Discurso durante a 77ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica à aprovação, ontem, pelo Senado Federal, da permissão de venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante a Copa do Mundo de Futebol de 2014.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESPORTE, SENADO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Crítica à aprovação, ontem, pelo Senado Federal, da permissão de venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante a Copa do Mundo de Futebol de 2014.
Aparteantes
Ana Amélia, Eduardo Lopes.
Publicação
Publicação no DSF de 11/05/2012 - Página 17423
Assunto
Outros > ESPORTE, SENADO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • COMENTARIO, CRITICA, APROVAÇÃO, SENADO, AUTORIZAÇÃO, VENDA, BEBIDA ALCOOLICA, LOCAL, ESTADIO, FUTEBOL, DURAÇÃO, CAMPEONATO MUNDIAL, REGISTRO, POSIÇÃO, ORADOR, DISCORDANCIA, RELAÇÃO, VOTO, REFERENCIA, LEI GERAL.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Marta Suplicy, Srªs e Srs. Senadores, hoje vou abordar um tema, Senadora Ana Amélia, que ontem, durante aquela discussão e votação, pode ter ficado um pouco nebuloso na cabeça de muita gente, porque, realmente, pela forma como foi conduzida a votação da Lei Geral da Copa, aqueles que se opunham à venda de bebida alcoólica durante as duas Copas, a de 2013 e a de 2014, não tinham outra opção, a não ser: ou votavam no bloco de emendas que estavam sendo rejeitadas ou votavam contra.

            Quero aqui colocar a minha posição de maneira bem clara. Primeiro, quero dizer que não tenho qualquer tipo de hipocrisia em relação a bebida alcoólica. Na minha juventude e até mesmo durante a idade adulta, eu gostava muito da minha cerveja e a tomava, mas posso dizer que tive sorte em não ter outros problemas de saúde, como foi o caso do nosso colega médico e jogador Sócrates, que teve uma cirrose hepática. E tive sorte também de não ter tido nenhum tipo de acidente durante esse percurso.

            Como médico, no entanto, não posso ignorar as estatísticas. E também não posso compreender a incoerência que estamos vivendo, porque a Câmara está votando o chamado “endurecimento da Lei Seca”, quer dizer, vai tornar a Lei Seca mais rígida, inclusive dispensando a prova do bafômetro para os motoristas embriagados.

            Enquanto a Casa trabalha nesse sentido, ela mesma aprova a autorização para o consumo de bebida alcoólica. E vai dizer, como aliás já está dizendo, que não está autorizando, mas repassando para os governadores, portanto, para os Estados, a competência de dizer se autorizam ou não. Porque já existem Estados que proíbem a bebida alcoólica. Ou seja, está jogando a peteca para as mãos dos governadores.

            De qualquer forma, seja presidente, seja governador, seja prefeito, o que não se pode é dizer: “No período tal pode-se cometer tal infração; fora desse período, não”. Realmente, é uma incoerência.

            E os dados dos acidentes de trânsito mostram que a maioria é de jovens, que morrem ou, muitas vezes, ficam inválidos para sempre por sérias lesões cerebrais ou medulares. Além disso, podem também provocar a morte de outras pessoas que não estão ao volante, como, por exemplo, os transeuntes. As estatísticas, Senadora Ana Amélia, são alarmantes.

            Por isso, não consigo realmente compreender como compatibilizar essa questão. Ouvi discursos os mais variados. Por exemplo, que o Brasil assumiu com a Fifa o compromisso de aceitar as regras que ela tem para qualquer país. Muito bem. O Brasil, diga-se, o Presidente da República. Isso não passou pelo Congresso Nacional.

            Não quero dizer que possamos ter, durante a Copa - e torço para que não aconteça -, o aumento não só dos casos de violência ao volante, mas também de violência física, como agressão e assassinatos, decorrentes disso.

            Antes de prosseguir, quero ouvir a Senadora Ana Amélia, que, por sinal, ontem fez um brilhante relatório sobre o tema.

