Discurso durante a 45ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à posição da Receita Federal sobre projeto de lei de autoria de S.Exa.; e outros assuntos.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • Críticas à posição da Receita Federal sobre projeto de lei de autoria de S.Exa.; e outros assuntos.
Aparteantes
Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 27/03/2012 - Página 8217
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, ELIMINAÇÃO, TRIBUTAÇÃO, IMPOSTO DE RENDA, REFERENCIA, SALARIO, EMPREGADO DOMESTICO, FATO GERADOR, GARANTIA, PREVIDENCIA SOCIAL, DESENVOLVIMENTO, ECONOMIA.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Pedro Ribeiro, levando em conta que no plenário hoje estamos eu, V. Exª na Presidência da Mesa e o Senador Alvaro Dias, Líder do PSDB, ao invés dos 20 minutos regimentais eu reivindico 60, embora não pretenda usá-los.

            Eu quero conversar hoje...

            O SR. PRESIDENTE (João Ribeiro. PR - TO) - Só que é João Ribeiro, e não Pedro Ribeiro.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - João Ribeiro, claro!

            Eu quero conversar hoje, Senador, sobre economia brasileira e sobre um projeto que apresentei, eliminando a tributação de Imposto de Renda sobre o salário de empregados domésticos de uma forma geral. É um modo de garantir aos empregados domésticos acesso aos benefícios da Previdência e da Saúde e que está sofrendo oposição forte e decidida por parte do nosso Governo, o Governo da Presidente Dilma, mulher, fazendo uma oposição a meu ver absolutamente irracional.

            O ex-Líder do Governo, Senador Romero Jucá, pediu para que saísse da pauta. E, posteriormente, a Receita pediu à Senadora Vanessa Grazziotin que também retirasse de pauta, porque queriam discutir. Hoje pela manhã, eu tive um encontro com a Receita e os argumentos colocados me soaram como um absurdo. Para ser franco, Senador João Ribeiro, soaram-me como uma indignidade. Mas vou explicar isso ao fim do meu pronunciamento.

            Quero falar um pouco, Senador Alvaro Dias, sobre a nossa política de estímulo à industrialização no Paraná. Eu, logo no começo do Governo, instaurei uma política de apoio às pequenas empresas, eu reduzi o ICMS da microempresa a zero e o da pequena empresa a uma média de 2%. Paralelamente a isso, instituí o maior salário-mínimo regional do País.

            O pessoal da minha própria Receita dizia: “O Governador quer quebrar o Estado: vai reduzir brutalmente a arrecadação”. O efeito, Senador João Ribeiro, foi exatamente o contrário disso. A arrecadação do Paraná aumentou, porque o pequeno e o microempresário, que viam reduzida ou aniquilada sua carga de impostos, gastavam no mercado formal; capitalizavam-se e iam ao mercado formal, o que estimulou a economia de uma forma extraordinária. Essa minha medida inspirou, posteriormente, o Simples do Governo nacional, menos ambicioso do que o do Paraná, mas, de qualquer forma, extraordinariamente produtivo em relação à geração de empregos.

            Nós dois sabemos, Senador João Ribeiro - e falo nós dois porque parece que agora só nós dois estamos no plenário, uma vez que o Senador Alvaro Dias se afastou para dar uma entrevista à imprensa que trabalha no Senado da República -, que o estímulo dado à economia, juntamente com outras medidas do nosso ex-Presidente Lula - o companheiro Lula - e também do Governo do Paraná, notadamente o preço zero da energia elétrica para os consumidores até 100kW, a tarifa social da água e do esgoto, que deram a possibilidade de esses recursos irem para o mercado, tiveram um efeito extraordinário, no Paraná, contra, eu insisto, a posição dura dos arrecadadores, dos membros da estrutura fiscal do Estado, que se opunham a qualquer medida que privilegiasse o povo mais pobre, dizendo que eu acabaria com a Receita.

