Discurso durante a 96ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Insatisfação com a situação dos serviços de saúde prestados no Brasil; e outros assuntos.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Insatisfação com a situação dos serviços de saúde prestados no Brasil; e outros assuntos.
Aparteantes
Alvaro Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2012 - Página 23512
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • APREENSÃO, CRITICA, ORADOR, SITUAÇÃO, PRECARIEDADE, SERVIÇO, SAUDE PUBLICA, PAIS, NECESSIDADE, MINISTERIO PUBLICO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), FISCALIZAÇÃO, SETOR, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), OBJETIVO, MELHORIA, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Alvaro Dias, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, quero cumprimentar especialmente a Senadora Ana Amélia, que acabou de fazer um brilhante pronunciamento que até nem comportava aparte. Senadora, quero apenas, de fato, me solidarizar com o que disse V. Exª, principalmente no que tange a essa medida provisória, que, curiosamente, ao invés de estimular os profissionais da saúde, especialmente os médicos, segundo sua leitura, reduz os salários. Quer dizer, aumenta a jornada de trabalho à medida que reduz a remuneração pelo mesmo tanto de horas trabalhadas. Então, é inexplicável isso. Eu já pedi a minha assessoria que comece a estudar a questão.

            Espero que essas audiências públicas sejam feitas, Senadora Ana Amélia, porque é inexplicável isso aí. Aliás, o tema do meu pronunciamento é a questão da saúde, mas não poderia deixar de iniciar o meu raciocínio por aí, e, também, Senador Alvaro Dias, me solidarizar com os professores das universidades federais.

            É lamentável que os professores tenham que recorrer à greve, e o que pior, prejudicando a formação dos alunos. Recebi já inúmeros e-mails e outros tipos de correspondências de alunos do curso de Medicina que estão no último ano e que podem ficar prejudicados de se formar este ano por causa da greve que se estende. Não entendo por que não há um diálogo rápido, efetivo do Ministro da Educação, no sentido de obter uma solução para essa questão. Porque é lógico, os professores têm razão de protestar. É irrisório o que recebe um professor de uma universidade federal de qualquer área. Se eles fazem a greve, lamentavelmente, os maiores prejudicados são, de fato, os alunos.

            Vamos nos apegar, feita essa introdução, à questão de um tema central, aliás, há muito tempo neste País, a saúde, seja a saúde pública, seja a saúde suplementar, aquela assim dita que é atendida pelos planos de saúde. Não vou nem entrar no detalhe da saúde particular, aquela que você paga do seu bolso diretamente sem usar plano de saúde.

            É lamentável constatar - e digo isso, tristemente, como médico - a situação por que vem passando a nossa saúde pública, a saúde suplementar. Mas também não diria que é diferente até mesmo a particular, porque o que vemos manifestado, a cada ano, inclusive por pesquisas de opinião pública, é a opinião brasileira manifestar, claramente, que o problema que mais atinge o cidadão, a cidadã é a situação da saúde. Poderiam perguntar: mas não há problemas sérios como o desemprego, como a questão do transporte, a questão da segurança, a questão da moradia? Sim. Eles aparecem, mas aparecem muito depois do problema da saúde. E é compreensível, Senador Alvaro Dias. Depois da vida, qual é o bem maior que a pessoa pode ter? É a saúde, porque é ela, inclusive, que lhe garante permanecer ou não vivo. E, lamentavelmente, vemos que - e é uma constatação de norte a sul, de leste a oeste neste País -, nos Municípios grandes, nos Municípios pequenos, nos Municípios médios, a situação é a mesma: fila nos estabelecimentos de saúde, seja nos postos de saúde, nos centros de saúde, nos hospitais; pacientes sendo internados nos corredores dos hospitais; pessoas sendo obrigadas a comprar medicamentos e até material para uso em cirurgia e outros para seus parentes poderem ser atendidos nos hospitais públicos. E, quando pagam plano de saúde, a coisa também não muda muito. Nós temos aí exemplos imensos, a rodo, vamos dizer assim, de pessoas que pagam plano de saúde e, na hora de serem atendidas, são mal atendidas, submetem-se a situações precárias e, muitas vezes, vão a óbito porque falta equipamento ou algum tipo de material. Lá no meu Estado, falta até gaze, até esparadrapo, até equipo para aplicar um soro. Mas isso, repito, não é um caso isolado.

