Discurso durante a 23ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca dos dados divulgados no relatório elaborado pelo Banco Internacional de Desenvolvimento.

Autor
Marta Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Marta Teresa Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • Comentários acerca dos dados divulgados no relatório elaborado pelo Banco Internacional de Desenvolvimento.
Publicação
Publicação no DSF de 07/03/2012 - Página 5057
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, RELATORIO, BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO (BID), ASSUNTO, EVOLUÇÃO, PAPEL, MULHER, SOCIEDADE, REGISTRO, NECESSIDADE, MELHORAMENTO, POLITICAS PUBLICAS, OBJETIVO, REDUÇÃO, CRIME CONTRA A LIBERDADE SEXUAL, VIOLENCIA, AMBITO, DOMICILIO, AUMENTO, LIBERDADE, IGUALDADE, SEXO, MERCADO DE TRABALHO, PAIS.

            A SRª MARTA SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caros Senadores, caras Senadoras, ouvintes da TV Senado e da Rádio Senado, hoje será lançado aqui, no Congresso Nacional, o relatório do BID, um relatório sobre igualdade de gênero e desenvolvimento que o Banco Mundial acabou de apresentar.

            Esse relatório é extremamente importante porque faz um diagnóstico, uma análise da situação das mulheres no mundo, dá encaminhamentos, adverte e analisa as dificuldades de diferentes países. E coloca, principalmente, para a importância do desenvolvimento econômico, um papel de igualdade para a mulher e a diferença que a mulher faz para uma nação quando ela está inserida na produtividade daquela nação.

            Quando li os primeiros esboços que chegaram, o que mais me impressionou foi perceber que pode chegar a 25% a mais a produtividade de um país com a inserção da força de trabalho feminina. Então, realmente, nós estamos deixando escoar pelo ralo uma possibilidade, nós, o Brasil e os países que não têm toda essa força feminina ainda integrada na produção.

            Mas o que também anima, no relatório, é que as coisas estão mudando, os países estão melhorando, a situação da mulher está melhorando. Claro, muito longe ainda do ideal, mas a expectativa de vida da mulher aumentou 20 anos, desde 1960.

            E na questão do trabalho, nós aqui na América Latina nos destacamos, pois foi a região em que a mulher melhorou mais no mundo. A inserção de mulheres no mercado de trabalho brasileiro cresceu 22%, para se ter uma ideia, em relação aos países vizinhos nossos, que cresceram 16%. Mas nós ainda ganhamos muito menos. Para cada R$1,00 que o homem ganha a mulher ganha R$0,73, para executar exatamente a mesma função. Nesse ponto, nós só estamos abaixo do México. Trata-se de um problema de desenvolvimento, mas principalmente - hoje tem-se a clareza - de um problema cultural..

            O relatório do Bird também traz à tona dados fortíssimos em relação à violência doméstica. Não é à toa que estamos agora com essa investigação no Congresso Nacional sobre a violência doméstica. Em São Paulo, que é o meu Estado, 27% das mulheres já tiveram algum episódio de violência doméstica, o que equivale - olhem o número! - a 1,6 milhão de mulheres vítimas de maus tratos dentro de suas casas. Violência doméstica, ninguém está falando de violência na rua, é violência dentro da casa daquela mulher. É um dado muito assustador.

            O relatório que o Bird lança hoje no Brasil foi divulgado pela primeira vez em outubro passado, recentemente, em Washington. E o Brasil é um dos países em destaque do relatório. Por isso foi escolhido o Brasil para o lançamento, o primeiro país fora dos EUA. O Brasil é citado 40 vezes, sendo que 10 vezes de forma negativa. Mas é citado principalmente pelo bom exemplo de iniciativas ou pelo apoio à redução da desigualdade entre os gêneros.

            O Brasil é o país em que o Bird tem mais investimento direto em projetos para a diminuição da desigualdade de gênero: mais de US$1 bilhão investidos e voltados principalmente para a implantação de políticas públicas nos Estados, em especial na região Nordeste.

            O exemplo brasileiro no relatório é citado para alertar para o perigo das generalizações nas análises. A situação das mulheres não é homogênea. Nós aqui temos uma mulher presidenta. Bom, a mulher chegou lá, mas aí se você for ver a situação do emprego doméstico para as mulheres, das empregadas domésticas, o Brasil é um dos países mais atrasados. Então, é muito heterogêneo, o que torna também difícil a luta, o diagnóstico e tudo mais.

