Discurso durante a 81ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Avaliação sobre a distribuição dos royalties do petróleo e dos minérios entre os entes federados, bem como acerca de outros pontos estruturantes do pacto federativo.

Autor
Aécio Neves (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
Nome completo: Aécio Neves da Cunha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MANIFESTAÇÃO COLETIVA, GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Avaliação sobre a distribuição dos royalties do petróleo e dos minérios entre os entes federados, bem como acerca de outros pontos estruturantes do pacto federativo.
Aparteantes
Jayme Campos, Luiz Henrique, Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2012 - Página 19155
Assunto
Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA, GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, REFERENCIA, REIVINDICAÇÃO, MARCHA, DISTRITO FEDERAL (DF), PREFEITO, MUNICIPIOS, PAIS, APRESENTAÇÃO, SITUAÇÃO, CENTRALIZAÇÃO, RECEITA, TRIBUTOS, FATO, REDUÇÃO, ATUAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, AMBITO, ESTADOS, MUNICIPIO, REGISTRO, NECESSIDADE, DEBATE, REFORMULAÇÃO, PACTO FEDERATIVO.

            O SR. AÉCIO NEVES (Bloco/PSDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, ilustre Senadora Ana Amélia, Srªs e Srs. Senadores, venho hoje a esta tribuna tratar de uma questão que não é nova nesta Casa nem tampouco nas minhas manifestações.

            Começo, ilustre Senadora, por fazer uma análise um pouco diferenciada daquela que foi feita pela imprensa, no dia de hoje, em relação à reação, ontem, de algumas centenas, talvez alguns poucos milhares de prefeitos que estiveram presentes em Brasília, em mais uma marcha, reivindicando atenção do Governo Federal para importantes pleitos dos Municípios brasileiros.

            A imprensa, hoje, repercute que, em determinado momento, vários desses prefeitos se manifestaram contrariamente à posição da Srª Presidente da República em relação à questão da distribuição dos royalties do petróleo.

            A avaliação que faço, Srª Presidente, é diferente. Não se trata apenas de uma reação de descontentamento em relação a uma questão específica, esta também motivo de descontentamento, já que o Governo Federal poderia também, em relação à questão dos royalties, ter arbitrado uma discussão em que a reorganização da Federação fosse a prioridade maior. Diferentemente dessa posição, preferiu o Governo Federal brigar por uma parte expressiva dessas novas receitas.

            Mas, na verdade, faço apenas essa introdução, Presidente Ana Amélia, para dizer que há muitos anos, pelo menos há 10 anos, o Governo Federal vem virando as costas para a Federação brasileira. Hoje, estamos vivendo praticamente num Estado unitário, a concentração de receitas tributárias nas mãos da União é a maior, Deputado João Paulo, de toda a nossa história republicana. Hoje, se percebêssemos com a profundidade devida o avanço dessa concentração, certamente muitos brasileiros se surpreenderiam. Sabe disso o Senador Aloysio, estudioso da matéria.

            Para falar na área de segurança pública, Srª Presidente, hoje uma tragédia nacional, preocupação de todas as famílias de brasileiros, morem eles no Norte, no Sul, em cidades grandes ou em cidades menores, de todos os investimentos feitos em segurança pública no Brasil, 82%, Senador Jarbas, são de responsabilidade dos Municípios e dos Estados, e apenas 18,5% de responsabilidade da União.

            A Firjan, Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, há pouco mais de uma semana, apresentou um interessante estudo que demonstra que 83% dos Municípios brasileiros não conseguem mais se sustentar, não conseguem, sem se endividar, pagar, no final do ano, o 13º salário para os seus servidores.

            Mas eu poderia ir muito além - citei apenas a área de segurança pública. Na área de transporte, 65% dos investimentos são feitos por Estados e Municípios e apenas 35% pela União; na área de educação e cultura, 77,5% dos investimentos são feitos também por Estados e Municípios; na área de habitação e urbanismo, os Municípios e os Estados, Srª Presidente, arcam com 90% de tudo o que é investido no Brasil; e na área de saneamento básico e da saúde, lembro-me, Senador Aloysio, há dez anos, quando o PT, atual partido hoje detentor do poder central, assumia o governo, dos investimentos em saúde pública, 46%, no ano de 2000, eram de responsabilidade da União. Hoje a União participa com 30% apenas do total de investimentos em saúde pública.

