Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre audiência pública realizada hoje na CAS, durante a qual se discutiu a necessidade de interiorização dos médicos.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXERCICIO PROFISSIONAL. SAUDE. :
  • Comentários sobre audiência pública realizada hoje na CAS, durante a qual se discutiu a necessidade de interiorização dos médicos.
Publicação
Publicação no DSF de 25/04/2012 - Página 14213
Assunto
Outros > EXERCICIO PROFISSIONAL. SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), ASSUNTO, AUSENCIA, MEDICO, TRABALHADOR, SAUDE, INTERIOR, PAIS, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, ASSISTENCIA MEDICA, IMPORTANCIA, DEBATE, PROGRAMA DE INTERIORIZAÇÃO, QUALIDADE, SERVIÇOS PROFISSIONAIS, SAUDE PUBLICA.
  • REGISTRO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, SAUDE, REFERENCIA, AUSENCIA, NUMERO, QUALIDADE, MEDICO, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DOCUMENTO, REUNIÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), ASSUNTO, AUSENCIA, MEDICO, MUNICIPIOS, BRASIL, REGISTRO, CONCENTRAÇÃO, TRABALHADOR, SAUDE, REGIÃO SUL, REGIÃO SUDESTE, NECESSIDADE, DISTRIBUIÇÃO, INTERIOR, PAIS.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Waldemir Moka, o assunto de que vou falar, hoje, tem a ver justamente com a sua profissão, que também é a minha, de médico.

            Hoje, nós tivemos uma audiência pública na Comissão de Assuntos Sociais, de que participaram o representante do Ministro da Saúde, Dr. Fernando Antonio Menezes da Silva, que, por sinal, foi reitor da nossa Universidade Federal de Roraima e é médico; o Dr. Roberto Luiz D´Ávila, Presidente do Conselho Federal de Medicina; o Presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde; o Secretário Adjunto de Atenção Especializada do Interior da Secretaria do Estado do Amazonas; o Conselheiro do Conselho Nacional de Saúde; o Diretor de Relações Institucionais da União dos Estudantes; o Sr. Vice-Presidente da Associação Médica Brasileira; o Secretário do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde; e o Secretário de Comunicação da Federação Nacional dos Médicos. Para discutir o quê? A questão da interiorização dos médicos.

            O requerimento falava em debater a presença dos médicos nos Municípios brasileiros. Na verdade, é isto: debater a ausência de médicos nos Municípios brasileiros.

            Em dezembro, Senador Moka, vou fazer 43 anos de formado, e, quando estava na faculdade, por volta do 5º ano de Medicina, houve um seminário em que já se debatia, naquela época, a questão da interiorização dos médicos, inclusive tentando sensibilizar a nós, que nos estávamos formando, a ir trabalhar no interior. Interior aí é entendido de várias formas.

            Mas, veja bem, essa realidade não vem mudando. Em 2008, a Organização Mundial de Saúde relacionou que 455 cidades no Brasil não tinham médicos. Essa realidade não mudou muito nesses quatro anos e, a cada dia que passa, na verdade, essa situação se agrava.

            E aí, como médicos, poderiam perguntar qual é o remédio. Alguns diriam que seria criar mais escolas de Medicina. É preciso saber que escolas de Medicina e onde criá-las, porque hoje tanto a concentração das escolas quanto os médicos estão concentrados nas regiões Sul e Sudeste.

            Aliás, isso foi colocado muito claramente hoje na audiência, mostrando que, enquanto, relativamente, a proporção médico/paciente recomendada pela Organização Mundial de Saúde, de um para mil, no Sul e no Sudeste é alta, com cerca de quase três para mil, no Norte, no Nordeste e até no Centro-Oeste, tirando Brasília, é baixa. E o pior é que, mesmo nessas regiões, os médicos estão concentrados ou nas capitais, ou nas cidades de médio porte.

            E se pergunta-se: “Por quê?” Por que os médicos não querem ir para o interior? A questão não pode ser colocada de maneira tão simples assim. Vou citar o meu exemplo: quando me formei em 1969, eu, que sou roraimense, portanto filho do Estado de Roraima, na época Território, tinha o maior sonho de voltar para lá, como voltei. Mas fui convidado por um professor para ficar trabalhando em sua clínica. Inicialmente, perguntou quanto eu ia ganhar lá em Roraima. Eu disse: x. E ele, então, disse que me pagaria 2x para trabalhar com ele. Eu já era casado à época, consultei minha esposa, que também é de Roraima, e nós resolvemos ir para lá. Ele dobrou a oferta, ou melhor, aumentou a oferta, dizendo que me colocava como sócio da clínica e ainda me pagava aquele salário. Pois bem, eu fui para Roraima.

            À época, havia cinco médicos que exerciam a parte clínica e um que era sanitarista. Então, nós fazíamos de tudo. Éramos os hoje chamados de generalistas e, na época, nós nos chamávamos de “tudologistas”, porque fazíamos de tudo mesmo. Agora, em condições razoáveis; diria até, do ponto de vista de excelência, com muitas dificuldades, seja na estrutura física, seja nos equipamentos.

