Pronunciamento de Mozarildo Cavalcanti em 10/04/2012
Pela Liderança durante a 55ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Reflexões sobre a distribuição desigual dos médicos nos municípios brasileiros, tema de matéria veiculada no jornal O Globo do último domingo, com apelo ao Ministério de Saúde para organizar uma frente de luta com vistas à solução da questão.
- Autor
- Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
- Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Pela Liderança
- Resumo por assunto
-
SAUDE.
EXERCICIO PROFISSIONAL.
ENSINO SUPERIOR.:
- Reflexões sobre a distribuição desigual dos médicos nos municípios brasileiros, tema de matéria veiculada no jornal O Globo do último domingo, com apelo ao Ministério de Saúde para organizar uma frente de luta com vistas à solução da questão.
- Aparteantes
- Casildo Maldaner.
- Publicação
- Publicação no DSF de 11/04/2012 - Página 11464
- Assunto
- Outros > SAUDE. EXERCICIO PROFISSIONAL. ENSINO SUPERIOR.
- Indexação
-
- SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DOCUMENTO, CONSELHO FEDERAL, MEDICINA, ASSUNTO, ANALISE, INSUCESSO, PROGRAMA DE GOVERNO, DISTRIBUIÇÃO, MEDICO, INTERIOR, BRASIL, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO CARENTE.
- NECESSIDADE, POLITICA, SETOR PUBLICO, VALORIZAÇÃO, TRABALHADOR, SAUDE, APOIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, SENADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), ASSUNTO, TRANSFORMAÇÃO, PROFISSÃO, AREA, SAUDE PUBLICA, CARREIRA, ESTADO.
- SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, OFICIO, AUTORIA, CONSELHO FEDERAL, MEDICINA, CRITICA, SIMPLIFICAÇÃO, EXAME, AUTOMAÇÃO, REVALIDAÇÃO, DIPLOMA, ESTRANGEIRO.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, há um tema que é recorrente, aliás há muitos anos, que é o tema da distribuição desigual dos médicos no Brasil.
No domingo passado, dia 8, o jornal O Globo publicou, como matéria de capa: “Programas falham e governo não atrai médico para áreas pobres do Brasil”, em que diz que interesse por 7.193 vagas oferecidas pelo governo foi de apenas 20%. Isto é, 20% apenas se interessaram por essas vagas.
O jornal tem uma longa e extensa reportagem, página inteira, pág. 3, sob título: “Procuram-se médicos”.
Sr. Presidente, como médico, fico pasmo, indignado e chateado de ver que é um tema que vem se discutindo há tanto tempo, desde o tempo do governo Fernando Henrique Cardoso, que é a questão clara e até matemática de o Brasil ter mais médicos do que o necessário, considerando a proporção estabelecida pela Organização Mundial da Saúde, que é de um médico para mil habitantes.
No entanto, já é sabido por todos que os médicos estão nas capitais ou nas cidades médias e grandes.
Até nas grandes cidades, em suas periferias, falta médicos. A toda hora, nós estamos vendo na televisão pessoas nas salas de espera ou nos corredores, à míngua, em busca de um atendimento médico.
Pergunta-se: a culpa é da falta de médicos ou a culpa é da falta de uma política de valorização da profissão do médico? Isto é, o médico, que existe - repito - em número suficiente, não tem estímulo para ir, realmente, para o interior. Mas não é porque, como diz à matéria, a prefeitura xis de um município do interior paga três vezes mais do que paga, por exemplo, uma capital grande.
Acontece que, lá no município xis do interior, ele vai para lá e não tem sequer condições de trabalhar. Vai se expor a trabalhar botando em risco a vida dos pacientes. Isso é um fato claro e notório para quem quer que seja, de qualquer Estado.
E aí se verifica, neste mapa aqui, que o Brasil é o 33º país do mundo em distribuição ou má distribuição dos médicos. Existe uma correlação de 1,95 médicos por mil habitantes no Brasil. E o pior é que, se olharmos o mapa que o jornal publica, vamos ver que o adensamento dos médicos está, justamente, nas regiões do centro-sul do País. Nas regiões Norte e Nordeste, há uma carência absoluta. Mas, repito, mesmo numa grande cidade como São Paulo ou num grande Estado como São Paulo, existem lugares onde não há médicos; no Rio de Janeiro, em Minas Gerais.
