÃO, SITUAÇÃO, GREVE, POLICIA MILITAR, POLICIA CIVIL, BOMBEIRO, PROXIMIDADE, DATA, CARNAVAL, REGISTRO, HISTORIA, COMEMORAÇÃO, APRESENTAÇÃO, IMPORTANCIA, FESTA.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senadora Angela Portela, quero aqui saudar, como todos os Senadores do Partido dos Trabalhadores têm feito nesta semana, e especialmente hoje, o 32º aniversário de nosso Partido.

            Em 10 de fevereiro de 1980, tive a honra de ter sido convidado e aceitei ser um dos sócios fundadores do Partido dos Trabalhadores ali na memorável reunião do Colégio Sion, onde estavam presentes, dentre outros, Apolônio de Carvalho, Luiz Inácio Lula da Silva, Sérgio Buarque de Hollanda e tantas outros que vieram à época, como Florestan Fernandes e Francisco Belfort, a participar daquela fundação deste Partido.

            E eu, que nos anos 70, como economista que escrevia três, quatro artigos por semana na imprensa, como na Ultima Hora, na revista Visão - da qual fui editor de economia - e também na Folha de S.Paulo, como redator de assuntos econômicos. Ali escrevia; e, exatamente por estar escrevendo, interagindo com os trabalhadores, com os movimentos sindicais e também me importando muito com as questões relativas, na época, a falta de democracia no Brasil, e também por estar sempre preocupado com o cumprimento dos direitos à cidadania para todos, eis que fui eleito Deputado Estadual pelo MDB em 78, porque disseram para mim - os meus amigos - que seria bom que eu pudesse, também no Parlamento, como Deputado, defender as idéias que eu publicava na imprensa. E foi ai que me tornei primeiramente Deputado pelo MDB.

            Mas, quando o MDB e a Arena foram extintos, em 1979, eu considerei então o convite feito para estar entre aqueles - líderes sindicais e intelectuais - que seriam os fundadores do Partido dos Trabalhadores.

            Na época, como eu havia tido 78 mil votos para Deputado Estadual, fui o segundo mais votado nas eleições de 78. Então, lembro-me de ter feito um pronunciamento na Assembléia Legislativa e escrito alguma comunicação. E por telefone, por cartas e todas as outras formas que eram possíveis - não havia Internet naquela época - resolvi perguntar àqueles que haviam sido meus eleitores que eu estava considerando ingressar naquele novo partido. Lembro-me de ter recebido inúmeras respostas, eram centenas de respostas; e, no meu levantamento, aproximadamente 85% disseram que sim, “é nossa expectativa que você seja fundador do Partido dos Trabalhadores”. E assim vim participando desse Partido desde as primeiras batalhas, quando, por exemplo, Lula foi candidato a governador, em 1982. Naquela época eu fui candidato a deputado federal, e eleito; em 85/86 fui candidato a prefeito, a governador em São Paulo. Não venci.

            Em 88, solicitaram-me, sugeriram-me que eu fosse candidato a vereador, e, por ter sido muito bem votado, eu aceitei. Fui eleito com 201 mil votos. Por isso, levaram-me à presidência da Câmara Municipal, e, pelo trabalho ali realizado, o PT sugeriu que eu fosse candidato ao Senado. E desde 90, em 98 e 2006, novamente eleito outras vezes, para aqui estar completando 21 anos como Senador pelo Partido dos Trabalhadores.

            E fico muito contente porque acredito que o nosso Partido, que tem por objetivo a construção de uma sociedade em que possam ser compatibilizados os objetivos de maior igualdade, de solidariedade, de realização de justiça, sobretudo através dos meios democráticos, sempre assegurando a democracia, a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão, a liberdade de organização partidária, eleições livres e diretas para as quais tanto batalhamos, Senadora Angela Portela. Tudo isso me pareceu algo tão compatível com aquilo que eu tanto passei a acreditar desde a minha adolescência, que era perfeitamente possível, sim, no Brasil nós construirmos um país mais justo, mas por meios democráticos, pelo meios da não violência.

            Hoje, em especial, quero cumprimentar o Partido dos Trabalhadores, a Presidenta Dilma, o Presidente Lula e, ao mesmo tempo, também fazer uma reflexão aqui a respeito desse fenômeno fantástico que é, para todos nós brasileiros, o Carnaval que se aproxima.

