Discurso durante a 108ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões sobre o momento atual da economia brasileira.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Reflexões sobre o momento atual da economia brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 21/06/2012 - Página 27076
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, ECONOMIA, PAIS, APREENSÃO, BAIXA, CRESCIMENTO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), AUSENCIA, INVESTIMENTO, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, CONSUMO, COMERCIO, PARALISAÇÃO, INDUSTRIA NACIONAL, IMPORTANCIA, CRIAÇÃO, PROVIDENCIA, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, CRISE, NATUREZA ECONOMICA.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, apesar do esvaziamento do Congresso Nacional, nestes dias em que as atenções estão voltadas para os problemas globais em discussão no Rio de Janeiro, na Rio+20, a economia brasileira ficou em plano secundário. Mas é preciso que todos nos preocupemos com os acontecimentos que dizem respeito a ela.

            Até agora não se ouviu do Governo ou da Presidente ou mesmo do Ministro Mantega nenhuma explicação sobre as razões de ter a situação piorado tanto em tão pouco tempo. Os indicadores econômicos são preocupantes. Vale recordar que, até há bem pouco tempo, a Presidente da República propagandeava aos quatro ventos que a economia brasileira aceleraria neste ano. A Presidente não falava sozinha; o Ministro da Fazenda apostava ainda mais alto e previa crescimento de 5% em 2012. De repente, de forma sorrateira, o discurso do Governo foi mudando. As projeções fantasiosas de dias atrás foram sendo abandonadas, sem, contudo, merecerem qualquer explicação oficial do Governo.

            A portas fechadas, em encontro com governadores, na semana passada, a Presidente Dilma disse não enxergar luz no fim do túnel para a crise europeia. Foi uma forma de dizer que, por aqui, a escuridão também deve preocupar.

            Já se aceita que o desempenho da economia brasileira neste ano deverá ficar aquém até mesmo dos 2,7% do PIB do ano passado, que foi pífio. No boletim Focus, divulgado pelo Banco Central, os prognósticos despencaram. A previsão prevalecente entre analistas financeiros agora é de que o PIB crescerá apenas 2,3% em 2012. Mas o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, desde a semana passada, vem duvidando dessas previsões da pesquisa Focus. Após a divulgação do resultado das contas nacionais no primeiro trimestre deste ano, a equipe do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas revisou sua previsão de crescimento do PIB para 2012 de 3% para 1,8%.

            O resultado ruim da indústria já não é novidade. O que mudou no cenário econômico brasileiro é que o setor de serviços dá sinais de perda de fôlego, e o quadro de investimentos se agravou. “Os investimentos estão muito fracos”, diz a Fundação Getúlio Vargas.

            Ainda segundo a Fundação, o problema do Brasil não é crescer pouco; o grande problema é o descasamento entre o consumo das famílias e do Governo frente à evolução do investimento. O investimento está negativo há três trimestres e é o consumo que continua sustentando algum crescimento.

            Essa armadilha é complicada e a previsão é de que a taxa de investimentos cresça 0,4% em 2012.

            O setor de serviços é o segundo grande fator que levou o Instituto da Fundação Getúlio Vargas a rever a sua previsão para o PIB. O índice de confiança apurado recuou significativamente, se comparado com o mesmo período do ano passado.

            O setor que mais emprega no País começa a ficar menos otimista. Se a economia não reagir, teremos um impacto sobre o emprego do setor, e esse fator, somado à alavancagem das famílias que estão mais inadimplentes, pode-se tornar um problema maior.

            Não são apenas as projeções que azedaram. A economia real continua amarga no segundo trimestre: de acordo com a prévia do PIB divulgada pelo Banco Central na sexta-feira, em maio a economia caiu 0,02% sobre o mesmo mês de 2011, na primeira queda neste tipo de comparação desde setembro de 2009. No acumulado em 12 meses, o crescimento é de 1,65%. Ocorre que o Governo brasileiro apostou alto numa única estratégia: a do aumento do consumo, parecendo julgar que a curva ascendente verificada nos últimos anos poderia perdurar para sempre. Descuidou, neste ínterim, de incentivar os investimentos e os empreendimentos privados.

            Com as vendas no comércio já refluindo, o Governo simplesmente ignorou que o consumidor tem limites para se endividar. Estrilou quando a federação que representa os bancos fez um alerta nessa direção, mostrando que não bastaria os juros baixarem na marra, se o tomador não quer beber da água da dívida.

            Erros acontecem. O que não se admite é a insistência neles, a despeito de todos os alertas em contrário. Não é de hoje que o Governo vem sendo criticado pelo seu samba de uma nota só na economia, o do incentivo ao consumo desenfreado - e justamente no momento em que o mundo todo discute como tornar o planeta mais sustentável e menos agredido pelos excessos.

