Discurso durante a 103ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Prestação de contas da missão parlamentar, realizada por S.Exa., semana passada, nos Estados Unidos, em que representou a Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar o tráfico nacional e internacional de pessoas no Brasil; e outro assunto.

Autor
Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
Nome completo: Lídice da Mata e Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS.:
  • Prestação de contas da missão parlamentar, realizada por S.Exa., semana passada, nos Estados Unidos, em que representou a Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar o tráfico nacional e internacional de pessoas no Brasil; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/2012 - Página 25871
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • REGISTRO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, RELAÇÃO, REALIZAÇÃO, VIAGEM, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), OBJETIVO, INVESTIGAÇÃO, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, CRIME, TRAFICO, PESSOAS, ESPECIFICAÇÃO, EXPLORAÇÃO SEXUAL, COMERCIALIZAÇÃO, ORGÃO HUMANO, TRABALHO ESCRAVO.
  • COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, ERRADICAÇÃO, TRABALHO, CRIANÇA, ELOGIO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), REDUÇÃO, NUMERO, EXPLORAÇÃO, INFANCIA, BRASIL.

            A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco/PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, quero agradecer a gentileza, o cavalheirismo do grande Senador do Piauí e ex-Governador Wellington Dias. Na verdade, cedi o meu tempo ao grande Senador Pedro Simon, que acabou de falar.

            Sr. Presidente, gostaria de, na tarde de hoje, fazer um registro da viagem que eu e a Senadora Vanessa Grazziotin fizemos, durante a semana passada, para os Estados Unidos, nas cidades de Washington e Nova York, onde estivemos, como membros da CPMI do Tráfico de Pessoas - a Senadora Vanessa, Presidente; eu, Relatora -, em contato com as autoridades daquele país, do departamento de estado, discutindo e conhecendo a legislação de enfrentamento do tráfico de pessoas nos Estados Unidos. Tivemos, além das autoridades que viabilizam a prevenção e a repressão ao tráfico de pessoas e à criminalização, um contato muito rico, Senadora Ana Amélia, com as organizações não governamentais daquele país.

            E o destaque que faço - a Senadora já pôde falar ontem, a nossa Presidente - é para a necessidade de que o Brasil possa ter uma legislação específica para o enfrentamento do tráfico de pessoas. Este vai ser o esforço do relatório que estamos preparando: oferecer ao Senado Federal uma nova legislação para o enfrentamento do tráfico de pessoas.

            Que nessa legislação nós possamos dar conta também da proteção às vítimas que são traficadas. Essa compreensão de que as pessoas traficadas são vítimas precisa estar expressa numa legislação e numa ação permanente, intensa, de governo, de política pública, para que elas sejam acolhidas.

            Quem são as vítimas? As vítimas são mulheres, em geral muito jovens, meninas, adolescentes, que são traficadas do Brasil e de outros países, principalmente da América do Sul e da América Central, para a exploração sexual nos países mais desenvolvidos. São vítimas também trabalhadores, homens que são traficados para, nos países desenvolvidos, realizarem trabalho forçado, trabalho semiescravo ou trabalho escravo, como caracterizamos aqui no Brasil.

            As vítimas são também crianças, meninos ou meninas sequestradas para os mais diversos fins, desde o tráfico de órgãos a qualquer outro tipo de crime hediondo, porque se parte do princípio, inclusive, de que o sequestro de crianças é um crime hediondo.

            Ora, o Brasil, que, durante muitos anos, tem sua população vitimada por esse tipo de tráfico, principalmente o tráfico de mulheres para países europeus, com fins de exploração sexual, hoje começa também a receber populações do entorno - que são vítimas -, tanto para os mesmos fins de que as nossas mulheres e jovens são vítimas nos países desenvolvidos, quanto para o trabalho forçado, degradante, em condições indignas, para o qual muitos homens de países vizinhos vêm, como a grande imprensa brasileira já registrou.

            A Rede Globo, mais de uma vez, fez reportagem sobre a situação do tráfico de trabalhadores bolivianos para a indústria em nosso País, inclusive para a indústria de confecções.

            É preciso, portanto, que o Senado se debruce sobre esse assunto, na defesa da nossa população e na penalização do crime do tráfico de pessoas.

             Atualmente, o Código Penal brasileiro prevê o crime apenas nos casos do tráfico de mulheres com fins de exploração sexual, não prevê a amplitude maior que o tráfico tem hoje no País e no mundo. E é indispensável que o Governo brasileiro tenha uma política forte de acolhimento e proteção àquelas vítimas do tráfico.

            O destaque da nossa viagem, sem dúvida nenhuma, foi conhecer a rede de proteção ao tráfico de pessoas, à violência doméstica, de proteção à mulher e à criança que sofrem violência naquele país. Há realmente uma política avançada de proteção nos Estados Unidos, que é praticada pelas organizações não governamentais daquele país, financiadas pelo governo - seja ele federal, estadual ou municipal -, que, em parceria, financia programas de acolhimento para garantir proteção a essa população.

            Isso é muito importante ressaltar, caro Senador Eduardo Suplicy, V. Exª que aqui representa há muitos anos a aspiração e a prática dessas organizações não governamentais em nosso País.

            O que temos visto aqui é o ataque às organizações não governamentais, como se elas não tivessem legitimidade. Aquilo que no Brasil é uma exigência nossa que seja uma política de Estado, realizada pelo Estado, como a manutenção dos abrigos para as populações violentadas, para as crianças nas ruas, para as mulheres que sofrem violência doméstica, para a família que sofre a violência doméstica, para a grande maioria da população brasileira que vive sob algum tipo de violência ou de vulnerabilidade, nos Estados Unidos ela é quase que totalmente executada pelas organizações não governamentais.