            O Carnaval de 2012 está sendo diferente dos outros. Há rebeliões, revoltas, movimentos de reivindicação na Polícia Civil e Militar, nos Bombeiros em muitos Estados brasileiros, como ali na Bahia. Agora, se anuncia que no Rio de Janeiro está por haver um movimento e possivelmente em São Paulo, em outros Estados, enfim.

            Ontem, em uma assembléia na Cinelândia, no Rio de Janeiro, foi colocado que isso poderá ameaçar o grande carnaval do Rio de Janeiro, como também o da Bahia, de Salvador, e de outros Estados. O interessante é que essa é uma festa tão tradicional na humanidade inteira que tenha chegado a tais excessos.

            Aqui, duas forças estão se defrontando: a força do desejo e a da alegria, que move as multidões em todo o País, a fim de dar um alívio coletivo às aflições do trabalho cotidiano, na maioria das vezes repetitivo; a outra é a da desigualdade de rendimentos, que coloca os responsáveis pelas vidas das pessoas nesses dias, em face de uma realidade trágica, muitas vezes com uma remuneração, um salário, que não chega ou que não dá para cobrir as necessidades mínimas de suas famílias.

            É possível que se tenha perdido a alegria originária que fazia com que todas as culturas primitivas comemorassem a fertilidade das colheitas. Era a festa. No Brasil, todas as culturas indígenas faziam periodicamente a comemoração da festa da colheita. Um padre jesuíta disse: "Eles trabalham quatro anos para poder ter uma festa com muita bebida, muita dança." Quando o padre percebeu isto disse ao cacique: "Por que ao invés de gastar tudo isso em alguns dias, nós não compramos instrumentos para arar a terra, material para fazer uma escola e assim fazer progredir a vida da tribo?" Alguns acham que depois disso eles não se esforçaram tanto para trabalhar mais. Na verdade, acredito que todas as pessoas precisam ter o direito de partilhar da riqueza da nação. Isso, de maneira alguma, vai proporcionar qualquer sentido de não se trabalhar, mas é importante que as pessoas possam ter um trabalho condizente com a dignidade, com a vontade maior de cada um e de acordo com sua vocação.

            A raiz do trabalho nada mais é do que um desejo de que esse trabalho leve todos a uma festa em que os tabus sejam quebrados e que pelo menos durante um pequeno tempo todos possam descansar. Essa foi a origem primitiva do carnaval e foi assim durante milhares de anos.

            Como o conhecemos hoje, ele nasceu na Grécia 600 anos a.C, como uma comemoração coletiva da continuidade da vida e da fertilidade da terra. Mais tarde gregos e romanos colocam também atividades sexuais nessas festas.

            A partir do ano 400 d.C, em que a religião católica passa a ser a religião oficial do Estado, o carnaval foi condenado porque era pecaminoso e ia contra todas as leis da Igreja.

            A partir da adoção do carnaval por parte da Igreja, a festa passou a ser comemorada através de cultos oficiais, o que bania os "atos pecaminosos". Tal modificação foi fortemente espantosa aos olhos do povo, já que fugia das reais origens da festa, como o festejo pela alegria e pelas conquistas.

            Em 1545, durante o Concilio de Trento, o carnaval voltou a ser uma festa popular. Em 1723, aproximadamente, o carnaval chegou ao Brasil sob influência européia. Ocorria através de desfiles de pessoas fantasiadas e mascaradas. Somente no século XIX que os blocos carnavalescos surgiram com carros decorados e pessoas fantasiadas de forma semelhante à de hoje.

            Atualmente, as escolas de samba no País inteiro gastam somas enormes para fazer os desfiles apenas para os que podem pagar. E também os turistas, obviamente. Mas nem sempre todo o povo em geral pode participar das suas comemorações; acabam comemorando nas ruas, em todas as esquinas, porque nem sempre há o acesso. O problema de alguma perversão que foi a transformação da sua festa em objeto de consumo. Mas, como seus ancestrais tinham direito a um período de ruptura dos tabus, o carnaval de hoje vira um objeto de consumo que nem sempre é para eles. E eles então começam a divertir-se como podem, formando blocos e bandas em todas as esquinas das cidades.