            Muito bem. Nós crescemos, no meu período de governo, industrialmente, 55,7%, com a soma da política social, da microempresa, do salário-mínimo regional, que incorporou, além da inflação, a produtividade do sistema econômico do Estado. E foi a falta da incorporação da produtividade que fez os Estados Unidos quebrarem. A valorização e a financeirização da economia e o congelamento dos salários fizeram com que, em determinado momento, aqueles empréstimos que foram engenhados pela estrutura financeira para impedir a paralisação do país, não pudessem mais ser pagos. Eram o subprime e o derivativo tão conhecidos de todos nós, que levaram à falência a economia americana, que, de um momento para outro, caiu como um castelo de cartas.

            Pois muito bem, o Paraná cresceu industrialmente 55,7% durante o meu governo, até 2010 - as estatísticas não são minhas, são oficiais -, o dobro do crescimento do Brasil, que foi 27%. Crescimento industrial. Em segundo lugar, ficou São Paulo, o motor da nossa economia, com 34% - Paraná, 55,7% -; e em terceiro lugar ficou Minas Gerais com 32%.

            Então, essa política, que teve a oposição dos fiscalistas, foi uma política efetiva, que surtiu resultados impressionantes, mesmo não tendo o Paraná, através do seu governo, as possibilidades que tem o Governo Federal de intervir na economia em defesa do desenvolvimento.

            Eu tenho deixado claro que nós precisamos estimular o mercado interno, e esse também é o discurso da nossa Presidenta Dilma Rousseff, do nosso Ministro Mantega. No entanto, não é a prática. Eu tenho dito que apoio o dito, mas discordo do feito, porque as medidas até agora são extraordinariamente tíbias.

            Lendo uma matéria do Ipea, na companhia de Rafael Greca, que hoje é o nosso candidato a prefeito de Curitiba, candidato do velho MDB de guerra, eu tive a notícia, a informação de que 75% das empregadas domésticas do Brasil não têm registro em Carteira, não têm acesso à Previdência Social, não têm aposentadoria, não têm plano de saúde consequente. Setenta e cinco por cento.

            Então, nós dois urdimos um projeto que apresentei e que foi aprovado à unanimidade na Comissão de Assuntos Sociais. O projeto é o seguinte: até três salários-mínimos por empregado, por unidade familiar, terão o valor pago pelo salário, mais o décimo terceiro e a antecipação de férias deduzidos do Imposto de Renda a ser tributado. Ou seja, estamos estimulando, de forma impressionante, a formalização.

            Qual seria o efeito disso? É evidente que podemos até ter uma pequena redução no Imposto de Renda a ser arrecadado, mas vamos ganhar, de forma extraordinária, numa visão holística, numa visão econômica do Brasil, vamos ganhar na arrecadação da Previdência Social. E, evidente, como aconteceu no Paraná, com a isenção da microempresa, com o aumento do salário-mínimo regional, de forma significativa, vamos ganhar no efeito multiplicador que o salário e a formalização efetuam na nossa economia. Um empregado doméstico não vai aplicar no mercado financeiro; o empregado doméstico vai gastar seu dinheiro nas suas necessidades objetivas e efetivas. É uma injeção direta na economia, com efeito multiplicador na arrecadação de ICMS, no aumento do lucro das empresas formalizadas no País inteiro, e isso vai significar um aumento da arrecadação do Imposto de Renda, ao invés de uma diminuição da arrecadação do Imposto de Renda.

            É evidente que, do ponto de vista social, não podemos apostar na escravização como forma de aumentar a arrecadação do País, senão a proposta verdadeira seria abolirmos a abolição da escravidão.

            Mas veja aqui, Senador João Ribeiro, a preciosidade que me apresenta a Receita Federal a respeito do meu projeto, já aprovado por unanimidade na Comissão de Assuntos Sociais. No seu item nº10, eles fulminam a proposta. E fulminam como? Vou ler:

Caso a medida em análise incentive de maneira inequívoca a formalização do mercado de empregados domésticos, estima-se que, no limite, todos os empregados domésticos seriam formalizados.

