Pronunciamento de Vanessa Grazziotin em 12/03/2012
Discurso durante a 26ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Comentários acerca da importância da sessão solene do Congresso Nacional, a realizar-se amanhã, destinada a comemorar o Dia Internacional da Mulher e a entregar, às agraciadas, o Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz.
- Autor
- Vanessa Grazziotin (PC DO B - Partido Comunista do Brasil/AM)
- Nome completo: Vanessa Grazziotin
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.
FEMINISMO.:
- Comentários acerca da importância da sessão solene do Congresso Nacional, a realizar-se amanhã, destinada a comemorar o Dia Internacional da Mulher e a entregar, às agraciadas, o Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz.
- Aparteantes
- Valdir Raupp.
- Publicação
- Publicação no DSF de 13/03/2012 - Página 5815
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM. FEMINISMO.
- Indexação
-
- COMENTARIO, IMPORTANCIA, HOMENAGEM, REALIZAÇÃO, SENADO, LOCAL, CONGRESSO NACIONAL, RELAÇÃO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, MULHER, ENTREGA, DIPLOMA, CIDADANIA, REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, POLITICA, VOTO, FEMINISMO, BRASIL.
- COMENTARIO, HISTORIA, VITORIA, DIREITOS POLITICOS, MULHER, PAIS.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Senador Paim. É exatamente sobre desse tema que falarei neste momento, Senador Valdir Raupp, porque considero, e sempre considerei, a iniciativa do Senado Federal...
E, aqui, quero fazer justiça: partiu da ex-Senadora Serys Slhessarenko a iniciativa de institucionalizar, de criar, a partir do Senado Federal, uma premiação, um diploma que reconhecesse mulheres que atuaram e que atuam na luta feminista, na luta pelos direitos das mulheres, na luta pela busca da igualdade.
Infelizmente, ainda há alguma incompreensão. Acho que, no passado, havia uma incompreensão maior do que hoje, mas ainda há incompreensões no sentido de não se compreender corretamente o que significa a luta feminista. A luta feminista não é uma luta de mulheres contra os homens; a luta feminista é uma luta que deve ser das mulheres, mas também dos homens, em prol da construção de uma sociedade mais justa, de uma sociedade mais igual. A luta feminista é aquela travada tanto por mulheres quanto por homens que não consideram, Senador Paim, normal o fato de as mulheres representarem 52% do eleitorado brasileiro, por exemplo, e só ocuparem, Senador Valdir Raupp, 10% das cadeiras do Parlamento no País. Isso não é normal, não é lógico! Então, essa é uma luta que deve ser abraçada não só por mulheres, mas por homens, principalmente.
Nós lutamos porque também não consideramos normal o fato de as mulheres terem grau de escolaridade, um nível de formação, hoje, superior ao dos homens. Aqui, quero abrir um parêntese para lembrar que esse direito foi conquistado muito recentemente, porque, até há pouco tempo, a mulher não podia votar, mas ela também não podia estudar. Não era permitido que a mulher estudasse, porque ela era criada para cuidar da casa, para cuidar do esposo e para cuidar dos filhos.
Conseguimos, tardiamente, esse direito, e, hoje, nós temos um nível, Senador Paim, de escolaridade superior ao dos homens, mas a média dos salários recebidos pela mulher, no Brasil, ainda é 30% inferior ao que os homens recebem.
Nós não podemos considerar normal que a mulher seja penalizada, principalmente no mercado de trabalho, por desempenhar a função mais nobre da humanidade, que é a função da maternidade. Infelizmente, não à luz da legislação, mas, na escuridão, a mulher ainda é penalizada porque engravida, porque dá à luz, porque, na hora de buscar no mercado de trabalho, o patrão, geralmente, entre um homem candidato e uma mulher candidata àquela vaga, opta pelo homem.
