Discurso durante a 78ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da realização de plebiscito sobre o fuso horário do Estado do Acre.

Autor
Anibal Diniz (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Anibal Diniz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FUSO HORARIO.:
  • Defesa da realização de plebiscito sobre o fuso horário do Estado do Acre.
Publicação
Publicação no DSF de 12/05/2012 - Página 17907
Assunto
Outros > FUSO HORARIO.
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REFERENCIA, REALIZAÇÃO, PLEBISCITO, ESTADO DO ACRE (AC), ESTADO DO PARA (PA), ESTADO DO AMAZONAS (AM), OBJETIVO, DEFINIÇÃO, DIFERENÇA, FUSO HORARIO, REGIÃO, REGISTRO, HISTORIA, UNIFICAÇÃO, MEDIDA, HORARIO, MUNDO.

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, nesta semana, foram aprovados neste plenário dois requerimentos, o Requerimento nº 292, de 2012, e o Requerimento nº 293, de 2012, solicitando que o Projeto de Lei da Câmara nº 63, de autoria do Deputado amazonense Pauderney Avelino, tramitasse também na Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática e na Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo.

            Esse projeto do Deputado Pauderney Avelino propõe a volta do fuso horário do Estado do Acre, e fiz a apresentação desses dois requerimentos justamente porque outras três matérias sobre o mesmo assunto estão tramitando aqui. Uma delas é de minha autoria e propõe que realizemos um plebiscito em 2014, juntamente com as eleições de 2014, para que haja uma posição definitiva em relação à opinião do povo do Acre, se quer a manutenção do horário como está ou se quer mesmo a volta do horário antigo, com duas horas de diferença em relação a Brasília. Lembro que todos os demais Estados amazônicos, a partir do Mato Grosso, têm uma hora apenas de diferença em relação a Brasília. Apenas o Acre estava num fuso horário isolado, com duas horas de diferença.

            O Senador Tião Viana, à época, apresentou uma proposta, que conseguiu aprovação no Senado e na Câmara e que contou com a sanção presidencial, diminuindo essa diferença de fuso de duas horas para uma hora. Na realidade, era uma iniciativa bastante inovadora e interessante, que atendia a um antigo clamor de diferentes segmentos da sociedade e que, por força do aquecimento da campanha eleitoral de 2010, acabou se transformando numa grande polêmica, aliás, uma polêmica muito maior do que o problema causado, porque, na realidade, uma adaptação de fuso horário é algo absolutamente normal. Quem faz uma viagem ao exterior, a um país que tem fuso de quatro ou cinco horas de diferença, um ou dois dias depois de estar nesse local, sente-se adaptado. Mas a politização no Acre foi de tal monta, que parecia que essa diferença de uma hora fosse algo que mexesse na saúde física das pessoas e causasse um desconforto - digamos - insuperável.

            O Senador Sérgio Petecão já se pronunciou aqui, nesta semana, apresentando seu protesto contra a aprovação dos dois requerimentos de minha autoria. Na realidade, estou muito tranquilo em relação a essa discussão. Tenho a certeza de que a sociedade acreana também está encarando isso com muita tranquilidade, porque o horário em vigor no Acre foi estabelecido há mais de três anos. Com a aprovação do Projeto de lei nº 11.662, do Senador Tião Viana, a lei foi sancionada pelo Presidente Lula e entrou em vigor em 2009. Nós já estamos em 2012. Então, já existe toda uma adaptação. E tenho a certeza de que, hoje, se tivesse de haver um retrocesso ao horário antigo, isso, certamente, também causaria muitos transtornos para as pessoas que estão vivendo essa situação de adaptação.

            É real que aconteceu um referendo em 2010, por proposição do Deputado Flaviano Melo, do PMDB. Esse referendo acabou gerando uma proposta de lei do Senador Pedro Taques, e se chegou a um entendimento na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Essa proposta foi aprovada no Senado e, depois, na Câmara, mas foi vetada pela Presidente, exatamente porque não levava em conta os Estados do Amazonas e do Pará. Por isso, achei por bem, para tentar dirimir a questão e trazer minha contribuição para resolver esse problema, pedir que, em 2014, fosse realizado um plebiscito tanto no Estado do Acre quanto no Estado do Amazonas e no Estado do Pará. Essa proposição está tramitando hoje na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, está aguardando Relator, e imagino que, uma vez aprovada a proposta, poderemos apensar os demais projetos relacionados a esse assuntos, para que resolvamos todos eles de uma só vez.