            É exatamente o objetivo. Não sei se todos, mas o objetivo é levar a 90%, 99% a formalização dos empregados domésticos, das empregadas domésticas, garantindo leis sociais e planos de saúde, garantindo aposentadoria, garantindo tranquilidade, com salário decente.

Estima-se que, no limite, todos os empregados domésticos sejam formalizados, o que [percebam o tamanho da estultice!] levaria a um impacto financeiro potencial ainda maior aos cofres públicos.

Nesse cenário, baseando-se nos estudos de grau de formalização do mercado de empregados domésticos pelo Ipea, estima-se que a renúncia fiscal envolvida poderia atingir os valores de aproximadamente R$15,3 bilhões, em 2012, R$16,9 bilhões, em 2013, e 18,6 bilhões em 2014, ao envolver todo o mercado de empregados domésticos.

Pelo exposto, diante dos montantes envolvidos, sugere-se o posicionamento contrário da Secretaria da Receita Federal do Brasil à aprovação do PLS analisado.

            E pedem isso à base do Governo, a mim, que sou autor, mas sou da base do Governo. Eles estão propondo o quê? Primeiro, esses números são absolutamente aleatórios, não têm uma demonstração clara de que nós possamos perder essa arrecadação em função de um salário decente para uma empregada doméstica e da garantia dos seus direitos sociais, da aposentadoria, da saúde. Mas não têm a visão econômica; eles ignoram que o salário da empregada doméstica não vai para a aplicação financeira nos bancos, não vai para a especulação, não é o capital vadio dos 21 mil rentistas que faturaram R$226 bilhões este ano, no País. Esse dinheiro é injetado imediatamente na economia, é uma prise direta na veia da economia, do consumo brasileiro. Esse pessoal, então, propõe, ao invés da regularização das empregadas domésticas - falando pelo Governo, o Governo da primeira Presidenta da história do Brasil, a Presidenta Dilma -, à base do Governo, a rejeição da medida. Isso vem assinado por quatro gênios da Receita Federal: o Auditor Fiscal da Receita Federal, Fabrício Bacelar Liparizi; o Coordenador-Geral Roberto Name Ribeiro; o Coordenador-Geral da Coget, Othoniel Lucas de Sousa Júnior. Fossem funcionários do meu governo, seriam removidos da Receita Federal. E como não gosto de por ninguém na rua, porque ia prejudicar também o futuro da família deles, eu os mandaria para um curso de formação econômica, para entenderem mais a globalidade da economia, os princípios e a multiplicação que importa um salário decente para uma empregada doméstica, que tem garantidos seus direitos sociais, sua aposentadoria e seu plano de saúde.

            Essa barbaridade está segurando, já há mais de trinta dias, a tramitação do projeto que apresentei a favor da formalização, da decência e da dignidade da vida das empregadas domésticas do País.

            Fiquei estupefato. E não posso esconder aqui, no plenário, a minha indignação. É um verdadeiro absurdo, no nosso Governo, no Governo da Presidenta Dilma, essa falta absoluta de visão holística do efeito multiplicador que significa o salário. Mas, mais do que isso, neste Governo, que a Presidenta Dilma disse que é o governo das mulheres, da participação definitiva das mulheres na vida pública do Brasil, funcionários falando pelo Governo Federal propõem a manutenção da escravização da empregada doméstica no País como forma de arrecadação de renda. Um absurdo total.

            Então, fica aqui o meu protesto. E eu lamento que esteja falando para um plenário vazio, que esteja conversando com nosso Presidente João Ribeiro, mas esses argumentos serão repetidos na Comissão de Economia. E eu espero que a Comissão de Economia dê uma resposta, como deu a Comissão de Assuntos Sociais, contra a mesma, irracional e não justificada oposição da Receita Federal, falando pelo Governo da Presidenta Dilma, à aprovação, por unanimidade, do projeto. E que seja feita rapidamente, porque nós estamos precisando de emprego neste momento de crise econômica que o País passa.

