Discurso durante a 13ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Relato sobre o episódio da reintegração de posse de Pinheirinho, em São José dos Campos.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS.:
  • Relato sobre o episódio da reintegração de posse de Pinheirinho, em São José dos Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 24/02/2012 - Página 3740
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • COMENTARIO, DECISÃO JUDICIAL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ASSUNTO, REINTEGRAÇÃO DE POSSE, PROPRIEDADE PARTICULAR, OBJETIVO, DEMONSTRAÇÃO, NECESSIDADE, RESPEITO, DIREITOS HUMANOS, DURAÇÃO, EXECUÇÃO, DECISÃO, JUDICIARIO.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Prezado Presidente Waldemir Moka, prezado Senador Pedro Taques, quero registrar com satisfação a presença, na tribuna de honra do Senado, do Vereador Tonhão Dutra, de São José dos Campos, do Partido dos Trabalhadores, que participou hoje, junto com inúmeras pessoas, da audiência pública de tamanha relevância sobre os episódios de reintegração da posse da área do Pinheirinho, em São José dos Campos.

            Eu gostaria de fazer aqui uma reflexão, primeiramente, que escrevi juntamente com o Deputado Ivan Valente, pois, como testemunhas diretas do ocorrido na reintegração de posse do Pinheirinho e participantes das negociações que antecederam a desocupação, sentimo-nos na obrigação de relatar a marcha da insensatez das decisões das autoridades, que são responsáveis pela truculência, violação dos direitos humanos e desprezo pelos menos favorecidos. Não foi por falta de argumentos com alternativas às autoridades do Judiciário e do poder público que o episódio não teve outro desfecho.

            Por volta das 12 horas de 18 de janeiro, em companhia dos Deputados Adriano Diogo e Carlos Giannazi, fizemos uma visita ao Presidente do Tribunal de Justiça, Ivan Sartori, para alertá-lo que um entendimento entre o Governo Federal, o estadual e a Prefeitura de São José dos Campos que estava próximo de se concretizar, com vistas a solucionar o problema de moradia de um número considerável de famílias que haviam construído residências no Pinheirinho, em São José dos Campos.

            Ressaltamos que seria importante dar um prazo para a concretização daquele acordo antes de se iniciar a reintegração de posse determinada pela Juíza Márcia Loureiro. Ponderou o Presidente Sartori que só se poderia sustar a reintegração mediante clara documentação das partes. Deu-nos o nome e o telefone do Síndico da Massa Falida da Selecta S.A., autor da reintegração da área, da qual apenas parte havia sido ocupada, nos últimos oito anos, por um número superior a 1.700 famílias, mais de 6.000 pessoas. De pronto, o Síndico, Jorge T. Uwada, marcou um encontro conosco perante o Juiz de Falências, Luiz Beethoven Giffone Ferreira, na 18a Vara do Fórum de São Paulo.

            Após uma hora de ponderações sobre os problemas sociais que poderiam advir da reintegração, o Juiz Beethoven perguntou ao Sr. Uwada se ele concordaria com a concessão de um prazo de 15 dias para a realização de um entendimento. Mesmo tendo o advogado da massa falida, Waldir Helu, expressado sua discordância, o síndico concordou. O Juiz Beethoven pediu que o síndico redigisse um requerimento explicitando sua concordância e a de todos os presentes. Nesse mesmo documento, o juiz deferiu a suspensão da reintegração por 15 dias. Também registrou seu telefonema à Juíza Márcia Loureiro solicitando a suspensão da reintegração pelo prazo acordado.

            De pronto, seguindo a recomendação do próprio juiz, levamos aquele documento ao Juiz Rodrigo Capez, no Tribunal de Justiça, que estava encarregado pelo Presidente Sartori de nos receber. Ainda no TJ, o Juiz Rodrigo Capez, auxiliar direto do Presidente do Tribunal - e o mesmo que depois avalizou toda a ação da PM no Pinheirinho -, comprometeu-se a se empenhar por uma solução negociada.

            Naquela mesma tarde, conversei com a Secretária Nacional de Habitação, Inês Magalhães - que hoje participou da audiência -, sobre o prazo aberto para a negociação. Ela se prontificou a receber o Prefeito Eduardo Cury, de São José dos Campos, na Secretaria Geral da Presidência, para acelerar os planos do possível aproveitamento de parte daquela área para o desenvolvimento de programa de moradia. Naquela tarde, o Governador Geraldo Alckmin informou a mim próprio que, se o Governo Federal e a Prefeitura chegassem a um entendimento, o Governo Estadual providenciaria a infraestrutura necessária para o terreno.

