Discurso durante a 16ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Voto de pesar pelos falecimentos de militares brasileiros na Estação Antártica Comandante Ferraz.

Autor
Sergio Souza (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Sergio de Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, FORÇAS ARMADAS.:
  • Voto de pesar pelos falecimentos de militares brasileiros na Estação Antártica Comandante Ferraz.
Aparteantes
Ana Amélia.
Publicação
Publicação no DSF de 28/02/2012 - Página 4040
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • REGISTRO, VOTO DE PESAR, FAMILIA, BRASILEIROS, MORTE, ACIDENTE EM SERVIÇO, INCENDIO, LOCAL, ESTAÇÃO, ANTARTIDA.
  • REGISTRO, HISTORIA, PROGRAMA ANTARTICO BRASILEIRO (PROANTAR), RELAÇÃO, INSTALAÇÃO, ESTAÇÃO, OBJETIVO, PESQUISA CIENTIFICA, CAMADA DE OZONIO, BIODIVERSIDADE, LOCAL, ANTARTIDA.

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, caros telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, funcionários, assessores, é com pesar que subo à tribuna do Senado Federal na tarde de hoje, para me manifestar sobre a tragédia ocorrida no Continente Antártico com a estação brasileira Comandante Ferraz. Inclusive, venho registrar que apresentei requerimento com o intuito de prestar homenagens de pesar pelo falecimento, em ato de bravura, do Suboficial Carlos Alberto Vieira Figueiredo e do Primeiro-Sargento Roberto Lopes dos Santos, falecidos no dia 25 de fevereiro de 2012, quando combatiam um incêndio ocorrido na Estação Antártica Comandante Ferraz.

            Em comunicado, a Marinha informou que o incêndio começou por volta das 2 horas da madrugada do sábado passado, na casa de máquinas do local onde ficam os geradores que fornecem energia à estação.

            Num ato de heroísmo, os dois militares brasileiros morreram justamente no local de maior risco, na tentativa de debelar o incêndio, e não conseguiram.

            Também merece registro e homenagem o brasileiro ferido no episódio, o Sargento da Marinha Luciano Gomes de Medeiros, que sofreu queimaduras nos braços e na mão, também combatendo o incêndio. O Sargento Medeiros felizmente passa bem.

            Esta madrugada, chegou ao Rio de Janeiro o avião da FAB que resgatou todos os demais brasileiros, entre militares e cientistas, que estavam na base do Brasil no continente Antártico.

            A Marinha contabilizou, Sr. Presidente, a destruição de cerca de 70% da Estação Antártica Comandante Ferraz, causando sérios prejuízos à pesquisa científica brasileira naquele continente.

            O Proantar foi criado em janeiro de 1982 e vivia hoje o seu trigésimo ano naquele continente.

            Naquele mesmo ano, a Marinha do Brasil adquiriu o navio polar dinamarquês Thala Dan, apropriado para o trabalho nas regiões polares, recebendo o nome de navio de apoio oceanográfico (NApOc) Barão de Tefé.

            No início de dezembro de 1982, o navio suspendeu, pela primeira vez, a tarefa básica de realizar um reconhecimento hidrográfico, oceanográfico e meteorológico de áreas do setor noroeste da Antártica e de salientar o local onde seria instalada a futura estação brasileira.

            O sucesso da Operação Antártica I resultou no reconhecimento internacional da nossa presença na Antártica, o que permitiu, em 12 de setembro de 1983, a aceitação do Brasil como parte consultiva do Tratado da Antártica.

            Na Operação Antártica II, realizada no verão de 1983 para 1984, as principais tarefas foram o transporte, a escolha de local e a implantação da estação brasileira. Em 06 de fevereiro de 1984, foi instalada a Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF), na Península Keller, Baía do Almirantado, Ilha Rei George, Ilhas Shetlands do Sul. A primeira equipe, composta de 12 homens, guarneceu os 8 módulos da EACF, durante 32 dias, no período de verão, deixando-a desativada até o início da próxima Operação.

