Discurso durante a 68ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a crise no Estado do Amapá.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL.:
  • Preocupação com a crise no Estado do Amapá.
Publicação
Publicação no DSF de 27/04/2012 - Página 14641
Assunto
Outros > ESTADO DO AMAPA (AP), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • APREENSÃO, ORADOR, RELAÇÃO, CRISE, ESTADO DO AMAPA (AP), MOTIVO, INDICIAMENTO, PRISÃO, MEMBROS, PODERES CONSTITUCIONAIS, LEITURA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, PROBLEMA, POLITICA, EPOCA, GESTÃO, SENADOR, GOVERNO ESTADUAL, OBJETIVO, APRESENTAÇÃO, AUMENTO, ATUAÇÃO, MINISTERIO PUBLICO, POLICIA FEDERAL, COMBATE, CORRUPÇÃO, COMENTARIO, FATO, DIFERENÇA, SALDO, FINANÇAS, TRIBUNAL DE CONTAS, REGIÃO.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado e ouvintes da Rádio Senado, como é de conhecimento de todos, o meu Estado, o Estado do Amapá, enfrenta uma grave crise institucional, uma vez que importantes responsáveis do Executivo, Legislativo, Judiciário e Tribunal de Contas estão indiciados e alguns foram presos nas diversas operações da Polícia Federal, como a última, a Operação Mãos Limpas, em que foram presos o Governador em exercício, o ex-Governador, vários secretários, Prefeitos e conselheiros do Tribunal de Contas.

            E, nessa segunda-feira, o STJ afastou cinco Conselheiros do Tribunal de Contas do Amapá, dos sete existentes.

            No entanto, não se trata de um fato novo. Ao contrário: já no ano de 2000, o respeitável jornal O Estado de S. Paulo, também conhecido como Estadão, publicou um editorial intitulado: “A Cassação Adiada”, no dia 25 de dezembro de 2000, dia de Natal, que versava sobre o embate entre o Governo do Amapá e os demais poderes do Estado.

            Conforme o editorial, o Executivo queria “equilibrar as finanças estaduais e moralizar os hábitos políticos locais”. É bom lembrar que ainda não existia a Lei de Responsabilidade Fiscal - estava nascendo essa lei. Mas, na verdade, nós éramos impedidos de moralizar e tornar a política mais republicana em nosso Estado pelas escusas perpetradas pelos demais Poderes.

            A seguir, passo a ler o editorial do Estado de S. Paulo, datado do dia 25 de dezembro de 2002, com o título “A Cassação Adiada.”

A decisão de se autodissolver, adotada pela Comissão Processante da Assembleia Legislativa do Amapá [abra-se parêntese para explicar o que é essa Comissão processante: uma comissão composta por seis desembargadores e seis Deputados Estaduais], interrompendo assim o processo de cassação do mandato do Governador João Alberto Capiberibe, surpreendeu a todos, especialmente ao Governador, que dava como certa a sua cassação.

A crise institucional do Amapá, no entanto, não terminou. Um grupo de deputados estaduais está disposto a aprovar o impeachment de Capiberibe e já anunciou que voltará à carga, saneando as falhas jurídicas que levaram à dissolução da Comissão processante.

Eleito pela primeira vez em 1994, quatro anos depois foi reeleito com grande apoio popular. Para ser diplomado e empossado, Capiberibe precisou recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral. Recebeu de herança o compromisso de pagar um substancial aumento concedido ao funcionalismo, retroativo a março de 1994, para ser pago em 1995, além de restos a pagar correspondentes a obras superfaturadas e fornecimentos duvidosos no valor de R$ 160 milhões. A dotação anual destinada ao Judiciário, Legislativo, Ministério Público e Tribunal de Contas Estaduais foi dobrada antes da sua posse, passando de R$ 49 milhões, em 1994, para R$ 104 milhões, em 1995.

            É bom lembrar que já estava em pleno vigor o Plano Real, portanto, a inflação de 1995 foi da ordem de 22%. Então, não teria sentido sair de R$ 49 milhões para R$ 104 milhões de um ano para o outro os gastos com os Poderes.

A cada tentativa do Governador de equilibrar as finanças estaduais, de moralizar os hábitos políticos locais, a oposição respondeu com um processo na Justiça. Em menos de seis anos acumularam-se contra Capiberibe 479 processos, desde ações populares até a acusação de desvio de recursos do Fundef, o que deu origem ao processo de cassação, cuja tramitação foi suspensa esta semana.

O conflito entre o Governador e os Poderes Legislativo e Judiciário tornou-se crítico a partir do momento em que ele convidou, no início deste ano, a CPI do Narcotráfico para investigar o crime organizado em seu Estado. O relatório da CPI, divulgado em 5 de dezembro daquele ano, sugere o indiciamento da Presidente do Tribunal de Contas do Estado, Margarete Salomão, do Presidente da Assembleia Legislativa, Deputado Fran Júnior, e dos Deputados Jorge Salomão e Paulo José por suspeita de envolvimento com o narcotráfico e com lavagem de dinheiro.

            É bom lembrar que a Conselheira Margarete Salomão acaba de ser afastada por decisão do STJ e, pelo menos dois desses nomes foram indiciados e estão sendo investigados pelo Supremo Tribunal Federal.