            No dia 19, o Prefeito Cury foi à Brasília, dialogou no Ministério da Ciência e Tecnologia, mas adiou a reunião que teria sobre o Pinheirinho. No dia 20, veio a São Paulo. Depois de ter conversado com juízes, teve a atenção de me visitar, em minha residência, para expor as dificuldades e progressos havidos, nos últimos oito anos, no seu relacionamento com a comunidade do Pinheirinho. Conversamos por uma hora e meia. Falou de sua discordância com a ocupação, mas também de sua responsabilidade em resolver os problemas sociais daquelas famílias, em especial com os serviços de educação e saúde - e, obviamente e principalmente, para com as crianças. Eu próprio relatei, então, a disposição do Ministério das Cidades, da Secretaria Nacional de Habitação e da Secretaria-Geral da Presidenta Dilma Rousseff de acelerar um entendimento para o assentamento definitivo das famílias. Foi agendado com o Prefeito uma reunião para a semana seguinte. No sábado, 21, deslocamo-nos - eu, o Ivan Valente e diversos outros Parlamentares - para o Pinheirinho, onde relatamos, a cerca de 700 pessoas ali reunidas em assembleia, que estava sendo construída uma solução para o caso. Recomendamos a todos que se portassem com serenidade e respeito. Na ocasião, pedi a todos que seguissem as recomendações de, por exemplo, Martin Luther King Jr., que recomendava a todos, sempre, como “eu tenho um sonho”, que é sempre importante confrontarmos a força física com a força da alma.

            Eis que, no domingo, dia 22, às seis e pouco da manhã, alertado pelo Vereador Tonhão Dutra, fiquei sabendo que cerca de dois mil policiais com extraordinário aparato, com helicópteros, atirando balas de borracha, bombas de gás e com pimenta, junto com a guarda municipal, esta com arma de fogo, gás lacrimogêneo, tratores, viaturas da ROTA, passaram a expulsar os moradores daquela área, retirando-os de suas residências, forçando-os a se dirigirem a abrigos nas áreas contíguas como a do Campo dos Alemães. Ao verem aquelas cenas, alguns dos moradores das áreas vivinhas protestaram. Então, a operação da PM expandiu-se para as áreas vizinhas, possivelmente para tentar criminalizar a conduta daquela comunidade.

            No Pinheirinho e na vizinhança, houve inúmeras pessoas que foram feridas com tiros de balas de borracha - sendo que um deles esteve aqui hoje, o  
Sr. David Washington Furtado, que mostrou, na audiência pública, o tiro que levou da guarda municipal, que estava, inclusive, apontando a arma para sua esposa, na hora em que ambos estavam saindo do Pinheirinho e já no Campo dos Alemães. Sua esposa, Laura Maria Silva de Souza, que esteve aqui também presente, descreveu o momento em que o seu marido se colocou à frente dela e a bala, que talvez viesse para ela, atingiu seu marido na coluna, causando-lhe graves consequências - o que poderia torná-lo até paralítico, mas não completamente. Entretanto, a bala - segundo o diagnóstico feito pelo médico e entregue pelo Sr. David Washington Castor Furtado para o Senador Aloysio Nunes Ferreira - trouxe-lhe consequências, pois diversos nervos da perna foram atingidos e ele agora precisa de um tratamento fisioterápico de grande complexidade.

            No Pinheirinho e na vizinhança, houve inúmeras pessoas feridas, inclusive uma mulher que levou 12 pontos na boca; um homem de 70 anos, o Sr. Ivo, que, agredido em sua cabeça, está até hoje internado na UTI, segundo testemunho de seus próprios vizinhos, David e Laura, que o viram na hora em que foi agredido. Naquele hospital, o diagnóstico foi de AVC, mas, na verdade, ele teve traumatismo craniano, conforme podem testemunhar as pessoas que o viram ser agredido pelos policiais militares. Houve também outro homem que, conforme mostraram as imagens de TV, foi brutalmente agredido por golpes de cassetetes, centenas não conseguiram se organizar - depois do trauma de fugir da polícia, das bombas e da humilhação - para contratar o carreto, ou não tinham dinheiro na mão para pagar. Entre os que o fizeram, a maioria não pôde retirar tudo o que tinha, mas apenas o que coube em uma Kombi. Temos de lembrar que o terreno só tinha uma entrada, e o trânsito das Kombis e dos caminhões foi limitado, ou melhor, foi caótico. A entrada dos tratores que demoliram todas as construções existentes no Pinheirinho foi uma ação de uma brutalidade atroz - aliás, como demonstrado hoje no DVD, de excelente qualidade, feito por diversas pessoas, como o da Srª Andrea Luswarghi e o da Srª Camila Sampaio e outros. O próprio Senador Pedro Simon disse que o documentário estava de excelente qualidade e que pode até ser apresentado em um desses festivais de documentários, porque foi muito bem feito.