            Nos últimos dias, Presidente João Ribeiro, uma série de pronunciamentos sobre a desindustrialização do País ocupou as manchetes dos jornais, os espaços das televisões. Pronunciamentos no Senado, matérias na imprensa escrita, na radiofonia e na imprensa televisiva. Na verdade, não se trata de um fenômeno recente. Eu mesmo, desde o primeiro dia que assumi esta tribuna, tenho falado no processo de desindustrialização, que vem de longe: vem da década de 80.

            Na década de 80, quando o Brasil participou, pelas mãos do Fernando Henrique Cardoso, do consenso... Nos primeiros ensaios de adesão, não tinha Fernando Henrique Cardoso ainda; avancei um pouco, numa acusação indevida, e me desculpo dela. Na década de 80, quando ensaiávamos a adesão ao Consenso de Washington, à valorização do capital financeiro, que quebrou os Estados Unidos com a financeirização da economia. Mas nesses anos 80, ainda no período anterior, não havia essa submissão do nosso País aos cânones do neoliberalismo. Verificando os dados do nosso crescimento industrial e do crescimento industrial do mundo, vemos o estrago que essa visão neoliberal do Consenso de Washington fez na nossa industrialização.

            Em 80, Presidente, a Tailândia, a Malásia, a Coreia do Sul e a China, juntas, representavam 15% da produção industrial do nosso Brasil. Hoje, pelo Censo de 2010, não chegamos a 15% da produção somada desses países. Então, alguém diria: “Mas, Senador Requião, nós estamos melhor que em 80”. É claro que estamos melhor que em 80. A política social do Lula foi interessante, aproveitamos o crescimento da China exportando nossas commodities.

            Hoje, porém, 50% da exportação brasileira é: ferro, petróleo, carne, café e soja. Estamos primarizando a economia do País, e a indústria não tem subido na mesma velocidade. E essa exportação de commodities pode acabar de uma hora para outra, e teremos o fim de um ciclo, como tivemos o fim do ciclo do café, da madeira, ou, lá atrás até, do pau-brasil. É uma política de pouca responsabilidade que tem que ser enfrentada.

            Esse processo - aí sim eu volto ao Fernando Henrique - de desindustrialização se acelerou nos anos 90. Daí se acelerou com o PSDB no governo. Foi o início. Mas o PT, que era a nossa esperança, não mudou nada desse processo. Nós vemos um discurso bom, mas vemos uma prática ruim, inclusive agora no Governo da Presidenta Dilma. A abertura sem restrições, a desregulamentação de todas as barreiras, a fixação de tarifas generosas para importações levam à destruição de um dos setores mais avançados da indústria brasileira: o setor de autopeças. Foi na época do Fernando Henrique, lembram? A abertura absoluta para a compra de autopeças no estrangeiro levou ao desemprego 250 mil trabalhadores só em São Paulo, no setor metal mecânico, mas isso continua até agora.

            De lá para cá, não foram tomadas medidas efetivas de produção industrial para o Brasil, a não ser medidas quebra-galho. O processo de desaparecimento da indústria brasileira continua em franco desenvolvimento, e a reação contra isso é tão epidérmica quanto são epidérmicas as medidas governamentais.

            Vamos agindo em relação aos espasmos pontualmente aqui e ali, sem uma política verdadeira de crescimento industrial.

            Hoje, calcula-se que os industriais brasileiros, por medo de investir nas indústrias e até na Bolsa, tenham cerca de R$250 bilhões em letras do Tesouro. Eles têm medo de investir na produção e têm medo de investir no mercado.

            Não vejo, nos discursos da base do Governo, ou mesmo nos discursos da oposição, a radicalidade necessária para um freio ao desaparecimento da nossa indústria. Por quê? Porque os problemas estruturais não estão sendo enfrentados. A oposição e alguns da base criticam o Governo, criticam mas são tão conservadores quanto o Governo, quando apontam caminhos.

