Discurso durante a 90ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre alguns vetos presidenciais à proposta do Código Florestal.

Autor
Rodrigo Rollemberg (PSB - Partido Socialista Brasileiro/DF)
Nome completo: Rodrigo Sobral Rollemberg
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CODIGO FLORESTAL.:
  • Reflexão sobre alguns vetos presidenciais à proposta do Código Florestal.
Publicação
Publicação no DSF de 29/05/2012 - Página 21823
Assunto
Outros > CODIGO FLORESTAL.
Indexação
  • ANALISE, VETO (VET), DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROJETO, CODIGO FLORESTAL, CRITICA, CAMARA DOS DEPUTADOS, ALTERAÇÃO, TEXTO, SENADO, COMENTARIO, NECESSIDADE, CRIAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), OBJETIVO, AMPLIAÇÃO, AREA, PROTEÇÃO, PRESERVAÇÃO, NASCENTE.

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco/PSB - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Prezado Senador Waldemir Moka, que preside esta sessão, prezado Senador Cícero Lucena, demais Senadores e Senadoras, ouvintes da Rádio Senado e telespectadores da TV Senado, não poderia deixar de usar a tribuna, na tarde de hoje, para tecer alguns comentários, ainda que breves e iniciais, sobre os vetos da Presidenta Dilma à proposta do Código Florestal aprovada na Câmara dos Deputados e sobre a edição de uma medida provisória que busca preencher as lacunas deixadas pelo veto.

            Já tive oportunidade de contextualizar várias vezes, desta tribuna, como a proposta do Código Florestal chegou ao Senado. Naquele momento, o ambiente era extremamente radicalizado, com muitas criticas da opinião pública ao texto aprovado pela Câmara dos Deputados. E o Senado, com grande esforço - quero registrar aqui que contou com a participação muito importante do Senador Waldemir Moka -, construiu um ambiente de diálogo, de entendimento que propiciou a construção de um texto equilibrado, que, depois, Senador Moka, foi reconhecido, inclusive, pelos críticos mais ácidos do processo, que compreenderam que o Senado fez o melhor que era possível, naquele momento, compatibilizando a segurança jurídica necessária para a continuidade das atividades produtivas no meio rural brasileiro com a preservação ambiental.

            Numa primeira leitura dos vetos da Presidenta Dilma e da edição da medida provisória, eu quero aqui registrar, mais uma vez, que a melhor alternativa para o Brasil - tenho convicção disso - era o texto aprovado pelo Senado na íntegra. Na íntegra! Nós teríamos encerrado essa discussão, teríamos virado essa página e poderíamos começar a construir um novo momento de entendimento, construindo uma agenda comum, uma agenda de convergência nacional em relação a novas formas de produção, que, aliás, é algo que terei oportunidade de falar mais detidamente desta tribuna, talvez ainda nesta semana, sobre o que considero um legado da Rio+20, uma agenda de convergência nacional em torno de temas como água, como alimentos, como energia, como biodiversidade, como democracia e como investimento em ciência, tecnologia e inovação.

            Mas eu quero aqui aplaudir alguns vetos da Presidenta Dilma em relação a determinados temas que estavam presentes na proposta do Senado e, ao mesmo tempo, demonstrar minha preocupação com alguns temas inseridos na medida provisória e que, em minha opinião, significam um retrocesso do ponto de vista ambiental.

            Em relação aos vetos, é importante registrar que o art. 62 do texto do Senado, que definia os critérios de recomposição das áreas de preservação permanente, ficou completamente mutilado após apreciação pela Câmara, que regulamentava apenas a recomposição de rios de até dez metros de largura e não se referia aos demais. Isso poderia criar entendimentos diversos como, por exemplo, um entendimento, digamos, mais radical, de que, em não definindo quanto deveria recuperar, deveria recuperar o total das áreas de preservação permanente, indo, portanto, de trinta metros até quinhentos metros para rios mais largos.

            Outro entendimento é o de que, se era preciso, se era obrigado a recuperar pelo menos quinze metros em rios de até dez metros de largura, essa obrigatoriedade deveria ser no mínimo a mesma para rios mais largos. E isso iria gerar uma verdadeira confusão, em segurança jurídica, no meio rural brasileiro. Portanto, o veto a esse trecho foi absolutamente correto. Também foi correta a previsão na medida provisória de restrição a qualquer tipo de concessão ou de crédito rural, crédito agrícola, àqueles produtores que não se cadastrassem no cadastro ambiental rural, aqueles que não promovessem a sua regularização, porque não teria sentido algum fazer um grande esforço de regularização ambiental e não haver nenhuma punição para aqueles produtores rurais que não buscassem a regularização ambiental.

