Discurso durante a 72ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise das dificuldades relativas ao comércio entre Brasil e Argentina; e outros assuntos.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMERCIO EXTERIOR. CONGRESSO NACIONAL. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Análise das dificuldades relativas ao comércio entre Brasil e Argentina; e outros assuntos.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2012 - Página 15474
Assunto
Outros > COMERCIO EXTERIOR. CONGRESSO NACIONAL. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • APREENSÃO, ORADOR, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, COMERCIO EXTERIOR, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, MOTIVO, ADOÇÃO, POLITICA, PROTECIONISMO, FATO, CRIAÇÃO, PREJUIZO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, RESOLUÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, MOTIVO, ASSUNTO, CRIAÇÃO, PREJUIZO, REPUTAÇÃO, PARLAMENTO, FATO, INDICIO, PARTICIPAÇÃO, POLITICO, CORRUPÇÃO.
  • REGISTRO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, RECONHECIMENTO, RESERVA INDIGENA, ESTADO DA BAHIA (BA), FATO, DEMORA, JULGAMENTO, CRIAÇÃO, PREJUIZO, INDIO, REGIÃO.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, nossos telespectadores da TV Senado e ouvintes da Rádio Senado, nesta tarde, houve uma sequência de temas relevantes.

            O último orador que me antecedeu tratou da questão do Fundo de Garantia, pela palavra do Senador Cyro Miranda, tema de grande interesse dos trabalhadores brasileiros e da própria economia, porque o dinheiro do Fundo de Garantia é um recurso que é poupança interna, que ajuda financiamentos em setores importantes, como, por exemplo, saneamento e habitação, apenas para citar duas áreas importantes.

            O Senador Casildo Maldaner trouxe à tribuna a questão das micro e pequenas empresas. Eu participo, com muita honra, da Frente Parlamentar Mista da Micro e Pequena Empresa, que, nesta Casa, conta com o Senador José Pimentel como um dos seus líderes, exatamente para atualizarmos a legislação e ampliarmos o espaço de acesso às pequenas e médias empresas.

            Concordo com o Senador Casildo Maldaner, com a definição de que, para que se beneficiem da Lei do Simples, as empresas sejam consideradas não pela sua atividade econômica, mas pelo seu faturamento. Essa seria uma forma muito mais racional, eu diria, e também mais lógica do ponto de vista do acesso a essa área, ao Simples Nacional.

            Também defendo as microcervejarias e as vinícolas familiares, que, no meu Estado, assim como em Santa Catarina, são hoje significativamente importantes do ponto de vista social e também do ponto de vista da sua atividade econômica. No turismo também, há um reflexo importante da participação dessas empresas.

            Portanto, os temas todos aqui foram abordados de maneira muito adequada às discussões que fazemos hoje.

            Pela manhã, houve um momento relevante. Ontem, houve a instalação dos trabalhos da chamada CPMI do Cachoeira, que investigará as denúncias relativas ao Sr. Cachoeira. E, nesta manhã, na sequência, houve uma importante reunião do Conselho de Ética desta Casa.

            Não integro o Conselho de Ética, mas queria apresentar aqui os cumprimentos ao Relator, Senador Humberto Costa, pelo acolhimento da representação contra o Senador Demóstenes Torres, promovida pelo PSOL, por meio do Senador Randolfe Rodrigues. O Plenário do Conselho e, depois, o Plenário da Casa deverão examinar e apreciar essa complexa matéria que diz respeito às questões relacionadas aos compromissos éticos do Senado Federal.

            Como disse o Relator, Senador Humberto Costa, com muita propriedade, o que está em debate não é apenas a imagem do Parlamentar, mas do próprio Parlamento. É exatamente isso que me preocupa nesse processo.

            Eu também gostaria de registrar uma decisão tomada ontem pelo Supremo Tribunal Federal em relação ao reconhecimento das reservas indígenas no sul da Bahia.