Que razões levam à opção pelo homem? Pensa assim o departamento de recursos humanos da empresa: “O homem não vai engravidar, portanto, não vai pedir licença-maternidade”. “O homem pode até ser pai, mas, quando os filhos estão doentes, não é ele que vai se ausentar do trabalho para cuidar das crianças”.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senadora Vanessa, desculpe-me
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Eu tenho de dizer isso, porque não disse ali.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - Pois não, Senador.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Eu ouvi de um empresário um argumento que achei tão absurdo que não respondi, neguei-me a responder. Ele disse que a mulher não podia receber o mesmo salário que o homem porque ela tem filhos. Só isso.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - Olha aí! Primeiro que nós não fazemos filhos sozinhas. Os filhos são fruto de uma relação de gênero, homem e mulher, mas coube à mulher a capacidade, a tarefa, a função de abrigar, de formar essa criança durante nove meses. Coube à mulher, mas, infelizmente, a sociedade em que nós vivemos no mundo, Senador Paim, ainda nos trata dessa forma.
No entanto, nós já começamos a mudar. Há experiências, e aqui faço justiça, não só de mulheres, mas de muitos homens empresários que têm não só acabado com essa discriminação, mas têm, em certo ponto, tentado tratar a mulher de forma diferenciada. É a discriminação positiva, e são empresas com extremo sucesso; são empresas que têm dado certo, porque a mulher não pode continuar sendo vista assim na sociedade.
Então, eu digo isso tudo, primeiro, para destacar a importância da nossa luta e chamar a atenção dos homens. Nós não queremos só a participação das mulheres nas lutas femininas. Nós queremos também a participação dos homens, porque é assim que vamos conseguir quebrar, um a um, todos os tabus que ainda se impõem para todas nós, mulheres, na sociedade brasileira e na sociedade do mundo inteiro.
Eu não tenho dúvida nenhuma de que, amanhã, a nossa sessão será importante, será uma sessão extremamente prestigiada. E eu espero que não seja só por conta da presença da nossa Presidenta Dilma, o que, para nós, é algo muito importante. Eu não tenho dúvida. Isso vai representar - e já representa - um marco na história do País, também um marco na história da luta das mulheres brasileiras pela ocupação do espaço que elas merecem.
Então, amanhã, nós realizaremos a sessão em homenagem ao Dia Internacional da Mulher e faremos a entrega e a homenagem às cinco mulheres, entregando-as o Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz. Serão homenageadas, além da nossa Presidenta Dilma Rousseff, pelo Senado Federal, as Srªs Ana Alice Costa, que é da Bahia; Rosali Scalabrin, do Estado do Acre; Maria do Carmo Ribeiro, que é Maria Prestes, viúva de Luís Carlos Prestes; e Eunice Michiles, que foi a primeira Senadora do Brasil.
Concedo um aparte a V. Exª, Senador Raupp.