            É preciso pôr um fim à tibieza! O Brasil precisa ter uma estratégia de desenvolvimento industrial, uma estratégia de política comercial; e não vejo isso no Governo da nossa Presidenta Dilma, com a radicalidade necessária para a retomada do desenvolvimento econômico no Brasil.

            Mas aqui eu falo de forma critica sobre o que está acontecendo, mas aqui vamos sinalizar o que, a meu ver, precisávamos estar fazendo.

            O processo de desaparecimento das nossas indústrias não cessará enquanto não houver mudança no câmbio. Não é possível que continuemos com o real apreciado, com o dólar desapreciado, vendo as importações de bens de consumo entrarem no Brasil, sem restrição, ainda com benefícios fiscais, por parte de muitos portos brasileiros.

            Mudança de câmbio necessária. Corte de juros. É claro! Está a 9.75% a taxa Selic, mas essa é a taxa Selic para grandes empresas. Os juros da caderneta de poupança são baixos, mas os juros do cheque especial e do cartão de crédito são astronômicos! Passam dos 150%! Vão a 227%! São esses juros que estão ferrando a economia população.

            Então, sob o pretexto de diminuir a capacidade de consumo da população, aumenta-se o lucro dos banqueiros e dos especulares.

            Corte de impostos. Eu cortei impostos no Paraná de 100 itens de bens de consumos comprados pelos salários dos trabalhadores, o que chamamos de bens de consumo salário. Qual foi o resultado? “Ah, Requião! Vai quebrar o Estado!” Em vez de quebrar o Estado, tivemos um crescimento industrial que foi o dobro do crescimento industrial brasileiro. Reitero os números: Paraná, 55,7%, de 2003 a 2010; a média brasileira, 27%. Segundo lugar, São Paulo, com 34%; terceiro, Minas Gerais, com 32%. E foi com redução de impostos que dinamizamos o movimento comercial e industrial do Estado.

            Controle do capital financeiro, com maior taxação sobre a especulação dos bancos e grandes fortunas. É IOF mesmo, vamos acabar com essa história cantada em prosa e verso pela mídia, que não devemos tributar o capital. Devemos tributar, sim, o capital vadio, o capital que não produz nada, o capital que não produz a peça de uma máquina, uma porca, um parafuso, uma peça de vestuário; o capital que não gera emprego, mas que está rendendo R$226 bilhões para 21 mil especuladores num País de 200 milhões de habitantes. Dados do Ipea dos 12 meses de 2011.

            Nacionalização do crédito da produção. Tem que haver um crédito especial, com juros baixos associados ao imposto baixo para a verdadeira produção e inovação.

            Prioridade absoluta ao mercado interno e ao mercado latino. Nós estamos exportando commodities para a China. Tudo bem, mas 90% do produto industrial brasileiro, manufaturado, é exportado para a América do Sul. Portanto, vamos deixar de discussões ideológicas e, de uma vez por todas, incorporar ao Mercosul, a Venezuela, que tem 350 bilhões de PIB por ano e tem um mercado sedento de compra de manufaturados brasileiros.

            Prioridade absoluta ao mercado interno e ao mercado sul-americano. Aumento de salários. Aos salários temos que ver incorporada a produtividade da nossa indústria. Sem salário, não há consumo e não adianta haver produção. E vamos acabar com aquela bobagem do Fernando Henrique Cardoso: exportar ou morrer; exportar e exportar. Exportar para quem, com os Estados Unidos e a Europa quebrados, desesperadamente procurando mercado para os seus manufaturados, seus produtos industrializados?

            Inovação tecnológica. Eu me lembro dos Estados Unidos com o seu tratado das manufaturas, de Alexander Hamilton, no governo de George Washington, enfrentando o liberalismo do Adam Smith e propondo a modernização, propondo a inovação, propondo a abertura do mercado interno e se recusando ao que queria dele a Inglaterra e a Companhia das Índias, que era um produtor de mão de obra barata e de matéria-prima a baixo preço.

