Discurso durante a 26ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca da renúncia, hoje, do Sr. Ricardo Teixeira à Presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESPORTE. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Considerações acerca da renúncia, hoje, do Sr. Ricardo Teixeira à Presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
Publicação
Publicação no DSF de 13/03/2012 - Página 6031
Assunto
Outros > ESPORTE. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, RENUNCIA, PRESIDENTE, CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL (CBF), MOTIVO, CORRUPÇÃO, ILEGALIDADE, CONTA BANCARIA, EXTERIOR, ABUSO DE PODER.
  • COMENTARIO, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, ATRASO, ORGANIZAÇÃO, PAIS, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL, REFERENCIA, AUSENCIA, AGILIZAÇÃO, CONSTRUÇÃO, ESTADIO, RESULTADO, REDUÇÃO, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, MUNDO, RELAÇÃO, GOVERNO, BRASIL.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o Sargento Garcia prendeu o Zorro, e o Ricardo Teixeira caiu. Eu tinha, Senador Cristovam, outro assunto a tratar no discurso de hoje, mas vejo que esse é o tema do dia.

            Foram, no mínimo, dez anos de impunidade, pelo menos desde o encerramento da CPI do Futebol, que presidi nesta Casa, tendo como Relator o ex-Senador Geraldo Althoff. Houve o indiciamento, o Ministério Público acolheu as denúncias da CPI do Futebol, propôs ações criminais que tramitam até hoje na Justiça Federal. Em dez anos de impunidade, de conivência, de cumplicidade, utilizando-se ardilosamente do poder econômico e político que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) tem, o Sr. Ricardo Teixeira cooptou autoridades do Legislativo, do Executivo e do Judiciário e, especialmente, dirigentes de clubes e de federações, para permanecer durante 23 anos comandando o futebol brasileiro, como se não existissem pessoas competentes neste País para o exercício dessa missão.

            É bom recordar que foi exatamente a CPI do Futebol, há dez anos, nesta Casa, que revelou a existência num paraíso fiscal de uma offshore denominada Sanud, que estabelecia uma triangulação de recursos que chegavam ao Brasil: ISL, Sanud e Ricardo Teixeira. Recentemente, a BBC de Londres apresentou ao mundo esses fatos, que vieram à tona devido aos trabalhos de uma CPI instalada nesta Casa. Como decorrência desses fatos, houve uma ação na Justiça suíça, que esconde detalhes ainda não conhecidos pela opinião pública tanto da Europa quanto do Brasil. Há uma batalha judicial: de um lado, a BBC de Londres tenta a revelação dessas informações; de outro lado, os interessados dificultam a transparência. Enfim, como decorrência daquela CPI, esses fatos tornaram-se públicos no Brasil e, mais recentemente, na Europa, em razão dos procedimentos adotados na Justiça da Suíça.

            Relembro que a CPI do Futebol indiciou 17 cartolas brasileiros, dirigentes de federações e de clubes, incluindo o Sr. Ricardo Teixeira, e possibilitou a recuperação de mais de R$160 milhões pela Receita Federal e pelo Banco Central, recuperação decorrente de transações marginais realizadas com venda ou empréstimo de jogadores a clubes no exterior.

            Isso demonstra que uma CPI levada a sério, Senador Paulo Paim, produz, apresenta resultados, oferece benefícios ao País. Além de tudo isso, a CPI do Futebol deu origem ao Estatuto do Torcedor e à Lei de Responsabilidade do Desporto Nacional, dois documentos legais essenciais que mudaram o conceito de gestão do futebol brasileiro, tornando a administração do futebol mais transparente e possibilitando a responsabilização de dirigentes que, até então, se colocavam acima do bem e do mal. Eles podiam arrebentar os cofres dos seus clubes e das entidades desportivas sem que nada lhes ocorresse. O Ministério Público, hoje, pode ser acionado. Os clubes são obrigados a realizar auditorias externas e a publicar seus balanços. É por essa razão que os brasileiros, hoje, conhecem o endividamento de clubes de futebol no Brasil, fato antes absolutamente desconhecido.