O Sr. Valdir Raupp (Bloco/PMDB - RO) - Obrigado a V. Exª. Ao mesmo tempo em que a parabenizo pelo pronunciamento, eu não sei se, amanhã, como o plenário vai estar muito disputado pelas mulheres, justamente por ser o dia delas, terei condições de falar. Então, aproveito este aparte para render as minhas homenagens às mulheres brasileiras, porque elas estão avançando, com justiça. Hoje, as mulheres já estão no Parlamento, se bem que a minoria ainda, na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, assim como V. Exª, como a Senadora Ana Amélia, que está aqui em plenário, e tantas outras que estão nas prefeituras, nas câmaras de vereadores, nos governos estaduais. Também já há algumas mulheres na Presidência da República, posto este que, até então, era muito difícil imaginar que seria ocupado por mulheres. Hoje, o País, que é a sexta economia do mundo, é presidido pela Presidente Dilma Rousseff, uma das personalidades mais importantes do mundo. Ela, hoje, está entre as cinco, seis personalidades mais importantes do mundo. Portanto, por onde passam as mulheres, elas têm demonstrado a sua capacidade. Eu, quando Prefeito, há muito tempo, ainda muito jovem, coloquei mulheres em várias Secretarias: na da Saúde; na de Fazenda, em que ficou durante todo o meu mandato; na Secretaria de Educação; na Secretaria de Ação Social. No Governo do Estado, quando fui Governador, também não foi diferente. Fui o primeiro Governador a nomear uma desembargadora para o Tribunal de Justiça, que, depois, veio a ser Presidente do Tribunal de Justiça e do Tribunal Eleitoral. E, no Ministério Público, havia outros juízes concorrendo. Na lista, escolhi uma mulher, que foi a primeira desembargadora do nosso Estado. Na União, também já tivemos mulheres presidindo a Corte Suprema do País, assim como está assumindo agora o Tribunal Superior Eleitoral a Ministra Cármen Lúcia. Enfim, as mulheres estão alcançando. Agora, no Parlamento, V. Exª tem razão, está faltando muito ainda. Eu presidi uma reunião, no início do ano, com o parlamento da Escócia. Lá, eu pude observar que a maioria eram mulheres. De trinta parlamentares que vieram ao Brasil, a maioria eram mulheres. Elas estão chegando. Acho que 48% ou 50% do parlamento escocês já são de mulheres. Outros países do mundo estão conseguindo avançar, lógico, até pela idade. Então, acredito que o Brasil, daqui a 50 ou 100 anos, vai chegar também. Talvez até, nessa escalada em que as mulheres estão indo, com mais mulheres nas escolas, com mais mulheres nas universidades se formando, no mercado de trabalho, eu acho que as mulheres vão chegar também ao equilíbrio ou até passar os homens. Parabéns às mulheres!
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM) - Muito obrigada, Senador. Incorporo o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento.
Mas, primeiro, quero convidar V. Exª a se pronunciar amanhã. Amanhã, nós teremos uma sessão dividida em duas partes: a primeira será a entrega do prêmio Bertha Lutz, que contará com a participação da Presidenta Dilma Rousseff; e a segunda sessão contará com a presença de todas as Deputadas e Senadoras, Deputados e Senadores, e todos os Parlamentares poderão falar.
Eu até vou sugerir ao Presidente da Casa para que não haja problema se avançarmos o tempo. Acho que nenhum Senador e nenhuma Senadora vai se opor pelo fato de adentrarmos o período dos pronunciamentos, porque seria importante que todos os homens pudessem estar presentes e falar. Para nós, muito mais importante do que ouvir uma mulher, Senador Paim, é ouvir os homens, ouvir pronunciamentos como o que V. Exª acabou de fazer.
Para comentar só a questão da participação política das mulheres, a representação política, eu quero dizer, Senador Valdir Raupp, que nós não queremos esperar de 50 a 100 anos para atingir se não a equidade, a igualdade de presença no Parlamento, mas um número mais expressivo de uns 30% ou 35%. Não. Nesses países todos, onde a mulher avançou muito e está muito mais presente no Parlamento, é por conta exatamente da legislação. Na maior parte desses países, existem leis eleitorais que estabelecem lista alternada entre homens e mulheres. Isso ainda é necessário por conta de todo o problema que sofre a mulher: “A mulher não é política. Não é porque não quer”. É porque a mulher, apesar de trabalhar fora, de produzir quase 45% de tudo o que a Nação produz, ainda é obrigada a fazer quase tudo com exclusividade dentro da sua casa. E ainda tem um marido que não vê com bons olhos o fato de ela se filiar a um partido político, militar num partido político.
Então, se essas questões culturalmente são barreiras difíceis de serem ultrapassadas, vamos elaborar leis. Foi assim que fez a Argentina. Foi assim que fez a maior parte dos países do mundo, onde as mulheres já ocupam 25%, 30%, 40% das cadeiras. Não precisaríamos iniciar um a um. Vamos iniciar dois a um. Já é um bom começo, já é um bom início. E não vamos entender ou achar que a mulher está querendo tirar o espaço que é do homem. Não. Vamos imaginar e pensar que é um espaço devido a quem representa 52% do eleitorado.
