Pronunciamento de Demóstenes Torres em 03/07/2012
Discurso durante a 116ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Alegação de inocência a respeito das acusações imputadas a S.Exa., relativas às atividades do Sr. Carlos Cachoeira.
- Autor
- Demóstenes Torres (S/PARTIDO - Sem Partido/GO)
- Nome completo: Demóstenes Lazaro Xavier Torres
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.
EXPLICAÇÃO PESSOAL.:
- Alegação de inocência a respeito das acusações imputadas a S.Exa., relativas às atividades do Sr. Carlos Cachoeira.
- Publicação
- Publicação no DSF de 04/07/2012 - Página 30071
- Assunto
- Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO. EXPLICAÇÃO PESSOAL.
- Indexação
-
- DEFESA, INOCENCIA, ORADOR, ACUSAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, SENADOR, ATIVIDADE, JOGO DE AZAR, CRITICA, DESENVOLVIMENTO, PROCESSO, ENFASE, NULIDADE, ILEGALIDADE, PROVA, DENUNCIA, INVASÃO, INTERCEPTAÇÃO, TELEFONE.
O SR. DEMÓSTENES TORRES (S/Partido - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, esta é a continuação do discurso que fiz ontem e que continuarei a fazer também nos próximos dias.
Como disse ontem, não concederei aparte, porque me faltam poucas horas para chegar ao dia final.
Diz este discurso: a campanha incessante feita contra mim chegou ao paroxismo. O assunto estacionou, cansativo, e, para abreviá-lo, a fúria punitiva exige não a elucidação do caso, mas a eliminação do meu mandato. É preciso atenção ao precedente perigoso de entregar uma cabeça só porque ela já não suporta mais tanta pancada. Os que vociferam pela cassação se recusam a tomar conhecimento da defesa. Felizmente, vivemos numa democracia, e a defesa não é um privilégio; é a garantia das liberdades, é um sinal de superação do arbítrio.
No que concerne a mim, ampla defesa e contraditório acabaram superados pelas manchetes. Para que perder tempo ouvindo o Demóstenes, se já saiu no jornal que ele é culpado? Para que fazer perícia nas interceptações telefônicas, se foi a Polícia Federal que gravou, editou e montou? Afinal, numa altura dessa do campeonato, é mais fácil acreditar no Demóstenes ou em seus detratores? Felizmente, devido processo legal não é uma competição; é uma conquista da cidadania. De acordo com o Supremo, é imprescindível na fase administrativa a obediência aos ritos.
O Senado certamente não se curvará a essa tática de campanha, que sazonalmente instala um Parlamentar como alvo e só sossega quando aparece outro na mira. Por que o açodamento? Rapidez em processo não pode ser sinônimo de precipitação. Acusar, denunciar, julgar e condenar são etapas conjugadas com o esgotamento de cada fase da defesa. Uma dessas fases, absolutamente indispensável, é a aferição da qualidade das provas.
O detalhe que incrimina pode ser desmentido por outro detalhe que inocenta. Para emergirem os diálogos que interessariam à defesa é vital o cumprimento de três estágios: periciar com rigor todas as gravações, transcrever ipsis litteris as frases e identificar outros sons, e, em seguida, periciar as transcrições, checando-as com as gravações. Perícia não é uma modalidade de enrolação da defesa, não é uma filigrana para postergar julgamento. Perícia é uma ciência a serviço da Justiça. Como avançou a tecnologia de grampear telefone, houve significativas melhoras no pessoal, nas técnicas e nos equipamentos de perícia. Para me investigar ilegalmente se utilizou tecnologia de ponta. Para me punir estão sendo usados métodos medievais. Existir bode expiatório é indigno do Senado da República.
Desde o início, atesto a minha inocência, peço cuidado com o produto das escutas e alerto para o estratagema de divulgação sistemática que dinamita honra. Faz parte do método iniciado nos grampos. Acusam, denunciam, punem e obrigam ao cumprimento de pena para depois se pensar na legalidade e na qualidade das provas. Se, ao final, descobrir-se que o linchado era inocente, isso não terá a menor repercussão, porque outro personagem já estará na fogueira para o sacrifício.
Para me ouvir diuturnamente, todo dia, toda noite, o dia inteiro, a noite inteira, acompanhando as minhas conversas, a Polícia Federal destinou quatro delegados e dez agentes de cada vez. Para fazer a degravação completa e a perícia do inteiro teor, alega-se não haver pessoal. Não somente em relação a mim, mas quantas pessoas no Brasil vão pagar com a inocência pela suposta falta de estrutura dos órgãos acusadores?