            Ninguém aqui discute o direito dos indígenas sobre essas reservas. São 50 mil hectares numa região valorizada daquele Estado do Nordeste brasileiro. O que se discute nessa matéria é exatamente a omissão do Estado num processo tão delicado e condizente com os direitos dos indígenas e das minorias e com a proteção dos direitos dos produtores rurais. As reservas foram demarcadas em 1930, e o Estado nada fez para homologar essas demarcações, o que era um papel inerente do Estado brasileiro e, portanto, de governos. E não se vai dizer que foi este ou aquele governo. O Estado falhou redondamente, prejudicando os indígenas e os agricultores.

            É exatamente essa insegurança jurídica que acaba comprometendo a imagem do País internacionalmente e trazendo uma instabilidade e, às vezes, até um conflito social desnecessário, como aconteceu agora, com derramamento de sangue, num julgamento que foi antecipado pelo Supremo Tribunal Federal ontem.

            É também discutível que o Supremo Tribunal Federal, na conclusão desse julgamento, tenha se limitado a dizer que cabe agora ao Poder Executivo saber o que vai fazer, se vai ou não indenizar, pelas benfeitorias, os proprietários rurais que ocupavam aquela área, titulados oficialmente pelo próprio Estado, como reconheceu o voto do Ministro Marco Aurélio de Mello.

            Então, é preciso que o Estado tenha, em relação à questão do direito e da legalidade, uma atitude de maior responsabilidade, para evitar novo derramamento de sangue. A questão indígena é séria e precisa ser abordada de forma eficaz.

            Aliás, hoje, pela manhã, na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, propus - e foi aprovada - a realização de uma audiência pública para debater essas questões. Devemos levar paz ao campo e não permitir que essa omissão do Estado propicie mais derramamento de sangue e conflitos desnecessários.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - V. Exª me concede um aparte, Senadora Ana Amélia?

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Com muito prazer, concedo um aparte ao Senador Casildo Maldaner.

            O Sr. Casildo Maldaner (Bloco/PMDB - SC) - Quero me solidarizar com V. Exª quanto a essa preocupação. Sem dúvida alguma, a omissão do Estado preocupa. Não se trata apenas do caso da Bahia. Inclusive, no oeste catarinense, há um desses focos, um problema localizado. Famílias que vieram do Estado de V. Exª - que também é meu de origem -, foram para o oeste catarinense e lá moram há 80 anos. Agora, estão delimitando como áreas indígenas os Municípios de Saudades e de Cunha Porã. O pessoal não sabia disso. O Estado escriturou. Agora, falam que poderão indenizar os donos de residências, de galpões. Minha Nossa Senhora, aquilo já pertence aos netos! Está todo mundo ali! É a vida de centenas de famílias! Agora, o próprio Estado de Santa Catarina, junto ao Governo Federal, está tentando encontrar uma área junto à fronteira com a Argentina, em São Miguel do Oeste, para acomodar alguns índios que vieram de Nonoai e que estão por ali. Querem encontrar uma área que possa acomodá-los. Do contrário, será uma loucura! Dou esse exemplo, mas há muitos casos no Brasil. Temos de ter muita consciência disso. O Ministério da Justiça, o Governo como um todo deve se preocupar muito com isso. Temos de ter muito cuidado com isso, porque, daqui a pouco, não sei aonde chegaremos. É claro que devem existir as reservas, a proteção, mas isso não pode ser feito ao bel-prazer. Como ficam essas famílias? A vida delas está ali. Fizeram ali benfeitorias, há o investimento de capital, há empreendimentos. Toda uma vida está ali! Não é assim que se deve proceder! Ali bisavós, avós, pais estão enterrados. Isso é muito duro! Quero me solidarizar com a preocupação de V. Exª, Senadora.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Exatamente esta é a grande questão, Senador Casildo Maldaner: não podemos deixar ao desabrigo essas pessoas, não podemos deixar que essas pessoas, além do prejuízo material que terão, fiquem sem esperança e desacreditem neste País, que trata os seus com injustiça.