            Inovação tecnológica e integração latino-americana. A desindustrialização não é episódica, não é resultado de uma crise passageira, segue os cânones mais caros do neoliberalismo. Enquanto não for combatido, a destruição industrial vai continuar.

            Mas, de repente, nossa Presidente Dilma altera seu discurso, em uma reunião com empresários, e declara que não vai tomar medidas protecionistas e que elas são medidas desavisadas. Desavisado, Presidente Dilma, é o liberalismo econômico de Adam Smith, derrotado no planeta Terra há décadas e nunca praticado pelos países que se desenvolveram no mundo! Avisado é o governo que cuida de seu povo, de sua indústria e de seu processo de desenvolvimento.

            Dar uma aliviada na linha branca? Dar uma aliviada no IPI dos automóveis? Depois de amanhã, nos brinquedos que estão desaparecendo no Brasil? As fábricas de brinquedos desapareceram, e alguns industriais se transformam hoje em representantes comerciais da China, ganhando fortunas, mas prejudicando o País na geração de empregos e no desenvolvimento.

            A indústria brasileira de verdade não quer alívios, quer e precisa, definitivamente, de uma política industrial de longo prazo, uma política de governo, uma política que foi abandonada desde os anos 80 e que nos levou a esta tragédia de produzirmos apenas 15%, industrialmente, do que produzem a Tailândia, a Malásia, a Coreia do Sul e a China, em uma regressão absurda à primarização de nossa economia.

            Sustentarmo-nos sobre exportação de commodities é um risco brutal. Não é um risco brutal; é risco certo! Um dia a casa cai... Sem indústrias e com a queda da demanda de grãos e minérios, para aonde nós iremos? E, de repente, o que vemos? A Receita Federal se opor à formalização do trabalho das empregadas domésticas com um argumento que pode ser traduzido, cruamente, desta forma: “a escravização aumenta a arrecadação”. Então, vamos regredir, aumentar a jornada dos trabalhadores, eliminar as garantias sociais. O Brasil, no discurso da Presidente, está em uma linha correta. Agora, a prática é muito ruim.

            E eu repito aqui: apoio o que tem dito a Presidente e o nosso Ministro da Fazenda. Apoio o dito, mas não apoio o feito. O feito é tíbio, o feito é fraco, o feito não traduz uma política consequente de industrialização, política de comércio, política trabalhista, política social. O Brasil não pode ser administrado com a visão do Banco Central.

            Senadora Vanessa, eu estava falando aqui - V. Exª chegou agora - sobre essa pérola que a Receita Federal levou ao meu gabinete esta manhã, sobre o meu projeto de isenção do imposto de renda sobre o valor pago às empregadas domésticas. Eles dizem, nada mais nada menos, que a escravização da empregada doméstica é boa para a Receita. Eu vou ler, uma vez que V. Exª não estava no plenário quando me referi a isso no início da minha intervenção. A pérola do Sr. Fabrício Bacelar Liparizi, Roberto Name Ribeiro e Othoniel Lucas de Sousa Júnior. Nenhuma demonstração consequente de prejuízos, absoluta visão holística do País e da economia. Senadora, escute com atenção o que eles dizem: “Caso a medida em análise incentive de maneira inequívoca a formalização do mercado de empregados domésticos, estima-se que, no limite, todos os empregados...

(Interrupção do som.)

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - ...cofres públicos. Nesse cenário, baseando-se nos estudos de grau de formalização do mercado de empregados domésticos do Ipea, estima-se que a renúncia fiscal envolvida poderia atingir os valores de aproximadamente 15,3 bilhões, em 2012; 16,9 bilhões, em 2013; e 18,6 bilhões, em 2014; ao envolver todo o mercado de empregados domésticos.