            Há pouco tempo, tivemos uma oportunidade histórica, daquelas que não se pode perder. Apresentada a proposta por um ex-senador do PT, encampada por nós da oposição, e até com a proposta de escalonamento da sua implantação definitiva, propusemos que, da mesma forma que os Municípios participam com 15% das suas receitas, no mínimo, dos investimentos em saúde, os Estados com 12%, que a União pudesse chegar, nos próximos anos, a 10%. O que fez o Governo Federal com a sustentação, infelizmente, da sua base? Virou as costas a essa oportunidade. Não teremos, portanto, a possibilidade de reorganizar o atendimento à saúde pública no Brasil com a participação da União. São 30% apenas da União, a maior concentradora de receitas, hoje, de investimentos na área da saúde pública.

            Poderíamos voltar a falar sobre a questão de saneamento básico. Lembro-me, Srªs e Srs. Senadores, Senador Jayme Campos, que na campanha eleitoral, depois de uma proposta apresentada pelo ex-senador, ex-ministro e candidato José Serra, encampada pela atual Presidente da República, ela assumiu com os brasileiros a responsabilidade e o compromisso de desonerar as empresas de saneamento básico de todo o Brasil, com a extinção do PIS, PASEP e COFINS. Hoje o que estamos assistindo? Já em 2011 iniciou-se esse processo, que vai se repetir em 2012; as empresas de saneamento básico estão pagando mais impostos do que fazendo investimentos em todo o Brasil.

            Eu próprio tenho uma proposta, que tramita nesta Casa, mas sem que a ela seja dada a celeridade adequada, a de que haja o cumprimento daquele compromisso de campanha, desonerando as empresas de saneamento básico. Essa seria, sim, uma proposta que nos levaria àquilo que conversava há pouco com o Senador Aloysio, a um País realmente carinhoso para com as crianças, sobretudo as de mais baixa renda, já que 50% dos domicílios do Brasil não têm saneamento básico. Por que não tomar uma medida ousada nessa direção? 

            Eu faço, portanto, hoje esse pronunciamento para dizer que outras oportunidades nós teremos este ano, pela frente, que muito provavelmente não se repetirão. Três ou quatro questões estruturantes serão tratadas por esta Casa, Senador Wellington,...

            O Sr. Luiz Henrique (Bloco/PMDB - SC) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. AÉCIO NEVES (Bloco/PSDB - MG) - ...V. Exª, que já foi governador de Estado, com muita honra, e meu colega durante oito anos.

            Nós teremos alguns temas que vêm na direção da refundação da Federação no Brasil. São eles:

            - redistribuição dos royalties, cuja discussão deverá voltar a esta Casa, royalties do petróleo e também da mineração, obviamente algo que atenderá à necessidade premente de Estados e Municípios mineradores brasileiros;

            - a renegociação da dívida dos Estados, sincera, e também nesse contexto de reorganização e fortalecimento da Federação, já que permitiria espaço fiscal para que os Estados voltassem, em parceria com os Municípios, a fazer os investimentos que já não conseguem fazer.

            Teremos ainda este ano que discutir aqui, no Plenário desta Casa, os critérios para a distribuição do Fundo de Participação.

            E sobre nenhuma dessas matérias eu vejo uma ação organizada, Governador e Senador, meu querido amigo Luiz Henrique, do Governo Federal, que nos chame inclusive a nós, da oposição, porque nós temos tido, ao longo da nossa história, a capacidade de compreender e de diferenciar aquelas que são ações de governo daquelas que são ações de Estado. E para essas, nós estaremos sempre prontos a discutir e eventualmente a construir entendimentos, como aquele que construímos, sob a coordenação e o comando de V. Exª, em relação à proposta do Código Florestal aprovada nesta Casa e, a meu ver, muito mais adequada do que aquela que se discute na Câmara dos Deputados.

            Portanto, nós temos, Senadora Ana Amélia, esse grande tema, esta grande questão a ser colocada de forma definitiva: ou queremos viver numa Federação ou caminharemos para viver, definitivamente, no Estado Unitário.

            Dou, com muito prazer, um aparte a V. Exª, Governador e Senador Luiz Henrique.

