Discurso durante a 25ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com a decisão do Supremo Tribunal Federal de considerar inconstitucional a criação do Instituto Chico Mendes por Medida Provisória; e outro assunto.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEDIDA PROVISORIA (MPV).:
  • Indignação com a decisão do Supremo Tribunal Federal de considerar inconstitucional a criação do Instituto Chico Mendes por Medida Provisória; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 09/03/2012 - Página 5402
Assunto
Outros > MEDIDA PROVISORIA (MPV).
Indexação
  • CRITICA, ORADOR, RELAÇÃO, ERRO, UTILIZAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), MOTIVO, INSERÇÃO, DIVERSIDADE, MATERIA, FALSIDADE, URGENCIA, ASSUNTO.
  • CRITICA, ORADOR, RELAÇÃO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, DECLARAÇÃO, INCONSTITUCIONALIDADE, CRIAÇÃO, INSTITUTO CHICO MENDES, MOTIVO, ERRO, VOTAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).

            O SR. PEDRO SIMON (Bloco/PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na verdade, estamos vivendo uma fase em que nada mais nos surpreende. Tudo que se fizer no Congresso, na política brasileira, é um fato a mais, mas, cá entre nós, a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a Instituição Chico Mendes é algo que beira o absurdo. O Supremo mantém o Instituto Chico Mendes, mas dá o prazo de dois anos para o Congresso editar nova lei sobre a autarquia. Essa é uma figura que eu não conhecia. Sei que o Supremo pode determinar que uma lei é inconstitucional. Vem a declaração de que a lei é inconstitucional, e temos de acatá-la. Mas a lei não é inconstitucional, e se dá o prazo de dois anos! E há mais: o Supremo põe 466 leis no limbo. Essas 466 leis vieram de medidas provisórias.

            Agora, estou me sentindo minoria. Há dois Senadores do Amapá, e eu estou sozinho aqui. V. Exª e o Presidente, não me abandonem! Fiquem aí pelo menos, senão o Amapá toma conta; daqui a pouco, chegará aqui o Sarney, e não sei o que acontecerá.

            Quatrocentos e sessenta e seis leis estão no limbo. O que quer dizer isso? Essas leis, oriundas de medidas provisórias, segundo o Supremo, foram votadas de maneira irregular pelo Congresso Nacional. O Supremo pode mandar parar amanhã, pode mandar suspender essas 466 leis amanhã. Então, o Governo está dando prazo para a gente regulamentar essa matéria também.

            Vou ser sincero. Duvido que haja algum país no mundo com matérias iguais a essa. Há ditadura em que o ditador faz o que quer, mas há também essa mentirinha de democracia, como nós vivemos. Como pode acontecer o que está acontecendo? Fingimos que votamos, e o Supremo finge que faz justiça. Mas a Justiça diz que, por dois anos, vale, mas que, depois de dois anos, isso será suspenso.

            Quatrocentas e sessenta e seis leis estão no limbo. “Elas podem cair a qualquer momento! Virem-se aí, porque, a qualquer hora, nós vamos falar!” Não é assim!

            A verdade é que, primeiro, a medida provisória é uma vigarice. Ela veio no bojo do parlamentarismo. Na Assembleia Nacional Constituinte, a comissão sistemática criou o parlamentarismo, e faz parte da essência do parlamentarismo a medida provisória, que existe na Inglaterra, na Itália, na França e na Espanha. É que, com a medida provisória no parlamentarismo, o Governo manda. Se cai a medida provisória, cai o gabinete. Então, a coisa mais rara que existe é uma medida provisória no parlamentarismo, porque o Primeiro-Ministro não vai arriscar seu governo com uma determinada medida. Quando há medida provisória é porque ela é urgente urgentíssima, e o Governo sabe que vai ser aprovada. Não há como não aprová-la. No Brasil, caiu o parlamentarismo, e ficou a medida provisória.

