Discurso durante a 44ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem póstuma ao professor e geógrafo Aziz Nacib Ab'Saber.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem póstuma ao professor e geógrafo Aziz Nacib Ab'Saber.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2012 - Página 8143
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ORADOR, REFERENCIA, PROFESSOR UNIVERSITARIO, GEOGRAFO, MORTO, ELOGIO, SENADOR, RELAÇÃO, VIDA PUBLICA, PROFESSOR.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, eu queria cumprimentar meu companheiro de lutas pretéritas, Senador Aloysio Nunes. Juntos militamos na ALN (Ação Libertadora Nacional), comandada por Carlos Marighella, um herói do povo brasileiro.

            Eu, nesta manhã de sexta-feira, lembro aqui a morte de um sábio, o Professor Aziz Nacib Ab’Saber, uma pessoa a quem dediquei enorme admiração desde que o conheci. O Professor Aziz Ab’Saber era da mesma linha de Augusto Ruschi, Bertha Lutz, José Lutzenberger, outra pessoa admirável, Josué de Castro, Paulo Freire, Milton Santos, Zilda Arns e outros.

            Em 1924, ele nasceu no interior de São Paulo, filho de imigrantes oriundos de Damasco. Uma vez, conversando, ele me disse que seu apelido na escola primária era “Turquinho”.

            Inicialmente geógrafo, especializou-se em geohidromorfologia, e, para sorte dos brasileiros, sempre rompeu barreiras, a começar pelo departamentalismo de várias de nossas academias.

            Bem antes que o conceito de interdisciplinaridade se tornasse tema de polêmica entre professores, o velho Aziz já o exercitava em sua práxis docente e nos inúmeros trabalhos de campo efetuados Brasil afora.

            Durante meu segundo mandato no governo do Amapá, tivemos o privilégio de recebê-lo em Macapá, junto com sua esposa, Professora Cléa, historiadora gaúcha e sua fiel escudeira. E, como ele, também crítica, sempre que necessário.

            Num dos cursos que realizou conosco, lá no Centro de Formação de Recursos Humanos (CFORH), deixou-nos a todos fascinados com sua descrição, simultaneamente precisa e poética, do Golfão Marajoara. A nós, que moramos ali na margem esquerda do rio, muito próximos do oceano, separados de Belém apenas pelos 350km² da Ilha do Marajó. Encantou-nos com a sua descrição do Golfão do Marajoara.

            Dizia ele:

            "Não se pode falar só de Ilha de Marajó, sem uma percepção histórica e geográfica desse mosaico magnífico, que compreende a foz do rio-mar". Raramente, aqueles sinuosos meandros e aqueles recortes de arquipélagos terão sido tão bem apresentados.

            O Professor Aziz, entre outras qualidades, dominava muitíssimo bem os recursos da retórica, e sua fala nos chegava sempre permeada por princípios éticos e políticos. Era, propriamente, uma "boa palavra".

            Eis um exemplo recente de sua militância socioambiental: "(...) qualquer tentativa de mudança no Código Florestal tem de ser conduzida por pessoas bioeticamente sensíveis".

            E aproveito para registrar a presença do Secretário do Meio Ambiente do Estado do Amapá, Grayton Toledo, do Secretário de Ciência e Tecnologia, Antônio Cláudio, e, também, do Conselheiro de Meio Ambiente, Mamede Leal, que estão aqui presentes e que terão uma reunião no Ministério de Meio Ambiente, para discutir exatamente a inclusão de um dispositivo que reduz as áreas de reserva legal, sobre o que o Amapá se posicionou com clareza, não aceitando redução das suas áreas de reserva legal. Os Secretários de Estado estão aqui para debater, no Ministério de Meio Ambiente, essa que é uma possibilidade de suprimir esse dispositivo do Código Florestal que vai a voto na Câmara Federal.

            Mas, voltando ao Professor Aziz, lembro que, além de polemista exímio, era um sedutor em todas as acepções do termo.

            No ano de 2000, em Lisboa, durante um colóquio promovido pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), também encantou professores e alunos com sua inteligência vivaz, sua erudição polimorfa, sua generosidade e, igualmente, com seu arsenal de finas ironias.

            Com vários outros brasileiros, lá nos encontrávamos buscando visões e práticas alternativas às bombásticas efemérides - quem não lembra? - dos 500 anos da Descoberta, então em curso nas duas margens do Atlântico.

            Naquela ocasião, a repercussão da presença e das intervenções do Professor Aziz foram tão fortes que a Direção do ISPA decidiu criar o Centro de Estudos Interculturais Aziz Ab’Saber, que continua funcionando, até hoje, à beira do Tejo.

            Concluindo, a palavra de dois de seus pares: "Para a geografia e para o Brasil, ele representou o topo da ciência. Foi e continuará sendo referência nacional e internacional" - Helena Nader, Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

            "Era um homem elegante, de uma postura extremamente elevada e, ao mesmo tempo, alguém muito acessível e afável" - Aldo Paviani, Professor de Geografia Urbana, UnB.

            E, para quem ainda não leu livros e artigos escritos por nosso amigo querido, uma editora de São Paulo está reeditando sua opera omnia.

            Seus colegas e ex-alunos da Universidade de Sorocaba, da USP, do Instituto de Estudos Avançados, da SBPC e de tantos lugares mais vão sentir sua falta: e nós também!

            O Brasil perde, o Amapá perde e eu perdi um grande amigo.

            Muito obrigada, Srª Presidenta.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2012 - Página 8143