Discurso durante a 10ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre o anúncio, ontem, pelo Governo Federal, de cortes orçamentários em 2012.

Autor
Vanessa Grazziotin (PC DO B - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • Comentários sobre o anúncio, ontem, pelo Governo Federal, de cortes orçamentários em 2012.
Publicação
Publicação no DSF de 17/02/2012 - Página 2954
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • COMENTARIO, REUNIÃO, BANCADA, PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PC DO B), CRITICA, CORTE, ORÇAMENTO, UNIÃO FEDERAL, AREA, SAUDE, EDUCAÇÃO, SEGURANÇA PUBLICA, OBJETIVO, REDUÇÃO, GASTOS PUBLICOS.

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - Muito obrigada, Sr. Presidente. Srs. Senadores, Srªs Senadoras, companheiras e companheiros.

            Sr. Presidente, venho a esta tribuna para tecer alguns comentários que não se resumem a opiniões pessoais minhas, mas a uma opinião geral do meu Partido, o PCdoB. Com frequência, em nossas reuniões da Direção Nacional, assim com nas reuniões das Executivas Estaduais, fazemos questão de debater com certa profundidade a questão econômica do País porque entendemos que as necessidades da população brasileira, as necessidades que têm de desenvolvimento efetivo passam por decisões políticas e econômicas. Ou mudamos a forma como o Brasil encara a sua política macroeconômica ou continuaremos avançando a passos muito curtos e a um ritmo muito lento, muito vagaroso, aquém das necessidades apresentadas por nossa gente, por nossa população.

            Ontem, já no final da tarde, Sr. Presidente, após uma coletiva concedida pelo Ministro Guido Mantega, da Fazenda, e pela Ministra Miriam Belchior, do Planejamento, anunciou-se um corte. Muitos meios de comunicação tratam como corte, mas, na realidade, não é um corte e, sim, um contingenciamento, um bloqueio de recursos no Orçamento da União de 2012. Esse corte vem ocorrendo sistematicamente já há alguns anos, primeiramente por exigência do próprio Fundo Monetário Internacional, mantendo-se até hoje. Esse contingenciamento objetiva economizar recursos públicos para fazer frente aos serviços da dívida brasileira, Sr. Presidente. É exatamente sobre esse ciclo, que consideramos vicioso, que vou me referir neste momento.

            Então, como disse no dia de ontem, foi anunciado pelo Governo Federal um corte de R$55 bilhões nas despesas previstas no Orçamento da União para este ano de 2012, Orçamento este que foi aprovado pelo Congresso Nacional no final do ano passado. O valor contingenciado deverá ser destinado ao pagamento de juros da dívida pública, e o valor, como disse também, foi divulgado no dia de ontem pela Ministra do Planejamento e pelo Ministro da Fazenda.

            Do total de R$55 bilhões, o contingenciamento de despesas discricionárias ficou em R$35,01 bilhões, ou seja, ou seja 63,65%. O restante, aproximadamente R$20 bilhões, do corte foi feito sobre dotações para despesas obrigatórias, como aposentadorias e[despesas da previdência social. Isso foi possível porque o Governo refez seus cálculos e concluiu que poderá economizar cerca de R$20 bilhões com esse tipo de gasto orçamentário. Nas despesas discricionárias, os Ministérios da Saúde e da Educação também foram afetados, com contingenciamento respectivo de R$5,47 bilhão e R$1,93 bilhão.Ou seja, o Ministério da Saúde teve bloqueado, contingenciado quase que R$5,5 bilhões, enquanto que o Ministério da Educação, quase R$2 bilhões.

            Pelas contas da Fazenda e do Planejamento, o valor de R$55 bilhões é o contingenciamento necessário para viabilizar a meta cheia de resultado primário do setor público, conceito que exclui gastos com juros da dívida pública. A meta exige que o setor público não financeiro faça superávit primário de R$139,8 bilhões - ou seja, quase R$140 bilhões, essa é a meta de superávit primário para este ano estabelecida e aprovada no ano passado para o Orçamento que vigora neste ano de 2012 -, sendo R$ 97 bilhões no âmbito do governo central (Banco Central, Previdência Social e Tesouro Nacional).