            É preciso que o Ministério Público entre com força nessa questão, que os tribunais de contas, tanto dos Estados quanto da União, e a CGU façam uma fiscalização severa, que o Ministério da Saúde, de fato, fiscalize isso. Porque, Senadora Ana Amélia, vejo como muita comodidade quando alguém diz: ah, mas falta dinheiro para a saúde. É mesma coisa que querer fazer uma transfusão de sangue e não estancar primeiro a hemorragia. Não adianta nada botar sangue, se está saindo sangue pelo outro lado.

            De fato, pode faltar dinheiro na saúde. Mas, na saúde, se rouba muito neste País, o que é um crime hediondo. Tenho repetido aqui, em sucessivos pronunciamentos que faço, que é um crime hediondo, porque se está mexendo com o quê? Com um bem garantido pela Constituição, que é a saúde do cidadão; está-se mexendo com a vida do cidadão.

            Tivemos, há poucos dias, aqui, o exemplo de um funcionário graduado do serviço público, que faleceu, porque foi para um hospital. Como ele não tinha cheque para dar uma caução ou para fazer um depósito, morreu. Aliás, vi o pronunciamento de V. Exª, hoje, na TV Senado, sobre a questão, inclusive com relação a seu próprio esposo.

            Então, é lamentável que isso esteja acontecendo. Nós aprovamos, felizmente, uma lei que proíbe isso. Aí virão - pode esperar, Senadora Ana Amélia - as grandes discussões, porque o hospital que é privado e que atende ao plano de saúde vai dizer: “Como pago as despesas? Quem paga as despesas?”

            É verdade, nós aprovamos uma lei que diz que não se pode exigir isso. E está aí uma lei humanitária, porque não é possível que alguém que esteja passando mal e que queira ser atendido, não o possa ser, porque não pode pagar, não pode dar uma caução, não pode assinar uma promissória.

            Agora, por que o SUS, o Sistema Único de Saúde, não atende bem, quando a Constituição diz que a saúde é um direito do cidadão e um dever do Estado, isto é, um dever dos governos, a começar pelo Governo Federal, pelos governos estaduais e pelos governos dos Municípios?

            Aliás, é muito importante, Senadora Ana Amélia, que o eleitor que vai às urnas neste ano, para votar nos prefeitos veja, de fato, se esse prefeito... Não é só ele apresentar um bonito esquema de propaganda, com efeitos visuais na televisão, ou bonitas falas no rádio ou nos palanques, prometendo o céu, se depois vamos ver que vamos viver alguma coisa próxima do inferno ou pelo menos do purgatório.

            Então, é muito importante: se o prefeito vai para uma reeleição, o que fez no mandato anterior? Como funcionou a saúde no Município dele, quando ele foi prefeito, cargo para o qual está pleiteando a reeleição? Se o fulano nunca foi prefeito, vamos ver se ele tem capacidade de fato de encontrar mecanismos e de ter disposição para priorizar a saúde. Não como foi dito, usando o dinheiro que foi destinado para a saúde constitucionalmente, por exemplo, para asfaltar uma rua na frente do hospital ou uma estrada que dá acesso ao hospital. Pode-se até dizer que isso é uma questão importante para manter a facilidade de acesso. Mas o que interessa é que, em tendo o acesso, o que vai encontrar? Um hospital sucateado, médicos trabalhando em horário dobrado.

            Conheço casos de colegas que saem de um plantão no hospital e emendam plantões em outro hospital, trabalhando, por conseguinte, com uma perda de raciocínio, é lógico, porque a sobrecarga de trabalho leva à perda de raciocínio e à perda de capacidade de agir de maneira efetiva, o que é exigido de um profissional de saúde qualquer que seja ele, desde atendente de enfermagem, técnica de enfermagem, enfermeira, até médico, enfim, todos têm que trabalhar dentro de uma carga horária compatível para que tenham condições de exercer adequadamente a sua profissão.

