Pela Liderança durante a 80ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

– Comentários acerca das recentes medidas econômicas adotadas pelo Governo Federal.

Autor
Armando Monteiro (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/PE)
Nome completo: Armando de Queiroz Monteiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • – Comentários acerca das recentes medidas econômicas adotadas pelo Governo Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 16/05/2012 - Página 18790
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • COMENTARIO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO FEDERAL, REFERENCIA, REDUÇÃO, JUROS, BANCO OFICIAL, EFEITO, COMBATE, EXCESSO, LUCRO, BANCOS, ESTUDO, DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATISTICA E ESTUDOS SOCIO ECONOMICOS (DIEESE), ASSUNTO, SITUAÇÃO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.

            O SR. ARMANDO MONTEIRO (Bloco/PTB - PE. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Governo deu partida, em março, à ofensiva pela queda dos altos spreads bancários, que vem a ser a diferença entre o custo de captação dos bancos e os juros dos empréstimos que são cobrados lá na ponta aos clientes, sejam eles pessoas jurídicas ou físicas. Essa iniciativa foi uma decisão acertada de política econômica, e há muito esperada.

            O movimento iniciou-se pela redução do spread nos bancos oficiais, notadamente Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, e cresceu com a proposta de mudanças também na caderneta de poupança como parte da estratégia para baixar as taxas de juros. Neste último caso, foi editada, no início deste mês, a Medida Provisória nº 567, que propõe alteração da remuneração adicional do saldo dos depósitos de poupança a serem realizados a partir da vigência da referida medida provisória.

            Pela nova regra, os depósitos continuariam a render 0,5% ao mês mais a Taxa Referencial (TR), se a taxa Selic, no entanto, estiver acima de 8,5. Quando a taxa cair abaixo desse patamar, ou seja 8,5%, o rendimento passaria a ser de 70% da Selic mais a taxa de referência.

            Segundo o Governo, tal medida se faz necessária num contexto em que o atual modelo de remuneração do saldo dos depósitos de poupança poderá dificultar a gestão da política monetária e sobretudo impedir uma queda mais acentuada da taxa básica de juros.

            Na semana passada, foram aprovados nesta Casa requerimentos de audiência pública, no âmbito da Comissão de Assuntos Econômicos, para discutirmos num primeiro momento com o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, mas também com economistas, com o Presidente da Febraban e com outros convidados o conjunto de iniciativas que objetivam reduzir a taxa de juros para os tomadores finais, sejam eles, volto a dizer, pessoas físicas ou jurídicas.

            Reconheço a oportunidade desse debate, que, de resto, já vem sendo percebido pelo conjunto da sociedade brasileira e que diz respeito a essa anomalia no Brasil, que são os spreads bancários, ou seja, as margens brutas de intermediação do sistema financeiro no Brasil, que representam realmente uma distorção.

            Não é possível que um País que tem hoje as condições macroeconômicas do Brasil, que tem, inclusive, na percepção da comunidade internacional, prêmios de risco que são cada vez mais baixos, um País que é credor externo líquido, ou seja, que tem reservas cambiais maiores do que a sua própria dívida, que tem uma taxa básica de juros hoje que caminha para patamares de economias estabilizadas, como justificar, então, o nível de spreads, que ainda, infelizmente, são praticados no nosso País?

            A Consultoria Austin Rating mostra que, apesar da redução muito significativa da taxa básica de juros no período que vai de dezembro de 2005 até fevereiro de 2012 - a Selic caiu de cerca de 18% para pouco mais de 9%, em fevereiro de 2002 -, os spreads mantiveram-se no mesmo patamar. Eram 28,6%, em 2005, e oscilaram para 28,4%.

            Observemos o paradoxo: o custo de captação diminui, mas a margem bruta, que é agregada às operações, mantém-se a mesma, o que significa dizer que o dinheiro continua a ser muito caro para aqueles que se utilizam do crédito no Brasil.

