Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa de aprovação de projeto de lei que restabelece a taxação do Imposto de Renda sobre o capital estrangeiro.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. SENADO.:
  • Defesa de aprovação de projeto de lei que restabelece a taxação do Imposto de Renda sobre o capital estrangeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2012 - Página 6184
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. SENADO.
Indexação
  • REGISTRO, PROPOSTA, PROJETO DE RESOLUÇÃO, ASSUNTO, NECESSIDADE, ADOÇÃO, CRITERIOS, FICHA LIMPA, PROVIMENTO, CARGO EM COMISSÃO, SENADO.
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, GUIDO MANTEGA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), AUDIENCIA PUBLICA, SENADO, DEBATE, SITUAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, FORTIFICAÇÃO, MERCADO INTERNO, NECESSIDADE, POLITICA, EFICIENCIA, CONTROLE, FISCALIZAÇÃO, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, AUMENTO, EXPORTAÇÃO, OBJETIVO, PRESERVAÇÃO, CRESCIMENTO, ECONOMIA, PAIS, DEFESA, PROJETO DE LEI, ASSUNTO, RESTABELECIMENTO, IMPOSTO DE RENDA, CAPITAL ESTRANGEIRO.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Presidente. É total gentileza sua. Acredito que - reitero o que disse ainda há pouco - talvez tenhamos encontrado, na Presidência, alguém tão gentil quanto o senhor, mas mais, nunca, por toda a cordialidade com que V. Exª está conduzindo esta sessão.

            Presidente, antes, eu queria fazer referência a que hoje, pela manhã, esteve, no Senado da República, o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, para explicar as diretrizes da política econômica do Governo e para apresentar a situação, os números da economia nacional.

            Eu queria dialogar um pouco com o que foi, no dia de hoje, a exposição do Ministro Guido Mantega. Mas, antes, faço questão de registrar aqui, a V. Exª e a todos que nos ouvem e nos assistem pela TV Senado, o projeto de resolução que vamos apresentar, junto com o Senador Pedro Simon e com o Senador Pedro Taques, no dia de hoje, que se refere à necessidade de estabelecimento de critérios para que servidores ocupem cargos em comissão no Senado. Acho que, nesse ambiente da República, em que nós aprovamos, recentemente, no Supremo Tribunal Federal, a constitucionalidade da Lei Complementar nº 135, é importante que todas as instituições da República apresentem exemplos e apresentem instrumentos para dar cabo e aplicação concreta à Lei Complementar nº 135, de 2010.

            Sr. Presidente, o Ministro Guido Mantega apresentou, discorreu hoje sobre os desafios do crescimento econômico do País no cenário de crise global; apresentou os dados gerais da economia brasileira, como a economia brasileira tem enfrentado a crise; apresentou o que o Governo avalia que é uma trajetória de crescimento do Produto Interno Bruto, embora nós tenhamos tido uma radical queda, agora, no ano de 2011, muito abaixo do que era previsto pelo Governo e frustrando muitas expectativas, mas dentro de um ambiente, tenho que reconhecer, de crise econômica mundial; apresentou também as medidas do Governo de fortalecimento do mercado interno, que considero uma medida positiva e necessária. Acho que fortalecer o mercado interno e não deixar o nosso mercado à mercê da economia internacional é a medida e a condução correta para a nossa economia.

            S. Exª destacou que uma dessas medidas de fortalecimento do mercado interno é a expansão contínua da massa salarial, mas, por outro lado, também destacou que é necessário - o que foi defendido pelo Ministro - uma rígida política de controle fiscal. Parecem-me antônimos o crescimento econômico e esses ditames da economia neoliberal que são proclamados pelas necessidades de ajuste fiscal na economia que sempre se referem a diminuir a capacidade de investimento do Estado e sempre se referem a reformas que, via de regra, como está ocorrendo na Europa, diminuem o direito dos trabalhadores, são reformas que diminuem as conquistas sociais da ampla maioria da população brasileira.

            Quero chamar a atenção para um dos dados destacados pelo Ministro: que uma das políticas monetárias adotadas pelos países ricos foi inundar de liquidez, ou seja, foi de expulsão dos seus capitais em direção aos países emergentes. E o Ministro destacou que, dos capitais que fugiram - fogem da Europa, fogem dos países ricos -, US$8,8 trilhões, boa parte desse capital, foram para esses países emergentes, deslocaram-se para os países emergentes e, notadamente, parte deles consequentemente veio para o Brasil.

            A pergunta: por que esses capitais voláteis se deslocam como uma nuvem dos países que estão em crise econômica e por que boa parte desses US$8,8 trilhões vieram para o Brasil?

            Ora, vieram para o Brasil atraídos pela nossa taxa de juros. A nossa taxa de juros ainda é uma das maiores do Planeta. Esses capitais vêm para o Brasil, aportam aqui mobilizados pela nossa taxa de juros para investir na indústria brasileira? Para investir na produção? Para investir na produção de commodities? Não. Eles aportam aqui para se ancorarem no mercado financeiro. Eles aportam aqui para crescerem com a nossa alta taxa de juros.