            Pedi ao assessor da Liderança do Partido dos Trabalhadores no Senado, Marcelo Zero, um estudo específico sobre o fuso horário no mundo e achei por bem, nesta sexta-feira, um dia bem tranquilo no Senado, fazermos uma exposição, para mostrar que não é um assunto que começou no início do mundo, é algo muito recente. Considerando a longevidade da humanidade, a adoção de fuso horário no mundo é algo absolutamente recente. Então, vale a pena acompanharmos qual foi o fruto desse estudo, de muita competência, realizado pelo assessor Marcelo Zero, da Liderança do Partido dos Trabalhadores, que cumprimento.

            O estudo diz: “Fusos horários no mundo: origens e características”.

            A medição precisa, linear e universal do tempo, que regula inteiramente as nossas vidas e as atividades econômicas, políticas e administrativas em todo o mundo é uma invenção da civilização moderna.

            Com efeito, algo que se nos afigura, hoje, como “natural” é resultado de uma longa evolução tecnológica na medição do tempo e fruto de decisões político-administrativas, nacionais e internacionais, que uniformizaram os horários no Planeta.

            Antes do surgimento do mundo moderno, o ritmo da vida era ditado simplesmente pelos ciclos naturais da luz solar e, nas latitudes mais altas, pelo ciclo anual das estações.

            Estima-se que, no mundo ocidental, antes do surgimento da civilização moderna, os horários eram estabelecidos essencialmente pela passagem do sol. O chamado meio-dia era aferido pela “passagem meridiana” do sol, seu ápice no firmamento, em cada localidade. O horário era estipulado pela progressão meridiana solar localizada.

            Assim sendo, cada cidade, cada localidade, tinha o seu horário específico, pois o movimento aparente do sol pelo firmamento varia inteiramente conforme a longitude e a latitude.

            Um antigo viajante que percorresse, por exemplo, a Itália, um país geograficamente pequeno, teria de ajustar constantemente seu relógio, caso tivesse um relógio. Em Roma, haveria um horário; em Nápoles, outro. Florença, Pisa e Siena, cidades toscanas muito próximas, teriam horários diferentes.

            Essa confusão de horários, bem como a falta de precisão na medida do tempo, predominou durante séculos.

            Entretanto, com o surgimento da economia moderna e da administração moderna, que exigem uma padronização nacional e precisa do tempo, começaram a serem feitos esforços para a universalização dos horários. Com efeito, como administrar um país ou tocar um negócio com uma cadeia produtiva que se estende geograficamente sem um mínimo de padronização de horários?

            Esse conflito entre a falta de uniformização de horários e as exigências das economias e administrações modernas tornou-se particularmente agudo em alguns setores, como o de transporte, por exemplo.

            A expansão geográfica da rede ferroviária na Europa e nos EUA, bem como o extraordinário aumento do número diário de viagens, começou a chocar-se com a confusão e profusão de horários meramente locais. Na Inglaterra, cidades próximas servidas pelas mesmas ferrovias tinham horários muito diferentes. Enquanto Londres se guiava pelo horário do Observatório de Greenwich, Oxford estava 5 minutos “atrasada”; Leeds, 6 minutos “atrasada”; e Barrow, 13 minutos atrás do tempo da capital. À medida que as viagens passaram a ser frequentes, essa confusão de horários começou não apenas a atrapalhar a rotina das ferrovias, como a provocar acidentes e “quase acidentes”, pois os administradores e condutores tinham de recorrer a complexos e confusos almanaques para se situar temporalmente em cada trecho da ferrovia, o que nem sempre podia ser feito com a precisão que a operação ferroviária demandava.