E aí, como tudo na medicina tem diagnóstico, qual é o tratamento? Qual é a forma de fazer isso? Como resolver isso?
Eu disse, um dia desses, ao Ministro da Saúde - pessoa que admiro muito, competente, bem intencionado - que ele fizesse um trabalho preliminar de chamar os médicos que são parlamentares, Deputados Federais e Senadores, outros profissionais da área de saúde. Porque aqui está se falando de médico, mas também falta enfermeiro, falta atendente de enfermagem, falta técnico de enfermagem, falta profissional de saúde, falta odontólogo. Mas, na verdade, fala-se de médico porque é, digamos assim, o que o povo mais reclama.
Temos aqui um projeto de autoria do Senador Paulo Davim, transformando a profissão de médico em carreira típica de Estado, como é o Ministério Público, como é o Poder Judiciário, como é a Polícia Federal.
Será que a saúde é menos importante que essas outras áreas? Será que a condição de ter garantia de tratamento digno é menos importante do que nessas outras áreas? Não! Não é, com certeza. E é preciso, portanto, que nós mudemos essa qualidade.
Agora, decisões apressadas, tipo vamos revalidar o diploma de pessoas que se formam em países que não têm a grade curricular do Brasil - nem estou dizendo que não tenha a qualidade de ensino... Chega aqui e, no outro dia, é revalidado! A revalidação do diploma é um fato. Eu recebi uma correspondência do Conselho Federal de Medicina que fala desse tema. É uma preocupação constante. E, mais ainda, eu tenho um documento aqui, em que 17 países no mundo se manifestam contra a revalidação automática de diplomas.
Não vamos resolver o problema, portanto, da falta de médicos, abrindo as portas simplesmente para que qualquer médico tenha o seu diploma revalidado sem a devida cautela.
E aqui, em outro documento chamado Demografia Médica no Brasil, consta um levantamento feito pelo Conselho Federal de Medicina e pelo Conselho de Medicina do Estado de São Paulo e, nele, nós temos a distribuição por região.
Se nós olharmos, por exemplo, onde estão os especialistas, veremos que 66,12% estão na região Sul; 53,35%, na região Sudeste; 62%, na região Centro-Oeste. Aí vem a região Nordeste, cai para 49%; região Norte, 45%.
Em relação aos generalistas, a situação é a mesma: maior concentração na região Sudeste. Depois, região Sul e região Norte também.
Na correlação, fica da seguinte maneira: região Sul, 1,95 médicos para mil habitantes; região Centro-Oeste, 1,66; região Sudeste, 1,16; e região Nordeste, 0,96 - quer dizer, não tem sequer um médico para mil habitantes. E, na região Norte, 0,83 para mil habitantes, menos do que na região Nordeste.
Sr. Presidente, tive a felicidade, tendo sido, inclusive, o autor da lei que criou a Universidade Federal de Roraima, de ser um dos elaboradores do projeto de criação do curso de Medicina na nossa Universidade, que levou um tempão para ser autorizado e já deve ter formado - eu não tenho aqui o número mais preciso - mais de dez turmas. No Acre, inclusive, veio depois o curso de Medicina, só havia em Belém e em Manaus. O que estamos vendo hoje? Uma mudança desse perfil em regiões onde há uma faculdade de Medicina.
Então, não precisamos inventar a roda. Nós precisamos é pegar esses projetos que já estão aqui no Senado, na Câmara, mais as idéias e as iniciativas que o Governo Federal já tomou e consolidarmos - e disse isso há poucos dias em um pronunciamento - um conjunto de propostas que, de uma vez por todas, acabe com essa questão, com essa situação dramática de vermos o Brasil estar apenas acima da Venezuela, da Turquia, do Equador, da China, que tem uma superpopulação, da África do Sul e da Índia.
É muito triste, Senador Aníbal, não termos condições de ter médicos suficientes para atender a população. Não termos médicos suficientes em relação à distribuição geográfica, à demografia, não em relação à quantidade de médicos.
