Discurso durante a 43ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a impunidade no Brasil.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA NACIONAL, JUDICIARIO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Preocupação com a impunidade no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2012 - Página 8051
Assunto
Outros > POLITICA NACIONAL, JUDICIARIO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • APREENSÃO, ORADOR, IMPUNIDADE, RELAÇÃO, POLITICA, PAIS, FATO, DEMORA, PROCESSO, JULGAMENTO, ACUSADO, RESULTADO, PRESCRIÇÃO, DENUNCIA, CRIME.
  • COMENTARIO, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, RELAÇÃO, PROCESSO, LICITAÇÃO, MOTIVO, FRAUDE, CORRUPÇÃO, ATO PROCESSUAL.
  • SUGESTÃO, ORADOR, CRIAÇÃO, PROJETO DE LEI, RELAÇÃO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, REFERENCIA, PROCESSO, LICITAÇÃO, TRANSMISSÃO, TEMPO, REAL, ATO PROCESSUAL, OBJETIVO, POSSIBILIDADE, SOCIEDADE, CONTRIBUINTE, CONTROLE.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, ouvintes da Rádio Senado e da TV Senado, preocupa-me muito uma instituição criada neste País chamada impunidade, principalmente quando se investiga o andar de cima da criminalidade. Em geral, terminam impunes. Por isso, volto a lembrar, aqui da tribuna do Senado, que já se passou um ano e seis meses desde a Operação Mãos Limpas.

            Exatamente no dia 10 de setembro de 2010, centenas de policiais federais e dezenas de viaturas tomaram as ruas de Macapá e prenderam as principais autoridades do Estado: o Governador Pedro Paulo, a figura nº 1 do Estado; o ex-governador, que acabava de deixar o governo, depois de sete anos e três meses, o ex-Governador Waldez Góes; a primeira-dama, Marília Góes; o Presidente do Tribunal de Contas do Estado, o Conselheiro Júlio Miranda; o Prefeito de Macapá, Roberto Góes; o Secretário de Segurança.

            A cúpula política do Estado toda foi parar na cadeia naquele 10 de setembro. E um ano e meio depois, a sociedade do Amapá e do Brasil ainda aguarda o resultado dos inquéritos, até porque correm em segredo de justiça; o público não tem acesso ao que foi investigado, às provas ali contidas. E a preocupação é com a prescrição desses crimes.

            É assim que a impunidade se implantou no País. Há demora nos processos investigatórios; depois, no julgamento, termina-se levando à prescrição dos crimes e à impunidade.

            Por isso, lembro, mais uma vez, ao Ministério Público Federal e ao STJ que é necessário agilizar esses processos, até para que se saiba exatamente quem cometeu os crimes e aqueles que eventualmente não têm nada a ver tenham seu nome limpo nesse processo.

            São vários inquéritos. Foi uma megaoperação, talvez a maior operação da Polícia Federal em todos os tempos, neste País.

            Dessa operação resultaram vários inquéritos. Entre outros, gostaria de destacar aqui o inquérito que investiga a Assembleia Legislativa do Amapá. Sabe-se que alguns Deputados daquela Casa recebiam por diária de viagem... Em seis meses ou um pouco menos do que isso, alguns Deputados receberam mais de R$400 mil em diárias. Há, evidentemente, muitas informações contidas nesse inquérito que envolve a Assembleia Legislativa do Amapá.

            Na residência de um dos deputados, Deputado Edinho Duarte, que foi preso no dia da operação, estavam R$250 mil. Ora, mesmo sendo investigado, o Presidente da Assembleia Legislativa, Deputado Moisés Souza, tomou uma decisão, junto com sua Mesa, de alterar os valores da verba indenizatória, que já era altíssima. Cada Deputado, até junho do ano passado, se não me engano, dispunha de R$50 mil para as despesas do mandato e posterior prestação de contas.

            Nós, Senadores, temos R$15 mil de verba indenizatória. Quinze mil reais é tudo o que temos e o que podemos gastar, e depois temos que prestar contas. Os Deputados do Amapá, até junho do ano passado, dispunham de R$50 mil, mas o Presidente Moisés Souza e a sua Mesa elevaram para R$100 mil!

            Isso realmente nos enche de vergonha. As pessoas de bem no Amapá não aceitam esse tipo de situação. Por isso trago a esta tribuna para o Brasil tomar conhecimento. E faço isso, em primeiro lugar, para exigir resposta da Justiça. Em segundo lugar, para que a sociedade saiba o que está sendo feito com o seu imposto.

            A carga tributária do Brasil corresponde a 34%, 35% de tudo aquilo que produzimos. Janeiro, fevereiro, março, abril até 26 de maio do ano passado, tudo o que ganhamos foi para as mãos do Estado. Não é justo que essa energia coletiva, esse esforço coletivo seja concentrado nas mãos de meia dúzia. Que privilégio é esse? Que casta de privilegiados é essa que se julga com direito de se apropriar de recursos públicos dessa forma?

            Não satisfeito, o Presidente da Assembleia Legislativa alterou o orçamento de 2012. E fiz questão de fazer um levantamento comparativo por Estado, comparando os ex-territórios do Acre, Amapá, Rondônia e Roraima.

            O Acre, que tem uma população de 746.375 habitantes, gastou com o Legislativo - aí incluído o Tribunal de Contas -, em 2009, R$114 milhões; o Amapá, com uma população um pouco menor, com 684 mil habitantes, gastou R$136 milhões; Rondônia, com uma população de 1,5 milhão de habitantes, gastou R$162 milhões; e Roraima, com uma população de 460 mil habitantes, gastou R$128 milhões. Há um desequilíbrio, porque as assembleias legislativas desses Estados são exatamente iguais, cada uma delas tem 24 Deputados. Isso foi em 2009.