            O superávit primário é a economia que o setor público faz para pagar parte dos juros da dívida interna, que no total consomem mais de 5% do PIB, ou seja, de toda a produção do nosso País. Por praticar a mais alta taxa básica de juros reais do mundo, o País arca com uma despesa financeira absurda, que se tornou essencial à valorização do capital que rende juros e tem um impacto extremamente negativo para o desenvolvimento econômico e social do Brasil.

            Os impactos em relação ao PIB.

            O resultado é subtraído dos investimentos públicos e constitui uma das explicações para as baixas taxas de investimentos na economia nacional. Como os investimentos são a principal força motriz do crescimento, os cortes no Orçamento da União restringem a capacidade de expansão da economia. O contingenciamento das despesas no ano passado, por exemplo, foi uma das causas mais relevantes da forte desaceleração do PIB no segundo semestre, ao lado, obviamente, dos juros altos e da crise econômica mundial.

            Além disso, os cortes atingem áreas sensíveis, como educação, saúde e esporte, principalmente, no momento em que o País se prepara para a Copa do Mundo, quando o déficit de investimentos nesses setores, e poderia citar outros, é grande e a precariedade dos serviços públicos também, em determinados momentos, chega a ser assustadora.

            As metas de superávit primário, e aqui repito o que disse no início, foram introduzidas no Brasil por orientação do Fundo Monetário Internacional - FMI a partir do ano de 1999, ainda no governo do então Presidente Fernando Henrique Cardoso. É mais uma herança perversa do neoliberalismo que traduz o poder da oligarquia financeira à qual o governo Lula não renunciou, optando por manter, a exemplo do câmbio flutuante e da política monetária conservadora que Dilma, a nossa Presidenta, promete mudar. Inclusive, uma das explicações, das justificativas apresentadas ontem, em nome do Governo, pelo Ministro Guido Mantega, para esse corte de R$55 bilhões é exatamente criar condições objetivas para que possamos continuar diminuindo o valor das taxas reais de juros no Brasil. Entretanto, nós do PCdoB temos o entendimento de que, por conta de uma série de características da nossa economia, não haveria necessidade de um corte tão profundo.

            O remédio que se dá ainda leva muito em consideração a remuneração do capital financeiro internacional. E nós não precisamos, não podemos e nem devemos continuar remunerando dessa forma o capital financeiro, como o País vem fazendo nos últimos tempos.

            Então eu penso, e aqui quero repetir, que o Governo da Presidenta Dilma tem sido corajoso, tem enfrentado uma série de questões estruturais, sobretudo na macroeconomia.

            Volto a falar da queda das taxas de juros. A perspectiva é que cheguemos em breve a uma taxa de juros de um dígito. A nossa taxa, hoje, está em torno de 10,5% e a meta, em curto prazo, é baixar a taxa de juros brasileira, a taxa Selic, para a casa de um dígito. Entretanto, medidas tão drásticas, quanto a dos juros altos, são anunciadas, como essa medida que foi anunciada no dia de ontem.

            Eu quero dizer que os movimentos sociais - todos nós e principalmente os movimentos sociais, incluindo todas as centrais sindicais, as entidades juvenis - condenamos essa política fiscal que o Governo vem praticando, porque a experiência concreta ensina que o saldo primário feito para pagar juros, sob a justificativa de que é necessário manter a relação dívida/PIB num patamar baixo, é um sério obstáculo à realização de suas demandas ao setor público por educação de qualidade, saúde, habitação, valorização do funcionalismo, entre tantas outras.

            A polêmica, por exemplo, em torno do piso salarial dos professores, cujo valor é modesto e inferior ao salário mínimo constitucional calculado pelo Dieese, é um bom exemplo das restrições financeiras que o setor público enfrenta.

            Há um coro reacionário de governadores pela redução do valor do piso, mas não se tem notícia de nenhum deles propondo a redução do superávit primário para formar um fundo com o objetivo de viabilizar a aplicação da lei. Enquanto isso, o estado da educação pública, no País, não é dos melhores, e é notório que a elevação de sua qualidade depende da valorização do trabalho realizado pelos educadores.

