Discurso durante a 112ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da posição do PCdoB quanto à crise política no Paraguai.

Autor
Vanessa Grazziotin (PC DO B - Partido Comunista do Brasil/AM)
Nome completo: Vanessa Grazziotin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Considerações acerca da posição do PCdoB quanto à crise política no Paraguai.
Publicação
Publicação no DSF de 28/06/2012 - Página 28325
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, ASSUNTO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, POLITICA, PAIS ESTRANGEIRO, PARAGUAI, REGISTRO, POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, DESAPROVAÇÃO, IMPEACHMENT, PRESIDENTE, PAIS, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, MANIFESTO, PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PC DO B), ORADOR, REFERENCIA, REUNIÃO, REPRESENTANTE, POPULAÇÃO, MINISTRO, ITAMARATI (MRE), PEDIDO, ATUAÇÃO, GOVERNO, BRASIL, OBJETIVO, MANUTENÇÃO, DEMOCRACIA, GOVERNO ESTRANGEIRO.

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco PCdoB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidenta, Senadora Marta Suplicy, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, companheiros e companheiras, venho à tribuna, neste momento, para tecer alguns comentários que expressam não apenas a minha opinião pessoal em relação à crise política vivida pelo vizinho e querido país, o Paraguai, mas também expressam a opinião do meu partido.

            Em meio à importante conferência sobre o meio ambiente, Rio+20, todos nós fomos surpreendidos com o impeachment do presidente paraguaio Fernando Lugo. Processo realizado sem tempo hábil para a defesa do presidente que foi eleito pelo voto do povo.

            Quero aqui deixar claro que nós do Partido Comunista do Brasil consideramos o que ocorreu, no vizinho Paraguai, um golpe à democracia, não só daquele país, mas de todo o continente.

            E quero solicitar de V. Exª, Senadora Marta, que peça para incluir nos Anais a íntegra do meu pronunciamento, onde transcrevo um edital que foi publicado no Portal Vermelho, que deixa muito clara a posição do nosso partido, o PCdoB, em relação a esse episódio.

            Peço para que isso seja incluído dos Anais da Casa porque prefiro, ao invés de ler a nossa opinião, falar um pouco do momento que tivemos, hoje pela manhã, com o chanceler, o Ministro das Relações Exteriores do nosso País, Ministro Patriota.

            Organizado pelo Senador Lindbergh Farias, por um conjunto de entidades que representam a população brasileira, entidades juvenis, como a União Nacional dos Estudantes, o Movimento dos Sem-Terra, o Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade em Busca pela Paz), enfim, várias entidades, estivemos - o Senador Lindbergh, o Senador Randolfe Rodrigues e eu - com vários parlamentares federais, deputados federais, numa importante audiência com o Ministro Patriota, onde levamos, primeiro, nossos cumprimentos e o reconhecimento ao governo brasileiro pela acertada posição política adotada diante desse quadro crítico do Paraguai e, ao mesmo tempo, pedindo firmeza do nosso País, importante nação não só do hemisfério sul americano, mas importante para o mundo e para todas as Américas.

            Entendemos que a posição do Brasil, posição política, é fundamental no sentido do restabelecimento da normalidade democrática no Paraguai e em todo o Continente. Entregamos ao Ministro um manifesto de repúdio ao golpe de estado. E eu vou ler algumas das partes desse manifesto que considero extremamente isento de qualquer análise política e ideológica, um manifesto que trata do mérito da questão da própria democracia.

            Assim procedo, Presidenta Marta, porque eu tenho ouvido algumas manifestações a respeito do assunto e manifestações de apoio à atitude antidemocrática, golpista, adotada pelo parlamento daquele país de pessoas, parlamentares inclusive, que, apesar de fazerem um chamamento, uma abordagem correta, imparcial sobre a precisão conceitual e dizerem que essa abordagem deve estar despida de interesse de caráter político e ideológico, essas pessoas que fazem esse chamamento exatamente enveredam pelo caminho da análise política e ideológica.