Sr. Presidente, na condição de Presidente, este ano - e logo após teremos a escolha de um novo coordenador ou de uma nova coordenadora do Conselho do Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz -, quero dizer que é com muita alegria que, após a escolha... Primeiro, são as indicações. Nós recebemos aproximadamente 30 ou um pouco mais de indicações. Recebidas as indicações, o Conselho, que é composto por um membro de cada partido com assento nesta Casa, vota secretamente os nomes que acha que são merecedores desse diploma. E compreendi o resultado como um grato presente, porque, como nos anos anteriores, mas, principalmente, neste ano, acredito que as mulheres que receberão essa homenagem representam o verdadeiro retrato do Brasil. Temos uma militante de trabalhadores e trabalhadoras rurais que vem do Acre; temos uma mulher estudiosa das questões feministas hoje de gênero no Brasil, que vem da Bahia e que foi muito importante para a criação e a instalação das primeiras delegacias de mulher no País, uma pessoa que formula, teoricamente, a questão de gêneros; temos Maria Prestes, um nome muito forte e de uma posição muito forte, porque foi esposa, por mais de 40 anos, de Luís Carlos Prestes, mas poucos no Brasil sabem que ela também foi uma grande militante e que, portanto, receberá esse reconhecimento; temos a primeira Senadora do Brasil - e não é de muito tempo, não, Senador Paim. Em 1979, Senador Alvaro Dias, ingressei na universidade, muito jovem. Foi a primeira vez que uma mulher sentou-se em uma destas cadeiras do Senado. Agora, há pouquíssimo tempo, em 1979. Portanto, merece o reconhecimento de todas nós.
E quero, aqui, rapidamente - sinto-me nessa obrigação também, antes da sessão de amanhã -, falar um pouco a respeito das nossas homenageadas.
Quero começar por Rosa Scalabrin, conhecida no seu Estado como Rose. Nasceu no Rio Grande do Sul, mas migrou para a Amazônia, aos 10 anos, quando sua família, como dezenas e centenas de famílias sulistas, migrou para trabalhar no campo durante a construção da Transamazônica.
Portanto, ela foi, com 10 anos, para o Pará e, em seguida, mudou-se para o Estado do Acre. Começou sua militância aos 15 anos de idade, exatamente participando do Movimento de Resistência dos Trabalhadores Rurais da Transamazônica. Junto com a sua família, como já disse aqui, como uma assentada do Incra, foi para a região.
Em 1986, Rosali Scalabrin foi para o Acre, a convite da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ligada à Igreja Católica, para colaborar com a Organização Sindical dos Trabalhadores Rurais, no auge dos conflitos pela terra. Teve um belo trabalho, inclusive atuando lado a lado de Chico Mendes, cuja morte brutal é conhecida pelo Brasil e pelo mundo inteiro, assassinado que foi por conta de ter lutado pelos direitos dos trabalhadores rurais e, principalmente, dos seringueiros.
Rosali Scalabrin também atuou por dois anos, já no governo do Presidente Lula, no Ministério da Agricultura, onde criou o Programa Coopergênero, em prol do Cooperativismo associado à igualdade entre homens e mulheres no campo.
Rose, como é conhecida, tem, portanto, uma atuação forte não apenas no Movimento dos Trabalhadores Rurais, mas também, desde o ano de 2008, compõe o Comitê do Movimento do Plano Nacional de Política para as Mulheres, representando o Fórum de Organizações de Políticas para as Mulheres. Ou seja, é uma mulher que tem a sua vida ligada aos movimentos sociais e democráticos, mas, sobretudo, à promoção da igualdade de gênero, que marca o Diploma Mulher- Cidadã Bertha Lutz.