            Aqui, Sr. Presidente, eu faço questão de reafirmar que essa política econômica foi herdada, e nós consideramos essa uma das heranças malditas do Governo anterior. Por conta de uma série de fatores políticos vividos pelo ex-Presidente Lula, ela se manteve e, agora, a Presidenta Dilma está iniciando a sua mudança.

            Repito que a mudança, a coragem da Presidenta de diminuir, gradativamente, o valor das taxas de juro, é muito importante. Entretanto, nós estamos, aqui, a dizer - eu estou, aqui, a dizer - que essa é uma medida importante, mas seria importante, também, que o corte no orçamento, que vai atingir exatamente os recursos para investimentos em infraestrutura, em áreas sociais, de saúde e educação, não fosse feito, porque, efetivamente, não há, no nosso entendimento, necessidade de que isso continue sendo feito.

            Por mais que o Governo deixe de investir nos programas sociais, o problema não se resolve, pois a dívida pública aumenta a cada ano, independentemente do superávit, uma vez que o setor público é forçado a contrair novos débitos para pagar a totalidade dos juros. É, este sim, um círculo vicioso.

            São compreensíveis, por isso, as reivindicações das centrais sindicais e dos movimentos sociais por mudanças na política econômica. Sem recursos para o gasto social não se muda a realidade de desigualdade e injustiça em nosso País, refletida na negação do acesso dos mais pobres à saúde, à habitação e à educação de qualidade. O Brasil estaria bem melhor se os recursos subtraídos do orçamento para pagar dívida fossem investidos em programas para melhorar efetivamente a vida do povo brasileiro e aumentar a taxa de crescimento da nossa economia, que se revela módica ou mesmo medíocre quando comparada ao desempenho de países como China, Índia e outros emergentes.

            Aqui eu quero também abrir um novo parêntese, Sr. Presidente, Srs. Senadores, para fazer outra observação: quando a crítica vem pela direita ou quando a crítica vem pela esquerda.

            A oposição ao Governo Federal, que critica todas as medidas adotadas pela Presidenta Dilma - e assim o fez com o governo do Presidente Lula -, todas, critica não pela esquerda, mas pela direita, porque entende que a tal da responsabilidade fiscal deva ficar acima da responsabilidade social.

            É claro que eu não estou aqui defendendo nenhuma atitude irresponsável por parte do Governo Federal. Eu estou apenas aqui levantando um ponto de vista que é meu pessoal, que é do meu partido e que é dos movimentos sociais, de que o Brasil não teria necessidade de fazer tanta economia, de fazer tanto sacrifício para pagar serviços de uma dívida, Sr. Presidente, que cresce em decorrência de praticarmos as mais elevadas taxas de juros reais do planeta - que estão diminuindo, é verdade.

            Mas o que eu quero, o que nós queremos é que essas mudanças aconteçam com mais celeridade e que se, por um lado, se diminui o valor da taxa de juro, não se promova, por outro lado, um corte no orçamento tão drástico como esse que foi anunciado no dia de ontem.

            Ao contrário do que se observa na Europa e nos Estados Unidos, a dívida pública brasileira, Sr. Presidente, é pequena. Eu repito: ao contrário da realidade da maioria dos países do mundo, a dívida pública brasileira é pequena e tem um perfil considerado bom pela maioria dos economistas.

            De acordo com o Banco Central, em outubro do ano passado, a dívida líquida consolidada do setor publico (somando as dívidas da União, dos Estados e dos Municípios) equivalia a 38;2% do Produto Interno Bruto - PIB, enquanto a dívida da Grécia deve estar na casa dos 160% do PIB daquele País. Eu vou repetir, Sr. Presidente, o perfil da nossa dívida comparada com a de outros países: enquanto a dívida pública brasileira equivale aproximadamente a 38% do nosso PIB, a da Grécia chega a quase 160% do PIB; a da Itália, a quase 120% do PIB; a de Portugal, a 110%; a do Japão, a 200%; a dos Estados Unidos, a 100%; e a da França, a aproximadamente 87%, contra 38% da dívida do Brasil. Então, Sr. Presidente, não há justificativa para a manutenção de juros tão elevados e não há necessidade ainda para um corte tão drástico para justificar a queda de juros em nosso País. Na realidade, o povo brasileiro tem sido obrigado a assistir diariamente à grande transferência de recursos públicos do capital público brasileiro para o setor privado, principalmente para os setores rentistas. É contra esse círculo vicioso que nós levantamos a nossa voz.