            O Sr. Luiz Henrique (Bloco/PMDB - SC) - Nobre Senador Aécio Neves, V. Exª aborda assunto que faz parte da minha luta política há mais de 40 anos. O Brasil não pode continuar de costas para os brasis. O Brasil é um continente com diversidades as mais absolutas e, por isso, não pode concentrar, como concentra, mais de 2/3 da receita tributária arrecadada pelo povo nas mãos do Governo Federal. O Brasil tem que descentralizar-se. E eu lembro V. Exª - nós, que fomos governadores, durante oito anos, no mesmo período - que, em 1954, os Estados detinham 35% dos recursos arrecadados no País, enquanto a União detinha - já muito - 50% dos recursos. Depois da Constituição, com a criação de impostos não compartilhados, mascarados sob o nome de “contribuições”, a arrecadação tributária da União cresceu para mais de dois terços (65%), a dos Estados caiu para 22%, e a dos Municípios ficou, miseravelmente, na proporção de 13%. A luta de V. Exª é a nossa luta. Estaremos juntos por um novo Pacto Federativo.

            O SR. AÉCIO NEVES (Bloco/PSDB - MG) - V. Exª, Senador Luiz Henrique, tem sido das vozes mais vibrantes na direção da refundação da Federação brasileira.

            Apenas para corroborar com o que disse V. Exª, quando estávamos aqui, na Constituinte de 1988, a soma das contribuições, que são os impostos arrecadados exclusivamente pela União, representava cerca de 20% de tudo o que se arrecadava, com a soma de IPI e Imposto de Renda, que são os impostos - sabe disso o Prefeito Fortunati - compartilhados com Estados e Municípios.

            Hoje, ilustre Prefeito, ex-Deputado Fortunati, as contribuições somam mais de 100% de tudo o que se arrecada com impostos compartilhados. Por quê? Porque as bondades são feitas, Senadora Ana Amélia - V. Exª, que sempre também aqui tem sido uma voz vibrante na direção do novo Pacto Federativo -, as bondades são sempre feitas com os parcos impostos hoje compartilhados com Estados e Municípios.

            Esta não é uma manifestação de oposição; é uma manifestação da cidadania. Fomos governadores e temos a responsabilidade de compreender que ou temos a coragem de refundar a Federação do Brasil ou seremos todos cúmplices dessa sanha arrecadadora do Governo Federal.

            Dou um aparte, se me permite a Presidente, ao Senador Wellington e, em seguida, ao Senador Jayme Campos.

            Ouço o Senador Wellington Dias, Governador Wellington Dias, e o Senador Jayme Campos.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Senador Aécio, primeiro, quero aqui louvar por estarmos tratando dos temas que interessam à Federação. Muitas vezes, ficamos discutindo aqui nome de rodovias, e me constrange trazer ao Parlamento brasileiro alguns temas que, por mais importantes que sejam no nível local, não estão dentro daqueles grandes temas que nós temos. Quero lembrar, permitam-me, algumas coisas. A primeira é que já faz mesmo algum tempo que a União vem ampliando essa concentração. E também tenho, da mesma forma que V. Exª, o interesse que possamos fazer o caminho contrário. Lembrar que a criação dessas contribuições foi uma forma - inclusive não partilhada com os demais Estados - ocorrida mais para trás. Assim como, em relação à saúde, permita-me apenas lembrar que essa participação maior se dava no instante em que nós tínhamos a antiga CPMF. Também acho que nós votamos aqui a Emenda nº 29 capenga, por isso que há esse problema hoje para Estados e Municípios. Temos que olhar para isso. Estou junto com V. Exª na questão do saneamento. E não posso deixar de ressaltar que foi exatamente no entendimento com o Governo que tratamos de temas como esse, do Fundo de Participação, do e-commerce, o comércio eletrônico que temos que trabalhar, da redução da dívida; e é assim que vamos tratar da questão do Fundo de Participação. Devo dizer que estive ouvindo atentamente sobre a fala que a Presidenta fez ontem na marcha dos prefeitos sobre os royalties. Os três aspectos levantados - eu acho que houve ali um erro na forma de colocar - a Presidenta levantou que ela é contra a quebra de contrato. Todos nós somos. O País tem que honrar os seus contratos. Que não quer inviabilizar Rio e Espírito Santo: nós também. Que tem que trabalhar uma regra nova daqui para frente: nós também. Então, o projeto que esta Casa aprovou e V. Exª nos ajudou aqui na defesa, na construção, é um projeto que tem que ser votado lá na Câmara. Nesse ponto eu acho que a marcha dos prefeitos e o fórum dos governadores ajudam nessa direção. Está correto, é preciso discutir temas como per capita SUS, como o repasse de Fundeb que dá essa crise hoje devido ao piso da educação. O problema não é o piso da educação, o problema é na hora da distribuição dos recursos do Funbeb que colocou uma amarra para Estados e Municípios que têm maior dificuldade. Então, quero aqui me congratular e quero me somar para estarmos juntos nessa agenda do Pacto federativo, uma agenda que trata de mudanças que não são fáceis na repactuação do Pacto federativo, como chamamos, com a União. Muito obrigado.