            Eu acho que precisamos observar essa rede de proteção para propor ao Governo brasileiro, em nosso relatório, uma intensificação da parceria com as organizações não governamentais do nosso País, no sentido de fazer possível uma política de acolhimento das pessoas que são traficadas e que na sua maioria são mulheres ou crianças, homens, meninos ou meninas, jovens em situação de completa vulnerabilidade. Muitas delas fogem das suas casas como reação à violência doméstica a que são submetidas.

            Portanto, essa questão, que, no geral, nos parlamentos tem sido foco da preocupação das mulheres, porque as mulheres são vistas como as grandes responsáveis ou, quem sabe, para alguns, as únicas responsáveis pela manutenção do chamado núcleo familiar e sobre elas cai a carga do resultado dessa ação de criação, de formação dos filhos, então, em geral, os homens, no Parlamento brasileiro, não discutem a questão; repetem um pouco o que é a prática de muitos deles nas suas vidas pessoais: família é questão para as mulheres.

            Eu me lembro que, no tempo antigo, os homens, muitas vezes pais de família, quando os meninos se davam bem, diziam: “Olha, o nosso filho é um doutor, é um médico, é um engenheiro”, mas quando tinham algum problema, que não estavam estudando, olhavam para a mãe e diziam: “Olha como se comporta o ‘seu’ filho”.

            Então, sobre os ombros da mulher, especialmente da mulher brasileira, dessa mulher que hoje significa 30% das chefias de família deste País, há uma sobrecarga de responsabilidade na proteção dos filhos. Precisamos de políticas públicas que garantam a essas mulheres a possibilidade de criarem seus filhos com dignidade. Para tanto, precisamos ter abrigos, precisamos ter políticas públicas de inclusão dessa população que, muitas vezes, é jogada nas ruas, mãe e filhos, por uma atitude de agressão do seu companheiro, do seu marido, agressão doméstica, que, graças a Deus, hoje, no Brasil, já pode ser punida, pela Lei Maria da Penha.

            Mas se nós temos uma Lei Maria da Penha, ela só pode e só vai se tornar realidade se houver, ao lado da Lei Maria da Penha, uma ampla e radical política de acolhimento e de proteção daqueles que sofrem e que são vítimas da violência doméstica em nosso País.

            Portanto, quero dizer da satisfação que tivemos, eu e a Senadora Vanessa Grazziotin, de participar desse programa, de poder trocar ideias e conhecer de forma mais profunda a legislação de um país que tem tradição no trato dessa questão. Isso nos dá a oportunidade de oferecer ao Senado uma nova proposta, a proposta de uma nova legislação que possa dar conta da seriedade e da preocupação que o Senado brasileiro tem com a questão.

            Por último, Sr. Presidente, queria também registrar aqui o que foi divulgado no dia 12 de junho último, que foi o Dia de Combate ao Trabalho Infantil. Na última terça-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dados, com base no Censo Demográfico 2000/2010, que registram a situação do trabalho infantil no Brasil.

            O dado geral é positivo: entre 2000 e 2010 houve uma redução, no País, de 13,44% do trabalho infantil na faixa etária de 10 a 17 anos. Entretanto - vejam bem a gravidade do assunto -, entre crianças de 10 a 13 anos, o indicador aumentou. O indicador aumentou justamente na faixa etária de maior vulnerabilidade: entre crianças de 10 a 13 anos. O indicador aumentou 1,56% na última década.

            Outro dado positivo, embora qualquer indicador de trabalho infantil seja ruim, é que em todos os Estados da região Nordeste houve redução, o que demonstra o esforço dos governos de uma região que é a região mais pobre e sofrida deste País para superar essa dificuldade da nossa população em vulnerabilidade, que é a população infanto-juvenil do nosso País.

            Recentemente, no mês de abril, tive oportunidade de participar, como Coordenadora da Frente Parlamentar pelos Direitos da Criança e do Adolescente, do Encontro Sub-Regional Tripartido sobre Trabalho Infantil, realizado em Cabo Verde, na África, a convite da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O encontro serviu como preparação para a 3ª Conferência Global sobre Trabalho Infantil, que o Brasil sediará no próximo ano.

            Essa conferência global acontecerá no Brasil, provavelmente aqui em Brasília, e, a partir do momento da realização dessa conferência da OIT em Cabo Verde até a conferência global no próximo ano, ocorrerá uma grande mobilização, saindo do meu Estado da Bahia e percorrendo todos os países africanos até voltar ao Brasil, numa jornada de combate ao trabalho infantil, que deve se transformar num grande momento de mobilização internacional para que possamos, em plena crise que o mundo passa, compreender que a população adulta tem que ser a responsável pela proteção, pelo acolhimento e pela formação das nossas crianças, adolescentes, futuros jovens e trabalhadores do nosso País.

            Portanto, Sr. Presidente, quero ressaltar aqui essas conquistas e destacar que, na Bahia, temos 417 Municípios, e em todas as faixas etárias a Bahia registrou diminuição do trabalho infantil na última década. Por isso eu quero parabenizar o Governador Jaques Wagner, a Unicef e todas as organizações não governamentais do meu Estado, que têm desenvolvido um trabalho muito profundo, muito sério, de realmente erradicar o trabalho infantil em nosso Estado.

            Quero parabenizar também todos os governadores dos Estados nordestinos que, integrantes do pacto pela criança, dirigidos pela Unicef, no semiárido especialmente, têm realizado esse esforço de criar uma qualidade de vida melhor e um futuro e uma esperança maior para as crianças e os adolescentes do Brasil.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/2012 - Página 25871