            Quando não for mais agradável ao Brasil, nem serão necessárias grandes turbulências; quando o Brasil não for mais agradável para esses capitais, eles voltam ou para os seus locais de origem, ou se deslocam para outra nação. É uma característica desses tempos de globalização. O capital, concretamente, em definitivo, não tem uma pátria só: ele se desloca como nuvem para onde é mais interessante. Neste momento, boa parte dele está no Brasil, ancorado na altíssima taxa de juros praticada pela economia brasileira. Eles estão no mercado financeiro. Eles estão no que eu chamo, concretamente, na especulação, na agiotagem financeira, porque um capital que ancora numa taxa de juros de 9% ao ano está ancorado na agiotagem financeira.

            O Brasil, no meu entender, fica, com isso, vulnerável para esses capitais. Em virtude da entrada desses capitais, uma das medidas adotadas pelo Governo brasileiro foi o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras - IOF para taxar a entrada desse capital. Mas veja, Sr. Presidente: a discrepância nisso é que a taxação do IOF não faz cócega nesse capital estrangeiro, nesse capital volátil que entra na nossa economia. O Governo brasileiro, em 2006, isentou esse capital do Imposto de Renda. Com isso, os ganhos desse capital estrangeiro com a dívida externa triplicam em nosso País muito mais que quadruplicam em qualquer outra nação no mundo.

            Então, vejam, nós brasileiros somos tributados em 27%. Qualquer brasileiro médio, qualquer professor universitário, qualquer professor que tenha uma renda superior a três, a quatro mil reais é tributado em 27% dos seus vencimentos. Esse capital estrangeiro que entra no Brasil com a reles taxação do IOF é isento de Imposto de Renda, não tem nenhum tipo de tributação. Parece-me que está aí uma grande injustiça e uma enorme, no meu entender, Sr. Presidente, vulnerabilidade da nossa economia. E essa vulnerabilidade da nossa economia parece-me que precisa de medidas mais firmes por parte do Governo brasileiro.

            Fico feliz, Sr. Presidente, pois, nesse aspecto, pelo menos o Ministro Mantega nos declarou que estava à disposição para dialogar sobre o restabelecimento do Imposto de Renda sobre esse tipo de capital.

            Nesse sentido, Sr. Presidente, tramita aqui no Senado um projeto de lei da Senadora Marinor Brito, minha querida companheira do Partido Socialismo e Liberdade, que restabelece a taxação do Imposto de Renda sobre esses capitais. Foi designado o brilhante Senador Lindbergh Farias para relatar essa matéria, e hoje o Senador Lindbergh me disse que o parecer dele é favorável à matéria.

            Ora, se há uma manifestação favorável por parte do Ministro da economia brasileira, se há uma manifestação favorável por parte do Senador Lindbergh de que esses capitais têm que ser taxados, parece-me que é urgente que nós aprovemos essa matéria proposta pela Senadora Marinor Brito, para reparar essa injustiça e até para proteger nossa economia, porque nós não podemos ficar à mercê da volatilidade desses capitais. Assim como eles vieram, eles vão. E, quando eles se forem, eles podem deixar uma terrível nuvem de capital especulativo sobre a economia brasileira.

            Esse me parece que é um dos desafios, e esse desafio, Sr. Presidente, parece-me que tem que dialogar com outro dilema, e aí está um dos problemas da política econômica.

            Os últimos dados, e o próprio Ministro reconheceu, dão conta de uma brutal queda da produção industrial brasileira. Os últimos dados dão conta de uma queda de 2,1% da produção industrial em janeiro último. Esses números, esses dados da queda da produção industrial e os dados do PIB analisados mais pormenorizadamente, mais detalhadamente, dão conta de que estamos assistindo a um aprofundamento do nosso processo de desindustrialização.

            Vejam, os dados do PIB dão conta de um crescimento da economia de 2,7%. Isso até as perspectivas, as estimativas mais pessimistas não apontavam, uma queda tão drástica do nosso Produto Interno Bruto. Se nós fizermos a dissecação desses dados do PIB que foram anunciados, na semana passada, pelo IBGE, eles revelam outras tristes constatações para nós.

            Vejam só: o PIB revela que, acima da média do PIB, cresceram o agronegócio, a indústria da construção civil e a indústria da mineração. A indústria da transformação, que compreende as fábricas, que compreende concretamente a produção industrial, que é de onde sai todos os produtos de fato com valor agregado, cresceu 0,1%.

            Então, Sr. Presidente, veja o nosso dilema. Nós tivemos a queda do nosso Produto Interno Bruto, mas não é só a queda que nos assusta. É que, dissecado o PIB, aponta um caminho incorreto para o País. Dissecado o PIB, aponta que nós tivemos um crescimento maior do agronegócio e tivemos um crescimento maior da indústria de mineração. Indústria de mineração é indústria de exploração de matéria-prima e de exportação. Ou seja, é, na pratica, igual ao agronegócio. É exportação de commodities.

            E, no que interessa, que é o produto com valor agregado, que é o crescimento da indústria, que é o que gera empregos na economia, que é o que dinamiza a economia brasileira, nós tivemos um crescimento de 0,1%.

