Discurso durante a 65ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reverência pelo transcurso dos 50 anos de fundação da Universidade de Brasília.

Autor
Romero Jucá (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RR)
Nome completo: Romero Jucá Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Reverência pelo transcurso dos 50 anos de fundação da Universidade de Brasília.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2012 - Página 14074
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), ELOGIO, ATUAÇÃO, ENSINO.

            O SR. ROMERO JUCÁ (Bloco/PMDB - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) -

            [Saudação às autoridades presentes conforme o protocolo]

            A história do ensino superior em nosso país está marcada por vários pontos de inflexão. O marco inicial foi a instalação dos primeiros cursos superiores, ligados diretamente à presença da Corte Portuguesa no Brasil, em 1808, quase três séculos após as primeiras universidades serem instaladas na América Espanhola.

            Na década de 1930, temos o segundo grande marco, com a instalação da primeira universidade brasileira digna do nome, a Universidade de São Paulo. O atraso da estrutura brasileira era visível, em contraste com a dinâmica das instituições dos nossos vizinhos, que desde 1918 já empreendiam amplas reformas educacionais, inspiradas pela Universidade de Córdoba, na Argentina.

            O terceiro grande momento, talvez o mais simbólico entre eles, foi a instalação da Universidade de Brasília - UnB, em 1962. A partir desse momento, o Brasil deixou de estar a reboque de inspirações e modelos universitários estrangeiros, passando a ter referência própria de inovação e de concepção.

            Esta sessão solene do Congresso Nacional é, pois, bastante merecida, recolocando a Universidade de Brasília em seu lugar de direito.

            O modelo proposto para a UnB estava impregnado por todo o clima político e social da entrada dos anos 1960. O Brasil ganhava impulso no setor econômico, após a euforia do Governo Juscelino Kubitschek, que reinventara o País em cinco anos. A meta-síntese de JIC estava materializada na mudança da capital para o Planalto Central. Uma cidade inovadora em seus padrões estéticos e urbanísticos, criada do zero para representar um país que começava a buscar seu lugar ao sol. A produção cultural também fervilhava, com a Bossa Nova e o Cinema Novo. O esporte projetava o país: bicampeão mundial de futebol, campeão mundial de basquete. Tudo parecia favorável à inovação, à quebra de paradigmas.

            Nada mais justo que o projeto da universidade concebida para a nova capital apresentasse todos esses traços inovadores. A UnB não foi criada a partir de cursos pré-existentes, nem a partir da junção de faculdades isoladas, Foi concebida integralmente nova, de alma e corpo. Não uma universidade formada por cátedras estanques, por donos do saber encastelados em estruturas burocratizadas e hierarquizadas. Mas uma estrutura viva, com dinâmica própria, espaço coletivo de criação e de vivência do saber, da ciência e da cultura.

            O espaço físico, projetado por Niemeyer, refletia isso, permitindo a integração dos diferentes cursos. O espaço da UnB foi pensado para convivência, para compartilhamento. Institutos e Faculdades dividindo salas, laboratórios, acervos bibliográficos; alunos, professores e funcionários em permanente troca de energia.

            O projeto da UnB tem paternidade. Muito da inspiração e da sistematização da proposta tem as marcas de Darcy Ribeiro e de Anísio Teixeira, grandes inovadores da educação. Não eram pais ciumentos, reconhecendo que o projeto era vivo e deveria estar aberto a colaborações, não apenas na fase de concepção, mas também em sua implantação. Na prática, toda a geração inicial de professores, alunos e funcionários contribuiu na construção não de uma utopia vazia, mas de uma rica experiência educacional.

            A UnB foi a primeira universidade brasileira a enxergar um papel para si, no desenvolvimento do País. Pretendia gerar cérebros para a gestão pública e para o desenvolvimento do setor privado. Sabia que o futuro do Brasil passaria, de alguma forma, pelo crescimento das oportunidades de educação, lideradas pela escola superior.

            Inovava, sobretudo, na estrutura dos cursos, que pregava a livre movimentação dos alunos entre os vários ramos do conhecimento, até que pudessem definir-se em função de seu talento e vocação.

            O regime militar, contudo, foi cruel para com a UnB, Interviu diretamente em seus quadros de Direção, demitindo nomes que eram referências de nível internacional. Mutilou seu grupo de docentes, impedindo, ainda, que jovens talentos fossem promovidos. Desmontou cursos inteiros, como é o caso do famoso curso de cinema, cujas turmas iniciais foram compelidas a mudar-se para outro Estado.

            A documentação dos órgãos de segurança, hoje em domínio público, revela que os militares tinham medo da proposta de inovação. Viam na troca intensa de conhecimentos e experiências a formação de lideranças para a subversão. Interpretavam o desejo de formar cérebros para o País como infiltração comunista. Curiosamente, todas as novidades da UnB acabaram sendo base para a reforma da universidade brasileira, e o projeto, quase castrado pela intervenção militar, floresceu em outros locais, como foi o caso da Universidade de Campinas, cujo modelo foi herdeiro direto do projeto inicial da UnB.

            Mas só podemos contar essa história, hoje, porque a Universidade nunca se entregou. Seu espírito combativo e engajado superou todas as tentativas de contenção. Deve ter sido a universidade brasileira mais invadida por tropas, ao longo da história. E 1964, 1965, 1968, 1977 e 1984 foram alguns desses momentos de confronto aberto.

            Mais a UnB resistiu e refletiu diretamente a retomada da democracia em nosso País. A posse de Cristovam Buarque, hoje Senador da República, em julho de 1985, pouco mais de um ano após sua escolha como reitor, em expressiva votação de professores e alunos, coincide com os primeiros momentos do Governo José Sarney, e é considerada o marco do retorno da UnB ao seu caminho histórico.

            Nessa UnB reconstruída, novamente identificamos o ímpeto do projeto inicial: inovação, engajamento com a situação nacional, expansão de fronteiras, olhar voltado para o futuro, respeito pelo País e pela missão da universidade pública brasileira.

            Por isso, o Congresso Nacional hoje reverencia os 50 primeiros anos da Universidade de Brasília. Aqui mesmo, entre os parlamentares, temos algumas dezenas de ex-alunos que refletem o brilhantismo e a qualidade da educação lá recebida. E, se incluirmos o corpo funcional de Câmara e Senado, certamente chegaremos à casa do milhar. A UnB é um sucesso em sua proposta de presença no apoio ao desenvolvimento das funções do Estado.

            Sr. Reitor José Geraldo de Souza Júnior, está sob sua direção uma das mais prestigiosas universidades do Brasil e do mundo. Sua trajetória histórica, ainda curta para os padrões internacionais, já que existem instituições com quase mil anos, é significativa o suficiente para merecer o reconhecimento do Parlamento brasileiro.

            A UnB honra a memória de todos aqueles que lutaram para vencer o proverbial atraso brasileiro nos campos da economia, da sociedade, da política, do pensamento, da produção científica. A UnB honra o Brasil. Transmita meus cumprimentos aos alunos, aos professores e aos funcionários que, na UnB de hoje^, preparam o Brasil de amanhã.

            Era o que tinha a dizer. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2012 - Página 14074