            Isso é o que acontece hoje. Um prefeito do interior está pagando R$25 mil para o médico ir para lá. O médico vai para fazer o quê? Chega lá e não tem um hospital que preste, não tem um centro de saúde que preste, e o médico às vezes não tem nem condições de fazer uma consulta adequada.

            E foi dito hoje nessa audiência - aliás, a enésima a que assisto, mas eu não sou daqueles que perdem a esperança, não -, o que é certo é que nós temos dados demais já para fazer um bom diagnóstico. É uma situação complexa, que exige uma solução complexa também. Não se pode pensar em atitudes paliativas, como dizemos no linguajar médico. A pessoa está com um quadro sério, está sentindo dor; aí eu dou só um analgésico, a dor passa e o problema do camarada não acaba.

            Nós temos que realmente ver... E, aí, a proposta que fiz ao Ministro Padilha é que ele aproveite e reúna nós, médicos, Senadores e também os outros profissionais da saúde. Porque quando eu falo médico, na verdade, eu apresentei, Senador Moka, em 1999, em 2001, em 2003, projetos visando contornar essa situação, não só para os médicos. Está aqui o meu projeto, que dizia: “Os graduados em Medicina, Enfermagem, Farmácia, Bioquímica, Odontologia e Fisioterapia”. Quer dizer, vários profissionais da saúde, porque chama atenção dizer que não tem o médico. Mas, às vezes, tem médico e não tem enfermeiro de curso superior; às vezes, tem médico e não tem odontólogo; às vezes, tem médico e não tem sequer técnico de enfermagem.

            Então, é preciso que a saúde, como um todo, seja entendida e atacada de maneira, repito, não paliativa, mas que tenha uma solução rápida, pelo menos no médio prazo, e que seja duradoura.

            Daí porque a minha proposta hoje, depois dessa audiência, é que a gente faça uma reunião de todas as propostas que existem, tanto na Câmara quanto no Senado, como também as ideias do Poder Executivo - e aí não é só o Poder Executivo federal não; ouvir os prefeitos, os governadores -, e saia com uma solução que acabe de vez com esse problema.

            Dizer que não é preciso criar curso de Medicina é ilusão. Olha, nós criamos, em Roraima, em 1993, e começou a funcionar em 1994 - portanto, há 18 anos - o curso de Medicina. E o perfil da realidade médica no Estado mudou completamente. Mas não é ainda a graduação que fixa o médico no lugar. O que mais fixa o médico no lugar é a residência médica, porque o cidadão ou a cidadã que se forma em Roraima e vai fazer residência em São Paulo termina ficando lá, porque tem melhores condições de trabalho, tem hospitais mais qualificados, tem uma melhor remuneração. Termina ficando por lá mesmo, às vezes, ganhando menos.

            Nunca me esqueço de que, quando fui Secretário de Saúde pela primeira vez, liguei para um colega meu de turma, porque estava faltando anestesista no Estado, convidando-o para trabalhar lá. Perguntei: “Quanto tu ganhas aí?” Ele disse: “Ganho tanto”. Eu disse: “Vem para cá que tu vais ganhar o dobro e ainda o Governo te dá casa e um auxílio-moradia para mobiliar, etc, etc.” Ele disse: “Olha, eu prefiro ganhar pouco no asfalto a ganhar muito no mato.” Infelizmente, essa é a realidade.

            Agora, também não é criando um monte de faculdades particulares ou indo fazer cursos em países vizinhos que não tenham qualificação adequada que nós vamos resolver o problema de médicos, porque poderemos sair de uma situação em que vamos resolver o problema de quantidade, mas vamos ter problema de qualidade.

            Então, é muito sério o que se passa já hoje na questão não só do número de médicos, da qualidade de médicos, como na questão dos estabelecimentos de saúde.

            Nós estamos vendo todo dia, tanto na rede pública, atendida pelo SUS, quanto na privada, entre aqueles que atendem prioritariamente os planos de saúde, o caos que se instalou na saúde no Brasil - tanto pública quanto privada.

            Então, quero concluir, pedindo a V. Exª a transcrição de alguns documentos que eu trouxe, e conclamar, mais uma vez, todos a esse trabalho, que quem deve comandar, no meu entender, é o Ministro da Saúde.

            Mas não podemos ficar esperando também por soluções paliativas. Não adianta inventar, de repente, de dar incentivo para que o médico vá para o Município tal, para passar dois anos e ganhar ponto na residência. Temos de encontrar uma solução definitiva, criar uma espécie de estatuto da saúde para o Brasil; que não seja um plano de Governo só, mas um plano de Estado, porque, depois da vida, não há bem maior que a pessoa possa ter do que a saúde. Sem saúde não se faz o resto; não se faz educação, segurança, nada.

            Portanto, concluo, reiterando o pedido de transcrição das matérias a que me referi.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. art. 210, inciso I, §2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

-Comissão de Assuntos Sociais;

- “Brasil tem 455 cidades sem médicos, diz OMS; veja lista”;

- Projeto de Lei do Senado nº 233, de 1999;

- Projeto de Lei do Senado nº 594, de 1999;

- Projeto de Lei do Senado nº 120, de 2001;

- Projeto de Lei do Senado nº 451, de 2003

- “Escolas Médicas do Brasil”;

- “Médicos Ativos”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/04/2012 - Página 14213