Discurso durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da CPMI do “caso Cachoeira”.

Autor
Jarbas Vasconcelos (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PE)
Nome completo: Jarbas de Andrade Vasconcelos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Considerações acerca da CPMI do “caso Cachoeira”.
Publicação
Publicação no DSF de 24/05/2012 - Página 20855
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), MOTIVO, IMPEDIMENTO, ANDAMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, REFERENCIA, EMPRESARIO, ESTADO DE GOIAS (GO), NECESSIDADE, CONVOCAÇÃO, DEPOIMENTO, GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DIRETOR, EMPRESA, REU.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (Bloco/PMDB - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Senhora Presidente,

            Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, é público e notório que a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Cachoeira só saiu do papel porque o Partido dos Trabalhadores pensava em transformá-la num cadafalso para alguns de seus desafetos, incluindo políticos e setores da imprensa.

            Quem acompanha as reuniões da CPMI pode perceber o esforço do PT em trazer governadores que não sejam os da sua legenda para depor na comissão. Se for para convocar governadores - e eu acho que deveriam ser convocados - tem de ser todos os governadores citados no processo: o de Goiás, do Distrito Federal e também do Rio de Janeiro.

            Quanto à imprensa, parece que essa sanha de persegui-la e de se sentir perseguido por ela já foi para o beleléu. O revanchismo, a vendetta, são a marca da base de apoio do Governo.

            Felizmente, nem sempre os planos dos poderosos funcionam como estavam previstos. E um desses imprevistos atende pelo nome de Delta, a principal empreiteira do Programa de Aceleração do Crescimento, que, só no ano passado, recebeu R$884 milhões do Governo Federal. De 2003 a 2011, o volume de recursos da União para a Delta cresceu cerca de 1.400%.

            A intensa e comprovada ligação entre o esquema criminoso de Carlinhos Cachoeira e a Delta torna inevitável a convocação pela CPMI do dono da Construtora Delta, o Sr. Fernando Cavendish. Vale a pena relembrar que, na única entrevista que concedeu sobre o escândalo, feita pela jornalista Mônica Bergamo, publicada pela Folha de S.Paulo no dia 19 de abril passado, o próprio Cavendish admitiu que poderia falar para uma comissão parlamentar de inquérito. Portanto, é no mínimo suspeito que o PT e a base de apoio do Governo não apoiem essa convocação.

            A opinião pública brasileira precisa ver esclarecida a real participação da Construtora Delta nesse escândalo, e nada mais apropriado que o seu principal executivo prestar as devidas explicações à CPMI do Congresso Nacional.

            A convocação da Comissão Parlamentar de Inquérito não deve ficar restrita apenas ao ex-diretor da Delta no Centro Oeste, Cláudio Abreu, como se fosse plausível imaginar que a empreiteira tivesse uma atuação regional dissociada do comando da empresa, sediada no Rio de Janeiro.

            Senhora Presidente,

            Outra questão, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, à qual devemos estar atentos é a aquisição da Construtora Delta pelo Grupo J&F Participações. Essa operação precisa ter completa transparência, pois foi realizada em tempo recorde e envolve personagens e empresas com vínculos com o Governo. O primeiro desses vínculos é o fato de o J&F ser comandado pelo Sr. Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central do Brasil.

            O vínculo governamental com essa operação fica ainda mais estreito diante da informação de que o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) detém 31% do capital do frigorífico JBS/Friboi, controlado pelo J&F. Imaginem o escândalo que seria em um país que quisesse, realmente, com determinação, apurar a corrupção.

            Não há quem, em sã consciência, não desconfie que essa aquisição foi operada nos bastidores pelo Governo Federal, com o objetivo de impedir uma investigação mais profunda nos arquivos da empresa.

            Essa estranha teia de interesses é tão evidente que o Procurador da República no Rio de Janeiro, Nívio de Freitas Silva Filho, requereu a abertura de inquérito civil público para investigar a venda da Delta. Vou aqui reproduzir algumas das argumentações contundentes do Procurador:

“Caso se concretize esse negócio, por força de sua participação acionária no Grupo JBS, o BNDES, em evidente afronta aos princípios da legalidade e moralidade, irá inexoravelmente participar de empresa sobre a qual recaem notícias de graves ilicitudes e que se sujeita a ser declarada inidônea para contratar com o Poder Público.”

            O Governo deveria usar seu peso e sua força para impedir que uma instituição pública como o BNDES fosse envolvida numa operação suspeita, que tem o objetivo claro de salvar uma empresa com envolvimento em ilícitos.

            Senhoras e Senhores Senadores,

            Nos últimos nove anos, desde que o PT chegou à Presidência da República, sempre que surge alguma denúncia, algum novo escândalo, eu me coloco um desafio: imaginar o que os petistas fariam e diriam se o episódio tivesse ocorrido nos governos democráticos, corretos e decentes de Fernando Henrique Cardoso e de Itamar Franco.

            O PT do passado defenderia uma ampla investigação, que abrangesse todas as obras em todo o País, para que não pairasse nenhuma dúvida sobre a idoneidade da empresa e também do Governo. Acredito que boa parte dos brasileiros desejaria que o Partido dos Trabalhadores voltasse a ter aquele espírito aguerrido e sobretudo fiscalizador de outrora.

            Tenho certeza de que o PT daria imensa contribuição para que o Brasil jogasse luz sobre esses subterrâneos da corrupção.

            Não adianta, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o Governo Federal dizer que não tem nada a ver com essa transação imoral, ilícita e estranha da Delta. A mesma coisa ocorre quando o Governo diz - com relação a fortalecer o consumo para melhorar a economia no Brasil - que pretende reduzir tarifas nos setores de energia e da telefonia e que os Estados devem baixar os impostos. Quem deveria dar o exemplo, primeiro, é o Governo Federal, que deveria baixar as taxas federais, e não estar cobrando dos governos dos Estados essa redução.

            Como têm a maioria dos votos, o PT e os seus aliados são determinantes para que a CPMI tenha uma atuação mais transparente, fazendo as convocações necessárias e quebrando - isto é importante, fundamental - todos os sigilos daqueles que participaram de um esquema que pode envolver bilhões de reais - o sigilo bancário, fiscal e telefônico da diretoria da Delta.. Sem esses pressupostos, a CPMI corre o sério risco de cair no ridículo, de perder o resto de credibilidade que ainda resta, apesar do esforço diuturno de algumas poucas e corajosas vozes de parlamentares independentes.

            Também é fundamental que essa operação nebulosa da venda da Delta venha a público, deixando evidente que não há nenhum patrocínio governamental e muito menos uso inadequado de recursos públicos.

            É fundamental que se faça isso, Srs. e Srªs Parlamentares, para que este Senado Federal, que está no fundo do poço, completamente desmoralizado perante a opinião pública, dê uma contribuição larga, para não se afundar ainda mais, fazendo com que a CPMI, através da maioria do Governo ali presente, impeça a quebra dos sigilos dos envolvidos, e a convocação da diretoria da Delta.

            É importante que as pessoas que integram essa CPMI não se submetam e não se sujeitem ao ridículo.

            Era o que eu tinha a dizer, Senhora Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/05/2012 - Página 20855