            Segundo um estudo recente do Dieese, o Brasil detém a maior taxa, o maior nível de spreads, quando comparado às nações desenvolvidas, mesmo em relação à América Latina e aos Brics. Em janeiro, a taxa média dos empréstimos no País estava em torno de 38%, e a taxa média de captação, em 10,2%, resultando daí um spread bruto de 27,8%.

            No mesmo mês, o spread da Argentina era de 3,4 pontos ao ano; o do Chile, 4,5; e o do México, 3,8, só para citar alguns exemplos. Perdemos também para os demais integrantes do Brics, registrando que o spread da China se situa, ou seja, a margem bruta, em 3,1; na Rússia, em 3,0; e na África do Sul, em 3,5.

            O relatório explica os altos spreads, entre outras razões, pelo fato de que os bancos brasileiros permaneceram muito tempo fechados à competição externa e voltados ao financiamento dos elevados déficits do setor público no Brasil. A contínua pressão dos gastos públicos, da elevação dos gastos, consequentemente pressionando e agravando as condições de financiamento do Estado brasileiro, também propiciaram essa distorção, na medida em que esse espaço deslocava a demanda do setor privado e deixava o sistema financeiro numa posição cômoda de financiamento do Tesouro Nacional.

            Os longos períodos ae inflação alta e de crise levaram o Banco Central a dirigir ações para fortalecer o sistema financeiro, deixando para segundo plano a questão do custo do crédito. Hoje, as instituições estariam em condição de repensar sua estratégia, focando no aumento do volume de crédito a custos mais baixos, em razão da tendência de queda da Selic para os próximos anos.

            É hora de se aplicar ao sistema os princípios da economia de escala. Se é verdade que os ativos das instituições decuplicaram nos últimos anos em função da forte expansão do crédito no Brasil, como explicar a manutenção de margens unitárias tão elevadas ainda?

            O Dieese aponta também como causa dessa distorção a estrutura oligopolista desse segmento, com poucas instituições no controle e, portanto, com grande poder sobre o mercado, o que, evidentemente, reflete-se no nível das taxas lá na ponta e ainda das tarifas bancárias. Para terem uma ideia do nível de concentração da indústria bancária no Brasil, os cinco maiores bancos concentram mais de 80% dos ativos totais e das operações de crédito do sistema bancário. As fusões e a entrada das instituições bancárias internacionais fortaleceram o mercado, mas não propiciaram a esperada redução dos spreads. Em vez de provocar um acirramento da concorrência, com saudáveis efeitos sobre o nível das taxas de juros, o que aconteceu é que essas instituições acomodaram-se às elevadas margens praticadas no mercado brasileiro.

            O registro de spreads recordes nos últimos anos denota haver espaço para a redução desse componente sem impactar a saúde do sistema financeiro e, consequentemente, assegurando às instituições bancárias o cumprimento do seu papel fundamental como agentes de financiamento da economia.

            Ao que tudo indica, essa elevada concentração bancária tem produzido no mercado, dado o grande o poder de um número pequeno de instituições, uma distorção que, de resto, está hoje refletida nessa realidade do nosso mercado.

            Em fevereiro deste ano, na audiência pública promovida também na Comissão de Assuntos Econômicos, em um debate com o Presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, questionei enfaticamente a ausência da atuação de um órgão em prol da defesa da concorrência no mercado financeiro. É inegável que o Banco Central vem conduzindo bem as questões macroprudenciais, tendo acertado, ao iniciar, em agosto de 2011, o ciclo de redução da taxa de juros, mesmo quando o mercado financeiro defendia uma posição mais conservadora. Mas sua atuação sempre foi tímida no que se refere à defesa da concorrência no sistema bancário especialmente. E o maior prejudicado sempre foi o consumidor, permanentemente indefeso diante dessa realidade. O Cade, por exemplo, que é o órgão de defesa da concorrência no Brasil, nunca exerceu esse papel em relação ao sistema financeiro, porque dizia ser esta uma função do Bando Central, e este, por sua vez, não dispensou, até então, o tratamento prioritário, merecido por esse tema.