            Ficou ali demonstrada, até no episódio filmado pela TV Record, a brutalidade com que os tratores passaram a destruir aquelas residências, destruindo quaisquer aparelhos, como geladeiras, e outros pertences que estavam nas casas, antes que os seus residentes pudessem ali retirá-los.

            A entrada dos tratores que demoliram todas as construções existentes no Pinheirinho foi uma ação de uma brutalidade atroz. A casa de uma empregada doméstica e depois cozinheira em um restaurante informal e do marido, motorista de ônibus, que possuía geladeira, fogão, TV, computador e tudo o que eles compraram em oito anos por meio de prestações e mais prestações, foi destruída. Quem irá ressarcir essas pessoas?

            No domingo, 22 de janeiro, ao sermos avisados pelo vereador Tonhão Dutra, eu próprio dirigi-me ao Palácio dos Bandeirantes, às 7 horas eu estava ali no portão, para tentar conversar com o Governador Geraldo Alckmin, que me recebeu às 8h30min, enquanto o Deputado Ivan Valente foi para o Pinheirinho, onde testemunhou tais ações violentas. O Governador Geraldo Alckmin transmitiu-me que tudo seria feito com civilidade e respeito àquelas pessoas, mesmo que carentes. Entretanto, os abusos foram extremamente graves.

            Às 23h40min, com precisão, um grupo de policiais da Rota - e quero salientar que, ainda hoje, ouvi do casal David e Maria Laura, que estiveram comigo, que eles viram, na véspera, inúmeras viaturas da Rota, que estavam ali acampadas como que para preparar a ação tão violenta que iria ocorrer no dia seguinte. Eis que, às 23h40min daquele mesmo dia 22 de janeiro, um grupo de policiais da Rota, composto por três viaturas e cerca de dez a doze policiais, efetuou uma diligência no Campo dos Alemães, local contíguo ao Pinheirinho.

            Segundo depoimentos efetuados perante a Promotoria de Justiça, eles entraram numa residência sem mandado judicial, a título de averiguar a existência de drogas e perpetraram uma série de abusos da mais alta gravidade, envolvendo principalmente as moças existentes na casa, que foram vítimas de violências sexuais que aqui não vou historiar, até por serem atos constrangedores e degradantes. Eu já os mencionei na semana passada e hoje, na audiência pública. O Comandante-Geral da PM, Cel. Álvaro Camilo, providenciou que a Corregedoria da PM ouvisse essas moças.

            Mas é muito importante que, de fato, conforme o Governador Geraldo Alckmin mencionou a mim, haja uma apuração rigorosa desses fatos. Ele garantiu mais de uma vez, inclusive pela carta que o Secretário da Casa Civil, Sidney Beraldo colocou aqui, hoje divulgou, enviada à Comissão de Direitos Humanos.

            Algumas jornalistas, dentre as quais Laura Capriglione e Marlene Bérgamo, testemunharam o relato detalhado daquelas moças e acompanharam o Promotor de Justiça, o Delegado da 3ª DP e o perito da Polícia Civil no recolhimento dos objetos comprobatórios das acusações apresentadas contra os policiais.

            É muito importante que os Juízes Márcia Faria Mathey Loureiro, Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, Rodrigo Capez e o Desembargador Ivan Sartori acompanhem de perto a apuração destes lamentáveis episódios para que conheçam melhor as consequências de suas decisões, principalmente a que revogou o ato que suspendia a reintegração de posse do Pinheirinho, no momento em que estava em curso um entendimento dos três níveis de governo no sentido de garantir não apenas a integridade das famílias ali residentes, mas também o respeito à função social da propriedade.

            É fundamental que os três níveis de governo retomem os entendimentos para resolver as carências de moradia e de direitos sociais daquela comunidade, seja com o possível aproveitamento de parte da área do Pinheirinho, conforme estava sendo aventado, seja com a utilização de outra área municipal.