            Porque eu não imagino que alguém, Srª Presidenta, em sã consciência pode achar correto - repito alguém em sã consciência - pode achar correto, pode achar correto, pode achar normal que um presidente eleito de um País, em menos de 40 horas, em pouco mais de 30 horas, seja contra ele feita uma denúncia, aberto um processo e ele, destituído de suas funções. Não há explicação. Em nenhum manual de democracia de qualquer parte do mundo. Não há nenhuma, absolutamente nenhuma explicação, nada que possa justificar, Senador Suplicy, esse tipo de procedimento. Como um presidente eleito, processado, denunciado e “impeachmado” em menos de 40 horas? Isso é inimaginável!

            Lembramos ao Ministro Patriota alguns episódios no Brasil, quando vivemos momentos de impeachment, cujos processos demoraram oito, nove, dez meses. Agora, menos de 40 horas! - Senadora Ana Amélia, que passa a dirigir esta nossa sessão - é inimaginável! É inaceitável!

            Portanto, é obvio que eu, como qualquer outro membro deste Parlamento, todos nós temos posições ideológicas, sim, posições políticas, mas, neste caso, precisamos nos despir efetivamente na prática e não apenas num chamamento vazio. Mas, na prática, precisamos nos despir desses posicionamentos político-ideológicos para analisar o fato em si, se respeita ou não a democracia.

            Nesse sentido, fomos ao Ministro Patriota dizer que consideramos ajustada a posição do Governo brasileiro, equilibrada a posição do Governo brasileiro; não açodada, como alguns procuram caracterizar. Pelo contrário, o nosso posicionamento é exatamente o mesmo de quase a totalidade dos países do nosso continente.

            O Ministro Patriota nos lembrava que, mesmo antes do desfecho, ou seja, do impeachment, do golpe contra o Presidente Fernando Lugo, quando estavam todos os chefes de Estado e chanceleres reunidos durante a Rio +20, foi chamada uma reunião de emergência e foi formada uma comitiva para ir ao Paraguai, o que efetivamente ocorreu, para buscar demover os parlamentares desse posicionamento. Poderia até ou pode até um presidente perder o seu mandato, mas não sem ter sequer o direito à defesa. O que aconteceu lá foi um julgamento baseado em questões genéricas.

            Mas, enfim, eu quero ler aqui, se o tempo me permitir, se não permitir, solicito que seja incluída nos Anais, a íntegra da moção que entregamos ao Ministro Patriota. Repito, vários Parlamentares, Senadores e Deputados Federais, e o conjunto dos movimentos sociais organizados de nosso País.

            Diz o seguinte:

