Discurso durante a 25ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem pelo transcurso, hoje, do Dia Internacional da Mulher; e outro assunto.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Homenagem pelo transcurso, hoje, do Dia Internacional da Mulher; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 09/03/2012 - Página 5384
Assunto
Outros > HOMENAGEM. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, DIA INTERNACIONAL, MULHER, CRITICA, ORADOR, RELAÇÃO, EXCESSO, VIOLENCIA, FEMINISMO.
  • CONGRATULAÇÕES, ORADOR, RELAÇÃO, DISCURSO, JOSE SARNEY, SENADOR, ESTADO DO AMAPA (AP), ASSUNTO, EXCESSO, HOMICIDIO, PAIS, SUGESTÃO, PROPOSIÇÃO, ALTERAÇÃO, CODIGO PENAL, OBJETIVO, AMPLIAÇÃO, PUNIÇÃO, CRIME, FATO, NECESSIDADE, MELHORIA, SEGURANÇA PUBLICA.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, creio que o Dia Internacional da Mulher tem que ser um dia comemorado pelas conquistas ao longo dos anos, as quais ninguém pode negar, tem que ser um dia de agradecimento de todos nós pelo papel dessas mulheres não só na vida de cada um de nós, desde nossas mães, mas também pelo reconhecimento do que elas fazem pelo nosso País, mas deve ser também um momento de reflexão, porque, da mesma forma que todos os outros setores da sociedade, as mulheres são divididas em dois grupos: aquelas que fazem parte do bloco da modernidade e aquelas que fazem parte do bloco da exclusão social. Isso acontece também com os negros, com os brancos, com todos os grupos sociais.

            Este é um país dividido. Este é um país dividido entre alguns que participam da modernidade, que têm acesso à educação, que tem acesso à saúde, que têm um salário digno, e aqueles do mesmo bloco social, como as mulheres, que não têm um sistema de saúde, que não têm um sistema educacional, que não têm renda, que não têm emprego.

            E entre esses dois grupos, quero citar aqui e quase que fazer o centro desta minha fala o discurso de ontem, aqui, nesta mesma tribuna, do Senador Sarney. Ele fez um discurso que, sinceramente, nestes anos aqui, é um dos mais fortes que ouvi, um desses discursos históricos que acontecem raras vezes aqui dentro sobre o tema da violência.

            Eu começo pelo lado das mulheres. Segundo o mapa da violência que ele citou, produzido por uma entidade chamada Sangari, mais de 4.200 mulheres foram vítimas de homicídios em 2010. Em um ano! Quando ele começou a frase, dizendo que 4.200 mulheres foram vítimas de homicídios, antes de dizer o ano, eu imaginei que fosse num período de uma década, de duas décadas, de três décadas. Não, foi num período de um ano, o que dá, na média, mais de seis por dia. É mais que o número de soldados mortos nas últimas guerras por cada dia, Senador Eurípedes. Essa é a realidade que temos no Brasil no que se refere aos homicídios contra as mulheres. Mas esse é apenas um lado da violência brasileira.

            Eu uso aqui diretamente o discurso do Presidente Sarney, que eu acho que tem de ser repetido, discutido, debatido, criado um grupo para se debruçar sobre isso. Ele diz, citando o Instituto Sangari, que elaborou o mapa da violência no Brasil, que, em 30 anos, foram assassinadas em nosso País... Pasmem, porque eu fiquei pasmo quando ouvi, por mais que seja uma pessoa envolvida e informada; a gente não vai somando: em 30 anos, foram assassinadas no Brasil 1 milhão e 90 mil pessoas! Só em 2010, foram 50 mil. Não há guerras como essa desde a 2º Guerra Mundial. Se tomarmos os soldados do lado americano na Guerra do Vietnã, eu creio que foram em torno de 50 mil, ao longo de todos os 10, 12, 15 anos de guerra. Aqui, é em um ano!

            Nós vivemos numa sociedade - muitos têm dito aqui, mas nenhum falou com os detalhamentos e com a força do Presidente Sarney - com uma guerra civil. E nós não estamos sabendo como enfrentá-la, porque, mais uma vez, estamos fazendo as escolhas erradas, como o País sempre fez. Quando começou a nossa colonização, em vez de se basear em pequenas propriedades, nós preferimos trazer escravos e produzir açúcar para exportar em grandes latifúndios. Foi uma escolha errada. Quando nós, recentemente, decidimos nos industrializar, fizemos a opção errada: a industrialização baseada no automóvel. Abandonamos as ferrovias, as hidrovias e construímos rodovias, que têm um custo muito mais elevado do ponto de vista ecológico que os outros. Nós estamos sempre fazendo opções erradas para cuidar das pequenas coisas ao invés de fazer a opção correta para cuidar das grandes coisas.