            Outro ponto que chamou a atenção - e esse eu tenho percebido com clareza, estudando o desenvolvimento das nações onde a mulher adquiriu um protagonismo maior -, pois é algo que nós, mulheres, sempre achamos que faria uma diferença incrível, que é o nível de escolaridade que poderia mudar a situação da mulher. Mas o que nós vimos é que, mesmo nos países onde a escolaridade da mulher até, às vezes, é maior que a do homem, não tem tido um efeito tão bom assim como imaginávamos, porque a diferença de salário até aumenta. Quanto mais alta a escolaridade da mulher em relação à do homem, parece que aumenta. Parece não, os dados mostram isso. Fica mais alta a diferença entre o salário dos dois para o mesmo trabalho.

            Então, esta avenida que é a educação, que sempre acreditamos que seria o caminho, não é, sozinha, o caminho. É evidente que, sem ela, nós não chegamos à esquina, mas só com a educação nós não rompemos as barreiras.

            Isso é até triste, porque seria muito mais fácil investir só numa meta, mas essa é uma das metas em que nós, mulheres - e homens também, não é? -, temos que investir.

            O estudo mostra, também, que isso tem a ver com a responsabilidade familiar. No caso da política, tem a ver com a dificuldade de locomoção em países muito grandes como o nosso. Também tem a ver com a situação cultural, onde a mulher é ainda a responsável pelos filhos. Ela é que tem de levar ao dentista, ao médico, ou, se falta alguma coisa, ela é que tem que tomar providência. Então, tudo isso acaba afetando a questão do trabalho e do emprego e, na política, acho que o preço dessa questão ainda cultural é muitíssimo alto.

            O estudo do BIRD também elogia a decisão de conceder à mulher o dinheiro dos programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, no Brasil. E aí trouxe uma coisa interessante que ninguém tinha pensado - eu, pelo menos, não tinha - e que ocorreu no México. Este tipo de medida de dar o recurso do Bolsa Família para a mulher levou ao aumento da violência doméstica. Eu fiquei pensando: o que é que deve ocorrer? É que a mulher recebe o dinheiro, e o indivíduo quer o dinheiro para usar no que ele bem entender. E aí dá briga. Mas, em geral, tem levado ao aumento do poder de barganha da mulher no lar, favorecendo uma mudança no papel das donas de casa.

            Mesmo que possa ocasionar essa questão da violência doméstica, como foi notado pelos pesquisadores no México, é muito importante que o dinheiro vá para a mão da mulher. Porque, se a mulher tem filho, ela preserva aquele dinheiro para a família. Não há nenhuma dúvida: muitos estudos mostram isso. Se, por acaso, pode render briga, que renda briga. Isso vai ser parte dessa mudança que estamos hoje vendo.

            Para o Bird, o Brasil é um exemplo para outros países em desenvolvimento. Isso nos deixou a todas bastante orgulhosas pela questão de gênero. Isso pode ter um efeito multiplicador para o resto do mundo. E a nossa bandeira é a Lei Maria da Penha, que foi reconhecida, recentemente, pelo Supremo Tribunal Federal; é um marco de reconhecimento do trabalho que o Brasil vem fazendo nas últimas décadas pelos direitos das mulheres. A Lei Maria da Penha foi promulgada no Governo Lula e, agora, na gestão da Presidenta Dilma foi ao Supremo, porque havia juízes que não estavam respeitando a lei, usavam a própria cabeça para tentar mudar a lei e continuar dando cesta básica para quem bate em mulher. Agora, o Supremo colocou, definitivamente, uma pedra sobre esse tipo de interpretação, e foi bastante importante.

            Estamos comemorando, esta semana, os 80 anos do direito da mulher ao voto, e acho que não há motivo melhor para comemorar esses 80 anos do que termos uma mulher na Presidência do Brasil.

            Então, todas essas questões fizeram com que o Bird escolhesse o Brasil para o lançamento desse trabalho que é extremamente importante e vai apontar direções, também, para o nosso Governo e para outros países. Porque, hoje, todos têm interesse na questão da mulher em virtude da sua posição, para o País, para a Nação ter um crescimento mais igualitário.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/03/2012 - Página 5057