Discurso durante a 80ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

– Defesa do fim do voto secreto no Congresso Nacional.

Autor
Cyro Miranda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Cyro Miranda Gifford Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • – Defesa do fim do voto secreto no Congresso Nacional.
Aparteantes
Pedro Taques.
Publicação
Publicação no DSF de 16/05/2012 - Página 18788
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ASSUNTO, ELIMINAÇÃO, VOTO SECRETO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, CONGRESSISTA.

            O SR. CYRO MIRANDA (Bloco/PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, saúdo todos os alunos do 1º ano da Fundação Getúlio Vargas do Estado do Rio, aos quais dou nossas boas-vindas!

            Telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, senhoras e senhores, a matéria que trago a esta tribuna não é consensual, mas, muito pelo contrário, tem sido objeto de diferentes polêmicas e debates. Falo da extinção do voto secreto no Parlamento no caso de decisão pela perda do mandato de Deputado ou Senador.

            Entendo que, no modelo de Estado de direito ao qual nos filiamos, só há um único espaço para o voto secreto no sentido literal originalmente concebido. O voto secreto só tem sentido para o eleitor, quando este exerce o direito de escolher os representantes políticos para conduzir a Nação. No contexto do exercício democrático da cidadania, o voto secreto se justifica, porque, caso contrário, acabaria por expor o eleitor, por tornar violável o abrigo da urna e a vontade individual.

            Nas sociedades contratualistas, que se fundam nas concepções de Jean Jacques Rousseau, o cidadão de Genebra, acolhe-se o voto secreto como forma de proteção do eleitor, detentor, em última instância, da vontade expressa nos pleitos eleitorais.

            Na essência, o modelo que se usa hoje não difere do que se adotou na Austrália, ainda em 1856, para eleger o primeiro Parlamento daquele país. A ideia que preponderava e que permanece até hoje era a de que o eleitor pudesse votar a favor do candidato de sua preferência, não no indicado por seu patrão, pelo proprietário de terras ou apoiado pelos vizinhos.

            Srªs e Srs. Senadores, o voto secreto no processo eleitoral é, portanto, um mecanismo primordial para se fortalecer a democracia e a República, sobretudo pelo processo consagrado no princípio de um homem, um voto.

            No Brasil, o voto secreto firmou-se no Código Eleitoral de 1932, que rompeu com os costumes da República Velha, quando os coronéis controlavam os pleitos e puniam quem ousasse votar em candidatos diferentes dos escolhidos pelas oligarquias locais.

            Apesar de percalços durante os períodos de ditadura, o modelo que vigora até hoje entre nós, consagrado pelas Constituições de 1946 e de 1988, é o do voto secreto, como forma de expressão nas urnas das escolhas dos representantes políticos da Nação.

            Mas, Sr. Presidente, fora desse contexto, não consigo encontrar argumentos para defender o voto secreto, sobretudo no exercício do mandato parlamentar, seja como Senador, seja como Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital ou ainda como Vereador.

            Não há razão ou pretexto para o voto ser secreto no moderno Parlamento brasileiro, sobretudo quando se decide pela cassação de um dos seus membros.

            No meu sentir, talvez, não haja momento de maior importância para o eleitor conhecer de fato o candidato eleito do que este, quando precisamos cortar na própria carne, fazer uma opção de se juntar ao trigo ou separar-se com o joio.

            Senador Pedro Taques, nas votações pela perda de mandato de parlamentares, o voto precisa ser aberto e transparente, uma forma de satisfação direta ao eleitor, detentor último da vontade que emana do povo. Se o eleitor não tem o direito de conhecer o voto daquele que elegeu, sobretudo na hora da decisão sobre os destinos de um parlamentar acusado de quebra de decoro, coloca-se um véu sobre o Plenário. E, sob esse véu do voto secreto, acaba por se refugiar a desconfiança, a dúvida quanto aos efeitos do nefasto espírito de corpo e da leniência.

            Já não se justificam mais as defesas feitas em favor do voto secreto, sobretudo quando se considera o avançado amadurecimento da sociedade civil e de todos os setores representativos.

            Se o Parlamento optar pelo fim do voto secreto, na apreciação da perda de mandato, dará um passo significativo no sentido de fortalecer a imagem do Congresso, porque essa situação envolve uma relação que, em última instância, projeta sobre o parlamentar a vontade individual do eleitor, exercida na urna. É como se, pelo voto aberto e transparente, o parlamentar reafirmasse a posição perante o eleitor que o escolheu e o conjunto da sociedade. Eu diria mesmo que se trata de um momento muito próximo do exercício da democracia direta, tamanha a força e a representatividade do voto nesses episódios.