            Nos últimos anos, nós demos importância ao ensino superior e abandonamos a educação de base. O jornal de hoje mostra que, em São Paulo, 53% das crianças que terminam o ensino médio não sabem o mínimo que deveriam saber de matemática. Quero repetir: são 53% dos que terminam o ensino médio, mas lembro que 64% da totalidade não chegam ao final, têm nota zero, e os outros têm nota dois. A nota, então, deve ser um. E nós estamos resolvendo o problema criando mais vagas nas universidades, em vez de atacarmos o problema da educação de base.

            E a violência? Como estamos enfrentando o problema da violência? Colocando transmissores de vídeo para depois identificar o assassino; cercando as casas em condomínios, aprisionando até os que estão dentro; usando o shopping center porque não podemos caminhar nas ruas; comprando carros blindados. É o caminho errado, embora necessário para o presente.

            Por que a gente não pensa uma proposta mais ampla para evitar essa tragédia que o Senador Sarney falou ontem, lembrando que os brasileiros mortos no Paraguai foram 100 mil; na Cabanagem, outra guerra interna, 40 mil; na tragédia de Canudos, essa guerra, essa tragédia do imaginário brasileiro, 5 mil; na do Contestado, 5 mil; na Farroupilha, 3,4 mil? E aí vai.

            Se nós somarmos todos os mortos nas revoluções brasileiras, não dá uma pequena parcela dos mortos por homicídios dos últimos anos. Se somarmos 62 conflitos armados no mundo inteiro entre 2004 a 2007, nossos mortos estão na frente dos mortos dos outros conflitos. E se tomarmos só o ano de 2009, nós estaremos em primeiro lugar.

            Ele mostrou um dado ontem que deveria estar em todas as manchetes: o Brasil tem 3% da população mundial e 12% dos homicídios no mundo. Esse é um dado que deve chocar muito mais do que o PIB ter crescido apenas 2,4 ou 2,1%. É muito mais grave nós sermos o terceiro país do mundo em população, 3% da população do mundo, e termos 12%, quatro vezes mais do que a média. Isso a gente ouve e amanhã esquece. Por isso eu fiz questão de vir aqui repetir essa parte do discurso de ontem do Senador Sarney.

            Mas ele não ficou apenas na denúncia de tudo isso que acontece com a violência. Ele fez suas propostas.

            Ele fez a proposta, por exemplo, de acabar com o direito de o homicida ser julgado livre, que não faz sentido. E lembrou que isso foi consequência de uma lei durante a ditadura militar, em que um dos delegados criminosos, torturadores cometeu um crime, foi condenado, e fizeram uma lei para que ele não ficasse preso. Mas, para que a lei valesse, tiveram que espalhar para todos.

            Não é possível continuar soltando da maneira que nós soltamos aqueles que são presos por homicídio, não aqueles suspeitos de homicídio, mas os presos, aqueles que não são suspeitos, aqueles que realmente cometeram o crime, que confessam o assassinato, e que são soltos.

            Ele lembrou bem que temos uma lista imensa de crimes hediondos. O homicídio não é crime hediondo no Brasil.

            Ele apresentou uma lista de mudanças que podemos fazer, que considero fundamental. E mudanças concretas. Não aquela que eu acho que vai ser a grande solução, que é uma revolução educacional no Brasil que não apenas dê igualdade para nenhum terminar caindo na bandidagem por falta de oportunidade, mas também para passar um sentimento de paz para a consciência das nossas crianças. Ele trouxe as medidas concretas.

            Sugiro, Presidente Moka, que o discurso de ontem, do Senador Sarney, não passe em branco, que nós criemos uma comissão especial para trabalhar aquele discurso e as propostas que ele fez, que surjam novas propostas de cada um de nós e que juntos não escondamos a realidade. Enfrentemos, Senador Paim, a tragédia que é muito maior do que a falta de energia com a qual alguns estão preocupados, que é muito pior do que o pequeno crescimento que estamos tendo, que é pior até hoje do que a desgraçada situação da educação brasileira; é a vergonha de uma guerra civil não declarada que está fazendo mais mortos, no Brasil, de inocentes, crianças, mulheres do que está acontecendo nas outras guerras onde, além de o número ser menor, muitos que morrem são soldados, guerrilheiros que estão diante da luta, não são aqueles inocentes que nós vemos na guerra civil brasileira.

            Sugiro, e vou formalizar isso, que nós trabalhemos de uma maneira sistemática em como enfrentar...

(Interrupção do som.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Como enfrentar sistematicamente, com a responsabilidade que nos cabe, a guerra civil em que vivemos, por causa da desigualdade, por uma degradação moral, mas também, como disse o Presidente Sarney aqui, por falta de medidas claras que punam os que cometem esses crimes.

            Era isso, Sr. Presidente, que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/03/2012 - Página 5384