            Quais as razões que se atribuem a isso? Há a primeira alegação concreta: o que estamos vivendo. Estamos vivendo claramente... E a própria Presidente da República - quero destacar - reconheceu o problema que temos tido no câmbio. Não é à toa que a sua definição da semana passada foi de que estamos sendo vítimas de um tsunami cambial.

            Hoje o próprio Ministro da Fazenda reconheceu que as medidas em relação ao câmbio, para tentar ancorar o câmbio, ainda são insuficientes para deter esse processo de desindustrialização. E esse processo de desindustrialização, Sr. Presidente, é resultado dessa combinação que não vai desse volume, dessa receita, que não combina com desenvolvimento, que não combina com futuro do País. A receita de ainda termos uma alta taxa de juros e da insistência e da política cambial da forma como está e da ausência de investimentos em infraestrutura vai, em definitivo, nos fazer retroceder em relação ao nosso desenvolvimento industrial, em relação ao nosso futuro.

            Há outro dado da exposição do Ministro que também me preocupa, dados relativos ao investimento do País em educação. Os dados apontados pelo ministro, de investimento em educação, dão conta de um crescimento em 2012 de R$18,7 milhões a R$68,6 milhões; um crescimento que seria de 222%. Mas esse crescimento continua representando um investimento do Estado brasileiro de apenas 5% do nosso Produto Interno Bruto em educação. Ora, Sr. Presidente, o Japão, quando saiu da Segunda Guerra Mundial, não investiu menos de 10% do seu Produto Interno Bruto em educação para dar o salto que deu.

            Estou preocupado com a fórmula que estamos adotando hoje em relação ao nosso futuro. Ou seja, estamos com uma economia... Dissecando nosso último crescimento, nosso último Produto Interno Bruto, temos visto um crescimento da exportação de commodities, temos visto um crescimento do agronegócio, mas temos visto uma retração da indústria. Ou seja, consolidamos um cenário que tínhamos desde o século XIX de sermos um reles, um simples exportador de matéria-prima. Aliás, alguns dados dão conta de que, na prática, com isso, podemos retroceder. Vejam só. Na virada do século, nossa pauta de exportações era composta 59% de produtos manufaturados e 22% de produtos básicos. Incrivelmente, hoje, 45% do total que exportamos é composto de commodities e 39% de produtos industrializados. Lógico! Não há paralelo entre a indústria da manufatura e a indústria que temos hoje! Mas vejam: a manufatura, na virada do século XIX para o século XX, ainda era central e tínhamos mais manufatura do que commodities. Nós temos hoje, lamentavelmente, mais commodities do que produtos e bens industrializados. Não me parece uma boa combinação para o futuro, Presidente. Esta combinação de mais exportação de commodities, menos exportação de produtos industrializados com valor agregado, uma taxa de juros que ainda é alta e a ausência de investimento em educação manterá o País como ele está hoje!

            A minha perspectiva...

            Acredito que o País tem necessidade de dar um salto, tem necessidade de avançar. Se não apostarmos em inovação...

            Quero reiterar dados que destaquei aqui há bem pouco tempo. Digo isso para concluir. Há bem pouco tempo, destaquei que nós, na América Latina, ainda não resolvemos o problema do analfabetismo, enquanto Cuba, Venezuela e Bolívia já conseguiram resolvê-lo. Na América Latina, ainda estamos depois do 12º lugar nos índices de analfabetismo.

            Se não resolvermos os gargalos da desindustrialização, se não apostarmos em tecnologia de inovação, ou seja, não apostarmos em educação, eu tenho medo de que os dados econômicos, por si só, não resolvam a dramática situação brasileira. Nós ainda estamos apegados, e muito, ao velho problema do superávit primário, que engessa o orçamento público. Nós temos quase 49%, quase metade do orçamento engessado pelo superávit primário, nós temos concreta ausência de investimento do Estado brasileiro em decorrência do superávit primário, nós temos uma pauta que prioriza exportação de commodities em vez de exportação de produtos industrializados com valor agregado e nós temos ausência de investimento em educação.

            Essa é uma combinação, Sr. Presidente, que no meu entendimento, não é boa para o Brasil, não é boa para o futuro, não é boa para que haja um crescimento sustentável de nosso País.

            Então, queria destacar, Sr. Presidente, para concluir, esses aspectos da audiência que tivemos hoje com o Ministro da Fazenda, Guido Mantega: parece-me que é necessário haver uma reflexão por parte do Governo nesse tripé. Em que pese os esforços na redução das taxas de juros, ainda me parece que, para o tamanho do Brasil, para o potencial que o Brasil tem, para a condição em que o Brasil está - ascendendo à sexta, quinta economia do mundo -, podemos perder uma chance concreta de esse crescimento de nosso País ser, de fato, sustentável. Ele não será sustentável se nós não tivermos investimento em educação, se não mudarmos a pauta de exportação brasileira e se não ampliarmos a capacidade de investimento do Estado brasileiro, reduzindo esse absurdo superávit primário, que compromete 50% do orçamento nacional.

            Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2012 - Página 6184