            Eu era Governador do Rio Grande - eu não estava aqui, no Congresso -, vim aqui e briguei com o Jobim e com o Covas, dizendo uma coisa. Quando caiu o parlamentarismo no plenário, quando o parlamentarismo foi derrotado, a medida provisória poderia ser retirada por emenda de redação. Nem precisava ser votada! A emenda de redação podia retirar a medida provisória. Caiu o parlamentarismo, caiu a medida provisória. Mas a adotaram, e ela está lá até hoje. E, hoje, virou regra. No Congresso, como a gente sabe, a gente vota duas coisas: o que o Governo quer e o que nada vale.

            Fui Relator de um projeto que é até meio assim. Os senhores sabiam que, no Senado, existe um museu? Há gente que não sabe disso. No Senado, há um museu, que, agora, levou o nome de Itamar Franco. Essa medida foi votada na Comissão - fui o Relator - e vai ser votada em plenário. Isso a gente vota.

            Votamos, na Comissão de Educação, três projetos. Um deles dá o nome de não sei quem a uma rodoviária; nós o votamos, e ele vem para o plenário. Outro dá nome a uma escola federal, que fica não sei onde, com nome de não sei o quê; este vem para o plenário. Isso é o que nós votamos. O resto é o que o Governo quer, ou, então, é medida provisória. E é medida provisória como a última que nós votamos.

            A norma é a de que uma medida provisória trate de uma matéria determinada. Se é urgente, importante e necessário, vamos tratar nessa medida provisória dessa matéria. No Brasil, uma medida provisória tem quatro páginas e trata de 30 a 40 assuntos ao mesmo tempo. A que votamos aqui tratava da Marinha Mercante, da criação do museu, de uma estrada, de um fundo de pensão, ou seja, assuntos que nada tinham a ver um com o outro colocamos na mesma medida provisória.

            O negócio é meio diabólico. Diz-se que Deus faz a panela e que o diabo faz a tampa, ou coisa parecida. No Congresso, aconteceu isso. Veio a medida provisória, e a gente se adaptou. Na Câmara, os Parlamentares já descobriram que, para fazer passar um projeto ou uma ideia, nada melhor do que colocar de contrabando o assunto numa medida provisória. Então, meta-o ali de contrabando! Se há não sei quantos assuntos, coloca-se mais um, mais um, mais um. E, no meio, é dito “mas também”, e vai o contrabando que interessa ao Deputado. O assunto vem no meio da medida, não se lê, e não se sabe o que aconteceu.

            Então, hoje, nós votamos aqui. O Congresso já votou, justiça seja feita, o Senado já votou. E a iniciativa é do Presidente Sarney. Parece mentira, mas a iniciativa é do Presidente Sarney. A medida provisória, diz o Presidente Sarney, que nós votamos tem de tratar de um assunto só, e nela não pode haver contrabando. Câmara e Senado não podem colocar ali emendas que nada têm a ver com a matéria. Isso não pode acontecer. O Senado votou por unanimidade, e a matéria está na gaveta da Câmara.

            Então, vem a medida provisória do Governo, que chega à Câmara. Cada Deputado apresenta uma emenda aqui e ali, compõe a medida, e vem a votação.

            Mas o que é mais grave? O que motivou a decisão do Supremo? A determinação de que, para analisar as medidas provisórias, seja designada uma comissão especial. Essa comissão especial mista se instala e dá o parecer. Para analisar todas essas medidas provisórias, não há comissão especial; não se instalou comissão especial. Não se instala a comissão especial. Alguém, um parlamentar dá o parecer, e a matéria vai diretamente para o plenário. É assim que é feito.

            O projeto do Senador Sarney que votamos é importante, pois diz que a medida provisória pode contemplar somente uma matéria.

            Então, não se constitui uma comissão. A medida vai para a Comissão permanente a que ela diz respeito. Se a matéria trata de educação, ela vai para a Comissão de Educação; se trata de finanças, vai para a Comissão de Finanças; se trata de questão institucional, vai para a Comissão de Constituição e Justiça, e se resolve essa questão.

            Esses 400 projetos que são aprovados pelo Plenário sem passar por comissão, sem estudo, sem análise, sem conteúdo técnico, terminam. Se sai uma medida provisória, tem de se esperar que o Presidente nomeie a comissão. Aí a comissão tem de se reunir e escolher um presidente e um relator, tem de marcar data para a reunião e mais não sei o quê. Isso leva tempo. E passa o tempo, e nada acontece.