            Esse assunto poderia ter avançado mais na audiência pública marcada para hoje cedo, na CDH, se, sobretudo, tivessem comparecido o Secretário de Habitação do Governo de São Paulo, Silvio Torres, a Secretária de Justiça, Eloisa Arruda, bem como o Prefeito Eduardo Cury, que me telefonou ontem dos Estados Unidos dizendo que não poderia comparecer. Infelizmente também não tivemos a presença dos Juízes Márcia Faria Mathey Loureiro, Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, Rodrigo Capez e do próprio Presidente Ivan Sartori.

            Uma sociedade democrática não pode tolerar que o Poder Público - incluído Judiciário, Executivo e Legislativo - perpetre ações como as ocorridas no Pinheirinho. Lá, não tiraram vida daquelas pessoas, salvo de uma maneira que acabou resultando em óbito, quando uma bomba foi jogada para dentro de um automóvel, e uma mulher que, assustada, ao guiar acabou atropelando uma pessoa e causando óbito. Indiretamente, então, houve uma morte, mas houve diversos feridos, tiraram a dignidade daquelas pessoas jogadas na rua, sem saída.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Além disso, como serão ressarcidas pela perda de suas propriedades? Fogões, geladeiras, mesas com cadeiras na cozinha, sofás, guarda-roupas, as fotos dos filhos que cresceram ali etc. Há que se tomar medidas para a superação da dura realidade que essas pessoas estão enfrentando.

            Sr. Presidente, Senador José Agripino, não se pode simplesmente achar que a Constituição assegura o direito à propriedade privada. Na verdade, assegura o direito à propriedade privada, desde que realizada com função social, aproveitada para a função social. Mas não se pode querer considerar sagrada a propriedade privada daqueles que têm áreas como de 1,3 milhão metros quadrados e, ao mesmo tempo, desrespeitar o direito à propriedade daqueles que têm móveis como sofás, geladeira, aparelhos de televisão ou um animal de estimação que foi morto pela PM.

            Quero aqui dizer, prezado Presidente Waldemir Moka, que hoje houve um momento na audiência pública em que o Senador Aloysio Nunes Ferreira observou que se estava utilizando a audiência pública para o propósito de simplesmente estar-se fazendo campanha para o PT e para os partidos envolvidos na solidariedade ao pessoal do Pinheirinho e para criticar o Governo Alckimin, o Governo do PSDB.

            Quero aqui afirmar, sendo eu um Senador do PT, que se houvesse, no governo do Partido dos Trabalhadores, policiais militares ou guardas municipais tivessem realizado ações com tanta arbitrariedade e violência, eu estaria, da mesma maneira, aqui, cumprindo com o meu dever de apurar o desrespeito aos direitos humanos, como ali aconteceu.

            Portanto, quero dizer ao Senador Aloysio Nunes, que colocou no Twitter que o Senador Suplicy começou a fazer campanha para a eleição de 2014: ora, a cada instante, momento, hora, é meu dever, aqui, representar o povo de São Paulo, fiscalizar os atos do Executivo, em nível federal, estadual e municipal, e expressar o sentimento do povo. Quando, neste País e, sobretudo, no meu Estado, direitos humanos são desrespeitados, constitui meu dever como Senador aqui apontar, procurando esclarecimentos.

            Quero dizer algo mais: o Senador Aloysio Nunes Ferreira havia criticado os líderes do movimento do Pinheirinho e hoje, no início da sessão, resolveu fazê-lo, mas eis que, hoje, estava presente o Sr. Valdir Martins de Souza, o Marrom, que, então, esclareceu um pouco da sua vida. Ao final desse esclarecimento...

            Se me permite, Senador Moka, eu lerei rapidamente, aqui, porque é importante, tendo em vista o que o Senador Aloysio Nunes havia falado.

            O SR. PRESIDENTE (Waldemir Moka. Bloco/PMDB - MS) - Eu vou conceder a V. Exª mais três minutos.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - São suficientes.

“Meu nome é Valdir Martins de Souza, o Marrom. Comecei a trabalhar muito cedo, aos 10 anos, como todos os garotos que moram na roça. Aos 13 anos perdi parte de um dedo. Não recebi nenhuma indenização, coisa que é muito comum acontecer com as pessoas que neste país afora trabalham na plantação de ramin, na colheita de arroz, trigo, no corte de cana, do sisal, na quebra de coco de babaçu ou ainda outros tipos de trabalho rural.