“Considerando que o presidente da República do Paraguai, Sr. Fernando Armindo Lugo de Méndez, foi legitima e democraticamente eleito; enfatizando que o devido processo legal e o direito à defesa constituem-se em pedras angulares do estado democrático de direito; destacando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos dispõe que toda pessoa tem direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, para que se determinem seus direitos de qualquer natureza, incluindo o direito do acusado de dispor de tempo e dos meios adequados à preparação de sua defesa (artigo 8); recordando que a Constituição da República do Paraguai de 1992 afirma que o direito de defesa das pessoas é inviolável (artigo 16) e que toda pessoa tem a garantia dos direitos processuais, entre os quais se destacam os meios e prazos indispensáveis à preparação de sua defesa (artigo 17); CONSIDERANDO que o julgamento político do presidente Fernando Lugo, que durou menos de 36 horas, ocorreu de forma a violar gravemente tais direitos e garantias; colocando em relevo, ademais, que o processo contra o Presidente Fernando Lugo foi constituído com base em acusações vagas e sem a apresentação de uma única prova consistente; concluindo, de forma inequívoca, que tal processo resultou num verdadeiro golpe de Estado, que contraria o espírito da Constituição paraguaia e colide frontalmente com toda a arquitetura internacional de proteção aos direitos humanos; ressaltando que o golpe de Estado ocorrido no Paraguai representa clara ruptura da ordem democrática daquele país e grave afronta às consciências democráticas de todo o mundo; observando que a ruptura da ordem democrática no Paraguai não é apenas um assunto interno daquele país, estritamente circunscrito à sua soberania, mas, sim, uma grave anomalia institucional e política que afeta seriamente o processo de integração regional do Mercosul e da Unasul, bem como todas as democracias do subcontinente; considerando que o Protocolo de Ushuaia, firmado no âmbito do Mercosul e ratificado pela República do Paraguai, prevê, em seu art. 5, sanções severas, entre as quais está incluída a suspensão do bloco daqueles membros que promoverem rupturas da ordem democrática; considerando, da mesma forma, que o Protocolo Adicional ao Tratado Constitutivo da Unasul sobre Compromisso com a Democracia também prevê, em seu art. 4, a aplicação de sanções, que incluem a suspensão dos direitos e prerrogativas assegurados no referido tratado aos Estados-partes que pratiquem ou ameacem praticar rupturas da ordem democrática; consternados com o sofrimento do povo irmão do Paraguai, que merece e precisa de governos democráticos, transparentes e inclusivos e, por último, alarmados com a criação desse grave precedente que ameaça a ordem democrática de toda a região, fruto de décadas de árduas lutas contra regimes ditatoriais, que custaram as vidas de milhares de pessoas; nós, parlamentares da Câmara dos Deputados e do Senado Federal da República Federativa do Brasil, repudiamos, com veemência, o golpe de Estado perpetrado contra a democracia da República do Paraguai; conclamamos o Conselho de Chefes de Estado e de Governo da Unasul a suspender a República do Paraguai do direito de participar dos diferentes órgãos e instâncias (...)”

            E aí segue, Srª Presidenta.

            Então, eu fico aqui com esse registro, manifestando, pessoalmente, o meu repúdio e pedindo que o Brasil continue agindo como está para restabelecer a normalidade...

(Interrupção do som.)

(A Sª. Presidente faz soar a campainha.)

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/ PCdoB - AM) - Para restabelecer a normalidade democrática não só no Paraguai, mas em todo nosso continente.

            V. Exª, Senadora Ana Amélia, que faz parte do Parlamento do Mercosul, como uma das representantes brasileiras, confiamos muito na postura de V. Exª e de outros que lá estão para que deixemos de lado... É muito grave a questão ideológica, mas não é possível que um presidente, seja ele quem for, seja denunciado, processado e sofra impeachment em 36 horas. Isso é inadmissível.

            Portanto, temos uma grande responsabilidade com a reposição da democracia em todo o continente e no mundo.

            Muito obrigada, Srª Presidente.

 

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DA SRª SENADORA VANESSA GRAZZIOTIN

            A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco/PCdoB - AM. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, em meio a Conferência Rio+20 fomos surpreendidos com o impeachment do presidente paraguaio, Fernando Lugo. Processo realizado sem tempo hábil para a defesa do presidente, que foi eleito pelo voto do povo. Quero aqui deixar claro que nós, do Partido Comunista do Brasil, consideramos o que ocorreu no vizinho Paraguai um golpe à democracia não só daquele país, mas de todo o Continente.

            Passo aqui a ler editorial publicado no Portal Vermelho que deixa claro a nossa posição sobre o ocorrido:

            "O Congresso paraguaio, formado por uma maioria de oligarcas cevados durante a longa ditadura de Alfredo Stroessner, inovou e, imitando a guerra relâmpago dos nazistas, inventou o impeachment relâmpago: entre o abandono do presidente Fernando Lugo pelos parlamentares que formavam sua frágil base parlamentar, o início do "processo" e a decisão de afastar o presidente não transcorreram sequer 48 horas!