            O SR. AÉCIO NEVES (Bloco/PSDB - MG) - Agradeço a contribuição de V. Exª e, se me permite a Presidência, dou um aparte ao Senador Jayme Campos.

            O Sr. Jayme Campos (Bloco/DEM - MT) - Meu caro Senador Aécio Neves - a minha intervenção, Srª Presidente, será rápida -, eu não poderia deixar aqui de manifestar o meu aparte a V. Exª, diante do assunto muito pertinente que traz à tribuna, na tarde de hoje, sobretudo V. Exª que já foi governador por dois mandatos, já foi Presidente da Câmara e certamente é um dos brasileiros que mais conhecem as problemáticas de nosso País. V. Exª abordou vários assuntos: a questão do pacto federativo, uma melhor distribuição da renda nacional que hoje concentra na mão do Poder Executivo Federal. Todavia, quando V. Exª disse aqui, e que me chamou muito a atenção, que hoje nas companhias de saneamento deste País se paga mais tributo do que se investe, na medida em que 17%, Senador Aécio Neves, das mortes desconhecidas neste País ocorrem por uma questão de saneamento básico. Por isso, é fundamental que busquemos investimentos, seja na saúde, no saneamento, na segurança, em políticas públicas sociais, para certamente podermos melhorar as condições de vida do povo brasileiro, sobretudo daqueles mais humildes. Nós temos que buscar, certamente agora, e temos essa missão nobre, que o Governo Federal, por meio do Poder Executivo, sensibilize-se e faça uma melhor distribuição. É inconcebível, meu caro Senador e futuro Presidente Aécio Neves, que - particularmente posso falar em termos de Mato Grosso - o meu Estado, o Estado de Mato Grosso, nas suas receitas correntes líquidas, gaste 21%, ou seja, desembolse para pagar dívida. Ou seja, pagou no ano passado R$1,5 bilhão de uma dívida de R$5 bilhões e ainda deve R$6 bilhões. Então, a dívida não decresce, ela cresce. Então, nós temos que discutir. O mesmo que o BNH - palavras aqui do Senador Luiz Henrique. Então, V. Exª vem em bom momento. Temos que somar, naturalmente, a proposta. Nós estamos aqui não como uma oposição raivosa, radical, muito pelo contrário; nós queremos aqui dar a nossa contribuição e, sobretudo, na somatória dos esforços, buscar bons encaminhamentos, defendendo os interesses do povo brasileiro. Parabéns pelo seu pronunciamento, meu caro Senador e futuro Presidente Aécio Neves. Muito obrigado.

            O SR. AÉCIO NEVES (Bloco/PSDB - MG) - Agradeço a gentileza de V. Exª, Senador Jayme. Mais uma vez, o conhecimento profundo de V. Exª sobre a matéria só torna um pouco mais relevante este meu pronunciamento. E V. Exª sabe como eu que existe um projeto tramitando na Casa que poderia ser um primeiro gesto do Governo Federal nessa direção de transformar, realmente, o Brasil em um país carinhoso para com suas crianças, que seria nós trazermos a zero, zerarmos as alíquotas do PIS e COFINS sobre as empresas de saneamento.

            Caminho para encerrar, agradecendo a tolerância de V. Exª, ilustre Senadora Ana Amélia, e dizendo, ao final, que a sensação que me passa é de que, voluntária ou involuntariamente, há uma tendência do governo de avançar na concentração de receitas, fazendo com que os Estados e Municípios sejam cada vez mais pedintes em relação ao Governo Federal.

            Espero ainda viver no Brasil onde as marchas dos prefeitos não sejam mais marchas reivindicatórias e frustrantes, Senador Ivo Cassol, como essas a que temos assistido continuamente em Brasília, sejam marchas de confraternização por um novo Brasil, por um Brasil mais igualitário. E esse Brasil igualitário só vai ser realidade no momento em que Municípios e Estados readquirirem as condições de eles próprios enfrentarem as suas dificuldades, sem depender da benevolência, sem depender do carinho, sem depender do humor do Governo Federal, em especial da Senhora Presidente da República.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2012 - Página 19155