Quero falar um pouco de Ana Alice Costa, nossa outra homenageada. Nasceu em 1951, em Caravelas, na Bahia. Foi integrante do movimento estudantil no início dos anos 70, no período mais duro da ditadura militar. Quando foi, em seguida, estudar no México, já começou a trabalhar e a estudar teoricamente a questão da relação de gênero, ou seja, das diferenças entre homens e mulheres.
De volta ao Brasil, voltando do México, vinculou-se ao grupo feminista Brasil Mulher Seção Bahia, um dos primeiros grupos feministas daquele Estado. E, 1983, juntamente com outras colegas feministas, criou, na Universidade Federal da Bahia, onde já era professora, Presidente Paulo Paim, o Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre as Mulheres, em que vem trabalhando em articulação com outros movimentos sociais, em defesa dos direitos das mulheres para a transformação da condição feminina.
E, no ano de 1985, quando criada e instalada a primeira Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, no Brasil, ela também teve uma participação muito importante, muito importante nesse aspecto.
Retornou do México em 1994 e voltou para aquele país para concluir o seu doutorado. E, quando retornou, publicou um livro denominado As donas do poder: mulher e política na Bahia. Em 2004, concluiu o pós-doutorado em Teoria Feminista, em Madrid, na Espanha.
Ana Alice tem concentrado seus esforços na institucionalização dos estudos feministas, na produção de conhecimento e também na área do ensino. Ou seja, uma mulher que dedica sua vida ao estudo teórico sobre a questão de gênero, o que para nós é muito importante, porque é muito importante fundar nossa luta dentro do desenvolvimento de teorias científicas, Sr. Presidente.
Nossa outra homenageada: Maria Prestes.
No campo mais histórico da luta do povo brasileiro, quero dizer que se destaca uma mulher chamada Altamira Rodrigues Sobral. Esse é o nome original de Maria Prestes.
Filha de camponeses, aos 17 anos, quando pertencia à Juventude Comunista, teve de fugir para São Paulo e, na luta pela causa comunista, conheceu Luís Carlos Prestes, com quem se casou e viveu por mais de 40 anos, até a morte do marido.
Por ter lutado contra o regime militar e pela democratização do Brasil, Maria Prestes enfrentou a clandestinidade, perseguições políticas e o exílio. Apesar das dificuldades de viver na ilegalidade durante o regime autoritário, ela criou nove filhos, Sr. Presidente. Nove filhos, Senadora Ana Amélia! Sete da união com o líder do Partido Comunista e dois do primeiro casamento.
Filha e neta de militantes comunistas, Maria Prestes apoiou greves, organizou protestos, panfletos e comícios; divulgou livros e jornais. Sua experiência de vida está toda relatada no livro de sua própria autoria, denominado Quarenta anos ao lado de Luís Carlos Prestes.
Aos 80 anos de idade, Maria Prestes foi homenageada pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Posteriormente, recebeu mais uma série de homenagens Brasil afora. Recentemente, Maria teve uma atuação decisiva no episódio que trouxe o arquivo soviético de Luís Carlos Prestes para o Brasil.
Graças a ela, que coordenou uma mobilização ativa de intelectuais, diplomatas e até Presidentes, hoje, os inúmeros documentos de Prestes, principalmente os que se referem ao período do exílio, estão preservados no Arquivo Nacional. Em sua casa, colorida, em Saquarema, no Rio de Janeiro, onde vive, Maria nem parece a mulher política que é, a guerreira forjada nas lutas clandestinas das quais participou nas fileiras do partido. Hoje, é apenas a Maria, dona de casa, mãe e cidadã.
Eunice Michiles, a nossa outra homenageada.