Esse é um tema muito delicado e que angustia. Sei que a Presidente Dilma, junto com o Ministro da Saúde, está buscando encontrar fórmulas para, de fato, resolver essa questão. Acho que é fundamental que isso aconteça, mas é preciso acelerar. Porque, a cada dia, o que vemos? Os hospitais públicos estão caóticos; hospital que atende planos de saúde, também; e os hospitais particulares, no Brasil, são pouquíssimos os que se pode dizer que têm um nível de excelência.
Então, é preciso, realmente, que haja uma mudança rápida, que um conjunto de medidas seja aprovado rapidamente e que essas medidas sejam colocadas em prática, havendo um acompanhamento mais de perto por parte dos órgãos responsáveis pela saúde no País.
Tenho certeza que, querendo, se faz, porque - repito - na Medicina, nós aprendemos que o difícil é fazer o diagnóstico. Feito o diagnóstico, o tratamento não é complicado. E, no caso específico, eu não vejo por que não resolvemos a questão.
Quero dizer que tenho mantido um contato permanente com o Conselho Federal de Medicina, com os órgão encarregados da formação dos médicos. E quero dizer a V. Exª, Sr. Presidente e a V. Exªs, Srªs e Srs. Senadores, que o Brasil conta com 372 mil médicos e 185 escolas de medicina em atividade. Entre 188 nações, apenas China, EUA e Rússia, nos superam em números absolutos de profissionais - absolutos. De 1970 até 2011, o aumento de médicos no Brasil foi de 53%, enquanto a população cresceu 104%.
Então, é preciso que nós, realmente, analisemos esses documentos. Aqui está um ofício do Conselho Federal de Medicina, que vou pedir que seja transcrito na íntegra como parte deste meu pronunciamento, assim como esse documento Demografia no Brasil e esse outro documento que fala dos países que são contra a revalidação automática de diplomas, porque, no fim - esse documento é da Federação Ibero-americana de entidades médicas - não adianta pensarmos na quantidade. Temos que ver a qualidade e as condições de trabalho do profissional. Eu tive a oportunidade - digo, para mim, até feliz - de ter me formado lá em 1969, começando a trabalhar em 1970, em uma época em que tínhamos pouquíssimos médicos e equipamentos precários. Não tínhamos ultrassom, não tínhamos imagem, a não ser Raios X e, no entanto, fizemos, como se diz no popular, das tripas coração, e conseguimos salvar muitas vidas.Mas, com a tecnologia de que dispomos hoje, não é mais possível pensar no médico que atenda ao município apenas com o estetoscópio e o tensiômetro na mão.
É preciso, sim, que o Governo resolva a questão da distribuição dos médicos, mas é preciso também que os governos municipal, estadual e federal deem a atenção para que, de fato, o médico, em estando distribuído adequadamente - que não é o caso hoje -, possa de fato exercer a profissão com dignidade, podendo ser útil à pessoa que está doente, à pessoa que busca um atendimento médico, uma receita, um procedimento, e que, na verdade, muitas vezes, não se faz.
No meu Estado, por exemplo, instalou-se um caos na saúde, ao ponto de faltarem os materiais mais elementares no Hospital Geral do governo, na maternidade.
Então, por que essas coisas acontecem? Porque os governos não priorizam a saúde do povo. Preferem fazer festas, preferem fazer obras megalomaníacas, preferem fazer qualquer tipo de atividade, menos investir de maneira séria na saúde. E é de saúde que estou falando, e também não é diferente na educação e na segurança.
Eu estava falando, hoje, com o Senador Paulo Davim - e quero provocar mesmo os colegas médicos - para que possamos nos reunir com outros profissionais da saúde, aguardando o convite do Ministro da Saúde, a fim de fazer essa frente de luta para mudar essa realidade triste do País, no que tange ao ponto mais importante que a pessoa humana tem, depois da vida, Senador Benedito, que é a saúde. Muitas vezes, nem adianta muito estar vivo, se a pessoa vive doente, vive incapacitado para fazer as coisas, quando poderia ser de fato curado.
No entanto, vou encerrar aqui o meu pronunciamento, mesmo ainda faltando alguns minutos, com este apelo ao Ministro da Saúde. Ele já tem várias medidas tomadas, mas que ele procure buscar os parlamentares federais para uma rápida ação, da mesma forma em que procure convocar os governadores e prefeitos, fazer com que seus técnicos possam ir aos Municípios, e implementar ações que façam com que o Município tenha médico.