            Ninguém pode tirar do ser humano esse desejo de alegria, fruto de um longo e exaustivo trabalho. Isto faz nos lembrar o filme clássico mais belos, "Orfeu do Carnaval", uma produção franco-brasileira de 1959, dirigido por Marcel Camus e escrita e interpretada por brasileiros, o que nos dá uma idéia tão humana e tão bela desse desejo profundo de alegria em suas músicas que até hoje ecoam, e assim ecoarão para sempre como:

Tristeza não tem fim

Felicidade sim

A felicidade é como a gota

De orvalho numa pétala de flor

Brilha tranquila

Depois de leve oscila

E cai como uma lágrima de amor

A felicidade do pobre parece

A grande ilusão do carnaval

A gente trabalha o ano inteiro

Por um momento de sonho

Pra fazer a fantasia

De rei ou de pirata ou jardineira

e tudo se acabar na quarta-feira

Tristeza não tem fim

Felicidade sim

A felicidade é como a pluma

Que o vento vai levando pelo ar

Voa tão leve

Mas tem a vida breve

Precisa que haja vento sem parar

            Que belas as palavras de Antônio Carlos Jobim e Vinícius de Moraes, nesse filme que teve um sentido tão importante para todos nós brasileiros, porque, afinal, não é só de tristeza que vive o ser humano.

            E, nesse mesmo filme, há outra música tão bela que mostra o sentido da esperança, o sentido da esperança que é justamente aquele que veio a ser proporcionado pela criação, há 32 anos, do Partido dos Trabalhadores, para construir um Brasil melhor, um Brasil que possa ser expresso em:

Manhã, tão bonita manhã

Na vida, uma nova canção

Cantando só teus olhos

Teu riso, tuas mãos

Pois há de haver um dia

Em que verás

Das cordas do meu violão

Que só teu amor procurou

Vem uma voz

Falar dos beijos perdidos

Nos lábios teus

Canta o meu coração

Alegria voltou

Tão feliz a manhã

Deste amor

            Na maioria das religiões, o Céu é tomado como descanso eterno deste vale de lágrimas. Por que o vale de lágrimas está aumentando e a alegria diminuindo? Mas ela não quer diminuir e sempre encontrará um caminho para explodir.

            E é importante, prezada Senadora Angela Portela e queridos Senadores Anibal Diniz, Humberto Costa, que nós possamos perceber a importância do Carnaval entre nós. As escolas de samba, por exemplo, que, em São Paulo, a Camisa Verde e Branco, que vai homenagear, ter como tema “É o amor”; o Império de Casa Verde, “Na ótica do meu império, o foco é você”; a Paulistana, que vai ter como enredo, “Trazendo para os braços do povo o coração do Brasil; a X-9 Paulistana, “Desbrava os sertões dessa gente varonil”; a Vai-Vai, que vai homenagear “As mulheres que brilham, a força feminina, o progresso social e cultural do País”, e, portanto, que tem como principal homenageada a nossa Presidenta Dilma Rousseff.

            Eis o que diz o enredo da Vai-Vai:

Bixiga é alegria, é “bom Brilhar”

Gira a porta bandeira

Rodam minhas baianas

Vêm que o show vai começar

A mão de Deus abençoou o meu cantar

Fonte de inspiração

A essência de Adão

Luz para o meu caminhar

A duras penas prosseguiu a lutar

Na graça de Índia faceira

Com a força da negra guerreira

A realeza de grande brio

Aos olhos do regente do Brasil

Ora ie ieo Mamãe Oxum

Liberdade!!!

Soam os tambores quilombolas)

Um sonho que virou realidade (ora ie ieo)

E hoje tão linda e tão bela,

Toda a passarela a te exaltar

És música, poema,

Arte a me fascinar

Te vejo nas ruas

Nos bares, esquinas,

És como as estrelas bordando o luar

1001 faces no mundo a brilhar

Senhora da vida

Guerreiras na lida

Hoje és presidente e me rendo a teus pés

Pra sempre te amarei “Mulher”

           Eis que ali em São Paulo, a Gaviões da Fiel resolveram homenagear justamente o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, num enredo “Verás que um filho fiel não foge à luta, Lula, o retrato de uma Nação”.

           Dizem os Gaviões da Fiel:

Vai meu gavião…

Cantando a saga do menino sonhador

Um filho do sertão, cabra da peste… Irmão

Que deus pai iluminou!

Trouxe no sangue a coragem, a fé

O poder regendo seu destino!

Na cidade grande a esperança… O futuro promissor!

Traçou seu o caminho

Cresceu foi à luta… Pra vencer

E o sonho se torna real

Luiz Inácio o operário nacional!

Companheiro fiel… Por liberdade

Na corrente do bem… Contra a maldade!

Elo forte da democracia

A luz da nossa estrela guia!

Viu… No coração do Brasil

Tanta desigualdade

O retrato da realidade

A utopia buscando a dignidade!