            Fiquei muito feliz também com o retorno, através da medida provisória, de um artigo, de um inciso, que foi apresentado a partir de uma emenda, que foi incorporado no texto do Senado a partir de uma emenda de minha autoria, fundamental para bioma Cerrado, que hoje é o bioma mais ameaçado do Brasil e que tem um papel fundamental no abastecimento de água de várias bacias hidrográficas brasileiras, especialmente as bacias do Paraná, do Tocantins e Amazonas. A emenda retorna à regra que considera as veredas áreas de preservação permanente, definindo um limite de 50 metros a partir das áreas alagadas como áreas de preservação permanente em torno das veredas. É fundamental, porque vereda é uma fitofisionomia do Cerrado em que aflora o lençol d’água e, portanto, é fundamental no nascedouro de córregos, de rios que vão alimentar as bacias hidrográficas. E também obriga a recomposição nos mesmos patamares das veredas. Entendo que as veredas devam ter efetivamente um tratamento diferenciado.

            Considero importante também e lembro que o tema mais espinhoso ao ser tratado aqui no Senado foi a questão dos mangues. Os mangues são os grandes berçários da fauna marinha e, portanto, sua definição de mangues como área de preservação permanente. E me lembro que até o último momento, pelo texto do Senador Luiz Henrique e incorporado pelo Relator Jorge Viana, os mangues ficavam como áreas de preservação permanente em toda a sua totalidade. No entanto, houve o movimento, especialmente de Senadores ligados ao Nordeste, que compreendia a importância de duas atividades econômicas que acontecem na região de Salgados e Apicuns, que, muitas vezes, se confundem com a região dos mangues, que são as atividades de carcinicultura e de extração de sal, as salineiras.

            Depois de muita negociação, que envolveu o Ministério do Meio Ambiente, nós construímos um texto que permitia esse tipo de atividade econômica, mas respeitando critérios extremamente rigorosos e percentuais, definindo limites para o desenvolvimento dessas atividades, compatibilizando a preocupação da atividade produtiva com a preservação ambiental.

            Registro que não era a minha posição sobre o tema. Acabei, em função do acordo, concordando com o texto, mas, desde o primeiro momento, defendia a tese de que os mangues, em sua totalidade, deveriam se transformar em áreas de preservação permanente.

            Porém, o que me preocupa no texto, Sr. Presidente Waldemir Moka, é que, ao refazer o artigo referente às normas para a recuperação de áreas de preservação permanente, a Presidenta da República, o Governo Federal, entendeu por bem reduzir a obrigatoriedade de recomposição das áreas de preservação permanente para pequenas propriedades, levando essa obrigatoriedade até cinco metros para quem tem até um módulo fiscal, até oito metros para quem tem de um a dois módulos fiscais, e quinze metros - que era o texto original - para quem tem de dois a quatro módulos fiscais.

            Entendo as razões da Presidenta da República de fazer isso. É claro que, em função da vontade manifestada pela Câmara, se o texto fosse absolutamente igual, é certo que ele seria derrotado na Câmara dos Deputados, e buscou-se, então, compatibilizar uma alternativa intermediária entre o texto do Senado e o texto da Câmara, buscando criar condições políticas para a sua aprovação na Câmara dos Deputados.

            E quero registrar que desde o primeiro momento entendi que seria mais eficiente e mais efetivo garantir um programa de financiamento para o pequeno produtor, para que ele realmente tivesse condições de recuperar suas áreas de preservação permanente, do que simplesmente reduzir a obrigatoriedade de recomposição.