            Não é de hoje também que se pede mais celeridade para destravar investimentos privados, concessões, parcerias público-privadas no País. Mas, aos apelos, novamente a gestão petista responde com promessas tardias, voltadas agora a incitar o "espírito animal" do empresariado apenas, porém, no ano que vem, porque neste Inês já é morta.

            Em dezembro, Mantega falava que havíamos batido "no fundo do poço" e começaríamos a decolar. Meses depois, afirmou que "ter 2,7% como piso de crescimento é muito bom". Em ambos os casos errou feio, mas nem na primeira nem na segunda ocasião foi desautorizado pela Presidente da República. Caberia agora a ambos justificar por que alcançar o “pibinho” de 2011 tornou-se tarefa impossível.

            As avaliações e alertas dos especialistas não devem passar 
despercebidas. A competente Miriam Leitão, credenciada jornalista da área econômica e de negócios, no último fim de semana, trouxe à reflexão alguns atos que rondam o nosso sistema financeiro. Ela chama atenção para o fato de que, apesar da inquestionável solidez do sistema financeiro brasileiro, alguns fatos recentes demonstram que a conjuntura já não exibe sinais tão favoráveis.

            A jornalista destaca que foram usados R$9 bilhões pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC) para cobrir rombos e fraudes em cinco bancos: PanAmericano, Morada, Schahin, Matone e Cruzeiro do Sul.

            Ela ilustra sua análise afirmando que a conta do banco Cruzeiro 
do Sul está em aberto porque o banco tem R$ 1,5 bilhão de fundos de pensão e pode não ter como honrar.

            Vejamos o histórico traçado por Miriam Leitão: o Morada foi liquidado com um rombo de R$ 100 milhões, o PanAmericano recebeu R$ 4,3 bilhões de empréstimos para cobrir as fraudes. O buraco no Cruzeiro do Sul está até agora em R$1,3 bilhão. O banco Schahin foi absorvido pelo BMG, mas com a ajuda de um empréstimo de R$ 1,5 bilhão do Fundo Garantidor de Crédito. O Banco Original, do grupo JBS, absorveu o Matone com um crédito de R$1,8 bilhão. São movimentações atípicas e que, no turbilhão do nosso cotidiano, passam despercebidas.

            Vale recordar que, pouco antes de quebrar, a Caixa Econômica Federal havia injetado quase R$ 800 milhões na compra de 49% do capital votante do PanAmericano. Uma operação rigorosamente nebulosa e de contornos políticos controversos. Neste momento, a Caixa está capitalizando o PanAmericano.

            Com lucidez, a comentarista ressalta que o custo real de todos esses abalos do sistema financeiro nacional ainda não pode ser dimensionado com exatidão. Fatalmente, a conta será maior do que os R$9 bilhões usados do Fundo Garantidor de Crédito para salvar inúmeras instituições financeiras.

            Numa sequência de crescimento minguado, inadimplência crescente, famílias se endividando, empresas reduzindo investimentos, o real se valorizando, juros caindo, cenário atual da nossa economia, o acesso dos bancos médios ao interbancário foi prejudicado. Os bancos estão sendo afetados de diversas maneiras pela virada na economia brasileira e a piora da crise na Europa.

            As ações do setor financeiro têm o terceiro pior resultado da bolsa, com queda de 3,2%; mas, de março para cá, a queda é maior, o Banco do Brasil perdeu 34% do seu valor em bolsa nesse período; o Itaú, 21%, o Bradesco, 8,6% - só para ficar entre os maiores bancos. A queda reflete a expectativa de investidores de rentabilidade e lucro menores pela frente.

            Consideramos importante nesse trecho o seguinte:

Incapaz de executar investimentos federais previstos no orçamento, o Governo estimula o crescimento via consumo.

No último lance, por exemplo, o Governo incentivou os Estados a investirem, via endividamento de R$20 bilhões. No caso do consumo, depois de mais de três anos de expansão forte do crédito, que acelerou a partir de 2009, a tendência dos bancos privados é serem mais rigorosos na concessão e garantir liquidez.

           A Presidente anunciou há poucos dias o endividamento de mais R$20 bilhões para os Estados brasileiros. Ou seja, parece que estamos retornando a tempos que ficaram no passado, em que a irresponsabilidade do endividamento público empurrava o País para o caos econômico, com a inflação galopante que aterrorizava as famílias brasileiras até o golpe fatal dado pelo Plano Real.

O crédito, como proporção do PIB, saltou de 40,5% para 49,6%, de janeiro de 2009 a abril de 2012. O saldo de recursos emprestados cresceu a uma velocidade que oscilou de 15% a 21% de 2010 para cá. O crédito direcionado chegou a crescer 30% num período de 12 meses.

