Discurso durante a 90ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Crítica à conduta do ex-Presidente Lula que estaria exercendo pressão sobre um ministro do STF para proteger réus no processo do “mensalão”.

Autor
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: Aloysio Nunes Ferreira Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CORRUPÇÃO.:
  • Crítica à conduta do ex-Presidente Lula que estaria exercendo pressão sobre um ministro do STF para proteger réus no processo do “mensalão”.
Publicação
Publicação no DSF de 29/05/2012 - Página 21816
Assunto
Outros > CORRUPÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, ACUSAÇÃO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, TENTATIVA, CHANTAGEM, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), OBJETIVO, IMPEDIMENTO, JULGAMENTO, APURAÇÃO, CORRUPÇÃO, HIPOTESE, PAGAMENTO, PROPINA, MESADA, CONGRESSISTA.

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, há muitos anos, no curso de um ácido debate parlamentar, ecoou nesta Casa uma das lições de Santo Agostinho, que dizia respeito ao fato de que a exacerbação de determinadas virtudes pode agravar o inconveniente de determinados vícios.

            A solidariedade é, inegavelmente, uma virtude excelsa. Ela permite, inclusive, traçar uma linha distintiva entre os seres humanos e os demais seres vivos do reino animal. A prática da solidariedade decorre, inclusive, de uma lição ou de um mandamento bíblico, evangélico, que se encontra presente em todas as religiões: não faças a outrem o que não queres que façam a ti. Mas a solidariedade na vida pública está sujeita a determinados limites que são dados pela educação republicana, e diria, que é o respeito às formas, o respeito às regras do funcionamento das instituições, a noção dos limites.

            O Presidente Lula tem manifestado solidariedade aos seus companheiros que são réus no processo do mensalão. Provavelmente o fez no âmbito privado, no círculo de amizades, em relação àqueles que foram seus colaboradores durante anos de luta política e de governo, e chegou a fazer também no âmbito público, ao classificar o mensalão de uma farsa. E levou essa caracterização a ponto de ser ele o estopim deflagrador da CPMI hoje em funcionamento no Congresso Nacional.

            Acontece, Sr. Presidente, que os jornais nesse fim de semana nos deu notícia de que o Presidente Lula ultrapassou os limites da solidariedade, mesmo da solidariedade pública, quando, no afã de proteger os seus companheiros de um julgamento que ele teme que seja impiedoso e injusto, ousou exercer uma pressão absolutamente reprovável sobre um ministro do Supremo Tribunal Federal.

            Vejam os Srs. Senadores como a atmosfera pestilencial do mensalão continua a contaminar o ar que nós respiramos. Decorridos mais de seis anos dos fatos revelados de compra de votos no Congresso Nacional pelo Presidente da República, continua havendo ainda no ar as emanações que vêm desse episódio.

            O Presidente Lula é homem que tem virtudes que reconheço e que todos reconhecemos, mas creio que o reconhecimento público, mesmo por parte da oposição, e a idolatria de que ele é objeto por parte de seus correligionários, levaram-no a perder a consciência dos limites que devem ser traçados pela educação republicana. Os fatos narrados constituem uma ação reprovável do ponto de vista ético, do ponto de vista moral, uma ação eivada da mais profunda indelicadeza, mas sobre ser antiética, imoral e indelicada, a conduta é tipificada também no Código Penal Brasileiro.

            O Líder Alvaro Dias se referiu às providências que a oposição vai tomar em relação a esse episódio. Elencou pelo menos três artigos do Código Penal que, no nosso entender, são aplicáveis à conduta do Presidente da República e que podem levá-lo a ter sérias dores de cabeça com a Justiça. Eu me deteria num deles apenas: é o art. 344 do Código Penal, inserido no Capítulo III desse Código, dos crimes contra a administração da Justiça. O art. 344 tipifica o crime de coação no curso do processo.

            Eis o que diz o artigo:

            “Usar da violência ou grave ameaça com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamado a intervir no processo judicial, policial, administrativo ou em juízo.

            Pena: reclusão de um a quatro anos”.

            E multa além da pena correspondente à violência.

            Vejam os senhores que nós temos presentes no episódio noticiado pela revista Veja e que já começam a ser corroborados por episódios que aparecem em outros jornais - eu cito especialmente a reportagem estampada no jornal O Globo de autoria do Jornalista Jorge Moreno - os elementos se encaixam como uma luva, os elementos do fato incorporado. Houve grave ameaça a uma autoridade judicial, chamada a intervir no processo judicial. Quem é essa autoridade? É o Ministro do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Gilmar Mendes. Qual é o processo em que ele é chamado a intervir? É o processo do mensalão. Qual foi a grave ameaça usada contra ele pelo Presidente Lula? Fazer com que uma pretensa viagem a Berlim se transformasse em um episódio a ser investigado pela CPMI, como forma de abalar talvez, irremediavelmente a autoridade moral do Ministro. Essa foi a ameaça. É bom, é conveniente adiar o julgamento do mensalão. Até aí nós teríamos uma inconveniência. Até ai nós teríamos uma conduta desabrida, mas quando o Presidente Lula agrega a essa consideração de que seria preciso adiar o julgamento do mensalão a grave ameaça de trazer o Ministro à baila da CPMI, destruindo com isso a sua reputação de homem de bem, de julgador, de Ministro do Supremo Tribunal. Aí nós temos o crime de coação no curso do processo. E é um crime de mera conduta, um crime formal. Não precisa para se caracterizar da produção do resultado. Não é necessária a produção do resultado, basta a grave ameaça. É diante disto que nós estamos. E qual foi o instrumento usado pára fazer a grave ameaça? Foi uma instituição do Congresso Nacional. Uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito. Com isso o ex-Presidente além de ter insultado o Ministro do Supremo Tribunal Federal insultou o Congresso e mais particularmente os membros da situação que integram essa CPMI, que foram apresentados como sendo “meros fantoches”, “meros espantalhos”, vestidos com roupas esfarrapadas para espantar passarinhos. Foi assim que foram apresentados os membros da CPMI, injustamente porque entre os situacionistas que integram existem deputados e senadores comprometidos com o exercício correto do mandato parlamentar. 

            Por essas razões, Sr. Presidente, essa notícia nos enche de tristeza, de consternação e creio que o Presidente Lula deveria pedir desculpas à Nação pela conduta que ele se permitiu contra o Ministro do Supremo Tribunal Federal.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/2012 - Página 21816