            Aqui, no Senado, existe um movimento para criar uma comissão temporária que objetiva definir recursos federais, estaduais e municipais para a área de saúde. Perdemos uma oportunidade excepcional um dia desses quando votamos a regulamentação da famosa Emenda nº 29, apenas porque não amarramos para o Governo Federal o quanto ele deve gastar com saúde pública. Amarramos para os Municípios, 15%; para os Estados, 12%; e dissemos, nessa regulamentação, o que é realmente gasto com saúde, para que o prefeito e o governador não façam uma obra e encaixem como sendo recursos para saúde.

            O mesmo se aplica para a educação. O dinheiro que vai para o Fundeb, por exemplo, é desviado para outras coisas e maquiado como aplicado em educação.

            A saúde aparece nas pesquisas antes da preocupação com educação, o que é compreensível. Como um professor doente pode dar aula? Como um professor com uma condição emocional... E quando falo em doente, não quer dizer que a pessoa precisa estar com febre ou com doenças sintomáticas. A definição de saúde pela Organização Mundial de Saúde é “um estado de bem estar físico, mental e social”.

            Então, um professor ou um médico que ganha pouco - ou qualquer profissional, mas estou falando aqui da saúde -, que tem de trabalhar em vários plantões para obter um salário para viver melhor ou dar sustento a sua família, pode estar com saúde emocional, social e mental? Vou repetir a definição: é um estado de bem-estar físico, psíquico, social. Portanto, não é só o fato de não apresentar uma infecção, seja pneumonia, seja gripe forte, seja câncer. Não é só isso. É mais complexa a definição de saúde.

            Antes de prosseguir, quero ouvir, com muito prazer, o Senador Alvaro Dias.

            O Sr. Alvaro Dias (Bloco/PSDB - PR) - Senador Mozarildo Cavalcanti, é incompreensível o descaso do Governo Federal com a saúde pública no País. Enquanto V. Exª fala, recebo aqui, do Norte Pioneiro do Paraná, a queixa de que a UTI está fechada por falta de recursos, há uma lástima na cidade, na região, não há atendimento. Há um caos na saúde, em Santo Antônio da Platina, no Norte Pioneiro do Paraná. De Londrina, enviam-me uma foto de médicos e de funcionários do Hospital Zona Sul, em frente a essa instituição, com faixas, fazendo protestos. Construído por nosso governo há cerca de 22 anos, lá estão protestando os servidores públicos do hospital. Ligamos a televisão e vimos o ex-Presidente Lula, no Programa do Ratinho, fazendo campanha eleitoral, afrontando a legislação e queixando-se de que o Senado Federal acabou com a CPMF, para justificar o caos que há na saúde, subestimando a inteligência das pessoas, agredindo a nossa inteligência. Todos nós sabemos que, com o fim da CPMF, já no primeiro mês, em janeiro de 2008, houve um acréscimo de receita maior do que o valor da CPMF - R$40 bilhões por ano -, que não se aplicavam em saúde no País, R$40 bilhões que eram desviados para outras áreas do Governo. Portanto, não se justifica esse clamor do ex-Presidente. E vimos que a arrecadação só cresceu. Cresceu em todos os sentidos. Todos os parâmetros indicam um crescimento real da arrecadação no País. O que há não é falta de dinheiro; é falta de competência e de honestidade. Há corrupção, roubo; bilhões de reais são desviados dos cofres da saúde pública no País e os doentes morrem desassistidos. Há um descaso, há uma insensibilidade pública, há um desapreço ao ser humano; O que há é irresponsabilidade pública, é um acinte. Não se pode mais usar a mentira como arma para se proteger. Assumam a incompetência e digam ao País que são incompetentes para gerir a saúde pública. Enfim, cabe ao povo, nas eleições, protestar com veemência e dizer o que pensa a respeito dessa postura, dessa postura que não é nada republicana, que não é séria, que não é respeitosa, uma postura do Governo que é um acinte à pobreza no Brasil.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Senador Alvaro Dias, acolho o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento.