O Município é o principal ente federado que precisa. É lá que mora o cidadão. O cidadão mora onde? Na rua tal do bairro tal do Município tal, e lá que ele adoece.
Senador Casildo, V. Exª, que já foi até governador, sabe que há prefeitos que não constroem um posto de saúde, mas têm ambulância, porque, quando adoece alguém, ele bota na ambulância e manda para o Município vizinho, manda para a capital.
Nós vemos isso aqui, em Brasília, onde a estrutura pública de saúde é sobrecarregada pelos doentes que vêm dos Municípios do Entorno e de toda parte do País. No meu Estado, recebo, todo dia, pedidos de passagem e de apoio para a pessoa sair de Boa Vista, que é a capital do meu Estado, para Manaus, para Teresina, no Piauí, que é um centro de excelência, para Brasília, para São Paulo. Por quê? Porque faltam, nesses lugares, as condições mínimas para que o médico resolva problemas que, às vezes, são elementares.
E se fizéssemos um grande mutirão, por exemplo, das universidades, pegando as universidades de ponta, como as USP, e fazendo convênios por este Brasil afora, para que os professores fossem a cada Estado periodicamente? Pelo menos cada Estado deveria ter um curso de Medicina. Como eu disse, até há bem pouco tempo, na Amazônia toda, só tinha curso de Medicina em Belém, no Pará, e em Manaus, no Amazonas. Agora, já temos em Roraima, em que, como eu falei, já formamos mais de dez turmas; já temos no Acre; já temos em Rondônia. É um grande avanço. É preciso que haja escolas de Medicina federais ou estaduais, de forma que, formando os médicos no local, mais facilidades tenhamos para, de fato, ter uma boa assistência. Eu acredito que é obrigação número um do Governo combater a falta de oportunidades de dar saúde à população.
O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - V. Exª me permite?
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Com muita honra, ouço o Senador Casildo.
O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Eu sei que o tempo de V. Exª está se esgotando, mas eu não poderia deixar de pegar essa carona, Senador Mozarildo Cavalcanti, já que V. Exª fala com propriedade, pois, além de ser médico e Senador por seu Estado, entende desse métier, dessa questão que é tão fundamental. V. Exª está defendendo uma tese para evitar, como se diz, a “ambulanciaterapia”, para evitar essa corrida para outros centros, para que haja descentralização do atendimento à saúde. Que tema lindo, que tema bonito: atender às pessoas no seu meio, onde elas se encontram, levar as condições para que as pessoas se sintam bem onde moram, para buscar as mínimas condições de educação, disso, daquilo, mas também de saúde. Isso é muito lindo! Continue nessa tese. Terá o nosso apoio e acho que o apoio do Brasil, Senador Mozarildo Cavalcanti.
O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Muito obrigado, Senador Casildo. V. Exª disse uma coisa muito certa. A questão da “ambulanciaterapia” é uma coisa que tem de acabar no Brasil. Muitos prefeitos, repito, por falta de condição até, compram ambulâncias: a pessoa adoeceu, eles a colocam na ambulância e a mandam para o Município vizinho ou para a capital, e o Município só faz isso. Tem, às vezes, um ou dois médicos, que fazem a triagem e empurram o doente para frente.
Nós podemos mudar essa realidade. Está aqui o Senador Paulo Davim, que é autor de um projeto que transforma a carreira de médico em carreira de Estado. Isso é fundamental para que nós possamos, de fato, mudar essa realidade.
Encerro, portanto, Sr. Presidente, pedindo a transcrição da matéria publicada no jornal O Globo de domingo, que tem o título “Procuram-se médicos”, o ofício que me mandou o Conselho Federal de Medicina sobre a questão e o documento Demografia Médica no Brasil, além do que fala que 17 países se declaram contra a revalidação automática de diplomas de medicina, para que tenhamos isso nos Anais do Senado, para reflexão e uma tomada de providências definitiva.
Muito obrigado.
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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.
(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)
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Matérias referidas:
- Programas falham e o Brasil não atrai médico para áreas pobres;
- Procuram-se médicos, O Globo;
- Ginecologista cuida da cidade;
- Demografia Médica no Brasil;
- Ofício do Conselho Federal de Medicina nº 1145/2012;
- Declaração contra a revalidação automática de diplomas de medicina.