Pela Liderança durante a 135ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Expectativa com o julgamento, pelo STF, do “mensalão”; e outro assunto. (como Líder)

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA, ATUAÇÃO PARLAMENTAR. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Expectativa com o julgamento, pelo STF, do “mensalão”; e outro assunto. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 03/08/2012 - Página 39076
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA, ATUAÇÃO PARLAMENTAR. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, INICIO, JULGAMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), PAGAMENTO, MESADA, CONGRESSISTA, MOTIVO, POSSIBILIDADE, RESGATE, JUSTIÇA, POLITICA, PAIS, COMBATE, IMPUNIDADE, CORRUPÇÃO.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, RELATORIO, AUTORIA, ORADOR, ASSUNTO, PARTICIPAÇÃO, EX PRESIDENTE, RELAÇÃO, PAGAMENTO, MESADA, CONGRESSISTA.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Senador Suplicy.

            Primeiramente, faço um registro por solicitação do Deputado Roberto Freire, Presidente do PPS, e do Líder Rubens Bueno, na Câmara dos Deputados de um fato inusitado: a Presidência da Câmara dos Deputados censurou os discursos de ontem naquela Casa sobre o julgamento do mensalão.

            É um fato gravíssimo, inusitado, inexplicável e que merece o nosso repúdio.

            Tenho por objetivo na tribuna, Sr. Presidente, exatamente focalizar esse julgamento histórico, que teve início hoje às 14h no Supremo Tribunal Federal. Um julgamento que pode significar o início do fim dessa cultura de impunidade que lastimavelmente provoca indignação, sobretudo da parte decente deste País.

            É a expectativa que alimentamos de ver, agora, a impunidade derrotada, para que se restabeleça a crença dos brasileiros nas instituições públicas deste País.

            Eu poderia, para definir o escândalo do mensalão, apenas fazer referência a duas afirmações credenciadas, de respeitáveis figuras públicas deste País: o ex-Procurador-Geral da República, Antônio Fernando de Souza, que taxativamente o definiu como um esquema de corrupção complexo e sofisticado, idealizado por uma organização criminosa em nome de um projeto de poder de longo prazo no País; e o atual Procurador-Geral da República, que o define como “o mais atrevido e escandaloso esquema de corrupção”.

            Eu creio que essas duas afirmações seriam suficientes para esta expectativa alimentada por todos nós de um julgamento rigoroso, implacável da parte do Supremo Tribunal Federal, que se constitua em marco, definindo o fim da cultura da impunidade no País.

            As investigações conduzidas ao longo dos últimos sete anos e consubstanciadas em mais de 50 mil páginas de processo levaram os peritos oficiais a dimensionar a envergadura do mais atrevido e escandaloso esquema de corrupção, como disse Roberto Gurgel, já visto em nosso País: o mensalão. A varredura realizada pela Polícia Federal, Ministério Público, Tribunal de Contas da União e CPIs no Congresso foi exaustiva e apontou que a sofisticada organização criminosa, de inúmeros tentáculos, desviou mais de R$100 milhões em operações capitaneadas por uma quadrilha altamente articulada.

            A relação de promiscuidade que se estabeleceu entre as esferas pública e privada, numa teia de ramificações ilícitas, foi devidamente desmascarada.

            Após longo itinerário percorrido no emaranhado processual em irrestrita obediência ao princípio da ampla defesa, chegamos finalmente ao julgamento do mensalão pela Suprema Corte.

            As tentativas de vários matizes engendradas para caracterizar o escândalo como mera movimentação de recursos não contabilizados para campanhas eleitorais não resistiram às provas coletadas nas investigações.

            Como bem destacou recentemente o ex-Procurador Geral da República Antonio Fernando de Souza, o esquema não se restringia ao pagamento de “mesadas” a parlamentares da base de sustentação do governo do Presidente Lula. Seu raio de ação incluía uma rede formada para praticar diversos crimes: peculato, corrupção ativa, corrupção passiva.

            Os laudos técnicos produzidos pela Polícia Federal demonstraram, de forma cabal, que o mensalão utilizou recursos públicos para irrigar os escaninhos do esquema criminoso. As informações constantes da Ação Penal nº 470, as quais deverão nortear os Ministros do Supremo, são densas e não estão baseadas em conjecturas. Com lucidez e serenidade, o responsável pela acusação contra os 40 integrantes do mensalão, Antonio Fernando de Souza, afirmou que “muitas coisas eram provas, não apenas indícios, corroboradas depois por laudos”.