A primeira Senadora eleita do País é outra personalidade de destaque que estará conosco amanhã. Mas, há muitos que dizem: “Eunice Michiles era suplente”. De fato, Senadora Ana Amélia, Eunice Michiles assumiu nesta Casa, no ano de 1979, na condição de suplente, em decorrência da morte do ex-Governador João Bosco Ramos de Lima. Entretanto, ela foi votada pelo povo do seu Estado, o Amazonas, e assumiu, repito, três ou quatro meses depois da morte do Senador João Bosco Ramos de Lima. Quero lembrar que, naquela época, o suplente também recebia votos. O sistema eleitoral permitia que cada partido formasse uma chapa com três sublegendas representando três candidatos, e o mais votado assumia vaga.
Eunice Michiles obteve 32.819 votos, ou seja, 46% dos votos do seu partido. Por muito pouco perdeu para o ex-Governador. E seria interessante que todas as mulheres conhecessem essa história. Muitas vezes não era dado o direito a Eunice Michiles de falar nos comícios, porque ela era a segunda, porque ela era uma mulher e a ela não era dado o direito, certamente. Se ela tivesse todos os direitos e todo o apoio que teve o primeiro candidato, teria superado-o e sido eleita Senadora da República. Mas obteve 46% dos votos do seu partido e chegou aqui, Senadora Ana Amélia, em 1979, quando ainda nenhuma mulher havia se sentado em qualquer uma dessas cadeiras. Em 1979! Isso foi praticamente ontem. E ela diz que o Senado não estava preparado para uma mulher. Aqui, não havia banheiro feminino; aqui, só havia banheiro masculino, porque o plenário era dos homens, que ocupavam todas as cadeiras desta Casa.
Então, imaginem todas as dificuldades pelas quais Eunice Michiles passou!
Em 1984, ela foi convidada para ser candidata à Vice-Presidência do Brasil na chapa do Ministro do Interior Mário Andreazza. Mas ela preferiu unir-se à Aliança Democrática e defendeu a candidatura de Tancredo Neves, transferindo-se, à época, para o PFL.
Eunice Michiles está entre as cinco mulheres que recebem não só a homenagem das Senadoras, não só a homenagem dos Senadores, mas também a homenagem do Brasil, porque foi uma precursora. E acho que temos a obrigação de conhecer e de divulgar a história como ela foi, e não como gostaríamos que ela tivesse sido. Não dá. E, à época, infelizmente, a manchete de todos os jornais, principalmente dos jornais de circulação nacional, não era o fato de uma mulher chegar ao Senado, mas o fato de que uma suplente estava indo para o Senado, como se isso fosse mais importante do que a primeira mulher a ocupar uma destas cadeiras aqui, Senador Paim. Isso foi uma injustiça, porque ela havia sido eleita, diferentemente de hoje, quando nossos suplentes não recebem votos. À época, eles recebiam. E ela foi uma das responsáveis pela conquista da vaga. E repito: não foi a primeira colocada por muito pouco e por uma série de adversidades que sofreu durante sua campanha.
Por fim, para concluir, pois V. Exª está sendo extremamente bondoso comigo, quero destacar aqui o que não precisaria: a nossa Presidenta Dilma.
Dilma Rousseff, como sempre digo, nunca foi candidata a nada, nem a vereadora, nem a deputada, e é a Presidenta, a primeira Presidenta do Brasil. Ela quebra um monte de tabus.
Primeiro, demonstra que o político não é aquele detentor de mandato. O político é aquele que participa das lutas coletivas do povo, onde quer que esteja, no movimento sindical, como líder estudantil, como um técnico que participa do Poder Executivo. E ela foi militante em seus 16 anos de idade. Poderia ter feito, Sr. Presidente, como muitas meninas da sua época, em pleno regime da ditadura. Filha de família com um bom poder aquisitivo, poderia ter estudado fora do Brasil, poderia fazer o que quisesse. Mas optou, aos 16 anos de idade, por ingressar na vida política, por somar ao lado de outros e outras na luta pela reconstrução e retomada da democracia no País.
