Discurso durante a 137ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

– Importância da Lei Maria da Penha como marco no ordenamento jurídico brasileiro de proteção às minorias e como conquista na luta contra a violência à mulher.

Autor
Cyro Miranda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Cyro Miranda Gifford Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • – Importância da Lei Maria da Penha como marco no ordenamento jurídico brasileiro de proteção às minorias e como conquista na luta contra a violência à mulher.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2012 - Página 39828
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • IMPORTANCIA, IMPLANTAÇÃO, LEGISLAÇÃO FEDERAL, PROTEÇÃO, MULHER, VITIMA, VIOLENCIA, OBJETIVO, BUSCA, IGUALDADE, AMBITO, SOCIEDADE.

            O SR. CYRO MIRANDA (Bloco/PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senhora Presidente Ana Amélia, Sras. e Srs. Senadores, TV Senado, Agência Senado, Rádio Senado, feliz a nação que pode revisitar a história para consolidar as conquistas e rever paradigmas, porque outro não é o sentido da história: aprender com o passado para traçar os rumos do futuro.

            A Lei Maria da Penha é um marco na historiografia brasileira. Representa no ordenamento jurídico e na sociedade uma virada, uma guinada sem precedentes na forma de ver, tratar e respeitar a mulher na sua condição e plenitude de direitos.

            Sem a Lei Maria da Penha e outros mecanismos de proteção às minorias, não haveria lugar para pensarmos num Brasil moderno e contemporâneo.

            Não se pode medir o progresso e o amadurecimento de uma Nação, Sras. e Srs. Senadores, apenas pela força da economia.

            O progresso de uma Nação constrói-se, também, pela capacidade de estabelecer a ordem necessária à proteção de todos sob o manto do Estado. Essa proteção deve se dar, em especial, àqueles que, de algum modo, possam sofrer abusos e violência pela preponderância da força em qualquer circunstância, no lar, no trabalho e nas ruas.

            A Lei Maria da Penha é o resultado nítido e inequívoco de uma mudança de paradigma na sociedade brasileira.

            Lamentavelmente, foi preciso ver a vida de inúmeras mulheres ceifadas ou mutiladas para, de fato, se erguer uma barreira contra a violência que ainda vitima milhares de cidadãs no Brasil e no Mundo.

            Exatamente por isso, Srª Presidente, esse marco jurídico precisa ser fortalecido a cada dia, para evitar qualquer possibilidade, por ínfima que seja, de leniência diante do mal que ainda marca o cotidiano brasileiro.

            É preciso lembrar que, no Brasil, a mulher casada foi considerada relativamente incapaz até 1962 e não podia sequer exercer profissão sem autorização do marido, conforme o antigo Código Civil

            Apenas com o Estatuto da Mulher Casada, de 1962, a mulher passou a ter plena capacidade civil, mas o marido continuou sendo considerado o chefe da sociedade conjugal.

            É a Constituição de 1988 que, afinal, estabelece a igualdade entre homens e mulheres perante a lei brasileira.

            Essa concepção está consolidada, também, com o Novo Código Civil.

            É forçoso lembrar, nesta semana em que comemoramos seis anos da promulgação da Lei Maria da Penha, que não se esgota a luta pela mudança da mentalidade da legítima defesa da honra, alegada em inúmeros julgamentos de réus que assassinaram mulheres e companheiras no passado.

            Não termina a luta contra um desejo inconfesso que alimenta a visão machista, egocêntrica e distorcida, capaz de transformar a vítima em ré e o réu em vítima.

            O mais emblemático desses episódios, sem dúvida, foi o crime cometido por Doca Street, em 1976, que matou com quatro tiros - por motivos passionais - Ângela Diniz.

            Os quatro tiros que, àquela época, ecoaram na praia de Búzios, teriam sido motivados para defender a honra do réu.

            Há pouco mais de trinta anos, num primeiro julgamento, o tribunal absolveu Doca Street e condenou a vítima sob torpes alegações, entre estas, a que Ângela Diniz passaria "mais tempo na horizontal do que na vertical".

            E o pior de tudo é que o réu deixou o tribunal sob aplausos.

            Mas a força das mulheres e a mobilização social ganharam as ruas, já naquela época, com o slogan "Quem Ama não Mata", e Doca Street foi condenado, em novo julgamento, a 15 anos de prisão.

            Da mesma forma, o processo que culminou na elaboração da Lei Maria da Penha é laborioso e demonstra igualmente como é necessário fortalecer esse marco jurídico não só no seio da sociedade brasileira, mas também nas cortes de justiça, para que se puna de forma exemplar a violência contra a mulher.

            Vejam que somente em 1983 houve a criação do primeiro Conselho da Condição Feminina no Estado de São Paulo e, em seguida, em Minas Gerais.

            Apenas em 1985, foi criado o Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres e a primeira Delegacia Especial de Atendimento à Mulher, em São Paulo.

            No ano seguinte, foi criada a do Rio de Janeiro e, em 1987, criou-se o Conselho Estadual dos Direitos da Mulher também naquele Estado.

            Vale a pena lembrar, Sras. e Srs. Senadores, que o Brasil é signatário de inúmeros dispositivos legais e protocolos internacionais cujo objetivo é a proteção da mulher.

            São ratificados pelo Estado brasileiro a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, o Plano de Ação da Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, ambos de 1995.

            Todavia, Srª Presidente, a Lei Maria da Penha tornou-se realidade apenas depois que organizações de defesa dos direitos humanos apresentaram a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da OEA, denúncia relativa à impunidade do crime cometido contra a farmacêutica cearense Maria da Penha Fernandes.

            A Lei Maria da Penha só veio a ser aprovada depois que a Comissão da OEA aceitou a denúncia e reconheceu a omissão do Estado brasileiro.

            Como resultado, determinou-se expressamente, além do julgamento do agressor, a elaboração de lei especifica relativa à violência contra a mulher.

            A Lei Maria da Penha representa, portanto, uma conquista, mas, ao mesmo tempo, um desafio. Conquista porque a violência contra a mulher está tipificada como crime e tem punições previstas em lei. Desafio porque requer a mudança de valores fundados numa cultura cujas raízes se aprofundaram ao longo de séculos de história.

            A violência contra a mulher é outra das mazelas de nossa sociedade, como o trabalho infantil, a exploração sexual de crianças e adolescentes e o preconceito sob todas as formas. Lamentavelmente, é vista com certa permissividade por inúmeras pessoas. Por isso, é preciso punir os infratores de forma exemplar. É fundamental estimular a denúncia e treinar pessoal especializado para assistir a mulher e garantir abrigo e proteção.

            Mas, decerto, uma das frentes mais importantes no combate à violência contra a mulher está na educação infantil, porque é no nascer dos valores que se consolidam novos paradigmas. É na infância que ensinamos o respeito ao próximo e, sobretudo, a igualdade de gênero.

            Ao encerrar este discurso, gostaria de reafirmar a minha solidariedade e empenho nesta luta e a importância de renovarmos de forma permanente a força desta bandeira representada pela Lei Maria da Penha.

            Também agradeço a relatoria da minha colega Senadora Lucia Vânia, que, há seis anos, o fez com muito prestígio.

            Muito obrigado, senhoras e senhores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/08/2012 - Página 39828