Até os 18 anos trabalhei de sol a sol, sem carteira assinada. Comia arroz e feijão com molho de mamão verde ou guisado de banana verde, que é como vivem os trabalhadores no norte paranaense.

Depois vim para São José dos Campos. Hoje tenho 54 anos e trabalho há 36 com carteira assinada. Trabalhei na SP Alpargatas, nos Correios, na Rhodia, na Philips, na construção civil, na Avibras e há 18 anos trabalho na Tecsat.

Há 14 anos a empresa não deposita INSS, nem FGTS, porque ela entrou em recuperação judicial. O Banco do Brasil, como um dos credores, não quis fazer um acordo para pagar os direitos dos ex-funcionários. E até agora nenhum Juiz ordenou à empresa vender seu terreno para pagar os direitos de centenas de ex-funcionários.

Como funcionário da Tecsat me tomei diretor do sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos e Região. Fui proposto como membro da Executiva Nacional da Conlutas como responsável pelo movimento dos sem teto a partir da luta do Pinheirinho, porque sempre gostei do movimento popular. Minhas primeiras experiências nos movimentos sociais se iniciaram nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), no Paraná.

Aí comecei a entender que a saúde, educação e moradia são um direito do povo e responsabilidade do Estado. Já os movimentos sociais, os sindicatos e associações, se querem lutar de verdade pelos direitos dos trabalhadores e do povo, devem ter vida própria, ser independente e se auto-sustentar a partir da contribuição de seus participantes. Por isso sempre defendi que essas organizações não buscassem recursos junto ao Estado ou empresários. Nada de rabo com ninguém.

No Pinheirinho provamos que isso é possível. Ali o povo construiu suas casas com pouco dinheiro. O movimento construiu seu barracão de assembleia e atividades culturais, e também sua sede. Humildes, mas sem superfaturamento.

Em 8 anos praticamente construímos um bairro inteiro, onde apesar de todas as dificuldades, quase não tinha crimes, mesmo pequenos roubos. Não precisávamos de Policia, de Marronzinho ou da Guarda Municipal. Tínhamos uma Coordenação responsável por cada setor do bairro, onde tudo se discutia. Os coordenadores faziam reuniões semanais com os moradores de seu setor. E assim mantínhamos o bairro organizado.

Sem dúvida a experiência do Pinheirinho provocou muito desconforto no Poder Público e nas classes ricas, que sempre marginalizaram o povo pobre e não podiam aceitar o que estava ocorrendo.

O Pinheirinho era um projeto independente do povo pobre que estava dando certo, porque as pessoas estavam recuperando sua dignidade e sua auto-estima. Não foi à toa que o Pinheirinho foi tomado como estudo em diversas teses de mestrado.

Por isso penso que além dos interesses econômicos que levaram à desocupação, havia também razões políticas. Tinha que se impedir a todo o custo que o Pinheirinho fosse um exemplo a ser seguido. Não se podia deixar passar a ideia de que o povo pobre é capaz de se organizar e construir sua própria vida de forma independente, sem depender de favor político.

Isso é o que explica toda uma campanha que foi feita para desmoralizar o bairro, passando a ideia que ali só tinha bandidos e traficantes. Por isso toda tentativa de criminalizar o movimento, de perseguir e a difamar seus dirigentes. Essa campanha é parte de uma campanha maior para desmoralizar a luta do nosso povo. Mas enquanto houver injustiça social, nossa luta continua. Vamos mostrar que temos mais dignidade que essa gente, que apesar de ter mais condições econômicas que o povo do Pinheirinho, não são nenhum exemplo, porque tem as mãos bastante sujas. O episódio da desocupação do Pinheirinho deixa isso bastante claro,

Agradeço o grande apoio que temos recebido dos movimentos sociais, dos artistas, juristas, dos partidos de esquerda e de muitos parlamentares como é o caso do Senador Suplicy.

São José dos Campos, 22/02/2012.

Valdir Martins (Marron)” [Sic]

            Portanto, diante dessa carta e das explicações que deu, felizmente, o Senador Aloysio Nunes Ferreira pediu desculpas pelas suas afirmações e adjetivações em relação ao Sr. Valdir Martins de Souza.

            Por isso, quero agradecer a V. Exª, Senador Waldemir Moka, por ter me concedido o tempo necessário. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/02/2012 - Página 3740