Discurso durante a 47ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a Campanha da Fraternidade 2012, cujo tema é “Fraternidade e Saúde Pública”; e outro assunto.

Autor
Paulo Davim (PV - Partido Verde/RN)
Nome completo: Paulo Roberto Davim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA, SAUDE. SAUDE.:
  • Considerações sobre a Campanha da Fraternidade 2012, cujo tema é “Fraternidade e Saúde Pública”; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 29/03/2012 - Página 8499
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA, SAUDE. SAUDE.
Indexação
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, EDIÇÃO, CAMPANHA DA FRATERNIDADE, OBJETIVO, PROMOÇÃO, DEBATE, RELAÇÃO, PROBLEMA, SAUDE PUBLICA, PAIS, COMENTARIO, ORADOR, REFERENCIA, CONTRIBUIÇÃO, IGREJA, SETOR, SAUDE.
  • REGISTRO, REPUDIO, ORADOR, RELAÇÃO, CORRUPÇÃO, SETOR, SAUDE, COMENTARIO, REFERENCIA, APRESENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, SENADO, AUTORIA, SENADOR, OBJETIVO, TRANSFORMAÇÃO, FATO, DESVIO, DINHEIRO, SAUDE PUBLICA, CRIME HEDIONDO.

            O SR. PAULO DAVIM (Bloco/PV - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, realizada desde o ano de 1964, quando teve início em Natal, capital do Rio Grande do Norte, por iniciativa de Dom Eugênio de Araujo Sales, a Campanha da Fraternidade chega agora à sua 49ª edição, abordando, desta feita, o tema “A Fraternidade e a Saúde Pública”, com o lema “Que a saúde se difunda sobre a Terra”. Na última década, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tem dado ênfase especial aos temas voltados para os problemas sociais no Brasil.

            Tal como sempre ocorre, o tema selecionado pela CNBB é de grande relevância e atualidade, consistindo o atendimento de qualidade à saúde uma das demandas mais sentidas de nossa população. Ao eleger esse tema para a Campanha da Fraternidade deste ano, a Igreja busca sensibilizar todos sobre a dura realidade daqueles nossos cidadãos que não têm acesso à assistência de saúde pública condizente com suas necessidades e dignidade. Trata-se, com efeito, de uma situação com a qual não nos podemos conformar, representando, como diz o Texto-Base da Campanha da Fraternidade, “uma realidade que clama por ações transformadoras”.

            Ao lançar luz sobre o difícil quadro vivido pela saúde pública em nosso País, a Igreja não apenas busca instigar seus fiéis “a serem consolo na doença, na dor, no sofrimento e na morte”, mas também exige que os pobres tenham atendimento digno nessa área.

            Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o Brasil, indiscutivelmente, conquistou significativos avanços no campo da saúde pública ao longo das últimas décadas, merecendo destaque o aumento da expectativa de vida da população, a drástica redução da mortalidade infantil, a erradicação de algumas doenças infecto-parasitárias, a eficácia das campanhas de vacinação e a disponibilidade para todos os pacientes do tratamento da Aids. Essas nossas conquistas têm, inclusive, merecido o reconhecimento e os elogios de organismos internacionais como a Organização Mundial de Saúde (OMS).

            Persistem ainda, contudo, severas deficiências, representando uma verdadeira chaga na nossa realidade social. Nesse contexto, a Campanha da Fraternidade de 2012 serve para sensibilizar todos sobre a dramática situação daqueles brasileiros que enfrentam as longas filas para o atendimento à saúde, a demorada espera para a realização de exames, a falta de vagas nos hospitais públicos, a indisponibilidade de medicamentos indispensáveis à manutenção da vida, com o agravante da má remuneração paga aos servidores dessa área. A Campanha denuncia também a situação em que se encontra a saúde indígena, dos quilombolas e da população que vive nas regiões mais afastadas.

            A Igreja tem a correta compreensão de que os problemas verificados na área da saúde são reflexos do contexto mais amplo vivido pelo País, submetido à economia de mercado, atualmente globalizada, cuja lógica não se orienta pelos valores ético-morais e sociais. É somente nessa perspectiva que se pode entender -jamais aceitar! - o corte de R$5 bilhões da área da saúde realizado pelo Poder Executivo no Orçamento-Geral da União para o corrente ano, o que ainda paira sobre todos nós, com um laivo de indignação.

            Srª Presidente, ao longo das últimas décadas, o conceito de atenção à saúde experimentou importante evolução, deixando ela de ser considerada uma questão de caridade, para ser vista como uma questão de direito. Foi essa nova compreensão que inspirou a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), assentado em elevados princípios éticos, como o da universalidade, significando o direito de todos, indiscriminadamente, ao atendimento de qualidade. A conclusão do Texto-Base da Campanha da Fraternidade lamenta que esse direito esteja sendo “transformado em negócio”, conforme uma lógica de mercado desprovida de valores éticos.

            A Igreja tem dado, ao longo dos anos, extraordinárias contribuições à saúde pública no Brasil. Para citar apenas um exemplo, menciono que o índice de mortalidade infantil entre as crianças assistidas pela Pastoral da Criança foi, em 2010, menos da metade da média nacional.

            Alicerçada não apenas no seu arcabouço doutrinário, mas também na sua longa experiência prática de trabalho social junto à população carente, a Igreja sabe que, além da caridade na atenção aos enfermos, é necessário empenho por mudanças nas estruturas que geram enfermidades e mortes. E lembra a Igreja que tais estruturas tornam-se visíveis nas situações de exclusão, na falta de condições adequadas e dignas de vida e no descaso, em muitas circunstâncias, no atendimento oferecido aos usuários do sistema público de saúde.

            Aproveitemos todos, portanto, a oportunidade criada pela Campanha da Fraternidade de 2012 para fazermos uma reflexão sobre o atual quadro, mas, sobretudo, para fazer valer o seu lema: “Que a saúde se difunda sobre a Terra”.

            A iniciativa da CNBB soma-se aos clamores, aos milhões de vozes que se levantam na defesa do patrimônio da população brasileira, que é o Sistema Único de Saúde. Quão lamentável é assistir a cenas grosseiras e absurdas, que deixam qualquer um de nós indignado! Há pouco, num programa de televisão, foi divulgado como pessoas inescrupulosas transformaram a saúde pública num negócio. Lamento profundamente que a impunidade teime em existir no setor de saúde. Continuo indignado com essa prática, ao ponto de apresentar aqui, há dois meses, projeto de lei de nossa autoria propondo a transformação desses crimes de desvios de recursos da saúde em crimes hediondos.

            Mas o que preocupa sobremaneira é que demonstrações como essas depõem contra o movimento nacional, que conta com o apoio da CNBB, que reconhece o investimento insuficiente de recursos públicos na saúde. O Brasil ainda aplica 3,7% do seu Produto Interno Bruto (PIB) na saúde, e não nos podemos deixar levar por essas práticas inaceitáveis com o argumento de que não faltam recursos para a saúde. Faltam recursos, sim. Precisamos estancar essa sangria desatada, precisamos moralizar a gestão pública de saúde no Brasil, mas também precisamos reconhecer que existe, sim, deficiência de recursos para o financiamento do sistema.

            É óbvio, é claro que, se não houvesse esses desvios, se não houvesse essa prática corrupta e inescrupulosa, sobrariam mais recursos para a saúde. Não obstante termos cuidado em coibir esses desvios, precisamos encarar com realismo esse problema de subfinanciamento do sistema da saúde pública no Brasil.

            Era o que tinha a dizer, Srª Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/03/2012 - Página 8499