            Nesse caso, há realmente um desequilíbrio no tratamento e uma omissão do Estado, o que é inaceitável, sob todos os aspectos. Essa omissão acabou estimulando o conflito naquela região. Como disse bem V. Exª, não só em Santa Catarina, mas também em meu Estado, o Rio Grande do Sul, discutem-se ainda as demarcações que estão em análise pela Justiça.

            Eu gostaria de aproveitar a oportunidade para lembrar que a Relatora da matéria relativa às demarcações, à homologação ou à questão pendente no Supremo Tribunal Federal, a Ministra Cármen Lúcia, no dia em que tomou posse no Tribunal Superior Eleitoral - é a primeira mulher a ocupar esse cargo -, disse que duas matérias tiravam-lhe o sono: a questão das reservas indígenas do sul da Bahia e a questão do Aerus Varig. Agora, espero que a Ministra Cármen Lúcia, da mesma forma como conseguiu se haver diante desse desafio enorme, desse julgamento histórico em relação às reservas indígenas, com a celeridade possível, julgue esse caso da Varig que se está arrastando há vários anos, que é uma questão extremamente necessária, porque também envolve direitos sociais das pessoas que aguardam o registro e o resgate do seu direito de previdência social, Srª Presidente Marta Suplicy.

            Eu queria aproveitar esta ocupação da tribuna para registrar minha preocupação com outro tema relevante, que diz respeito aos resultados da balança comercial brasileira divulgado nesta semana. Os números ainda são positivos, porque houve um superávit de US$881 milhões, mas é o pior resultado para o mês de abril desde 2002. A queda das exportações para a Argentina foi um dos fatores que prejudicaram as exportações brasileiras. Houve uma redução de vendas para o País vizinho da ordem de 27%. E o Estado brasileiro que mais sente esta queda é o meu Estado, o Rio Grande do Sul.

            O volume de mercadorias retido nas alfândegas, especialmente de Uruguaiana e Paso de los Libres, mostra o resultado da política protecionista adotada pela Argentina.

            A cada mês, aumenta o peso de barreiras comerciais aos produtos brasileiros, Presidente Casildo Maldaner. E isso não é novidade para as indústrias gaúchas.

            Há dois anos, a Argentina passou a exigir a emissão de licenças prévias para os produtos brasileiros ingressarem naquele mercado, aumentando a burocracia para os exportadores, o que atrasa o processo de exportação e encarece os custos alfandegários.

            Essa política de barreiras comerciais atinge vários setores. Por exemplo, a exportação de móveis brasileiros para a Argentina caiu 70%, e foram vendidos 80% menos tubos de ferro para aquele mercado no último mês. Mas principalmente a exportação de carne suína, de máquinas agrícolas e de calçados vem tendo problemas todos os meses.

            Os números que apresento são preocupantes. Dados da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados indicam que 2,29 milhões de pares de calçados estão na alfândega esperando liberação para entrar na Argentina, um prejuízo de quase US$50 milhões.

            As exportações de calçados para a Argentina já caíram mais de 70%, se comparadas com as médias diárias de abril do ano passado.

            Desde fevereiro, a Argentina passou também a exigir uma declaração juramentada aos produtores de carne suína, e as exportações caíram de 3,5 mil toneladas para 500 toneladas de carne suína por mês. É muito, Senador Casildo Maldaner! O seu Estado também sofre essas consequências.

            Há pouco mais de um mês, o Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Mendes Ribeiro Filho, fechou acordo com o governo argentino para a retomada da venda de carne suína para nosso vizinho parceiro do Mercosul. Mas, até agora, esse acordo ficou só na palavra, não foi cumprido pelos argentinos.

            As indústrias de máquinas agrícolas estão na mesma situação, vendo as dificuldades de exportação para a Argentina aumentarem todos os meses.

            Uso como exemplo a empresa AGCO - detentora das marcas Massey Ferguson e Valtra -, que resolveu construir uma fábrica de tratores do outro lado da fronteira, portanto, na Argentina, resultado dos entraves impostos à exportação dessas máquinas para o mercado argentino.

            Aliás, diga-se, a Argentina é o maior importador, e o Rio Grande do Sul produz 60% das máquinas agrícolas fabricadas no Brasil e, é claro, é o maior exportador.