Segundo o governador João Capiberibe, "o real motivo da crise do Amapá é a discrepância de objetivos na aplicação dos recursos públicos: enquanto a meta político-administrativa do Executivo é investir na melhoria da qualidade de vida da população, membros do Legislativo querem apropriar-se dos recursos disponíveis sem justificar sua aplicação'”.

Este é um diagnóstico eufemístico do que se passa no Amapá. O antigo território, na verdade, transformou-se um Estado sem lei, administrado durante longos anos por oligarquias que se habituaram a tratar a coisa pública como se fosse propriedade privada. Que a população local estava farta dos desmandos, não resta a menor dúvida: em duas eleições seguidas escolheu o governador João Capiberibe, apoiando uma plataforma de governo financeiramente austera e politicamente moralizadora.

Mas só isso não saneará o Estado. As práticas imorais estão profundamente entranhadas na vida política e institucional do Amapá. Em julho, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal suspendeu por liminar a vigência das leis estaduais que haviam servido como base para a instauração de processo de impeachment de Capiberibe. Apesar disso, a Assembleia votou o pedido de instalação da comissão processante, que foi aprovado por 14 votos contra 4, quando o mínimo exigido para que a denúncia de crime de responsabilidade tivesse sequência era de 16 votos favoráveis.

A comissão foi, mesmo assim, formada, com a participação de cinco deputados e de seis desembargadores. O que sustou o processo foi a constatação, pelos desembargadores, de que ao governador havia sido negado amplo direito de defesa. Isso salvou temporariamente o mandato do governador João Capiberibe.

            Temporariamente, porque a cassação aconteceu cinco anos depois. Mas não queriam apenas a cassação do mandato; queriam o nosso expurgo da vida pública. Era o que desejavam.

Mas ele continua sujeito a novo processo de impeachment, porque seus adversários já declararam que não esmorecerão enquanto não o tirarem do governo. Enquanto isso, causa pasmo a inércia dos diretórios nacionais dos partidos a que estão filiados os deputados estaduais que não apenas dilapidaram o Tesouro do Amapá, como estão acusados de envolvimento com o crime organizado. Mas causa maior espécie que o governo federal, dispondo de instrumentos poderosos como a Polícia Federal e Receita Federal, assista, sem nada fazer, ao que se passa no Amapá.

            Eu fiz questão de ler esse editorial, datado de 25 de dezembro de 2000, para mostrar a diferença entre esses dois momentos na história do nosso País.

            Naquele momento, não havia ação nenhuma, seja do Governo Federal, seja da Receita. Havia uma convivência pacífica com a corrupção, com o desvio de recursos públicos. Hoje, dadas as inúmeras denúncias, as centenas de operações da Polícia Federal, a CPI do Cachoeira, enfim, uma série de denúncias de corrupção e desmandos, e a atuação da decisiva da Polícia Federal e do Ministério Público para coibir a corrupção, há uma aparência de que a corrupção é maior que ontem. Na verdade, não é. Hoje, a corrupção está mais exposta e submetida a uma vigilância maior, tanto da sociedade, como das instituições públicas.

            Eu falei isso para mostrar que, hoje, nós podemos, sim, fazer deste um momento histórico para o nosso País. Existe uma CPI para investigar a relação de um contraventor com instituições do Estado.

            Eu, que acompanho e dediquei uma parte da minha vida política, e paguei caro por isso... Vejam, responder a 479 processos não é uma tarefa fácil. Entre outros, havia alguns absurdos. Eu fui acusado de ter retirado na boca do caixa, em março de 2002, quando deixei o governo, a soma fantástica de R$365 milhões.

            O Procurador Geral da República, na época, que decidiu instaurar um inquérito criminal, bastava a ele imaginar o que representam, qual o volume de R$365 milhões para alguém retirá-los na boca do caixa de um banco. É preciso uma carreta, uma jamanta de 30 toneladas, talvez até mais do que uma, para transportar um volume tão grande de cédulas. Mas esse processo se prolongou por seis anos, até que o juiz federal mandou para o arquivo. Mas os meus adversários aproveitaram para tratar de me linchar publicamente por causa dessas acusações descabidas.

            E continua até hoje. Ainda há pouco, era a questão da minha casa...

(Interrupção do som.)

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - E eu tenho certeza de que eles não vão...

            O SR. PRESIDENTE (Waldemir Moka. Bloco/PMDB - MS. Fazendo soar a campainha.) - Para concluir, Senador.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Pois não. Vou concluir dizendo o seguinte: o afastamento desses cinco conselheiros está trazendo a público uma situação inusitada. O Tribunal de Contas em 2010 tinha um orçamento da ordem de R$64 milhões. Depois da operação que aconteceu no dia 10 de setembro, o Tribunal não conseguiu mais executar o orçamento e começou a acumular saldos financeiros em 2010 e em 2011; e, hoje, calcula-se, Senador Mozarildo, que o Tribunal de Contas do Amapá tenha saldo financeiro disponível da ordem de R$30 milhões. Basta ver que, em 2011, tinha uma dotação orçamentária de R$60 milhões e só conseguiu executar R$36 milhões.

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Waldemir Moka. Bloco/PMDB - MS) - Senador, eu já lhe concedi quatro minutos. Peço que V. Exª conclua.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP) - Concluo dizendo que essa diferença, esses R$30 milhões precisam ser estornados ao Executivo para serem aplicados em saúde. Saúde realmente é o que a população mais reclama, e esse dinheiro deve voltar porque está sendo estocado no banco sem nenhuma utilidade.

            Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/04/2012 - Página 14641