            A EACF foi ampliada, passando para 33 módulos no ano seguinte. O evento de maior importância veio a ocorrer em 1986, na Operação Antártica IV, com o início da ocupação permanente da Estação durante os 365 dias do ano, representando o ápice de um esforço contínuo e progressivo, desenvolvido desde o início das atividades.

            A estação dispunha de todas as instalações necessárias como se fosse uma pequena cidade. O total atual de módulos era de 62 unidades. Recentemente, passou a fazer parte da EACF um heliponto, construído de acordo com as normas internacionais.

            Até 2004, a composição modular chegou a 60 habitáculos com capacidade de viverem confortavelmente 48 pessoas, parecendo uma pequena vila em meio ao gelo antártico. A estrutura era composta por depósitos, oficinas, biblioteca, salas de lazer e estar, enfermaria, sala de comunicações, ginásio de esportes, cozinha e refeitório.

            O Ministro da Defesa, Celso Amorim, disse que o planejamento da nova estação Antártica, na Ilha Rei George, deve começar já a partir desta segunda-feira, e a base deve ser totalmente refeita em dois anos. Segundo o Ministro, a nova base terá uma arquitetura nova, mais "completa e orgânica".

            Há urgência no levantamento dos estragos na estrutura física dos equipamentos de medição científica, bem como na elaboração do inventário das informações científicas consumidas pelo fogo. Segundo a Marinha, o prédio principal, onde ficava a parte habitável e alguns laboratórios da estação, foi totalmente destruído.

            O programa antártico é estratégico para o País. Então, não pode parar, obviamente. Temos que fazer esse inventário nas próximas semanas. Há equipamentos que fazem medições permanentes e tiveram que parar, a exemplo das medições do oceano e da atmosfera.

            E aqui, Sr. Presidente, quero registrar que o sul de nosso País tem o seu clima definido pelo clima polar antártico, e nós temos muitos dados que são voltados principalmente à produção rural de nosso País. Conhecer um pouco da meteorologia e das frentes frias que vêm daquele continente é importante para a produção rural de nosso País.

            Segundo a Marinha, o prédio principal, onde ficava a parte habitável e alguns laboratórios da estação, foi totalmente destruído. O Programa Antártico é estratégico para o País - como eu havia dito.

            A Marinha informou que os refúgios (módulos isolados para casos de emergência), os laboratórios (de meteorologia, de química e de estudo da alta atmosfera), os tanques de combustível e o heliponto, estruturas isoladas do prédio principal, resistiram ao incêndio.

            O processo de reconstrução para voltar ao nível em que estava demorará de dois a três anos. A logística é muito difícil e só é possível construir durante o verão antártico. E o inverno já está chegando. É fundamental empenharmos todos os esforços necessários para reconstruir a estação e retomar, o quanto antes, as pesquisas lá desenvolvidas. Aliás, com atenção redobrada, de forma distinta do que ocorreu em 2011, quando o Proantar teve apenas metade de seu orçamento efetivamente gasto.

            Segundo dados do próprio Senado Federal, o orçamento do Proantar tinha recursos na ordem de R$18,3 milhões, mas apenas R$9,2 milhões foram pagos, o menor montante desde 2005. Em 2010, o orçamento previsto foi da mesma ordem, mas a execução chegou a 86%. Ou seja, o Governo gastou R$15,8 milhões do valor inicialmente previsto naquele ano. Esses dados incluem recursos aplicados no programa pelos Ministérios da Ciência e Tecnologia e da Defesa. No ano passado, os Ministérios chegaram a empenhar R$14 milhões dos recursos previstos. A medida é utilizada para permitir a inclusão do que não foi efetivamente pago em restos a pagar no ano seguinte.

            A evolução orçamentária do Proantar mostra que, desde 2002, o programa começou a ser turbinado com a ampliação, ano a ano, do seu orçamento e também dos valores efetivamente pagos, mesmo sem considerar os restos a pagar. Em 2008, os gastos chegaram a superar o valor inicial previsto no Orçamento da União. No ano seguinte, foi registrada a mais baixa execução, com apenas 36,6% pagos. Mas, naquele ano, o orçamento previsto era o mais alto já registrado no programa: cerca de R$27,4 milhões.