            Em relação à renúncia do Sr. Ricardo Teixeira, é bom reconhecer que se dá muito mais em razão da pressão externa do que da pressão interna, porque no Brasil ele obteve apoio, ele obteve apoio dos dirigentes e de políticos que chegaram a se manifestar na forma de apelo para que ele permanecesse dirigindo a CBF. A pressão externa vem de há algum tempo, desde revelações que envolvem Ricardo Teixeira e outros dirigentes ligados à Fifa no cenário internacional. Esta Casa, inclusive, realizou audiência pública com a presença de Andrew Jennings, jornalista da BBC de Londres, que trouxe revelações estarrecedoras, chegando a denominar a Fifa de organização criminosa ou sindicato do crime.

            Pois bem, essa organização, dita criminosa pelo jornalista, insinuou, há algum tempo, que veria com bons olhos a substituição do Sr. Ricardo Teixeira, acenando para o Governo brasileiro que, se indicasse outro representante para conduzir o projeto Copa 2014, a Fifa apoiaria.

            Pois bem, não devo pregar uma intervenção do Governo na CPF. É uma instituição. É uma entidade, a meu ver, paraestatal, porque, direta ou indiretamente, mobiliza recursos de natureza pública, uma vez que a essência dos recursos utilizados pela CBF tem origem nos jogos da seleção brasileira e na publicidade, etc., que patrocina a seleção nacional, que é parte do patrimônio cultural do povo brasileiro. Portanto, a CBF - vejo assim - é uma paraestatal que deveria ser fiscalizada pelo Tribunal de Contas da União.

            Deveria a administração da CBF prestar contas ao Tribunal de Contas da União.

            Diante dos fatos de hoje, com a renúncia já esperada do Sr. Ricardo Teixeira, que já providenciava há algum tempo a sua transferência para a Flórida, diante desse fato, cabe-me de forma insuspeita, porque sou da oposição, dizer que deveria o Governo influir na indicação do dirigente do Comitê Organizador da Copa do Mundo. Não estou defendendo a intervenção na CBF, que seria uma medida, de certa forma autoritária; mas estou defendendo que o Governo assuma a responsabilidade na condução do projeto Copa 2014, influindo na indicação de um nome que possa estabelecer uma parceria não promíscua como essa que se instalou para a organização da Copa do Mundo.

            E fácil argumentar. Segundo o Tribunal de Contas da União, apenas 8.8% dos recursos destinados à Copa do Mundo são recursos privados, o restante é dinheiro público. O povo brasileiro está pagando pela organização da Copa do Mundo, portanto, a responsabilidade é do Governo. Este modelo é do Governo. Quem assinou a carta-compromisso com a Fifa foi o Governo brasileiro; quem assumiu os compromissos, muitos dos quais desconhecidos por nós, foi o Presidente da República à época. Vou, inclusive, encaminhar um pedido de informações ao Ministro do Esporte para que esta Casa possa tomar conhecimento de todos os compromissos que foram assumidos pelo Governo brasileiro. Nós não sabemos quais foram esses compromissos. O Governo deve isso ao povo, que paga caro pela realização desse espetáculo que é a Copa do Mundo nosso País.

            Portanto, a responsabilidade pela administração da organização da Copa é, acima de tudo, do Governo Federal. Por isso - repito -, seria oportuno que o Governo, a Presidente Dilma, influísse na escolha do nome que vai administrar esse projeto.

            De outro lado, há um desvio de foco. Nós estamos há um bom tempo discutindo questões políticas. Nós discutimos se o Secretário-Geral da Fifa seria a autoridade para dialogar com a Presidente Dilma. Se não foi humilhação para o Governo brasileiro aceitar discutir com o segundo escalão da Fifa. Foi o que ocorreu quando nossa Presidente esteve na Bélgica, onde houve o encontro com o Secretário-Geral da Fifa.

