Discurso durante a 107ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre a importância de se perseguir os compromissos declarados pela ONU como objetivos do milênio.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Reflexão sobre a importância de se perseguir os compromissos declarados pela ONU como objetivos do milênio.
Publicação
Publicação no DSF de 20/06/2012 - Página 26880
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • CRITICA, ORADOR, REFERENCIA, EXCESSO, EXPECTATIVA, VALORIZAÇÃO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, MEIO AMBIENTE, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), FATO, AUSENCIA, CUMPRIMENTO, OBJETIVO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), RELAÇÃO, SAUDE, EDUCAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, POPULAÇÃO, MUNDO.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, REFERENCIA, APRESENTAÇÃO, SENADO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, PAUTA, DEBATE, CONFERENCIA INTERNACIONAL, MEIO AMBIENTE.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Waldemir Moka, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o que se ouve e o que se vê na imprensa, inclusive aqui no Senado, com muita razão, são notícias sobre o evento da Rio+20. Aliás, o Senado publicou, na revista Em Discussão, uma matéria muito bonita, cuja chamada de capa é “Rio+20, em busca de um mundo sustentável”. Aí se diz: “Senado contribui para que a Conferência da ONU aponte caminhos para conciliar desenvolvimento e meio ambiente”.

            Senador Moka, nós, que somos médicos, ficamos até certo ponto perplexos com o fato de que se gaste tanta energia, da ONU, de tantas nações, na discussão de um tema que parece muito complexo, mas que, na verdade, não é. Usam-se, inclusive, mistificações, como, por exemplo, que está praticamente desmentida essa história de aquecimento global provocado pelo ser humano, como se a Terra não tivesse períodos cíclicos próprios em função da posição de seu eixo, em função de sua trajetória em torno do sol. A Terra já foi gelada, só havia gelo. Houve a deglaciação e, em função disso, surgiu o homem.

            Demonizam-se certas regiões como, por exemplo, a Amazônia, o Pantanal; demonizam-se essas regiões e a quem mora lá como os provocadores do aquecimento global, os poluidores do meio ambiente, quando, na verdade, nós sabemos que os poluidores do meio ambiente são as grandes cidades, são os grandes países. Eu nunca ouvi uma matéria dizer que os aviões poluíssem a atmosfera, e quando você vê um avião passar no céu vê-se o rastro do combustível queimado que fica. Mas esses são debates em que os cientistas hoje já estão mostrando que tem muita balela no meio. Quanto às calotas de gelo, que diziam que estavam acabando, neste ano, confirmou-se que estão aumentando.

            O que é mais importante e a que eu quero me apegar aqui, justamente como médico, são os compromissos chamados pela ONU de Declaração ou Objetivos do Milênio, que, sim, têm que ser perseguidos. E não são só sobre o meio ambiente; são oito objetivos:

            O primeiro objetivo - como médico, vamos pensar nisso - é erradicar a extrema pobreza e a fome. É isso que leva a pessoa a adoecer, é isso que leva a pessoa, muito mais do que poluição, a ter doenças. E atingimos essa meta? O mundo atingiu? Esses são objetivos mundiais, e existem países no mundo que dá pena de se ver e que são mostrados na televisão. Por sinal, um dia desses eu vi a contradição de uma autoridade eclesiástica sentada em um trono de ouro e, do outro, lado meninos morrendo de fome na Etiópia. Mas não precisa ir à Etiópia para ver crianças morrendo de fome; há aqui nas periferias das grandes cidades ou nos nossos interiores da Amazônia e do Norte. Há uma concepção falsa de quem vive na Amazônia - os índios e os não índios - estão no paraíso, têm comida que se pega com a mão, peixe que se pega até com a mão e que ninguém, portanto, passa fome lá, o que é uma mentira! Há desnutrição e profunda na Amazônia;

            Segunda meta: universalizar a educação primária. Aqui está dito “primária”, fundamental, portanto. O Brasil disse que já universalizou, que não tem mais ninguém fora da escola, mas o problema é o seguinte: em que escola? Busca-se contornar um problema fundamental - para ser redundante - do ensino fundamental público fazendo o quê? Cotas para alunos que estudam nas escolas públicas. Então, se estudam em escola ruim têm uma cota para entrar sem o aperto do vestibular. É tapar o sol com a peneira.

            Depois, vem o terceiro item: promover a igualdade entre sexos e a autonomia das mulheres. Nesse campo, pelo menos, o Brasil tem avançado; mas vamos ver o que acontece em certos países mundo afora, em que as mulheres são obrigadas a viver em situações subumanas. Ontem ou anteontem vi, na televisão, um país onde as mulheres são obrigadas a engordar para ficarem bonitas. E são obrigadas a uma série de outros traumatismos. Então, estamos longe, em termos mundiais - já que isso aqui é uma conferência da ONU -, de atingir a esse objetivo.