            Com previsão de entrar em operação no próximo ano, essa fábrica, sem dúvida, afetará a produção das quatro unidades no Estado do Rio Grande do Sul, hoje principal fornecedor de máquinas do grupo AGCO para a Argentina. Isso quer dizer que mais de três mil funcionários nas indústrias de máquinas agrícolas das cidades gaúchas de Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre; de Santa Rosa, na região noroeste; de Ibirubá e de Marau estão correndo risco de perder o emprego.

            Aliás, ontem, o seu correligionário Deputado Osmar Terra, de Santa Rosa, falou-me amargamente, preocupado com essa situação em Santa Rosa.

            Srªs e Srs. Senadores, a política protecionista da Argentina, junto com o alto custo de produção no Brasil, está colocando a manutenção dos empregos em risco e pode tirar os investimentos de empresas instaladas no Brasil, transferindo tais investimentos e essas unidades fabris para a nossa sócia do Mercosul, a Argentina.

            Mas que sócia, hem, Sr. Presidente? Com mais uma sócia assim, nem precisaremos de inimigos.

            Mas essas mesmas empresas que se instalarem na Argentina irão, depois, exportar os seus produtos para o Brasil, fazendo o caminho inverso. Não podemos permitir que o Brasil se torne um mercado aberto para os produtos importados, que antes eram produzidos aqui. Isso não é solidariedade bilateral nem multilateral, nem solidariedade de um bloco, embora haja a máxima “amigos, amigos, negócios à parte”.

            A situação econômica da Argentina, é claro, explica em parte essa postura protecionista e deve ser levada em consideração. O Governo brasileiro já anunciou que têm um plano de ajuda para a Argentina em forma de linhas de créditos para as empresas argentinas. Mas essa ajuda não pode resultar em prejuízo para as empresas brasileiras e na eliminação de empregos no nosso território.

            Buscar o equilíbrio econômico da região do Mercosul é uma atitude saudável, inteligente e diplomaticamente correta. Mas a Argentina precisa respeitar e cumprir acordos e contratos já assinados e fechados anteriormente. Na verdade, Sr. Presidente, estamos diante de uma postura intransigente que só leva a Argentina na clandestinidade das regras de compromissos comerciais, bilaterais ou multilaterais.

            O Presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Heitor Muller, lembra muito bem que estamos diante de um problema agudo, que representa sério risco para as empresas brasileiras, gaúchas de modo especial, porque estão mais próximas da fronteira. Aliás, é o Estado que tem o maior limite de fronteira com a Argentina; são seis Municípios que estão nessa fronteira.

            O Presidente da Fiergs, Heitor Muller, acredita que esse impasse não será resolvido apenas com negociações comerciais. Isso só será resolvido de forma política. Esse também é o ponto de vista do Presidente da Associação Brasileira de Transportadores Internacionais (ABTI), José Carlos Becker, porque também o transporte, que é uma área de serviços, foi duramente afetado. Que o digam os empresários que operam em Uruguaiana!

            Os empresários gaúchos esperam que a Presidente Dilma Rousseff honre o compromisso de proteger e tornar a indústria brasileira ainda mais competitiva e defendem um encontro entre a Presidente Dilma Rousseff e a Presidente Cristina Kirchner, sua colega argentina, para discutir a atitude protecionista adotada pela Argentina na relação bilateral.

            A política de barreiras comerciais, de salvaguardas, levada ao limite, está dificultando acordos na região do Mercosul e abrindo precedentes que impedem negociações multilaterais.

            O não cumprimento de contratos sinaliza, a eventuais parceiros econômicos, uma política nada clara e impede, por exemplo, avanço de acordos do Bloco com a União Europeia. A estatização, um ato de força da espanhola YPF, pelo governo Cristina Kirchner agrava essa dificuldade.

            Não podemos aceitar que o Mercosul se torne refém do protecionismo argentino.

            O Brasil precisa assumir seu papel de economia forte e mostrar mais protagonismo no comércio regional e também no comércio multilateral.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2012 - Página 15474