            O que ocorreu entre a manhã de quinta-feira (21) e a tarde de sexta-feira (22) em Assunção foi um golpe de Estado com disfarce de legalidade. Ele expõe, à luz do dia, a contradição que havia desde a posse de Fernando Lugo, em 2008, entre o presidente que encarnava a promessa de mudança democrática e combate à pobreza e à desigualdade, e um parlamento raivosamente antidemocrático que sempre se pôs de joelhos perante os interesses dos EUA na América do Sul. Conclave de oligarcas saudoso da presença do imperialismo para assegurar seus próprios e anacrônicos privilégios e que foi entrave, por exemplo, à entrada da Venezuela no Mercosul, pois nunca votou a necessária aprovação para a incorporação da pátria de Hugo Chávez ao bloco regional -bem de acordo, é claro, com os interesses de seus patrões do hemisfério norte.

            A deposição de Lugo foi um golpe oportunista, que ocorreu no momento em que as atenções, e os principais dirigentes dos países do mundo, estavam no Rio de Janeiro, na Rio+20. E baseado numa alegação hipócrita: o conjunto de latifundiários que domina o parlamento paraguaio usou como bandeira o sangue derramado num conflito de reintegração de posse em Curuguaty, na semana passada, que deixou 17 camponeses mortos. Os trabalhadores rurais sem-terra lutam para retomar lotes onde suas famílias residem há mais de cem anos mas que, durante a ditadura de Stroessner, forma "doados" a um dos homens mais ricos do país, o latifundiário Blas Riquelme.

            Os camponeses expulsos querem suas terras de volta para trabalhar, e se chocam com a minoria extrema (2% da população) de ricaços que controlam 80% das terras do país, colocando o Paraguai entre as nações mais pobres do Continente, com quase metade da população abaixo da linha da pobreza.

            O convescote dos oligarcas confiscou o mandato de Lugo, mas não teve a coragem de apresentar a violência cometida com o nome adequado para sua ação: golpe de Estado. Preferiu dar a ela o disfarce de uma legalidade esfarrapada.

            Os paraguaios demonstram seu inconformismo contra o golpe. Deixam claro que Câmara dos Deputados e o Senado do Paraguai estão em oposição à nação e ao povo numa luta que, agora, extravasa as fronteiras nacionais e estende-se pelo Continente. Ao rasgar os compromissos continentais pela democracia, ordem constitucional e defesa das instituições democráticas, o golpe de Estado é um claro rompimento com as demais nações do continente e a busca de fortalecimento da União das Nações Sulamericanas (Unasul) e do Mercosul. O confronto com a nova legalidade democrática que se firma no continente é inegável, e inaceitável.

            O golpe abre uma nova etapa na luta dos paraguaios pela democracia, que impõe a derrota da oligarquia aliada ao imperialismo. E coloca um desafio institucional para a integração continental: as nações do continente não podem aceitar o rompimento de acordos regionais solenemente proclamados e festejados pelos povos e democratas.

            Se cabe aos paraguaios derrotar os golpistas, cabe aos democratas e aos governos da região agir para destruir a serpente da desunião e da traição aos povos. É preciso combater com toda a força, veemência, e com os instrumentos conquistados na última década, toda a ilegitimidade institucional no continente. Basta de golpes! Basta de interferências externas. Basta de alinhamento com os interesses do imperialismo e do latifúndio atrasado! O governo ilegítimo que nasceu do golpe precisa ser isolado e derrotado, e está tarefa cabe a todos os democratas do continente".

            Srªs Senadoras e Srs. Senadores!

            Sabemos que a Presidenta Dilma Rousseff manifestou desde o momento do acontecimento sua preocupação com esse golpe à democracia, e sinalizou que isso teria conseqüências. E entre as primeiras estão a suspensão do Paraguai do Mercosul.

            O Governo do Brasil já deixou claro que só tomará outras iniciativas em conjunto com a Argentina e o Uruguai. Mas é clara a disposição da presidenta, que acompanha atentamente os desdobramentos políticos no Paraguai, e conversa com seus ministros e com o embaixador do Brasil em Assunção, Eduardo Santos: O Brasil não tem intenção de reconhecer um Estado que desrespeita a ordem democrática,

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/06/2012 - Página 28325