Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise do pacto federativo brasileiro.

Autor
Paulo Davim (PV - Partido Verde/RN)
Nome completo: Paulo Roberto Davim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, POLITICA FISCAL.:
  • Análise do pacto federativo brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2012 - Página 7770
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, POLITICA FISCAL.
Indexação
  • COMENTARIO, HISTORIA, REPUBLICA FEDERATIVA, BRASIL, SUGESTÃO, ORADOR, ALTERAÇÃO, PACTO FEDERATIVO, MOTIVO, DEFASAGEM, ARRECADAÇÃO, MUNICIPIOS, RELAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, FATO, NECESSIDADE, AUTONOMIA MUNICIPAL, REFERENCIA, TRIBUTOS.

            O SR. PAULO DAVIM (Bloco/PV - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há algum tempo, vêm se observando acalorados debates sobre a necessidade de reformulação do pacto federativo que sustenta o Estado brasileiro.

            É bom lembrar que o federalismo, nos moldes atuais, surgiu com a independência dos Estados Unidos da América, pela união das colônias que queriam se livrar do jugo inglês. Daí, a ideia de respeitar a autonomia dos entes que compuseram a federação. O próprio conceito dessa forma de Estado tem origem na palavra foedus (do latim), que significa: aliança, pacto, contrato.

            É necessário, por isso, deixar bem claras as atribuições de cada ente federado, bem como a repartição dos recursos necessários para que cada um possa desincumbir-se a contento de suas responsabilidades.

            O Brasil, historicamente, a não ser na configuração das capitanias hereditárias, constituiu uma unidade colonial subordinada à metrópole portuguesa, unidade que foi mantida durante o Império.

            Com a proclamação da República, teve lugar a opção por um modelo federativo, mas que, na prática, continuou concentrando muito poder na esfera superior, aquela que se apresenta como o Estado brasileiro soberano.

            A Constituição Federal de 1988 manteve essa opção, estabelecendo em seu artigo 1º: "A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito [...]".

            Sr. Presidente, pode-se ver que a distorção que vem ensejando contínuas e acirradas discussões está na origem de nossa Federação. Trata-se do descontentamento dos entes federados com respeito ao nosso modelo tributário, que concentra enorme parte de tudo o que é arrecadado sob o controle da União. Essa distorção acaba gerando enorme dependência dos Estados e dos Municípios em relação ao Poder central.

            No Estado federal, existe uma distribuição de competências fixada pela Constituição, mas é evidente que de nada adianta receber atribuições se a entidade não possuir meios próprios para realização daquilo que lhe é atribuído. Quando a obtenção de recursos se transforma em dependência, o ente federado não poderá exercer suas funções com autonomia, o que contradiz o espírito de federação.

            Essa é a grande necessidade que temos de repensar o pacto federativo, para que os recursos sejam mais bem compartilhados. É bom lembrar que não se trata de simples distribuição, pois as atividades sobre as quais incidem os tributos, os fatos geradores acontecem no nível local. E, cada vez mais, são as unidades federadas as grandes responsáveis pela prestação dos serviços públicos, para os quais necessitam dos recursos.

            Por que, então, temos de continuar com um regime que concentra a arrecadação nas mãos do Poder central, o qual cuida da distribuição como se fosse um grande gesto de magnanimidade? E, como se não bastasse essa concentração, o Poder central ainda cria as chamadas contribuições sociais, porque os recursos delas advindos não precisam ser divididos com os Estados e com os Municípios. No caso dos impostos, existe determinação constitucional para a participação dos entes federados na arrecadação.

            Vem daí a necessidade de construirmos um novo pacto federativo, mais justo e que possibilite aos Estados e aos Municípios prestarem aos cidadãos serviços condizentes com a condição do Brasil de uma das mais fortes economias do Planeta.

            Há aspectos do pacto federativo que não estão em discussão. O que importa, realmente, é a distribuição dos recursos, pois está cada vez mais evidente a hegemonia e a hipertrofia da União em relação aos demais entes federados.

            A Constituição de 1988 estabelece a distribuição das receitas tributárias, em seus arts. 157 a 159, para assegurar uma relativa equivalência econômico-financeira entre os entes federados, inclusive com critérios que possibilitem a execução do objetivo constitucional de reduzir as desigualdades sociais e regionais. Porém, como a União pode criar as contribuições sociais, que não fazem parte do bolo a ser dividido, essa prerrogativa resulta em maior concentração ainda dos recursos arrecadados, colocando os Estados e os Municípios numa situação de extrema dependência de negociações políticas.

            A esperança de melhora é que haja, realmente, uma reformulação do pacto federativo, com uma repartição mais justa dos recursos e que atenda às necessidades dos governos locais e estaduais. Somente assim poderemos elevar a qualidade dos serviços públicos que o cidadão deve receber das esferas estadual e municipal.

            Aliás, trata-se da única solução viável, pois nossa Carta Magna assegurou, entre as cláusulas pétreas - aquelas que não podem ser alteradas por emenda constitucional -, no art. 60, a seguinte determinação:

            § 4o Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

            I - a forma federativa de Estado [...]

            Sr. Presidente, quando se pensa em federação como forma de Estado, há que se ter em mente a necessidade de repartição de competências, tanto legislativa como material, além da autonomia política organizacional e financeira.

            As competências dos entes federados aumentaram após a promulgação da Constituição Federal de 1988, mas os recursos recebidos do Poder central não acompanharam o aumento de responsabilidade pelos serviços aos cidadãos. Esse é um dos fatores que resultam na queda de qualidade desses serviços.

            Para possibilitar a autonomia financeira, é necessário que os entes federados tenham suficiente arrecadação, evitando-se o aumento nos tributos de sua competência, o que também pode trazer consequências desastrosas.

            Se não houver um equilíbrio da equação político-financeira, a federação ficará fragilizada, já que a autonomia política tem estreita relação com a autossuficiência.

            Entendo que de nada adianta gastarmos horas e horas em discussões estéreis, que não frutificam, não resultam em ações que mudem efetivamente a arrecadação e a distribuição dos recursos.

            O que é arrecadado tem de voltar para os cidadãos na forma de serviços do Estado. Se o cidadão paga muito, se a carga tributária é elevada, ele deveria receber serviços de primeira qualidade. Entretanto, para que isso possa tornar-se realidade, os Estados e os Municípios, que são os responsáveis mais diretos pelos serviços públicos, precisam de uma participação condizente e mais justa nos recursos que a União se encarrega de distribuir. Já que existe tanta concentração da arrecadação dos recursos públicos nas mãos do Poder central, que pelo menos os Estados e os Municípios tenham neles uma participação condizente com as suas atribuições.

            Está aí a maior premência na reformulação do pacto federativo.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2012 - Página 7770