            Entre os pesquisadores do Programa Antártico, o represamento dos investimentos científicos nos últimos dois anos é nítido. De acordo com integrantes do grupo, o orçamento, só em pesquisa, caiu de R$15 milhões, em 2009, para R$1,9 milhão, em 2011. Os cientistas sustentam que poderá ocorrer atraso em pesquisas a partir de 2013, caso o orçamento científico não seja reformado.

            Como presidente da Comissão de Mudanças Climáticas, fui convidado para conhecer, em parte, o Proantar e posso afirmar que a destruição da Estação Antártica Comandante Ferraz ameaça o futuro de um dos mais bem-sucedidos e estratégicos programas de pesquisas do Brasil.

            A Antártica ocupa hoje um lugar de destaque em discussões sobre o clima e as riquezas naturais do mundo. Antes colocado de lado nessas discussões, o Brasil ganhou voz no Tratado Antártico por conta da estação, e havia se firmado, nos últimos anos, na primeira linha das pesquisas sobre a região. Especialistas estimam que os estudos na estação ficarão suspensos por pelo menos um ano, Sr. Presidente.

            O Brasil faz ciência de ponta na Antártica. São estudos com implicações importantes sobre o clima no Brasil, recursos pesqueiros e biodiversidade.

            Além da perda de equipamentos importantes e caros - um único aparelho perdido está avaliado em US$120 mil - e de todos os dados coletados na temporada de pesquisa de 2012, que começou em dezembro e terminaria em março, o incêndio deixa sem base fixa todas as dezenas de grupos de estudo com trabalhos no continente Antártico. Até a definição de como será a reconstrução da estação, as pesquisas estão, em sua maioria, paralisadas ou dependerão da colaboração de parceiros estrangeiros.

            Perdemos a base de apoio da ciência do Brasil na Antártica. É uma catástrofe para várias pesquisas.

            Estima-se que de 35% a 40% dos trabalhos vão parar.

            O continente é fundamental para a regulação do clima e da circulação oceânica na América do Sul. É o grande refrigerador do mundo, que controla ciclos da vida e morte nos mares do mundo. A estação tinha uma importante linha de estudos de meteorologia. De lá, saíam dados importantes para a previsão de frentes frias no País, por exemplo, a que nós estamos acostumados a ver nas meteorologias apresentadas pelos canais de televisão e também pelos jornais de todo o Brasil.

            Nossas pesquisas têm impacto mundial, somos consultados nos grandes projetos, Sr. Presidente.

            A Antártica parece ser também especialmente vulnerável a mudanças climáticas, em especial a Península Antártica, onde fica a estação brasileira, hoje queimada.

            O Brasil também mantinha linhas de estudos importantes sobre o tema. Uma delas investiga a retração das geleiras locais e seu impacto no clima global. Outra analisa a diminuição do gelo marinho na mesma região. Menos gelo significa menos krill, o minúsculo crustáceo do qual se alimentam as baleias azuis (os maiores animais da Terra) e uma multidão de outras espécies marinhas.

            Entre outros estudos importantes, está um trabalho sobre o impacto da radiação ultravioleta desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). As regiões polares, devido ao buraco na camada de ozônio e por suas próprias condições geográficas, são especialmente vulneráveis à radiação solar ultravioleta. Porém, espécies de organismos antárticos resistem melhor aos efeitos nocivos dos raios UV. E são fonte em potencial para protetores solares mais eficientes. Também há pesquisas sobre substâncias anticongelantes encontradas em peixes e outros organismos que vivem na água gelada da Antártica.

            Do ponto de vista estratégico, a presença do Brasil na Antártica também é fundamental, analisam os especialistas. Somente quem tem estação e desenvolve pesquisas no continente tem direito a voto no Tratado Antártico - responsável por gerenciar toda a área do continente e do oceano austral, que correspondem a 10% da área total do planeta.