Exemplo de quão essencial é a perícia está no fragmento exaustivamente divulgado como se eu tivesse pedido R$3 mil para bancar o frete de um avião. Simplesmente fraudaram a transcrição. Esse e outros trechos foram analisados por um dos mais renomados peritos do Brasil, Joel Ribeiro Fernandes, especialista em mídias forenses. Sua manifestação é de que a ausência de autenticidade é diametralmente oposta às fartas evidências de montagens e edições. Abro aspas para ler a conclusão do perito:
Não há, no material resultante das escutas telefônicas, uma prova científica que demonstre que o mesmo é autêntico e que está íntegro, de acordo com o que orienta a Medida Provisória 2200-2, de 24 de agosto de 2001 , em seu art. 1º.
E o que diz o art. 1º da mencionada Medida Provisória:
Art. 1º Fica instituída a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP- Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras.
O exame técnico do perito é cristalino. Seria ideal lê-lo aqui em sua integralidade, mas vou repetir somente a conclusão. Diz o perito:
Associado à falta de documentação técnica que demonstre a idoneidade do material resultante das escutas telefônicas, são observados robustos indícios de EDIÇÕES nas informações acostadas aos Autos.
A seguir, serão enumeradas algumas dessas evidências que, mesmo sem a análise no material original, ou em cópia autêntica deste, foram possíveis de serem constatadas e facilmente demonstradas.
O perito chegou a outras conclusões, como à de que eu fui realmente grampeado de maneira ilegal. E todo mundo sabe que um Parlamentar federal só pode ser grampeado com autorização do Supremo Tribunal Federal. Não é detalhe técnico comum, é um absurdo político e jurídico. Hoje eu sou a bola da vez. Se a tramoia der certo comigo e me amputar o mandato, daqui a pouco pode se repetir com outra vítima, um outro Senador. É preocupante o precedente de tentar cassar um senador com base em provas ilegais.
Para completar, negam-se perícias, única forma de identificar ruídos, separar cada som de acordo com o que o provocou. Para se fazer justiça, é indispensável se descrever o ambiente em que está o autor da fala. Não é porque alguém diz que está próximo à casa de outrem que isso é necessariamente verdadeiro. Como não houve diligências à época das interceptações e não está havendo agora apuração alguma, resta aos difamadores a porta larga do achismo. O pensamento se resume assim: se tem tanta gente falando tanta coisa do Demóstenes durante tanto tempo, eu acho que alguma coisa tem de errado. E se eu não achar nada de errado contra ele nos autos não é porque está tudo certo, mas porque eu é que não estou encontrando. O raciocínio é tosco a esse ponto. E o pior: como foi repetido na mídia até cinquenta vezes por segundo nos últimos quatro meses, virou verdade.
O tira hermeneuta, de propósito, só colocou no papel o que julgou conveniente para a campanha de demolição da minha honra. No tal trecho dos R$3 mil do avião, ouve-se, nitidamente, uma voz ao fundo cobrando uma viagem aérea. As três não são minhas, nem a cobrança, nem a viagem, nem a voz. Duas empresas de táxi-aéreo e a Agência Nacional de Aviação Civil foram impelidas pelo Conselho de Ética e documentaram que estão explicados os meus itinerários e suas respectivas quitações. Portanto, os R$3 mil do tal frete não têm qualquer relação comigo. A cobrança do contratado ao contratante era acerca de outro voo. Mas não foi o que o público ficou sabendo. Aliás, se não tivesse sido feita a perícia, nem meus advogados teriam ficado sabendo. Seria a minha palavra contra a do irresponsável que fez a montagem e a digitou nos autos.
Por enquanto, vem dando certo a estratégia de moer reputação usando o sistema Triplo Ar: investigar ilegalmente, divulgar incessantemente e julgar rapidamente. Investigam à moda do arbítrio, divulgam no método Goebbels e julgam no modo turbo. Das 250 mil horas de gravações, foram pinçadas frases com o objetivo de enlamear a minha biografia. As frases foram pulverizadas de sorte que dezenas de veículos de comunicação dessem furos.
Ninguém duvidava da fonte. Afinal, quem estava vazando eram autoridades de organismos persecutórios ilibados. Ninguém duvidava do texto. Afinal, seu autor era um tira hermeneuta que supostamente relatou com fidelidade o que ouviu. Ninguém duvidava dos áudios. Afinal, as vozes eram atribuídas nos relatórios e os termos geralmente inteligíveis.