            Em novembro de 1840, a companhia inglesa Great Western Railway Company, que servia o oeste da Inglaterra, decidiu padronizar o horário em todas as suas estações, passando a usar somente a hora de Greenwich. Em 1846, essa decisão foi seguida pela Liverpool and Manchester Railway, que também passou a usar o horário londrino em suas estações. Ao final de 1848, todas as companhias britânicas de ferrovias já haviam aderido à padronização dos horários.

            Entretanto, houve resistências. Durante anos, algumas cidades inglesas conviveram com dois horários: o “horário da ferrovia”, londrino, e o “horário local”. Em algumas estações, como a de Bristol, foram instalados relógios com dois ponteiros de minutos, um sincronizado com o horário de Greenwich e outro sincronizado como o horário local.

            Aos poucos, porém, essa dualidade foi sendo abandonada. Por volta de 1855, 95% das cidades inglesas já haviam adotado o “horário da ferrovia”, isto é, o horário de Greenwich, como seu horário oficial.

            Em 2 de agosto de 1880, foi instituída a Definição de Tempo, o Statutes (Definition of Time) Act, que tornou obrigatório, legalmente, o uso do horário de Greenwich em toda a Inglaterra, padronizando o horário da Inglaterra.

            Processos semelhantes ocorreram em outros países. Nos EUA, a padronização dos horários também obedeceu às necessidades das ferrovias. Em agosto de 1853, houve um grave acidente ferroviário na Nova Inglaterra. Dois trens que trafegavam pelo mesmo ramal, mas que tinham horários diferentes, por procederem de distintas cidades, acabaram se chocando, matando 14 pessoas. Assim, a região da Nova Inglaterra decidiu usar um mesmo horário ferroviário.

            A padronização seguiu até que, em 18 de novembro de 1883, as dezenas de horários locais foram substituídas, mediante um quase consenso da maioria das cidades, por quatro fusos horários, que se estendiam do Atlântico ao Pacífico. Em 1918, esse consenso em relação à padronização de horários foi transformado em lei federal.

            O mesmo aconteceu, com nuanças, na Índia, na Alemanha, na Itália, na Holanda etc. No Brasil, a Lei nº 2.784, de 18 de junho de 1913, assinada pelo então Presidente da República, Hermes da Fonseca, determinou a padronização dos horários, com quatro fusos vigorando em todo o território nacional.

            Essa progressiva padronização dos horários nacionais e a crescente mundialização da economia e dos transportes acabaram por exigir também uma uniformização internacional dos horários.

            Coube a um Senador canadense, Sanford Fleming, em 1878, sugerir, pela primeira vez, um sistema internacional de fusos horários. Sua proposta era dividir a Terra em 24 faixas verticais (meridianos), na qual cada uma delas seria um fuso de uma hora. Como o Planeta tem, obviamente, 360° de circunferência, cada faixa (fuso) teria 15° de largura longitudinal. Em 1883, as ferrovias norte-americanas, como vimos, adotaram o modelo dos fusos, em escala nacional.

            Em 1884, foi realizada a Conferência Internacional do Meridiano, em Washington D.C., nos Estados Unidos, com a presença de 25 países, entre eles o Brasil. Essa Conferência teve como objetivo debater a proposta do Senador Fleming - o Senador canadense que havia proposto a divisão da Terra em 24 faixas verticais - de se estabelecer um Meridiano 0o, a partir do qual seriam definidos os outros meridianos, padronizando, assim, a utilização mundial da hora legal. A proposta de Fleming acabou sendo aceita. Com base no Meridiano 0o, que foi estipulado como sendo o do Observatório de Greenwich, os outros fusos seriam contados positivamente para leste e negativamente para oeste, até ao Meridiano de 180°, o Anti-Meridiano, situado no Oceano Pacífico, onde seria a Linha Internacional de Data, ou seja, o local onde o dia começa. Assim, quando um novo dia começa no Planeta, é meio-dia do dia anterior em Greenwich.

            A decisão foi adotada por 22 a 1. San Domingo, atual República Dominicana, votou contra. A França e o Brasil, pressionado por esta, abstiveram-se.