            Há, sem dúvida, um vácuo regulatório na questão da defesa da concorrência financeira do Brasil. Isso prejudica o crescimento do País, pois o elevado custo de capital para consumidores e empreendedores inibe os investimentos e os gastos privados, fatores essenciais para a dinamização da economia.

            Entretanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, reconhecemos que essa agenda dos spreads é uma agenda densa, complexa, que nos remete ainda à discussão de outras questões ligadas, por exemplo, ao ambiente da tributação. O Brasil é um dos países que tributam de forma direta e indireta e de modo severo a intermediação financeira. Diferentemente do que muitos ingenuamente supõem, ao tributar fortemente a intermediação financeira, nós não estamos tributando os bancos; nós estamos, sim, penalizando o tomador do crédito, porque todo esse custo é repassado para os tomadores do crédito lá na ponta.

            Temos ainda um nível de depósitos compulsórios, ou seja, aquela parcela dos depósitos que é recolhida compulsoriamente ao Banco Central, que também se constitui em algo que não tem paralelo no cenário internacional. O Brasil tem um nível de recolhimentos compulsórios altíssimo, inclusive até - pasme, Senador Wellington Dias - sobre depósitos a prazo. O Brasil também exige compulsórios sobre depósitos a prazo que não afetam diretamente a base monetária. Isso tudo termina por agravar esses custos que, ao final, estão incorporados a isso que se chama de spreads bancários. Além disso, temos ainda a velha questão da insegurança jurídica.

            O Brasil é um País em que o sistema judicial tem um viés pró-devedor. Quando se questionam juros - pasmem, Senhores -, quando alguém questiona os juros de um contrato, adquire também o direito de deixar de pagar o principal. Então, isso é algo que também não existe no mundo. Essa insegurança termina sendo levada para a taxa de juros. É uma espécie de prêmio de risco que vai ser incorporado também às taxas de juros praticadas no mercado.

            Adicionalmente, o estudo do Dieese considera importante uma mudança na gestão da dívida pública brasileira, para que as instituições financeiras detentoras de grande quantidade de títulos da dívida (atualmente remunerados pela Selic) disponham de um leque de alternativas de aplicação em ativos negociáveis com a vantajosa combinação de alta rentabilidade e baixíssimo custo. Com isso, haveria mais recursos para o crédito produtivo de longo prazo.

            Então, considero este debate extremamente oportuno e acredito que, da discussão madura entre bancos privados, Governo e Parlamento, possamos obter como resultado um ciclo mais virtuoso para o País e para os cidadãos.

            A hora não é para voluntarismos e nem para atitudes imprudentes. A energia deverá ser canalizada para o esforço de redução continuada da taxa de juros com soluções que não afrontem as leis de mercado, mas, sobretudo, que estimulem a concorrência, algo sempre muito saudável.

            Conhecemos bem o efeito perverso da combinação de spread elevado, juros altos e carga tributária pesada. Essa realidade nos distancia do patamar e dos padrões internacionais, penaliza a sociedade de modo geral, mas prejudica especialmente o setor produtivo, fonte de geração de emprego e renda, bem como distancia cada vez mais o País da rota do crescimento sustentável. É hora de desmontar esses entraves ao nosso desenvolvimento.

            Portanto, defendo um debate aberto, franco e responsável sobre essa questão. Não temos, evidentemente, propósito algum de querer demonizar o sistema financeiro. O Brasil tem um sistema financeiro eficiente, saudável e que, portanto, representa um ativo valioso para o nosso País, mas temos que encontrar solução para essa grave anomalia que hoje se traduz no nível das taxas de juros praticadas no nosso País.

            Essa é a nossa mensagem.

            Agradeço, Sr. Presidente. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/05/2012 - Página 18790