Integrou organizações que combateram o regime militar. Em 1969, foi presa, em São Paulo, pela Operação Bandeirante, submetida à tortura, e cumpriu pena no presídio Tiradentes até 1972. Livre da prisão, mudou-se para Porto Alegre, no Estado de V. Exªs, Senadora Ana Amélia e Senador Paim, em 1973.
Em 1979, dedicou-se à campanha a favor da anistia dos perseguidos e exilados pelo regime militar. A participação das mulheres brasileiras na campanha pela anistia ampla, geral e irrestrita, Sr. Presidente, é algo que está escrito na história brasileira, e a nossa Presidenta Dilma foi uma dessas mulheres, foi uma dessas mulheres que levantou alto a bandeira pela anistia, a favor dos perseguidos e exilados pelo regime militar. Também ajudou a fundar o Partido Democrático Brasileiro (o PDT), no Rio Grande do Sul, e trabalhou na assessoria da bancada estadual do partido entre 1980 e 1985. No ano seguinte, foi escolhida pelo Prefeito da capital gaúcha, Alceu Collares - amigo nosso, meu querido amigo Alceu Collares, por quem tenho muito carinho e forte admiração -, para assumir o cargo de Secretária da Fazenda - logo de cara! -, posição que ocupou até 1988.
Em 1989, foi nomeada Diretora-Geral da Câmara Municipal de Porto Alegre. Presidiu a Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (1991-1993) e, em seguida, ocupou o cargo de Secretária Estadual de Minas, Energia e Comunicações, também no governo de Alceu Collares, retornando ao posto no governo de Olívio Dutra, do PT, partido ao qual se filiou em 2000.
O trabalho técnico realizado por ela e sua firmeza política chamaram a atenção do primeiro candidato e depois Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, que a convidou, em primeiro lugar, para compor, como uma das coordenadoras, a equipe de transição e, depois, nomeou-a Ministra de Minas e Energia. A partir daí, o Brasil inteiro conhece a história.
Do Ministério de Minas e Energia, no qual fez tantas coisas - lançou o programa Luz para Todos, introduziu o biodiesel na matriz energética brasileira -, foi convidada a assumir a Casa Civil - não só assumir a Casa Civil, mas a coordenar os principais programas desenvolvidos pelo Brasil, como, por exemplo, o PAC, que é o Programa de Aceleração do Crescimento.
Candidata à Presidência da República, deixou o governo e foi eleita. Hoje, Dilma não é apenas o orgulho das mulheres brasileiras, mas das mulheres de todo o mundo. Como disse o Senador Valdir Raupp, é uma das figuras mais importantes do mundo hoje, e é uma mulher, sinal e prova de que nós, mulheres, somos sensíveis quando temos de ser sensíveis, mas duras, firmes, quando decisões duras têm de ser tomadas. Dilma representa isso tudo.
Daqui, quero dizer que nós, mulheres, neste momento em que homenageamos as mulheres que foram precursoras e aquelas que lutam ainda hoje por direitos iguais entre homens e mulheres, não podemos nos esquecer de homenagear também um homem; um homem que é importante para o Brasil não só pelo que fez pelo Brasil - ajudou muito o Brasil -, mas pelo que fez principalmente pelo povo. Acho que o fato de esse homem ter devolvido a autoestima ao povo brasileiro, aos mais humildes, aos mais pobres, já bastaria; mas a autoestima foi devolvida não só ao povo, mas às mulheres. Ele confiou numa mulher. E eu, aqui, refiro-me ao Presidente Lula, que deixou o hospital no dia de ontem. Que Deus o ajude, proteja-o, porque o povo está numa corrente única para que ele tenha a sua saúde plenamente restabelecida.
É uma figura masculina, mas que, sem dúvida nenhuma, merece as maiores homenagens das figuras femininas deste Brasil.
Muito obrigada, Sr. Presidente.