            E alerto para o fato de que, ainda tendo que recompor menos do que teria inicialmente, cinco metros ou oito metros, se não houver apoio do governo, um programa de apoio e de financiamento do governo para os pequenos agricultores, para os agricultores familiares, eles não terão condições de fazer a recuperação dessas áreas de preservação permanente. Até porque o texto editado pela medida provisória retoma o texto do Senado, que também foi uma emenda de minha autoria, reproduzindo uma decisão do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) de que o pequeno produtor poderia recuperar suas áreas de preservação permanente por meio da restauração passiva, ou seja, isolando a área, permitindo a recomposição da vegetação. Acontece que, mesmo para cercar cinco metros, há um custo que não é pequeno, para o agricultor familiar ou para o pequeno agricultor é preciso apoio para fazer isso. E é de interesse da coletividade, do conjunto da população, e não apenas de quem está no meio rural, a recuperação das áreas de preservação permanente, porque são elas que vão garantir vida aos rios brasileiros. É bom lembrar que um rio grande não nasce grande; os rios nascem pequenos, tornam-se médios e, depois, grandes, porque um rio acaba sendo afluente de outro maior, até termos a criação dos grandes rios.

            E é aí que faço a grande crítica à medida provisória, à qual apresentarei uma emenda buscando corrigir essa distorção. Entendo que o texto adequado é o texto do Senado. Houve um retrocesso na medida provisória no que se refere à recuperação das nascentes, dos olhos d’água, daquele momento que, como uma criança, é o mais frágil da vida, da existência de um rio, de um curso d’água. É exatamente na sua nascente onde todos os cuidados devem ser tomados, onde nenhum tipo de concessão pode ser feita, para que tenhamos as nascentes funcionando e alimentando os pequenos rios, que alimentarão os médios rios, que alimentarão os grandes rios, que desaguarão no oceano; no nosso caso, no oceano Atlântico.

            Porque, vejam bem, o texto do Senado que, em minha opinião, por mais um equívoco grave da Câmara, foi retirado do texto da Câmara, garantia isso. E esse foi um acordo produzido no Senado, com a anuência da Câmara. É importante que fique registrado nos Anais do Senado. O Senador Moka teve um papel fundamental nisso. Participei de diversas reuniões com o Senador Moka e com várias lideranças na Câmara dos Deputados. Uma pena que o Deputado Moacir Micheletto tenha partido no meio desse processo, porque ele foi um grande articulador na Câmara dos Deputados, era uma grande liderança na Câmara dos Deputados no que se refere aos compromissos acordados em relação ao Código Florestal e a compreensão da importância estratégica das nascentes ficou revelada ali, naquele texto do Senado, onde definíamos como 30 metros as áreas de preservação permanente em torno de nascentes e de olhos d’água em qualquer tamanho de propriedade.

            E aí, neste caso, entendo que não podemos ter um tratamento diferenciado para nascentes e olhos d’água em função do tamanho da propriedade, porque a importância estratégica para o País, para as bacias hidrográficas, para o sistema hídrico brasileiro é a mesma, independente do tamanho de propriedade. Eu entendo que reduzir a cinco metros as áreas de preservação permanente de um olho d’água ou de oito metros, se a propriedade tiver até dois módulos fiscais, é insuficiente, ou mesmo 15 metros para as demais propriedades, como ficou no texto da medida provisória, é absolutamente insuficiente.

            Neste caso, tínhamos que garantir, sim, uma proteção maior, uma proteção de pelo menos 30 metros, que era o que dizia o texto do Senado e que eu pretendo apresentar como emenda para que prevaleça o bom senso. Nós estamos falando de nascentes, de olhos d’água, de uma questão estratégica para não apenas o futuro do País, mas para a sustentabilidade da nossa agricultura, para garantir as futuras gerações com a qualidade de vida pelo menos equivalente ou igual à que nós temos hoje. Ou seja, uma legislação como o Código Florestal é uma legislação transgeracional, é uma legislação que não pode ter uma visão imediatista. É claro que temos que buscar - como buscamos aqui no Senado - garantir segurança jurídica, mas ela tem que ter os olhos voltados para as futuras gerações, ela tem que estar com os olhos voltados para o futuro, e se tem um bem precioso, um bem que devemos preservar como preservamos a vida, esse bem é a água.

            Portanto, nós temos que restabelecer uma proteção adequada às nossas nascentes e aos nossos olhos d’água.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esse debate está apenas recomeçando. Eu gostaria de ter visto o texto do Senado aprovado na Câmara e de estar entrando em outra agenda, mas essas são as minhas considerações iniciais deste recomeço de debate. Teremos oportunidade de subir à tribuna outras vezes para discutir este tema que, sem dúvida, é de interesse nacional.

            Muito obrigado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/2012 - Página 21823