Discurso durante a 116ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise das discussões realizadas durante a Rio + 20.

Autor
Ana Rita (PT - Partido dos Trabalhadores/ES)
Nome completo: Ana Rita Esgario
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Análise das discussões realizadas durante a Rio + 20.
Publicação
Publicação no DSF de 04/07/2012 - Página 30328
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCUSSÃO, REALIZAÇÃO, DURAÇÃO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, MEIO AMBIENTE, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), RELAÇÃO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, MODELO, ECONOMIA, VALORIZAÇÃO, RECURSOS AMBIENTAIS, IMPORTANCIA, ERRADICAÇÃO, POBREZA, MUNDO, ESTABELECIMENTO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.

            A SRª ANA RITA (Bloco/PT - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senadora Marta.

            Apenas para dizer para o Senador Walter Pinheiro que, além do aniversário da Bahia, o dia de ontem foi o aniversário da minha mãe. Então, quero aqui aproveitar a oportunidade para parabenizá-la também.

            Mas, Srª Presidente, prezadas Senadoras, prezados Senadores, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado e público que aqui nos acompanha, ocupo a tribuna desta Casa hoje para relatar minha participação na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, e no evento paralelo organizado pela sociedade civil global, a Cúpula dos Povos. 

            Aproveito a oportunidade para tecer uma breve análise do processo de discussão travado na Conferência, com destaque para a posição do Brasil, que teve papel de protagonista nas articulações, com vistas a garantir um consenso possível num contexto desfavorável, por conta da profunda crise econômica internacional que tem servido de pretexto para a não consolidação de avanços mais significativos da pauta do desenvolvimento sustentável, sobretudo no que diz respeito às responsabilidades dos países considerados ricos, especialmente da Europa e dos Estados Unidos.

            Na Rio+20, privilegiei um debate que considero fundamental e que tem movido a minha atuação parlamentar: o desafio de construir um modelo de sociedade e de desenvolvimento que seja capaz de erradicar a pobreza, as desigualdades sociais e econômicas e as atuais assimetrias existentes entre homens e mulheres, por exemplo.

            Por isso, fiz questão de participar do Fórum de Líderes, que discutiu o “Futuro que as mulheres querem: Igualdade de gênero e empoderamento das Mulheres para o Desenvolvimento Sustentável”, atividade promovida pela ONU Mulheres e pelo Governo brasileiro, que destacou a importância das mulheres para a construção de um mundo sustentável, tendo em vista que correspondemos à metade da população mundial, fator determinante para assumirmos o compromisso de influenciar na mudança do atual modelo de produção e consumo.

            Ficou claro em todas as exposições e intervenções realizadas durante o Fórum que um futuro realmente sustentável depende da superação das desigualdades entre homens e mulheres, da erradicação da pobreza e da miséria - que atinge principalmente as mulheres negras e indígenas -, da necessidade de garantir os direitos humanos e o empoderamento das mulheres no acesso ao emprego, à alimentação, à terra, aos recursos naturais e à biodiversidade e ao poder.

            Aproveito para parabenizar a iniciativa do Governo brasileiro, chefiado pela nossa Presidenta Dilma Rousseff, que mais uma vez deu exemplo ao mundo, ao firmar um acordo com a ONU Mulheres, que estabelece a cooperação Sul-Sul na área de igualdade de gênero.

            O acordo, assinado pela diretora-executiva da ONU Mulheres, Michelle Bachelet, e o ministro Marco Farani, da Agência Brasileira de Cooperação, a ABC, pretende fazer avançar a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres em programas nas áreas de paz, segurança e proteção social. Serão investidos três milhões de dólares, doados pelo Governo brasileiro, para a execução de programas em um período de três anos, após a aprovação dos projetos nacionais.

            Dito isso, compartilho agora parte das minhas impressões sobre os debates da Rio+20, Conferência da ONU, que trouxe o desafio de discutir os marcos do desenvolvimento mundial e o novo pacto em defesa da sustentabilidade do Planeta, vinte anos após a histórica Conferência do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio 92 ou Eco 92.

            Destaco aqui a referência histórica que a Rio 92 teve para esse debate, pois foi a partir dela que se introduziu de maneira definitiva o conceito de desenvolvimento sustentável como um novo paradigma capaz de gerar crescimento econômico, igualdade social e sustentabilidade ambiental, indo além de uma visão puramente preservacionista da natureza, predominante em alguns setores até aquele momento, para um conceito mais amplo e abrangente, que traz consigo as dimensões do social e do econômico. Além de desenhar de maneira brilhante o tripé do desenvolvimento sustentável, a Eco 92 deixou como legado a Agenda 21 e as grandes convenções do clima e da biodiversidade.

            Tenho convicção de que esse debate do desenvolvimento sustentável vem se tornando um fundamento cada vez mais presente para a sociedade. Estamos vivendo um momento histórico, fundamental para a humanidade, no qual temos total ciência da finitude dos recursos naturais e, portanto, do desafio de forjar um modelo de desenvolvimento que seja capaz de suprir as necessidades materiais da sociedade presente sem comprometer as gerações futuras.

            Temos ciência, ainda, de que o atual modelo de desenvolvimento, com seu padrão de produção e consumo, é insustentável e que a finitude dos recursos naturais e a sua escassez irão impor, cada vez mais, limites ao crescimento econômico linear e sempre ascendente dos países desenvolvidos e dos países em vias de desenvolvimento. Não é nada prudente insistirmos em um modelo socioeconômico que promove uma relação da sociedade junto ao seu habitat de forma predatória e imediatista, fazendo uso dos seus recursos naturais desregrada e irracionalmente.