Esse foi o enredo de criação da atmosfera para, de repente, eu ser um caso sem jeito. A notícia surgia insignificante...
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco/PSB - BA) - Mais um minuto, Senador.
O SR. DEMÓSTENES TORRES (Sem Partido/GO) - Peço a V. Exª um pouco mais de tolerância. Se V. Exª puder me dar mais cinco minutos, é para concluir apenas. Eu tinha combinado com a Mesa. Se V. Exª pudesse fazer assim, eu ficaria grato.
Esse foi o enredo de criação da atmosfera para, de repente, eu ser um caso sem jeito. A notícia surgia insignificante, e o que de manhã era ilação, à tarde já era fato e à noite transitava em julgado. De uma hora para outra, quem confiava em mim deixava de crer sem que nada de importante tivesse acontecido, apenas porque surgiam novas manchetes sobre o assunto de sempre. Não importava o que havia na manchete, se era verdadeira ou não.
Os autos foram de tal modo preparados para gerar manchetes que os agentes encarregados da transcrição puseram títulos nos diálogos. O artifício, Srs. Senadores, da máquina de moer reputação foi bem-sucedido, pois o título da transcrição virava título do jornal em letras garrafais. O que o policial decidiu que era certo virava certeza indiscutível. Para dar um exemplo prosaico, se, numa conversa de terceiros, alguém se referisse a outrem com apelido de "Gordo" ou "Gordinho", o policial que transcreveu colocava na frente, entre parênteses: DEMÓSTENES, em maiúsculas. Se a alcunha fosse "Doutor", escrevia DEMÓSTENES também. Se falasse a palavra "Professor", nem vacilava, DEMÓSTENES entre parênteses.
Dezenas de agentes acompanharam os grampos, descolados de outras unidades da Federação para me investigar de perto, e eles decidiram me transmutar nos diversos gordos, gordinhos, professores e doutores citados nos grampos. Como eu nunca fui doutor, deixei de ser professor em 1987 e de ser gordo em janeiro de 2009, a única explicação é que não ligaram o apelido à pessoa. Menos para as manchetes. Se no diálogo estava a palavra “gordinho” e a transcrição punha meu nome, mais um furo de reportagem com o Demóstenes aprontando alguma. Assim se desenhou o atual cenário, num método eficiente: quando a vítima se dá conta, já foi transformada em algoz e proibida de lutar pela sua sobrevivência.
Para encerrar, volto à pergunta às Srªs e aos Srs. Senadores: alguma vez, algum dia, ainda que en passant, fiz qualquer gestão junto a V. Exªs sobre qualquer interesse de Carlos Cachoeira? Certamente não! A análise acurada dos autos comprova que eu agia fora do Senado com a mesma retidão com que sempre atuei aqui dentro. Relembrem minhas ações, todas republicanas e a serviço do Brasil. Elas é que devem ser apreciadas.
Aqui estamos entre os melhores hermeneutas do País: os Senadores da República. E se entre nós a análise for puramente política, poderei ser crucificado ou enaltecido. É nesse sentido lato sensu que peço para me julgarem pelo que fiz. Não posso ser responsabilizado por interpretações dissociadas da realidade fática.
Confio na capacidade de discernimento das Srªs Senadoras e dos Srs. Senadores. O Senado não vai se render a pressões fabricadas para que a opinião pública seja a opinião publicada. Foi dito à exaustão que fica mal para o Senado me absolver. A leitura atenta dos autos indica o contrário. O que fica mal para o Senado é validar agressões à Constituição e ao seu guardião, o Supremo Tribunal Federal.
Por esta Casa passaram os textos da Carta Magna e as nomeações do Supremo. É vital respeitar a ambos e à segurança jurídica de aguardar que o Supremo Tribunal Federal decida sobre a validade das interceptações telefônicas. O que fica mal para o Senado é sacrificar um mandato em meio a um clima tramado para ejetar um Senador.
Insisto na ilegalidade das provas, questionando a qualidade das escutas e sua degravação. Para sanar as duas questões, não existe mistério algum, basta esperar as providências adequadas, no resguardo dos direitos constitucionais à disposição de todos os brasileiros.
Reafirmo a todas as Srªs e a todos os Srs. Senadores: sou inocente! E o tempo provará isso.
Quero o tempo necessário; quero permanecer no Senado para poder provar essa minha inocência, honrar o País, honrar os meus eleitores, honrar o Brasil, como sempre fiz até hoje.
Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.