            O voto aberto nos processos de perda de mandato por quebra de decoro parlamentar é, pois, um notório instrumento de fortalecimento da vigorosa democracia que deve preponderar num país como o Brasil.

            Concedo o aparte, com muito prazer, ao Senador Pedro Taques.

            O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT - MT) - Senador Cyro, quero cumprimentá-lo pela sua fala e dizer que o voto que o cidadão deposita na urna, o voto que ele digita na urna eletrônia, esse tem de ser sigiloso, tem de ser secreto. Aliás, o legislador constituinte trata disso como cláusula pétrea, como algo que não pode ser modificado, no art. 60, § 4º, da Constituição. Por que ele tem de ser secreto? Para que a verdade da urna seja a verdade da consciência do eleitor, para que ele não tenha o receio de escolher quem que quer que seja com o temor de descontentar algumas pessoas e algumas causas. Esse voto precisa ser secreto, para que ele não possa ser pressionado no momento de votar. Mas o voto do parlamentar, o voto que depositamos na urna desta Casa, por meio do painel eletrônico ou das cédulas, esse não pode ser secreto, com raríssimas exceções. O nosso voto não pode ser secreto, porque parlamentar que não aguenta pressão não pode estar aqui. Parlamentar tem de revelar aqui a vontade da sua consciência. Se o parlamentar não aguenta a pressão, ele não é digno do exercício de sua função, com todo o respeito a esses parlamentares. Há aqui uma proposta de emenda à Constituição, e temos de ter a coragem de votá-la. É possível votarmos essa proposta de emenda à Constituição. Quero cumprimentá-lo ao tempo em que também me associo à fala de V. Exª. O voto tem de ser aberto nesta Casa, com raríssimas exceções, como eu disse. Por exemplo, em caso de declaração de guerra pelo Presidente, isso deve ser aprovado pelo Congresso. Aí, sim, há o inimigo externo, e o voto tem de ser secreto. O voto não pode ser secreto quando apreciamos se um parlamentar ofendeu ou não o juramento que cada um de nós prestou e que ele prestou de obedecer à Constituição da República.

            O SR. CYRO MIRANDA (Bloco/PSDB - GO) - Muito obrigado, Senador Pedro Taques. Comungo com V. Exª suas palavras, pois isso é o que estou transmitindo.

            O afastamento do voto secreto nesse tipo de deliberação implica também o afastamento de uma prática antidemocrática. Assim, os eleitores conhecerão os votos dos parlamentares ou as razões que os levaram a tomar a decisão.

            Não sou radical quanto à necessidade de se votar aberto em todas as deliberações do Congresso Nacional, porque entendo procedente utilizar o mecanismo em determinadas circunstâncias. Creio que os demais casos de votação secreta, abrigados pela Carta de 1988, são razoáveis e se justificam. De fato, a votação secreta tem o condão de proteger o parlamentar contra a força preponderante tanto do Poder Executivo quanto de segmentos específicos do governo.

            A votação secreta justifica-se, portanto, nos casos de escolha de magistrados e de titulares de alguns cargos públicos, na aprovação de chefes de missão diplomática em caráter permanente, na exoneração do Procurador e na apreciação de vetos presidenciais. Mas não entendo como procedente a votação secreta em relação à prisão em flagrante, no caso de crime inafiançável praticado por membro do Congresso Nacional, tampouco em decisão pela perda do mandado de Deputado ou Senador. Quando o parlamentar incorre nesse tipo de conduta, não só macula a imagem do Parlamento, mas também falseia as bases da democracia. Deve ser julgado, portanto, de forma aberta, como se bem faz nas Cortes de Justiça, onde se pune o cidadão comum.

            Agir de forma transparente levanta o véu da desconfiança e da possível camaradagem, para mostrar claramente a que veio cada um dos parlamentares no Congresso Nacional.

            Portanto, Srªs e Srs. Senadores, firmo nesta tribuna a convicção de que as votações pela perda de mandato parlamentar devem ser abertas, como forma de sintonizarmos o Parlamento com os anseios da opinião pública. As votações secretas, no caso de perda de mandato, não têm lugar no contexto da moderna democracia que se tem fundado no Brasil em nome do Estado democrático de direito.

            Aproveito para salientar que a PEC nº 38, de 2010, que conta com um substitutivo do Senador Antonio Carlos Valadares, faz-se, nesta hora, necessária em regime de urgência urgentíssima para fazermos justiça neste País.

            Muito obrigado.

            Mais uma vez, meus parabéns aos alunos da Fundação Getúlio Vargas, que cumprimento!

            Obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/05/2012 - Página 18788