            Reduzir a mortalidade na infância. O Brasil tem reduzido, mas ainda em um ritmo muito precário, muito precário mesmo!

            O quinto: melhorar a saúde materna. A mortalidade materna no Brasil também decaiu, mas ainda é triste e vergonhoso o índice de mortalidade materna. Estamos longe, portanto, de atingir a meta.

            Combater HIV, Aids, malária e outras doenças. O Brasil até que está bem na parte da AIDS, tem um bom programa que está até sendo imitado. Mas, e a malária? Em alguns Estados caiu o índice de malária. Qual o remédio para malária, Senador Waldemir Moka? É o mesmo de quando eu estava nos bancos escolares, há 50 anos. Qual a vacina contra a malária? Não tem. Sabem por quê? Porque a Malária não dá em países desenvolvidos, não dá nos Estados Unidos, não dá no Canadá, não dá na Europa. Portanto, por que os laboratórios investirão em pesquisar vacina contra a malária? Nós que devemos nos mexer.

            É o mesmo com relação a outras doenças que somente atingem os países pobres. E aqui diz: “e outras doenças”, e temos, entre elas, a dengue e tantas outras. A tuberculose é uma doença para a qual tem medicamento, mas como não aparece mais no mundo desenvolvido, nós aqui, subdesenvolvidos ou emergentes, temos casos de aumento de tuberculose em certas camadas da sociedade que passam fome, porque a fome é a porta aberta para as doenças.

            O sétimo item é garantir a sustentabilidade ambiental; e o oitavo, estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.

            Vejamos o sétimo e o oitavo. Cuidar do meio ambiente e fazer uma parceria mundial pelo desenvolvimento. Pergunto: que parceria foi feita? Vamos pensar, Senador Moka, da ECO 92 - ou Rio 92 ou outros nomes que queiram dar - depois de duas décadas, qual foi o modelo que aconteceu? Qual foi a parceria dos países ricos com os países emergentes e com os países pobres? Na prática, nenhuma. Nenhuma!

            Há uma propaganda desmesurada, por exemplo, de energia limpa. Ora, para os países ricos, quando só havia o carvão, o carvão era limpo; depois, descobriu-se o petróleo, e começaram a condenar o carvão, porque as minas foram acabando; mas ainda existem muitos deles que queimam o carvão. Como o fim do petróleo já é uma ameaça, começa-se a pensar em energias limpas, e, aí, o Brasil é campeão. Há a energia hidroelétrica, e temos hidroelétricas para dar e vender. Não vamos vendê-las; podemos vender energia. Mas toda vez que se quer construir uma hidroelétrica no Brasil, notadamente na Amazônia, há uma campanha mundial contra a construção de hidroelétricas. Então, é aquela história: vale para nós; não podemos derrubar uma árvore sequer, como se uma árvore não fosse um ser vivo que nasce, cresce, reproduz e morre.

            E vem a história do manejo sustentável. Mas como é que você vai pedir ao homem do interior da Amazônia, sem dinheiro, passando fome, que não se submeta a derrubar uma árvore e vendê-la, ou até derrubar essa árvore para construir a casa dele? Agora, que incentivo tem o homem do interior de qualquer país? E não vou nem citar os países africanos, pois dá dó de se ver até pela televisão, imaginem pessoalmente.

            Então, não é possível pensar somente em festejar a realização da Rio+20, evento que, inclusive, acho que merece, sim, ser registrado, pensado, discutido e melhorado. Só que não vejo...

            Vejam bem, esses Objetivos são de 2001, Senador Moka. Em 2001, a ONU estabeleceu esses Objetivos do Milênio. Nós estamos em 2012, e eu quero perguntar: olhando país a país, onde esses Objetivos foram atingidos?

            Pelo meu olhar de médico, para mim, está em primeiro lugar o ser humano. O ser humano está em primeiro lugar em relação ao o mico-leão-dourado, por exemplo. Para mim, vale muito mais uma criança ser salva do lixão, vale muito mais uma mulher gestante ser bem atendida que proteger o mico-leão-dourado. Não estou propagando que se tenha que extinguir o mico-leão-dourado, porém não posso comparar o animal com o ser humano, que também é um animal, só que é um animal que, digamos, está no topo da cadeia zoológica.

            No entanto, quero dizer, Senador Moka, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, que precisamos não ter apenas aqueles que aplaudem, aqueles que acham bonito, mas também aqueles que analisam. Não sou contra.

            Sou de uma região da Amazônia, o Estado de Roraima, que é, inclusive, um Estado atípico, porque, ao contrário do que a grande maioria dos brasileiros pensa, porque vê na televisão, vê nos filmes, não é um Estado só de florestas. Pelo contrário, só um terço dele é de florestas; dois terços são campos naturais, que nós lá chamamos de lavrados e, aqui, no Centro-Oeste, chamam de cerrados - aliás, o Cerrado tem mais árvores do que os nossos lavrados, que também não são como os Pampas gaúchos, que só têm campo -, e a outra região, mais próxima da Venezuela e da Guiana, é uma região montanhosa. Então, é um Estado, na Amazônia, diferente da maioria dos Estados da Amazônia.