            Isso significa que eles estão defendendo a escravização da empregada doméstica e têm uma visão estreita, limitada, porque não são capazes de perceber que o salário da empregada doméstica, as suas garantias sociais, o seu seguro de saúde, mas principalmente o salário, são uma injeção direta na economia; vão transformar-se em compra de bens duráveis, em compra da casa própria, material de construção, gerando lucro nas empresas formalizadas e, portanto, aumentando de forma significativa a arrecadação da Receita Federal no País. Têm uma visão cega, uma visão tecnocrática pobre, uma visão depreciável de tudo isso. Eles ainda assinam isso e falam em nome do Governo, da nossa Presidenta Dilma, do nosso Governo.

            A Presidenta Dilma, que fala do período em que as mulheres ocupam espaço, tem pessoas no seu Governo, falando em seu nome, que querem a manutenção da escravização da empregada doméstica no País.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) - V. Exª me concede...

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Seu chefe de gabinete já me assegurou que V. Exª mantém o seu relatório e nós vamos aprová-lo, espero eu, pela unanimidade da comissão de economia, porque é bom para o fim da escravidão das mulheres que trabalham em serviços domésticos no Brasil. Sem a menor sombra de dúvida, vai multiplicar, pelo menos pelo dobro desses tolos números colocados aqui, a arrecadação da União.

            V. Exª com a palavra.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) - Agradeço V. Exª e cumprimento-o, Senador Requião, pelo pronunciamento que não abordou somente a questão das empregadas domésticas, mas a política econômica e a política social no Brasil. Eu penso que, no Brasil, temos muita responsabilidade fiscal, mas precisamos caminhar no sentido de entendermos que a responsabilidade social é muito importante. Penso que esse é o desejo da própria Presidenta Dilma, que disse que o importante numa nação não é apenas que ela se desenvolva, mas que ela se desenvolva melhorando a qualidade de vida das pessoas. V. Exª tem razão quando fala que o salário das empregadas domésticas vai ajudar no processo de desenvolvimento nacional.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Efeito multiplicador.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) - O exemplo está aí. O Brasil vem diminuindo a pobreza, não há dúvida. Nós criticamos, porque achamos que o processo de crescimento econômico tem de ser mais célere do que é hoje. Precisamos crescer para além dos 2,7%. Precisamos de um investimento de, no mínimo, 25% do valor do nosso Produto Interno Bruto - PIB. Nós queremos isso e continuamos a lutar por isso. Entretanto, essa política, mesmo que tímida ainda, tem tirado milhares de brasileiros da linha de pobreza, levando-os à classe média. Tudo indica, Senador Requião...

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Por quanto tempo, Senadora, se medidas concretas não forem tomadas?

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) - Os dados mostram - e ninguém contesta - que não foram apenas os programas sociais, como Bolsa Família, mas o aumento do salário mínimo. Quando conseguirmos formalizar... E a formalização tem cumprido um grande papel. Então, sinceramente, Senador Requião, o Governo não é de um ministério; o Governo é de vários ministérios. Pérolas, dependendo do assunto, os ministérios provocam. Agora, enquanto o ministério diz que vai provocar essa formalização que eles acham exagerada, o Ministério do Trabalho e o Ministério da Previdência Social lutam para que isso aconteça, como nós, Senador Requião. Então, quero dizer que é com muita dedicação que eu trabalho em cima do seu projeto. Eu já apresentei meu parecer favorável. Eu apenas gostaria de discutir com V. Exª algumas questões, porque o nosso objetivo, o seu objetivo, o meu objetivo, o objetivo das trabalhadoras e da própria Presidenta Dilma, não tenho dúvida nenhuma, é a formalização. E nós precisamos mostrar, provar ao Ministério da Fazenda, à Receita Federal do Brasil que é possível fazer isso, sim, Senador Requião. É possível! O projeto de minha autoria que diminui a contribuição da Previdência Social nós já aprovamos - diminui de 11% para 5%. Vamos aprovar o projeto em que V. Exª sugere ampliar a base de dedução do Imposto de Renda para aquelas famílias que registram as suas empregadas domésticas e/ou empregados. Então, eu quero parabenizar V. Exª, Senador, e dizer que nós não só queremos aprovar um projeto aqui; nós queremos aprovar um projeto aqui, queremos que o seu projeto seja aprovado pela Câmara dos Deputados e queremos que a Presidente Dilma...