            Se o Brasil não tiver pesquisas lá, deixa de ter o direito de decidir o futuro de 10% do planeta em termos de pesquisa científica.

            O Tratado Antártico proíbe ainda qualquer atividade de exploração mineral no continente até 2047, mas, depois disso, são os membros do Acordo que decidirão o que pode acontecer naquele continente.

            A presença brasileira é importante porque todos os países significativos têm estações por lá. É um posicionamento em relação ao futuro do território global e um grande exemplo de sucesso da comunidade internacional em governança.

            É fundamental que todos nos juntemos nesse esforço de reconstrução da Estação Antártica Comandante Ferraz e da retomada do Programa Antártico Brasileiro, Proantar.

            Até em homenagem aos dois militares brasileiros, Carlos Alberto Vieira Figueiredo e Roberto Lopes dos Santos, que deram suas vidas para defender a Estação Comandante Ferraz.

            Para finalizar, Sr. Presidente, quero dizer que tive oportunidade de visitar aquele continente no ano passado, mas não tive oportunidade, Senadora Ana Amélia, de conhecer a Estação Comandante Ferraz, porque no momento em que fui até aquele continente era inverno e os navios brasileiros que dão suporte para o transporte da estação chilena até a estação brasileira estavam em missão no Rio de Janeiro, aguardando a abertura do novo ano antártico.

            Mas eu pude conhecer muito o Programa Antártico Brasileiro. E olha, tenho um orgulho danado de perceber que o Brasil se preocupa com todo o planeta e que tomou também uma posição como líder sul-americano, líder mundial no que diz respeito à preocupação com as pesquisas.

            Com muito honra, concedo um aparte à Senadora Ana Amélia.

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS) - Caro Senador Sérgio Souza, a sessão não deliberativa, da tarde de hoje, foi praticamente, na sua maior parte, dedicada a abordar esse gravíssimo acidente que aconteceu na nossa base da Antártica; isso convenceu e isso comoveu a todos os brasileiros, não só pelo problema, a morte de dois militares no cumprimento estrito do seu dever, verdadeiros heróis, com coragem, com destemor para apagar um incêndio, o que não conseguiram. E deixaram a sua vida ali. E nós, pela relevância desse episódio, acabamos deixando em segundo plano uma tragédia gravíssima que aconteceu de novo na Capital da República, que foi o assassinato, por um grupo de jovens, que colocaram combustível no corpo, de dois moradores de rua. Um de 26 anos apenas, José Edson Nicolas de Freitas, e outro que está correndo sério risco de vida no Hospital Regional da Asa Norte, Paulo César Maia, de 43 anos. Isso lembra muito bem, Senador Sérgio Souza, o que aconteceu no dia 20 de abril de 1987, quando cinco rapazes de classe média, aqui em Brasília, colocaram também combustível sobre o corpo do índio Galdino Jesus dos Santos, na 703 Sul, em pleno coração da Capital Federal. A situação é complicada, porque 22% do corpo do Paulo César Maia, que está hospitalizado, sofreram queimaduras de segundo e terceiro graus. Esse episódio é gravíssimo. Nós temos aqui, nesta Casa, de alertar para impedir novas atitudes de barbarismo, de covardia sobre pessoas indefesas, porque são moradores de rua. Isso aconteceu na cidade de Santa Maria, na Quadra Residencial 118. Eu queria aproveitar o pronunciamento de V. Exª, apoiando integralmente todo o seu pronunciamento sobre o que aconteceu na Antártica com a base brasileira de pesquisa, e a morte de dois militares, para registrar esse fato, de todo lamentável, com esse bárbaro crime que temos de condenar. E temos de aplicar nos responsáveis as penas justas e merecidas. Obrigada.

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR) - Obrigado, Senadora Ana Amélia, eu me somo a preocupação de V. Exª. Não sei o que cidadãos como esses pensam, qual é a mentalidade deles, o que os leva a cometer atos tão bárbaros como esse. Chego a pensar se realmente não precisamos promover uma profunda reforma na formação moral, ética e até mesmo social e política do cidadão.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/02/2012 - Página 4040