            Na realidade, a Conferência não impôs fusos aos países, mas apenas decidiu que Meridiano 0o seria o de Greenwich, evitando a antiga profusão de meridianos e fazendo com que o “horário universal” (UTC) coincidisse com o de Londres. Os países adotaram os fusos gradualmente. No caso do Brasil, foi adotado em 1913, como eu disse, a partir da lei assinada pelo Presidente Hermes da Fonseca.

            Ao contrário do que se poderia pensar, o sistema internacional de fusos horários é adotado com bastante flexibilidade pelos países, a depender de suas conveniências administrativas e políticas.

            Há países que têm horários “quebrados” em relação a Greenwich. É o caso do Nepal (UTC + 5 3/4), Índia (UTC + 5 1/2), Irã (UTC + 3 1/2) etc. Há países que, embora gigantescos, comportando cinco fusos horários diferentes, têm, por motivos políticos e administrativos, apenas um fuso horário, como a China, que é um país de dimensão leste-oeste imensamente grande. Há também muitos países que têm fusos oficias diferentes dos de outros países que estão situados na mesma longitude.

            Assim sendo, os horários oficiais quase nunca coincidem com os antigos horários locais estabelecidos pela progressão solar. Na realidade, os horários dos fusos só coincidem com o “horário local” no centro do fuso. Em Greenwich, obviamente, o horário do fuso coincide exatamente com o “horário local”. O mesmo não ocorre em outras cidades inglesas. Em todas elas, há diferenças, ainda que pequenas, entre o horário oficial e o horário solar.

            Em alguns casos, essas diferenças podem ser muito grandes. Na China, em razão da adoção de um único fuso horário, o sol, mesmo no verão, só se levanta depois das 9 horas da manhã em seu extremo oeste.

            Se quiséssemos que o horário oficial (o horário do fuso) coincidisse exatamente com o horário solar, teríamos de abandonar todo esse sistema nacional e internacional de uniformização de horários e voltaríamos ao caos anterior, ficando todos nós guiados apenas pelo horário solar.

            Por outro lado, horários oficiais que são muito distintos dos horários solares locais podem trazer algum prejuízo aos ciclos circadianos da população. Esse não é, com certeza, o caso do Acre, que teve seu horário adiantado em apenas 1 hora, em relação ao antigo horário estabelecido em 1913.

            Saliente-se que, naquela época, em 1913, o Acre era uma região muito distante do centro nacional, e tanto o território quanto a economia do Brasil tinham baixa integração. O horário diferente não incomodava em 1913. Com a progressiva integração, particularmente com a aviação civil, com a televisão e, agora, com o advento da Internet, o horário diferente acabou...

(Interrupção do som.)

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC) - Peço um minuto a mais para concluir, Sr. Presidente.

            Saliente-se, repito, que, em 1913, o Acre era uma região muito distante do centro nacional, e tanto o território quanto a economia do Brasil tinham baixa integração. O horário diferente não incomodava. Em 1913, as distâncias eram muito grandes. Imagine se a diferença de fuso horário iria incomodar! Mas, com a progressiva integração, particularmente com a aviação civil, com a televisão e com o advento da Internet, o horário diferente acabou, no entanto, por interferir negativamente na vida cotidiana dos cidadãos do Acre.

            Atualmente, as circunstâncias mudaram inteiramente. Não é mais conveniente aos interesses do Acre e aos interesses do Brasil que um único Estado da Federação tenha um fuso horário diferente de todos os demais. Observe-se, ademais, que o Acre é área de fronteira, de modo que a padronização do horário daquele Estado é conveniente também à defesa nacional.

            Trata-se de somente uma hora. Assinalamos, finalmente, que a população do centro sul do País, bem como boa parte da população mundial, submete-se, todos os anos, a mudanças desse calibre, devido à adoção do horário de verão. Se, todos os anos, temos de nos submeter a uma hora de diferença, ao horário de verão, por que não nos adaptaríamos a esse fuso horário de hoje? O Acre está com apenas uma hora de diferença em relação a Brasília, como é o caso do Mato Grosso, de Rondônia e do Amazonas.

            Então, nesse sentido, sugiro - isto está na proposição que está em tramitação no Senado - que façamos um plebiscito em 2014, para definir essa situação, de acordo com a vontade da população.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/05/2012 - Página 17907