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS) - Senador Mozarildo, ao contrário do senhor, não sou médica, mas sempre os procuro quando preciso, porque são fundamentais. Mesmo não sendo da área, pelo volume de informações que temos, concordo, em gênero, número e grau, com V. Exª. Fui a primeira a tentar modificar a lei para que fosse mantida a proibição de bebida alcoólica nos estádios dos jogos. Está provado. Eu recebi as lideranças do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados, que fizeram um trabalho juntamente com a CBF, desde 2005, provando, com dados concretos, que a retirada da bebida representou, sim, uma redução expressiva da violência nos estádios. Agora vemos no entorno dos estádios, porque não há muito controle. Isso me levou à convicção de que, de fato, deveríamos manter a proibição por medida de segurança de todos os torcedores, especialmente dos estrangeiros. Porém, eu estava, como disse ontem, no dilema da “escolha de Sofia”: ou proibir a bebida, como a sociedade brasileira, V. Exª e eu queremos, ou quebrar um acordo internacional firmado pelo Presidente da República, em 2007, com a Fifa, em Zurique. Esse foi o motivo. Se quebrarmos unilateralmente um contrato internacional, não tem repercussão apenas sobre o esporte, mas sobre as questões econômica e jurídica. Foi esse o dilema que tive ao manter uma decisão do Governo brasileiro, para que tivesse o respaldo do Congresso Nacional em um compromisso que firmou em nome do Brasil, porque a Copa do Mundo é dos brasileiros e de toda a sociedade. Esse foi o motivo. Por mim, Senador, eu manteria a proibição da bebida alcoólica nos estádios.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Tenho certeza, Senadora Ana Amélia. Conheço V. Exª, uma pessoa que acompanha as estatísticas, acompanha, como jornalista que é, o noticiário e a realidade do País. Não tenho dúvida de que V. Exª votaria contra. Agora, é verdade também, como diz V. Exª, que ficaria difícil para o Congresso Nacional quebrar um compromisso assumido pelo Presidente da República. Por outro lado, acho que é um bom tema para se discutir, até mesmo para convencer a Fifa a arranjar outros patrocinadores que não sejam os fabricantes de bebida alcoólica. Existem tantos outros patrocinadores! Já que essa Copa é fato consumado - nós aprovamos a lei e a Presidente vai sancioná-la -, que evitemos daqui para frente.

            É inacreditável, como diz V. Exª, que um país que queira sediar uma Copa tenha de aceitar as regras de uma instituição privada que estabelece que, naquele período, é permitido tomar bebidas alcoólicas da fábrica que patrocina a Copa.

            Então, eu acho importante nós termos consciência: álcool é uma droga, álcool é uma droga que abre a porta para outras drogas e, principalmente, é um dos maiores responsáveis por mortes, por casos de invalidez e pelo grande gasto feito com o dinheiro do povo, dinheiro que o governo gasta nos hospitais públicos.

            O Sr. Eduardo Lopes (Bloco/PRB - RJ) - Senador...

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Ouço com muito prazer V. Exª.

            O Sr. Eduardo Lopes (Bloco/PRB - RJ) - Senador Mozarildo, quero congratulá-lo por seu pronunciamento. Ontem, fiz questão de registrar aqui que o projeto foi votado de forma global, e não havia como destacar a parte em relação à qual tínhamos uma posição contrária, como já citou a nossa Senadora Ana Amélia. Eu registrei, e quero reforçar, a exemplo do que o senhor fez no começo do discurso, que ficou meio confuso. Então, para que não haja nenhuma dúvida - o senhor está aqui fazendo o seu pronunciamento, a Senadora também já marcou sua posição -, quero reforçar a minha posição: nós votamos de maneira global, mas a minha posição, claro, é também contrária à venda de bebidas alcoólicas nos estádios. Portanto, parabenizo V. Exª por trazer à baila o tema, para esclarecê-lo melhor, principalmente com os dados que estão sendo trazidos.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Tenho certeza, Senador, de que, na verdade, a imensa maioria dos Senadores que votaram contra as emendas que estavam em bloco votaram porque não havia outra opção. Tenho certeza de que a maioria esmagadora dos Senadores é contra a venda de bebidas alcoólicas durante a Copa. Se nós estávamos num beco sem saída, eu fiz questão - eu e mais uns 19 - de votar contra por falta de alternativa. Se houvesse alternativa, teríamos votado a favor da Lei da Copa sem bebida alcoólica.

            Mas repito: é importante debater esse tema para que amanhã não fique na cabeça das pessoas, principalmente da juventude, que nós podemos abrir exceções. Senão, amanhã, Senador Moka, poderá acontecer de termos de abrir exceção quando houver um grande festival de rock patrocinado por uma grande empresa internacional; amanhã, poderá acontecer de termos de abrir exceção quando houver um evento internacional qualquer, em que, digamos, a presença da juventude precisa de bebida alcoólica.

            Portanto, é muito importante que deixemos claro: o Brasil adotou uma postura, assim como fez com relação ao fumo - hoje, talvez seja o país campeão em queda de consumo de cigarro -, de também proibir pelo menos que não se beba quando for dirigir, o que eu considero uma propaganda muito, digamos, suave: “Se beber, não dirija”, isto é, se não beber, pode beber à vontade. Não há um aviso sequer, em qualquer garrafa de bebida alcoólica, alertando sobre os riscos de a pessoa ter infarto, cirrose, doenças neurológicas e de sofrer acidentes.

            Portanto, quero deixar registrado que votei ontem contra a Lei da Copa, porque não tinha opção de votar no que eu queria: contra o consumo de bebida alcoólica.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/05/2012 - Página 17423