O estoque de crédito inadimplente subiu 35% nos 12 meses até abril. A provisão que os bancos têm que fazer para o crédito podre, que está inadimplente há mais de 180 dias, disparou 24% no período. O comprometimento mensal da renda das famílias chegou a 22%, isso sem contar financiamentos feitos via crediários em lojas, que não são contabilizados pelo Banco Central. A inadimplência das pessoas físicas chegou a 7,6% em abril.

           Em que pese os analistas econômicos afirmarem que não há problemas no sistema financeiro brasileiro, é inegável que a conjuntura mudou.

           O cenário não é mais o céu de brigadeiro. Temos a Europa com problemas, grandes empresas no Brasil adiando investimentos, o governo não consegue investir, a inadimplência da pessoa física subiu, o endividamento das famílias está elevado - avaliação do analista da Austin Rating Luís Miguel Santacreu, citado por Miriam Leitão.

           O outro alerta: os empréstimos consignados têm sido um problema para bancos pequenos e médios, segundo Luís Miguel Santacreu.

Embora a inadimplência seja baixa, o retorno sobre o capital é menor e de longo prazo. É preciso captação constante por parte dos bancos para girar essas carteiras. A crise na Europa diminuiu a liquidez; as fraudes em carteiras de consignado elevaram a desconfiança.” - explicou Santacreu.

           Por fim, ela nos chama a atenção sobre outros aspectos que inspiram cuidados no atual cenário do sistema financeiro:

O problema com o PanAmericano, no final de 2010, colocou na berlinda o Banco Central. Ele se viu obrigado a dar uma resposta sobre fiscalização e vigilância no sistema financeiro. Isso é bom porque há mais rigor sobre a situação dos bancos, mas os bancos, ao fazerem mais provisão, estão com menor capacidade de emprestar

Conclui dizendo:.

A situação no financiamento de veículos é um sinal de alerta. A inadimplência cresce há 16 meses. Saiu de 2,5% do total de operações para 5,9% dos empréstimos concedidos. A redução do imposto derrubou o preço dos carros novos. Com isso caiu também o do carro usado. Quando o banco tenta recuperar o ativo inadimplente ele recebe menos do que havia previsto. As crises nos Estados Unidos e na Europa são lições suficientes para se ter cautela quando o assunto é crédito. O sistema financeiro brasileiro é muito concentrado. Os seis maiores bancos detêm 91% de todos os ativos financeiros. Os bancos médios são necessários. Seria ruim se continuasse aumentando a concentração.

            Portanto, há economistas alertando o Governo. É preciso saber se o Governo tem a capacidade de ouvir esses especialistas independentes, que não rezam pela cartilha elaborada e adotada pelo Governo já há 10 anos, porque, desde a posse do Presidente Lula, quando se esperava um passo adiante em relação ao Plano Real, quando se imaginava a retomada da política desenvolvimentista para fazer com que os índices de crescimento fossem acelerados, nada se fez. O Governo valeu-se apenas do patrimônio herdado. Explorou ao máximo os dividendos conferidos pelo Plano Real sem promover as reformas exigidas no pós-Real.

            O pós-Real não aconteceu. Já são 10 anos de inação governamental. O Governo está paralisado, sem criatividade, sem capacidade de promover reformas e, evidentemente, o risco de que a bolha seja furada é visível.

            Esses economistas estão alertando, estão indicando as possibilidades de risco que o povo brasileiro está vivendo neste momento.

            O Governo não faz a reforma administrativa, o Governo não investe, o Governo gasta demais, é um governo perdulário, que engordou excessivamente e usa parte substancial da receita para manter a máquina inchada. Não investe, as obras de infraestrutura estão paralisadas, o superfaturamento consome mais do que devia consumir de recursos públicos e, de outro lado, a reforma tributária, que promoveria um incremento de desenvolvimento, com a redução da carga tributária e, certamente, promoveria uma melhor distribuição dos recursos entre os entes federados, e, mais do que isso, uma melhor distribuição de renda entre os brasileiros, em 10 anos, não andou. Como outras reformas, a reforma administrativa, que seria mais simples, dependeriam apenas de vontade política de que governa, também não acontece.

            Enfim, as apostas dos economistas não são levadas em conta pela Presidência da República. As apostas a que me refiro são as que dizem respeito a mudanças necessárias para que o País possa não só fazer frente a uma eventual crise econômica, decorrente da crise europeia ou dos Estados Unidos, mas para que País possa fazer frente às aspirações do povo brasileiro de crescer mais para viver melhor.

            Portanto, Sr. Presidente, modestamente, sem ser especialista na matéria, estamos trazendo depoimentos daqueles que conhecem economia. E estão diante das ameaças que a paralisia governamental nos oferece: a economia começa a fazer água e é preciso que o Governo acorde e adote providências urgentes e mais competentes do que aquelas que têm sido adotadas até aqui, já que o Governo se conforma com atitudes periféricas, com medidas secundárias, pontuais e não tem a ousadia ou a criatividade para adotar reformas de maior profundidade.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/06/2012 - Página 27076