Solta o grito da garganta e vem comemorar

A soberania popular

Felicidade…

O povo unido venceu

A cidadania resplandeceu

Uma nova era aconteceu!

Sou da nação, sou valente e festeiro

Corinthiano loucamente apaixonado!

Em oração a São Jorge guerreiro

Peço que o brasileiro seja sempre abençoado!”

           Que bonita homenagem que os Gaviões da Fiel prestam.

            E são tantos os enredos lindos que passam a ser cantados nos próximos dias por todas as escolas de samba, como, por exemplo, a Mocidade, que, no Rio de Janeiro, vai homenagear os 50 anos da morte de Portinari.

Por Ti, Portinari, Rompendo a Tela, a Realidade

Eu guardei

A mais linda inspiração

Pra exaltar em sua arte

A brasilidade de sua expressão

Desperta, gênio pintor

Mostra seu talento, revela o dom

Deixa a estrela guiar

Faz do firmamento seu eterno lar

Solto no céu feito para voar

Quero te ver qual menino feliz

Planta a semente do sono em verde matiz

Emoção me leva

Livre pincel a deslizar

Vou navegar, desbravador

Um errante sonhador

Voar pelas asas de um anjo

Num céu de azulejos, pedir proteção

Vida de um retirante

No sol escaldante que queima o sertão

Moinhos vencer, histórias de amor

Riscar poesias em lápis de cor

Você que do morro fez vida real

Pintou nossos lares num lindo mural

Você, retratando a alma, se fez ideal

Meu samba canta mensagens de “Guerra e Paz”

Seu nome será imortal em nosso Carnaval

É “Por Ti” que a Mocidade canta

Portinari, minha aquarela

Rompendo a tela, a realidade

Nas cores da felicidade.

            Também a Aruc, de Brasília, vai homenageá-lo: Portinari, as Cores e as Caras do Brasil. Mas lá no Recife, assim como no Rio de Janeiro, será homenageado o nosso Luiz Gonzaga pelo seu centenário.

            A Unidos da Tijuca realizou a final do concurso de samba-enredo para escolher o hino que vai entoar e sacudir a torcida tijucana na Sapucaí. Citam Luiz Gonzaga, um dos seis compositores que formam o pilar da música popular brasileira, Villa Lobos, Tom Jobim, Pixinguinha, Noel Rosa e Dorival Caymmi.

            E, para a próxima semana, lá estarão cantando, na Unidos da Tijuca:

Nessa viagem arretada

“Lua” clareia a inspiração

Vejo a realeza encantada

Com as belezas do Sertão!

“Chuva, Sol” meu olhar

Brilhou em terra distante

Ai que visão deslumbrante, se avexe não!

Muié rendá é rendeira.

E no tempero da feira

O barro, o mestre, a criação!

Mandacaru a flor do cangaço...

Tem "xote menina" nesse arrasta pé

Oh! Meu Padim, santo abençoado

É promessa eu pago, me guia na fé

Em cada estação, a "triste partida"

Eu vi no caminho vida severina

À margem do Chico espantei o mal

Bordando o folclore raiz cultural...

Simbora que a noite já vem, "saudades do meu São João"

"Respeita Veio Januário, seus oito baixo tinhoso que só"

"Numa serenata" feliz vou cantar

No meu pé de serra festejo ao luar...

Tijuca a luz do arauto anuncia

Na carruagem da folia, hoje tem coroação!

A minha emoção vai te convidar

Canta Tijuca vem comemorar

"Inté asa branca" encontra o pavão

Pra coroar o "Rei do Sertão”.

            Srª Presidenta, eu aqui quis dar alguns exemplos de como o povo, no carnaval, por meio das escolas de samba, homenageia de maneira tão bela as personagens mais importantes do nosso País, assim como também falam, como a Vila Isabel, em O Canto Livre de Angola 2012, da importância do negro. E também a Império Serrano, que vai homenagear a sambista Dona Ivone Lara com Dona Ivone Lara: o Enredo do Meu Samba. E com tantas outras coisas belas por todo o Brasil, certamente teremos algo muito importante para todos nós.

            E também em Salvador. Eu espero que os PMs voltem logo ao trabalho, num entendimento com o Governador Jaques Wagner, para que todos que visitam Salvador, do Brasil e do mundo inteiro, tenham um carnaval tranquilo, com muita alegria.

            Muito obrigado, Srª Presidente Angela Portela.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/02/2012 - Página 2152