            Nós não podemos aceitar - não vou chamar de circo - só um oba-oba sobre essa questão de meio ambiente. E leva-se um grupo de determinada etnia, de determinada minoria, para mostrar que se está fazendo o bem. Ao saírem dali, como irão viver essas pessoas (índios, negros, mulheres), se esses Objetivos do Milênio não estão sendo atingidos?

            Então, é importantíssimo ter-se chegado a esses objetivos, que são como uma espécie de diagnóstico do que tem que ser feito no Brasil e no mundo. Mas, se isso não é feito, a ONU está gastando uma energia enorme, os países estão gastando uma energia enorme com uma coisa que não tem dado resultados satisfatórios.

            Temos evoluído relativamente muito pouco em relação ao que deveríamos evoluir. Se a ONU fizesse um esforço semelhante com todos os países do mundo no combate à corrupção, tenho certeza de que esses objetivos seriam atingidos mais rapidamente, porque o dinheiro que se rouba - e digo mais, não é só no Brasil não, mas no Brasil é de maneira escancarada, é de maneira escandalosa - falta justamente aqui e em outros lugares para erradicar a extrema pobreza e a forme, falta para fazer educação de qualidade, falta para promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres, falta para reduzir a mortalidade da infância, falta para melhorar a saúde materna, falta para combater doenças como HIV, a Aids, a malária e tantas outras. Há inúmeras doenças, como a leishmaniose, que é exclusividade nossa e para a qual não há, portanto, interesse de nenhum laboratório em produzir remédio adequado e muito menos vacina. Falta recurso para se garantir a sustentabilidade ambiental e se estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.

            Senador Moka, entendo que parceria é coisa que vale e é bom para ambos ou para todos que fazem a parceria. Agora, parceria em os que são mais ricos ficam mais ricos e os que são mais pobres ficam mais pobres não é parceria. Isso, na verdade, é uma exploração dos mais pobres pelos mais ricos.

            Vejam bem; quanto à energia eólica, onde são fabricadas aquelas torres e aqueles cata-ventos? No Brasil, por acaso? Não. E o Brasil vai importar essas torres para energia eólica, como se dizia no passado, para fazer bonito, para inglês ver. É preciso que o Brasil realmente, e tenho visto isso por parte da Presidente Dilma, se imponha mais, que, inclusive tenha coragem de dizer o que pensa, de impor seus pontos de vista, de negociar no sentido mais amplo, para ter parceria que seja de parceiros e não uma parceria apenas de que nós sejamos caudatários da decisão dos mais ricos.

            O Protocolo de Kyoto até hoje não foi assinado pela maioria dos países mais ricos do mundo, e nós ficamos aqui fazendo o oba-oba da economia verde! Quando se fala em economia verde, leia-se: nós vamos ter de nos submeter ao controle das grandes multinacionais que vão ganhar com isso. Então, é preciso que a coisa seja para valer! E, para valer, repito e quero frisar: sem atingirmos esses oito objetivos do milênio, estaremos fazendo festa no Rio de Janeiro. De novo, porque a Eco 92 foi lá, e; agora, a Rio+20.

            E, quanto ao resto do País e ao próprio Rio de Janeiro, basta ver!

            Eu vi ontem uma reportagem mostrando que, a poucos metros de onde acontece o evento, há ruas com esgoto a céu aberto. Há esgoto correndo pelas ruas, e as crianças estão convivendo com isso. Então, vamos falar de maneira mais séria e mais correta e acabar com esse modismo. É muito comum essa história de modismo.Quando o negócio está na moda, todo mundo adere a isso até sem pensar, principalmente quando a mídia é manipulada.

            Veja aquele grande filme, bonito, que o ex-Vice-Presidente Al Gore produziu e que parecia o fim do mundo. Quase tudo aquilo, está desmentido, e, no entanto, ele se projetou mundialmente e adquiriu nos Estados Unidos uma posição de respeito. Agora, à custa de quem? Como se diria lá na minha terra, de um bando de alienados, para não se dizer o termo correto que eles usam.

            Como médico, repito: para mim, está em primeiro lugar o ser humano. Aliás, eu acho que para qualquer pessoa que tenha, de fato, consciência de que esses auês, essas fantasias que se fazem sem levar em conta prioritariamente o ser humano são coisas contra a humanidade.

            Peço a V. Exª, para encerrar dentro do tempo, que autorize a transcrição da matéria “Senado Espera Agenda Adequada e Compromissos”, porque aqui estão os oito objetivos do milênio que ainda não foram atingidos.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SENADOR MOZARILDO CAVANCANTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I, e § 2º do Regimento Interno).

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Matéria referida:

- “Senado Espera Agenda Adequada e Compromissos”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/06/2012 - Página 26880