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Sancione.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) -... o sancione. Por isso, Senador Requião, vamos dialogar, vamos chamar a Previdência Social para cá, vamos chamar a Secretaria Especial de Mulheres, vamos chamar...

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Senadora...

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) - ...o Ministério do Trabalho, e vamos ver como eles nos dão razão, dão razão a V. Exª, Senador Requião.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Senadora, perdoe-me a franqueza, mas acho que tudo isso é um retardamento do processo.

            O representante da Receita Federal esteve no meu gabinete hoje e começou com uma conversa dura; e duro fui eu com ele. A conversa terminou com ele dizendo que não tinham levado em conta a visão holística da economia globalmente, a visão econômica do projeto e cumprimentando-me pelo projeto. Ou seja, os argumentos não eram consistentes a ponto de me demover, mas mudaram a opinião, a meu ver, do assessor.

            Eu acho que nós temos de votar o projeto de uma vez por todas, porque esse retardamento não vai levar a lugar algum. Convoca-se uma audiência pública, e ela não acontece; a audiência pública susta a tramitação, ela causa sobrestamento a qualquer encaminhamento possível no Senado. E não há razão!

            A Receita não apresentou nenhuma razão para rejeitar o projeto, e eu apresentei todas as razões, demonstrando o efeito multiplicador na economia. Dei o exemplo do Paraná. V. Exª não estava aqui, mas políticas de valorização do salário no Paraná nos levaram ao crescimento de 55,7% no período em que fui Governador, o dobro do crescimento médio do Brasil. Em segundo lugar, ficou São Paulo, com 34%; e, em terceiro, Minas Gerais, com 32%.

            Não é possível que a visão caolha de três funcionários da Receita Federal impeça o avanço, a legalização e a formalização do trabalho dos empregados domésticos no Brasil! O resto é escravização!

            Eles têm a petulância de dizer, nesse parágrafo que eu acabei de ler para o seu conhecimento, que a escravização das empregadas domésticas aumenta a arrecadação da receita.

            É uma visão caolha; não é a visão do nosso Governo. Não foi por isso que estivemos com o Lula por quatro vezes e entramos pesadamente na campanha da nossa Presidenta Dilma.

            Eu solicitaria a V. Exª que não fizesse tantos pedidos de audiência, porque, se nós aprovamos o...

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM. Fora do microfone.) - Nenhum.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Mas anunciou.

            Nós aprovamos, na Comissão de Assuntos Sociais, contra a posição da Receita, que era a mesma de agora, por unanimidade, e que a Dilma decida se o Governo dela é o do fim da escravização das domésticas ou não é. Mas eu fico indignado com o tipo de oposição que a Receita faz a um projeto como esse.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) - Senador, nenhum pedido de audiência pública. Eu quero ouvir a opinião, também, do Ministério do Trabalho, da Secretaria Especial dos Direitos da Mulher. Para isso, nós não precisamos ter nenhuma audiência pública. Podemos fazer o diálogo informalmente, V. Exª, eu e os representantes desses Ministérios, até amanhã, Senador Requião.

            O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Amanhã cedo; está marcado, então.

            Presidente, obrigado pela tolerância do tempo. Mas, veja, é de causar indignação, e eu vivi isso como Governador do Paraná.

            Os meus fiscalistas se opunham a qualquer medida de redução de imposto dos pequenos, a qualquer aumento dos trabalhadores, também por influência do capital produtivo, mas desinformado.

            São capitalistas e industriais que ainda não perceberam que, se não houver salário, eles não vão poder produzir nada, porque não terão compradores; que a economia tem de ser vista holisticamente, como um todo, e que só assim o Brasil pode avançar, e não com tibieza e muito menos com uma bancada de base do Governo, e insisto, à qual eu pertenço, atendendo à irracionalidade de três tecnocratas de terceira categoria da Receita Federal.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/03/2012 - Página 8217