            Em 2010, o Amapá - nem vou citar o Acre, que cresceu de R$114 milhões para R$116 milhões, R$2 milhões apenas de 2009 para 2010 - saiu de R$136 milhões para R$184 milhões, ultrapassando Rondônia, que tem 1,5 milhão de habitantes.

            Agora, em relação à arrecadação desses Estados, vou citar o caso do Amapá. A arrecadação do Amapá cresceu, de 2009 para 2010, apenas 3,72%. No entanto, os gastos com o Legislativo cresceram 26,7%, ou seja, uma parcela significativa de recursos que poderiam melhorar a infraestrutura de saneamento, de água, de energia do Estado está sendo gasta na manutenção do Poder Legislativo.

            Esses dados mostram que há um descontrole nos gastos dessas assembleias. Temos aqui o caso do Amapá e de Roraima, que são muito emblemáticos. No mesmo período, Roraima sai de R$128 milhões para R$158 milhões.

            Portanto, esses valores repassados à Assembleia Legislativa, além de serem absolutamente exagerados - como é que uma assembleia de 24 Deputados pode justificar gastos mensais da ordem de R$13 milhões? -, o Presidente da Assembleia deixa de cumprir uma lei fundamental, que é a lei da transparência. A Lei Complementar nº 131, de 27 de maio de 2009, no art. 48, “libera ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, as informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público”.

            Quer dizer o seguinte: todas as receitas e todas as despesas devem obrigatoriamente ser colocadas claramente diante dos olhos do contribuinte, mas o Presidente da Assembleia Legislativa do Amapá não cumpre a Lei e não explica com o que gasta essa fábula. Isso evidentemente provoca uma grande preocupação a todos nós.

            A falta de prestação de contas, evidentemente, cria uma enorme desconfiança. Também há investigações da Polícia Federal na Assembleia Legislativa, envolvendo alguns Deputados. Não são todos, é bom que se esclareça. Os Deputados envolvidos nessa investigação são apenas sete a oito dos que compõem hoje a Assembleia Legislativa do Amapá. Mas é fundamental para a sociedade como um todo que saibamos o final dessas investigações e que tenhamos o resultado da Justiça.

            Ontem, fiz referência aqui a um projeto de lei para dar transparência aos processos licitatórios, pois vimos, no programa Fantástico, como as empresas fazem os conluios para ganhar, digamos, as licitações ou os contratos. Há uma reação enorme no País, inclusive a Presidenta Dilma determinou investigações profundas, e houve debates aqui no Senado.

            Estou trazendo um projeto de lei para revelar esse segredo de quatro paredes ao conjunto da sociedade. Não é possível mais que as comissões de licitação sejam feitas em salas fechadas, é preciso colocar câmeras a fim de transmitir em tempo real todo o processo licitatório. Além do que, é necessário também, para garantir a concorrência, que não se revelem as empresas que compram os editais, porque, na hora em que se revelam as empresas que compram os editais, é muito mais fácil fazer o conluio e viciar a licitação. Então, isso já está no projeto de lei que estamos elaborando.

            Outra questão fundamental é que, assim como hoje cada ente público reserva na Internet uma janela para a transparência, dentro dessa janela vamos criar a obrigatoriedade de que haja uma janela de transparência para as licitações públicas. 

            Todo processo de licitação pública deverá ser revelado em tempo real para o conjunto da sociedade. Para esse projeto de lei peço sugestões e contribuições daqueles que nos ouvem e nos veem, para que possamos fazê-lo tramitar com celeridade nesta Casa e dar transparência a uma questão emblemática, fundamental, que é o processo licitatório. Falta transparência no processo licitatório. Venho pensando nisso há muito tempo, e estamos formatando um projeto de lei para dar transparência aos processos licitatórios de compras e contratações de serviços públicos.

            Srª Presidenta, encerro esta minha participação na tribuna conclamando a sociedade brasileira - falei dos estudantes, da UNE, dos diretórios acadêmicos das universidades - a fazer o acompanhamento dos gastos públicos. Nós demos um salto importante. Hoje, todas as universidades públicas têm seu portal de transparência na Controladoria-Geral da República. Você pode entrar no Ministério da Educação, entrar na sua universidade e saber em detalhes dos gastos da sua universidade. É fundamental que os estudantes se mobilizem em suas faculdades e criem comitês de transparência, criem grupos para fazer o acompanhamento dos gastos. Dessa forma, vamos fazer a prevenção, porque o que aparece no portal da transparência são as notas de empenho. A nota de empenho é um compromisso de compra, ainda não foi feita a compra, ainda não foi paga. Então, esses comitês de transparência, que poderão ser organizados nas universidades públicas, nas repartições públicas e nas prefeituras podem evitar, sim, podem controlar a corrupção em nosso País.

            É fato que há uma desconfiança generalizada em relação às instituições públicas. Todas as pesquisas, todos os estudos mostram que os brasileiros não confiam em suas instituições. Instituições criadas para fiscalizar o uso correto do dinheiro estão sob desconfiança. Portanto, é hora de a sociedade colocar a mão na massa e aproveitar essas informações que estão disponíveis nos portais.

            Existem instituições que resistem à aplicação da lei, como é o caso que acabei de mencionar, da Assembleia Legislativa do Amapá. Estou encaminhando documentos ao Tribunal de Contas do Estado e ao Presidente da Assembleia Legislativa exigindo o cumprimento da lei.

            Neste País, precisamos, definitivamente, acabar com essa história de que tem lei que pega e tem lei que não pega.

            A Lei da Transparência é uma exigência da sociedade e tem que pegar.

            Obrigado, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2012 - Página 8051