            Valho-me, mais uma vez, das expressões emanadas do ex-Procurador Geral da República para moldurar meu raciocínio. Em meio à expectativa de um futuro veredicto, devemos ter em mente que “nenhum ministro do Supremo adotará posição que não tenha respaldo nos autos”.

            Sr. Presidente, o objetivo da minha presença nesta tribuna hoje é também registrar nos Anais do Senado Federal o voto em separado que propus à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios e que acrescentava itens ao relatório oficial, aprovado pela Comissão, de autoria do Deputado Osmar Serraglio.

            Ficou clara, Sr. Presidente, a participação do Presidente da República, imiscuindo-se na imoralidade política perpetrada por seu governo, sob suas ordens e seu comando.

            “É fundamental que esses fatos sejam desnudados ao fim dos trabalhos desta Comissão”, afirmava eu em meu voto em separado, “sob pena de associar-nos a essa rede de corrupção política”.

            A CPMI recolheu farta prova testemunhal que deixa indubitável a leniência presidencial.

            Nós elencamos, nesse voto em separado sobre a ciência e a responsabilidade do Presidente Lula, depoimentos de Roberto Jefferson, em duas oportunidades, e depoimento do Deputado José Múcio, no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, afirmando ter sido testemunha do segundo encontro entre Roberto Jefferson e o Presidente Lula, em que o Deputado confirmava ao Presidente a existência do mensalão, afirmando: “Presidente, o senhor precisa ver essa questão do mensalão, porque isso pode atrapalhar o seu governo”. Foi o segundo alerta do Deputado Roberto Jefferson, esse presenciado pelo Deputado José Múcio.

            O Deputado Aldo Rebelo, também ao Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, comprovou ter testemunhado o encontro de Roberto Jefferson, fazendo referência ao Presidente Lula da existência do mensalão, no mês de março.

            Participaram do encontro o Líder José Múcio, o Ministro Mares Guia, o Líder Arlindo Chinaglia e o próprio Deputado Roberto Jefferson. Portanto, são todos testemunhas de que houve a comunicação em tempo ao Presidente da República sobre o pagamento de mesadas a parlamentares do Congresso Nacional.

            Houve depoimentos em ocasiões diferentes e uma só versão para o fato de que o Presidente foi alertado, naquela ocasião, sobre a existência do mensalão. Quaisquer dúvidas eventualmente existentes quanto ao conhecimento do Presidente sobre o fato foram espancadas.

            Assim, mesmo que se admitisse, numa estreiteza de raciocínio, destinado exclusivamente a beneficiar o Presidente na base do in dubio pro reo, que S. Exa. não conhecia os fatos anteriormente, ainda que quiséssemos crer que, naquele momento, não havia todo esse sistema de pagamentos a parlamentares e a partidos para garantir seu apoio e comprar suas consciências, ainda assim, seria indubitável afirmar que, a partir daquele momento relatado pelas testemunhas, o Presidente tomou conhecimento do assunto mensalão.

            Ressalte-se que o relatório da CPI demonstrou à exaustão a ocorrência do pagamento a parlamentares com fins políticos. Não cabe mais negar a existência do mensalão, não só devido aos depoimentos que confirmam os fatos como também às provas documentais irrefutáveis.

            Transcrevo também, nesse voto em separado, o depoimento do Deputado Aldo Rebelo, que afirmou que o Presidente pediu-lhe e ao Líder Arlindo Chinaglia que o informassem sobre essa questão levantada pelo Deputado  
Roberto Jefferson.

            O Presidente demonstrou desídia. Tamanha ausência de tenacidade dada a gravidade dos fatos, que sua atitude sequer pode ser tomada como uma providência. Ele foi inerte. Por analogia, pode-se imaginar igual ordem dada por alguém à sua secretária para toda sorte de assuntos triviais.