            V. Exª tocou num ponto que eu preciso reiterar aqui. Eu votei contra a CPMF, Senadora Ana Amélia. Como médico, votei contra porque o que se constatou por um estudo adequado é que, em 14 anos de vigência da CPMF, a saúde pública não melhorou um milímetro, ao contrário, avaliações só eram para pior. Então, como se diz no linguajar do nosso homem do sertão, estava se botando sal em carne podre, não estava realmente melhorando nada. A saúde pegando dinheiro... E vou usar aqui também um dado de um órgão do Governo federal: a CGU, que é o órgão de fiscalização: nos quatro anos anteriores, tinham sido desviados da Funasa, só de um órgão da saúde, R$500 milhões.

            Então, o que está acontecendo na saúde vinha se fazendo de maneira crônica; melhorou muito, mas ainda há um longo caminho para se andar no tange ao combate à corrupção, principalmente na área da saúde. E a CPMF, Senador Alvaro Dias, foi imediatamente compensada com o aumento de outra carga tributária, o Imposto Sobre Operações Financeiras, IOF, imediatamente após a queda da CPMF aqui no Senado. O IOF, isto é, o Imposto Sobre Operações Financeiras foi aumentado para compensar. E como disse V. Exª, aumentou a arrecadação.

            Eu quero apenas deixar bem claro aqui, Senadora Ana Amélia, que eu sou um Senador dito da base aliada do Governo, mas eu não acho que ser aliado de alguém, ser amigo de alguém é vir para cá só dizer que está tudo às mil maravilhas, quando o povo está vendo e sentindo na pele que não está.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - Senador Mozarildo, peço licença porque essas crianças são alunos e alunas do ensino fundamental do Colégio Santa Rosa, que vêm com as professoras, os monitores e as Irmãs do Colégio Santa Rosa. Então, a todas essas crianças que estão lotando as galerias daqui - meninos e meninas -, futuros brasileiros médicos, futuros Senadores, Deputados, Professores também, uma saudação especial. E o que V. Exª está falando é muito importante para eles saberem também, porque diz respeito à saúde.

            Obrigada, Senador, por ter permitido a saudação especial a esses jovens que estão ouvindo V. Exª, como ouviram o aparte do Senador Alvaro Dias.

            Muito obrigada.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Eu quero também saudar todos os alunos, professores, monitores, as Irmãs que aqui estão presentes e dizer a vocês: muitas vezes até, há uma descrença generalizada dos jovens, mas também e principalmente dos mais velhos, na atividade política, por acharem que todo político é corrupto, todo político não presta. E, com isso, nós fazemos o jogo daqueles que são corruptos, nós fazemos o jogo daqueles que são maus. Porque os bons se enojam e já tacham a política como algo que não presta, e não entram na política, não se inteiram da política e, portanto, permitem que os corruptos, os maus se elejam justamente pela omissão dos bons.

            Aliás, um grande líder evangélico por sinal, Martin Luther King, disse uma vez: que o que mais o impressionava não era o grito, a ousadia, a corrupção dos maus, mas, sim, o silêncio dos bons.

            Então, não é possível que nós nos silenciemos diante daquilo que estamos vendo que está errado. Não é preciso agredir ninguém. O que eu estou dizendo aqui é que, como aliado da Presidente Dilma, como uma pessoa que admira o atual Ministro da Saúde, é preciso curar a saúde do Brasil, porque a saúde do Brasil está doente e o povo não pode pagar esse pato. E o que é pior: pagar justamente com o quê? Com a sua saúde? Porque, acima da saúde, só há um bem mais importante, que é a própria vida, mas, se nós não tivermos saúde, nós perdemos a vida.

            Senadora Ana Amélia, peço que considere que nós precisamos pedir ao Presidente José Sarney que acelere a implantação da Comissão Temporária Externa, que visa fazer esse estudo - até já propus isso aqui -, fazer um levantamento de todos os projetos daqui do Poder Legislativo e do que está no Poder Executivo, para aprovarmos uma lei que fosse um verdadeiro estatuto da saúde pública no Brasil, um estatuto da saúde suplementar, porque não é possível a saúde continuar como está no Brasil.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2012 - Página 23512