            Aqui, quero citar o economista Ricardo Carneiro, que diz que boa parte da dívida pública está inclusive lastreada em reservas A contrapartida está em reservas. “Nós não temos, a rigor, diz ele, do meu ponto de vista, nenhuma possibilidade de ter uma crise internacional amanhã e a dívida pública explodir, como aconteceu em várias ocasiões no passado”.

            Os cortes anunciados pela equipe econômica, portanto, parecem encontrar explicação no fato de que a política econômica do governo continua subordinada à ditadura do mercado financeiro.

            Aí, Sr. Presidente, nós entendemos que precisamos aumentar a celeridade dessas mudanças. Não há nada economicamente que justifique tamanho corte, Srs. Senadores. E mais: lendo as matérias todas divulgadas pela mídia, entristece-me muito o fato de a imprensa destacar, com muita força, que grande parte do alvo do contingenciamento são exatamente as emendas parlamentares, emenda individuais e emendas coletivas, de bancada.

            Dizem quase todas as matérias - eu li todas as matérias sobre o assunto no dia de hoje - que são emendas com as quais o Palácio do Planalto não tem compromisso. Elas diziam que com as emendas dos Parlamentares, de Senadores e Senadoras, de Deputados e Deputadas, o Palácio do Planalto não teria qualquer compromisso.

            Não vejo assim, pelo contrário. Não quero pegar o exemplo de outras bancadas, mas pego o da Bancada do Amazonas, Sr. Presidente.

            Nós, como todas as bancadas de todos os Estados, temos uma coordenação. Discutimos com os Municípios do interior, através da Associação dos Municípios do Estado do Amazonas, com a Prefeitura da capital e com o Governo do Estado do Amazonas. E todas as emendas, inclusive as emendas individuais, nós usamos de forma a garantir os serviços essenciais de que necessita o nosso Estado.

            Por exemplo, o problema de segurança é grave no Brasil inteiro. É um problema grave, e o Governo Federal já disse: a segurança pública não é uma atribuição direta da União, Presidente Moka, mas nem por isso o Estado brasileiro fechará - isso é afirmação dela, do Ministro da Justiça - os olhos para o problema da falta de segurança no Brasil.

            Hoje, o Governador do meu Estado está lançando aquele que talvez seja o seu maior programa, que é chamado Ronda nos Bairros, para levar policial, policiamento, viaturas - carro ou motocicleta - à população. Será um número importante de policiais em cada bairro, em cada região da cidade de Manaus.

            Agora, a bancada federal está contribuindo com o Governo do Estado do Amazonas. Cada um de nós colocou emendas individuais para a aquisição de viaturas, Sr. Presidente, para levar segurança ao povo do Amazonas.

            Então, como alguém ainda diz que as emendas de bancada não são emendas importantes? Como alguém diz que as emendas não são importantes? São, sim.

            Nós temos, entre as emendas nossas de bancada, aquela emenda que trabalha a preparação da cidade para a Copa do Mundo...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - ...coisas que muitas vezes o poder central não enxerga. Mas nós que vivemos no Estado, que representamos o Estado aqui, Senador Moka, sabemos dessas dificuldades e apresentamos as emendas individuais. Elas são importantes, sim. Elas são importantes, sim, para o País. Ninguém faz emenda para pegar voto, não. Nós fazemos emenda para ajudar as prefeituras, os nossos governadores, a população. É para isso que as fazemos, e é assim que a bancada do Amazonas age.

            Então, Sr. Presidente, eu acho que, em vez de ficarmos aqui debatendo corte aqui e corte ali no Orçamento, nós precisaríamos debater mais as responsabilidades sociais que o Governo tem perante a sua população, perante o seu povo, e não continuar permitindo tamanha sangria do capital público para o sistema financeiro privado e estrangeiro em boa parte.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/02/2012 - Página 2954