            Tratava-se de uma séria denúncia, trazida pelo Presidente de uma importante agremiação partidária da base de sustentação do próprio Governo, ou seja, de denúncia que atentava contra os pilares da democracia, violando, de forma indelével, toda a ordem jurídica do País e da própria essência da Constituição Federal. Enfatize-se, portanto, que não se tratava de uma denúncia corriqueira sobre o funcionamento da administração política no Brasil. Não se trata de saber se um funcionário de terceiro ou quarto escalão está cometendo algum crime contra a Administração Pública, situação que tem suas instâncias de acompanhamento e fiscalização apropriadas. Trata-se de o Presidente ter conhecimento de algo que estaria ligado à própria essência do seu Governo. Não existe governo em uma democracia que não tenha como um de seus mais importantes elementos a governabilidade junto ao Legislativo.

            O Presidente da República é informado que todo o relacionamento com sua base de apoio político está corrompida, destruindo-se a própria essência do processo eleitoral, que, a partir do voto popular, assenta-se na autonomia dos parlamentares.

            A responsabilidade maior do Presidente da República é garantir o que está previsto no art. 1o da Constituição Federal: o Estado democrático de direito. A denúncia atingia o âmago do funcionamento das instituições políticas do nosso País. No entanto, o Presidente não perguntou por mais detalhes ao Deputado Roberto Jefferson, não acionou seu Ministro da Justiça nem seu Ministro-Chefe da Casa Civil, não colocou a Polícia Federal no caso, não requisitou os serviços da Agência Brasileira de Inteligência, enfim, não tomou qualquer providência efetiva. Ou seja, não exerceu as prerrogativas do seu cargo, função delegada pelo povo, aceitando implicitamente a corrosão das instituições basilares da democracia, atentando contra o próprio Estado.

            Como um ausente do seu próprio governo, comandante de uma nau à deriva, na versão dada pelos membros da sua base aliada e do seu próprio gabinete, desconsiderou todo o ordenamento jurídico do País. Violou frontalmente o compromisso do seu juramento feito ao Congresso Nacional no dia de sua posse, in verbis: "Prometo manter, defender e cumprir a Constituição da República, observar as suas leis, promover o bem geral do Brasil, sustentar-lhe a união, a integridade e a independência".

            Esse compromisso representa a essência do pacto social que se inaugura quando um governante recebe um mandato popular. É bem mais que um evento protocolar, que uma formalidade revestida de pompa institucional. É um solene juramento de cumprir as regras do jogo, de manter nos trilhos a Nação que lhe é confiada a dirigir. E comprometer-se é uma questão séria no caminho dos progressos prometidos, sob as regras criadas pelo processo democrático. É o encargo de evitar que descalabros como os analisados neste relatório possam ocorrer. Mas o Presidente não honrou seu juramento, menosprezando a importância do seu cargo e toda a sociedade brasileira. Antes, contentou-se com a lassitude das providências tomadas por seu Ministro, que disse não haver mensalão simplesmente porque meses antes outro parlamentar houvera assumido a autoria da primeira denúncia ao Jornal do Brasil.

            Ou seja, não se investigou nada. Simplesmente buscou-se um desmentido anterior e fora de contexto para desacreditar uma denúncia explícita e formulada pessoalmente, mais de uma vez, pelo Deputado Roberto Jefferson e testemunhada por outros. A fragilidade das conclusões do Ministro era tão evidente que o mínimo que se poderia esperar do Presidente era que determinasse uma investigação formal - e oficial - sobre o caso.

            Mas o Presidente preferiu acomodar-se num mero desmentido à imprensa, repousando sua consciência num disse-me-disse relativo a uma antiga denúncia esvaziada, quando tinha uma nova denúncia concreta à sua frente. Preferiu fechar os olhos, preferiu deixar as coisas como estavam.

            Ficou comprovado o desinteresse e a ausência completa de iniciativa no sentido de buscar preservar a probidade de seu governo.