            De acordo com a ONU, em 2030, o mundo precisará de 50% mais alimentos, 45% de mais energia e 30% de mais água. O aumento de demanda, por alimentos, energia e água, se dará num contexto de profundas mudanças climáticas, que já estão alterando diversas regiões do globo, causando inúmeras catástrofes naturais e colocando em risco a biodiversidade do Planeta, a própria sobrevivência da humanidade.

            É a partir desse plano de fundo que a ONU realizou a Rio+20, na tentativa de enfrentar os dilemas para a consolidação de uma governança global e para a criação de estruturas político-administrativas capazes de fazer o desenvolvimento sustentável entrar, de fato, na agenda dos governos, da sociedade e das corporações.

            Para tanto, a Conferência apresentou ao mundo seu documento base intitulado “O Futuro que Queremos”, que traz o conceito de economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza. O documento versa ainda sobre a necessidade de fortalecer o marco institucional para o desenvolvimento sustentável.

            A alternativa apresentada para a solução do impasse colocado em relação ao desenvolvimento sustentável estaria na economia verde, a qual foi apresentada como a fórmula capaz de gerar o bem-estar humano, a equidade social, a redução dos riscos ambientais e a escassez ecológica, a partir de um novo padrão de produção e consumo sustentáveis, de novas tecnologias, novos mercados, novos empregos, novos produtos e serviços, com um crescimento vigoroso, sustentado em um novo modelo de desenvolvimento.

            A adoção da economia verde como novo paradigma para o desenvolvimento sustentável coloca o debate ambiental no plano econômico, marcando o início de um processo de precificação da natureza, que determina quanto custam a ação e a omissão dos Estados e das corporações, estando inclusos desde a possibilidade de pagamento por serviços ambientais até a negociação de crédito de carbono no mercado financeiro.

            À economia verde, o Brasil trouxe um importante ajuste conceituai ao debater a necessidade de um modelo de economia inclusivo, com foco num ciclo de desenvolvimento sustentável que permita a inserção de milhares de pessoas à economia do consumo de bens e serviços a partir de padrões sustentáveis e viáveis.

            Colocamo-nos no debate com posição avançada e ambiciosa, na defesa de um futuro com distribuição de renda, com combate à pobreza e à miséria, com melhoria das qualidades de vida e trabalho, com respeito às culturas e ao meio ambiente, com aprofundamento da democracia e da participação social na definição e implementação das políticas públicas, em oposição a um conceito de economia verde meramente mercadológico e liberal proposto pelos países desenvolvidos.

            O propósito da Rio+20 de formular um plano para que a humanidade se desenvolvesse de modo a garantir vida digna a todas as pessoas, administrando os recursos naturais de modo que as gerações futuras não sejam prejudicadas, não foi plenamente alcançado. Mesmo com todo o esforço, notável habilidade e protagonismo do Brasil em todo o processo de negociação, as metas assumidas pelos países foram pouco ousadas e ambiciosas. Não houve consenso em questões centrais, como quem irá pagar a conta da transição para um modelo de desenvolvimento sustentável global que possibilite aos países mais pobres a adoção de tecnologias e práticas mais sustentáveis, como previsto em um dos Princípios da Rio, criado em 1992, sobre as "responsabilidades comuns, porém diferenciadas", que significa que os países ricos devem investir mais no desenvolvimento sustentável por terem degradado mais o meio ambiente durante séculos e séculos.

            A crise econômica que atinge os Estados Unidos e a Europa é vista como um dos principais motivos que tornaram o momento atual muito difícil para que fóruns multilaterais assegurem avanços ou mesmo o cumprimento das resoluções aprovadas e consensuadas.

            Esses limites e impasses em torno da Conferência Oficial que reuniu mais de 190 países no Rio foram debatidos e questionados num fórum paralelo, organizado pela sociedade civil global a Cúpula dos Povos, que denunciou a incapacidade dos governos de pensarem respostas à altura dos desafios postos numa crise que não atinge apenas o sistema financeiro e a economia dos países, mas uma crise muito mais grave e profunda que coloca em xeque o próprio modelo civilizatório atual.

            A Cúpula dos Povos ainda questionou a proposta de capitalismo verde apresentado na Rio+20, que pretende combinar a lógica do lucro com a preservação ambiental, ou melhor, buscam transformar a preservação ambiental em fonte de lucro.

            Srª Presidenta, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, essa visão de economia verde, de mercantilização da vida e da natureza foi amplamente criticada, chegando a mobilizar mais de 80 mil pessoas de todo o mundo nas ruas do Rio de Janeiro, durante a Marcha dos Povos, a qual eu tive a honra de participar, juntamente com os movimentos sociais e a sociedade civil global.

            Mesmo não tendo suprido todas as expectativas, o grande legado da Rio+20 foi provocar o debate em âmbito mundial, popularizando o tema e fazendo com que os conceitos e princípios de um novo marco civilizatório, de uma nova geração, capaz de forjar novos paradigmas e padrões de desenvolvimento, ganhem, cada vez mais, força na sociedade.

            Era isso, Srª Presidenta, que eu tinha a dizer com relação à Rio+20, realizada recentemente, da qual tive oportunidade de participar, tanto do evento oficial quanto do evento paralelo, organizado pela sociedade civil global.

            Muito obrigada pela atenção.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/07/2012 - Página 30328