            O projeto do Sarney que nós aprovamos não é isso. Se para cá veio uma medida provisória que trata de educação, ela vai para a Comissão de Educação no dia seguinte. Chegou aqui? Vai para a Comissão! É designado um relator na Comissão, esta dá o parecer, e a matéria vai para o plenário. Está parada na Comissão na Câmara dos Deputados, e estamos nessa situação.

            Tenho um projeto extinguindo a medida provisória. Acho que a medida provisória é absolutamente desnecessária. Concordo que o Governo tem de ter meios absolutamente necessários para a matéria ter urgência para ser votada. Há assuntos que são da maior gravidade, com os quais não podemos brincar. Engavetar, não deixar votar, não sei o quê? Não! É matéria que tem de ser votada. Nós vamos ter de estudar isso.

            Hoje, existe a tal da votação de urgência, mas, como existe a medida provisória, a urgência não vale dois mil réis. Pedir urgência ou não pedir urgência, ninguém liga para isso, porque a gente sabe que, se é urgente, é feita uma medida provisória. Nada que é urgente é feito sem medida provisória. Então, a urgência, hoje, nada vale. Tínhamos de criar um regime para valer, em que isso acontecesse.

            Duas manchetes dos jornais de ontem e de hoje dizem que 466 leis estão no limbo, estão paradas. O Supremo deu os nomes. Está se na expectativa, deu-se um prazo: ou o Congresso, Senado e a Câmara, resolve, ou podem cair fora as 466 leis.

            A outra questão diz respeito ao Instituto Chico Mendes. Nós temos dois anos para votar de novo, senão fecha o Instituto Chico Mendes.

            Vejo essas decisões com profunda estranheza e, com toda sinceridade, vejo a incompreensão que temos nesta Casa para fazer as reformas que são necessárias.

            Vejo aqui dois Senadores do Amapá, representando duas gerações: um deles tem passagem já ilustre por esta Casa, e por ele tenho muito carinho, muito respeito e muita amizade; o outro, menino, deveria estar na Câmara de Vereadores e já está no Senado, mas se vem impondo ao respeito e à admiração de todos nós. Eu lhes diria, principalmente ao menino que está na Presidência: “Vale a pena esta caminhada”. Para mim, que estou terminando, não sei se vale a pena. Não vejo no fim do túnel, até onde enxergo, o que eu possa mudar, mas V. Exª, com sua capacidade e com sua garra, e esta Casa vão ter de mudar.

            Nós vivemos, realmente, um período muito positivo na história do Brasil. A Lei da Ficha Limpa está marcando passo e caminhando para frente. Está às vésperas de ser adotada no Supremo Tribunal para todo o Poder Judiciário. Funcionários do Poder Judiciário vão ter de ter ficha limpa. A Câmara dos Deputados, a Mesa da Câmara, está adotando essa lei. Para ser funcionário da Câmara, a qualquer título, tem de ter a ficha limpa. Nós, do Senado, também a estamos adotando. Inclusive, o representante que o Senado escolheu no Conselho Federal de Justiça, na hora de votar, disse que, como indicado pelo Senado Federal, tinha a obrigação de fazer o melhor e votou pela adoção da Ficha Limpa. A palavra está com a Presidenta da República. Já são doze Estados que estão encaminhando isso, alguns já a adotaram. Pode-se dizer que, nesse caminho, estamos traçando um bom futuro. Pode ser que a gente encontre uma saída para essa dolorosa medida provisória.

            A medida que o Senado adotou, a Emenda Sarney, para mim, é claro, não é o ideal, mas é o início. E está na gaveta da Câmara.

            Essa decisão do Supremo, cá entre nós, humilha a Câmara, o Senado, o Congresso Nacional. Aliás, são 466 leis que estão no limbo, diz o Supremo. Eu diria: diz o Supremo que o Congresso Nacional está no limbo. Nós estamos no limbo e temos de dar uma resposta. Creio que isso é necessário.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/03/2012 - Página 5402