            Mas não param por aí os elementos que atestam a gravidade da postura presidencial. Já se fez referência ao fato de que, segundo o Deputado Roberto Jefferson, teriam sido duas as ocasiões em que ele alertou o Presidente Lula sobre o mensalão. Admitindo-se, no entanto, por ausência de outros testemunhos, que somente existira a segunda conversa, e que somente ali o Presidente ouvira falar sobre o mensalão, como não perguntou por mais detalhes ao Deputado Roberto Jefferson? Segundo o Deputado, ele teria feito isso na primeira conversa, mas não há outros depoimentos que confirmem a existência desse primeiro encontro. Então, só nos restam duas alternativas: a) ou ele soube da existência do mensalão no momento daquela reunião com os Deputados Roberto Jefferson, José Múcio, Arlindo Chinaglia e o então Ministro Aldo Rebelo e, nesse caso, não se interessou sequer em entender um pouco mais profundamente o que seria o mensalão e como funcionava (pois a brevidade com que se tratou do assunto é unânime entre as testemunhas); b) ou, de fato, houve um primeiro alerta ao Presidente da parte do Deputado. Agrava-se ainda mais a postura do Presidente. Ou seja, após tomar conhecimento dos fatos pela primeira vez, ele nada teria feito. Numa segunda oportunidade, deu uma preguiçosa, displicente e nada efetiva ordem ao seu auxiliar mais próximo naquele momento, mais à mão, e despreocupou-se com o assunto.

            Em qualquer dos dois casos, caracterizou-se a omissão do Presidente da República em tomar providências concretas.

            Sr. Presidente, o relatório prossegue, e eu peço que, na sua íntegra, seja transcrito nos Anais do Senado Federal, já que é impossível ler seu inteiro teor. Mas eu prossigo.

            A absolutamente lamentável e revoltante postura de irresponsabilidade do mandatário maior da Nação evidentemente compromete qualquer condição sua de permanecer no cargo. Neste momento em que se chega ao fim desta CPMI com a clara evidência de que houve o mensalão e que seu propósito serviria justamente para manipular votações no Congresso, para tanto utilizando-se de favores do Estado, com prejuízo ao Erário, a fim de favorecer pessoas e empresas que pudessem por vias transversas garantir o pagamento aos parlamentares, não há mais escapatória, não há como evitar constatar os fatos que se põem diante de nossos olhos.

            As normas vigentes no Brasil não deixam dúvidas sobre o enquadramento de tais fatos. A começar pela Constituição Federal, que prevê as hipóteses de responsabilização do Presidente da República.

            E nós transcrevemos o art. 85:

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

.......................................................................

V - a probidade na administração;

.......................................................................

            Elencamos os crimes contra a probidade na administração e acrescentamos: a ausência de respeito à dignidade e à honra e ao decoro do cargo são evidentes quando se verifica que a leniência presidencial esbarra em crime previsto no Código Penal, condescendência criminosa. No art. 320 do Código Penal se estabelece essa responsabilidade do Presidente:

Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente.

            Por todo o exposto, é forçoso concluir que Sua Excelência o Presidente cometeu crime de responsabilidade contra a probidade na administração, previsto nos incisos III e VII do art. 9o da Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950. Cometeu ainda o crime de condescendência criminosa, previsto no art. 320 do Código Penal. Por fim, incorre nos delitos tipificados na Lei de Improbidade Administrativa.

            Em virtude desses fatos, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito recomenda a imediata abertura, pela Câmara dos Deputados, de procedimento visando a apurar a ocorrência de crime de responsabilidade do Presidente da República.

            Esse foi o voto em separado que apresentamos e encaminhamos à Presidência da Câmara dos Deputados, além de o termos submetido à Comissão Parlamentar de Inquérito. Da mesma forma, nós o encaminhamos ao Procurador-Geral da República e também ao Presidente da OAB à época, Roberto Antônio Busato.

            Foram as providências que adotamos como membro daquela Comissão Parlamentar de Inquérito, porque entendíamos que a responsabilidade do Presidente da República era visível e havia sido explicitada em todos os fatos que foram investigados pela CPI.

            Acrescentamos ainda em nosso voto em separado, Sr. Presidente, a questão referente à negociação da carteira de crédito consignado, que foi transferida da Caixa Econômica Federal para o BMG. Como não constou do relatório aprovado pela Comissão Parlamentar de Inquérito, apresentei voto em separado destacando que o BMG foi beneficiado em pelo menos R$290 milhões em uma transação de R$1,094 bilhão, uma negociação espúria entre a Caixa Econômica e o BMG. E nós elencamos aqui os responsáveis por essa negociação que deveriam ser indiciados.

            Muito obrigado, Sr. Presidente. Apenas reitero a solicitação de que V. Exª autorize o registro nos Anais da Casa, na íntegra, deste voto em separado que apresentamos à época à Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou o crime do mensalão.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ALVARO DIAS

EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

Matéria referida:

- Voto em separado CPMI “Dos Correios”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/08/2012 - Página 39076