            E imaginávamos que, com o Secretário-Geral da Fifa, deveria falar o Ministro do Esporte. Fragiliza politicamente o Governo aceitar um status secundário na representação nacional.

            Depois, veio o pronunciamento de conteúdo desse Secretário da Fifa, a expressão chula que pode ser repelida; mas o teor do seu discurso foi verdadeiro, reclamando que o Brasil não estava agindo com celeridade, que havia atraso.

            Enfim, nós poderíamos acrescentar outros itens críticos em relação à Copa do Mundo, especialmente aqueles que estão sendo desfocados. Porque enquanto discutimos se o Secretário-Geral da Fifa fez bem em dar o pontapé que deu, enquanto discutimos a Lei Geral da Copa, que trata de questões acessórias, como, por exemplo, se devemos permitir o consumo de bebida alcoólica nos estádios durante a Copa do Mundo para atender ao interesse econômico da Fifa, estamos esquecendo que as obras estão sendo superfaturadas, que somente no Estádio Mané Garrincha, em Brasília, mais de R$260 milhões foram acrescidos ao orçamento inicial, com onze aditivos já concretizados.

            Nós não estamos discutindo a pressa na privatização dos aeroportos. No caso do aeroporto de Guarulhos, por exemplo, quantos reais privados foram investidos nessa privatização? Os recursos são de origem privada ou pública? Na verdade foram recursos dos fundos de pensão e do BNDES, que têm origem em recursos de trabalhadores, como do FAT e do FGTS. Recursos privados, quem sabe, mais adiante, daqui a quanto tempo?

            Essa é uma questão que não está sendo convenientemente debatida. Nós estamos aceitando passivamente que se faça festa com dinheiro público. A construção dos estádios... os estádios que estão sendo construídos em algumas capitais se transformarão em elefantes brancos e não serão estádios milionários apenas no que diz respeito à sua edificação. Serão estádios milionários no que diz respeito à sua manutenção. Soube, por exemplo, que o Maracanã custará R$100 milhões por ano de manutenção, já que algumas dependências luxuosas custarão muito caro agora e depois, especialmente os camarotes vips, que ficarão à disposição das autoridades internacionais que virão para a Copa do Mundo.

            Portanto, o desvio de foco é lastimável, porque depois de concedermos ao Governo tudo aquilo que o ele solicitou - flexibilização da legislação de licitações, o pretexto sempre foi o mesmo: o Governo precisava facilitar licitações para agilizar obras. E as obras não acontecem.

            Ou acontecem muito lentamente. Em relação aos aeroportos é o que se vê, o Governo desistiu das obras e privatizou aeroportos. Em relação a portos, em seis desses portos, nada se fez. Foram compromissos assumidos, segundo consta, com a FIFA e até agora não honrados. E sabemos da deterioração, do sucateamento de muitos dos portos brasileiros.

            Não há como ficar discutindo questões acessórias, deixando num plano secundário essas questões primaciais para o povo brasileiro, que dizem respeito ao legado que ficará depois do espetáculo que poucos brasileiros assistirão presentemente, já que sabemos que a Copa do Mundo, no campo, nos estádios, é realizada sobretudo para os turistas que podem pagar, e pagam caro para assisti-la.

            Enfim, Sr. Presidente, não vejo razões para comemorar a renúncia do Sr. Ricardo Teixeira. Ela aconteceu tardiamente. Há razões para lamentar o atraso e, sobretudo, a vergonha a que somos submetidos vendo o nosso País exposto internacionalmente, com a sua imagem contaminada pela presença de um dirigente que foi alvejado por denúncias da maior gravidade, internamente e externamente, consagrando a tese de que a impunidade vence sempre no nosso País.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/03/2012 - Página 6031