Pela Liderança durante a 145ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica às altas tarifas do transporte aéreo brasileiro. (como Líder)

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Crítica às altas tarifas do transporte aéreo brasileiro. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 10/08/2012 - Página 40664
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, SITUAÇÃO, CUSTO, TARIFA AEREA, ATUAÇÃO, POLITICA NACIONAL, AVIAÇÃO, RESULTADO, FLEXIBILIDADE, ESTADO, MONOPOLIO, TARIFAS, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, REGISTRO, NECESSIDADE, MELHORIA, FISCALIZAÇÃO, AGENCIA NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL (ANAC), COMENTARIO, IMPORTANCIA, TRANSPORTE AEREO, ACESSO, ESTADO DO AMAPA (AP), AUSENCIA, VOO, REGIÃO NORTE, PEDIDO, ORADOR, AMPLIAÇÃO, QUANTIDADE, ROTAS AEREAS, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, ESTADOS, GESTÃO, RECURSOS, OBJETIVO, MELHORAMENTO, INTEGRAÇÃO, PAIS, REFERENCIA, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, SECRETARIO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, AVIAÇÃO CIVIL, DISCUSSÃO, ASSUNTO.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sra. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, antes de iniciar o meu pronunciamento, também queria cumprimentar o Presidente Sarney pela importante lembrança que trouxe à tribuna do Senado sobre o jornalista Octavio Frias, fundador da Folha de S.Paulo. Presidente, associo-me à memória de Octavio Frias, à lembrança que V. Exa. traz à tribuna do Senado Federal.

            Sra. Presidente, uso a tribuna para tratar novamente de um assunto que aqui já abordei, reclamando das altas tarifas de transporte aéreo. Inicialmente, imaginava que era um problema que atingia somente o meu Estado, o Amapá, mas, pelo visto e pela forma como tenho abordado o tema, vejo que a dimensão desse problema atinge todo o País, em especial a Amazônia.

            Portanto, além de aqui insistir na reclamação de que o sistema aéreo nacional encontra-se à mercê, refém do duopólio das empresas TAM e GOL, quero aqui me reportar a um apanhado histórico de como chegamos até o regime de liberdade tarifária de que desfruta o sistema aéreo nacional atualmente. Em especial sobre a situação de acesso aéreo ao Amapá. Nesse período de julho, chegamos ao absurdo de pagar tarifas de transporte aéreo de R$2,5 mil a R$3 mil, por perna, de passagem, tarifa superior ao deslocamento aéreo para a Europa.

            É importante encontramos as razões por que chegamos ao regime de liberdade tarifária de que desfrutamos hoje, destacando as providências tomadas em relação a essa situação de altíssimas tarifas de transporte aéreo, notadamente para o Amapá.

            No Brasil, a Política Nacional de Aviação Civil, inicialmente de um sistema de regulação rígida, em vigor nos anos 70, passou para um regime de flexibilização, até a criação, recentemente, de uma agência reguladora, a Anac, que volta à fiscalização das atividades da aviação civil.

            Então, vamos remontar ao tempo. Vamos, inicialmente, nos dirigir aos anos 70 e até a meados dos 80, em que verificamos que a política regulatória para o setor aéreo se apresentava vinculada à política de desenvolvimento do Governo Federal.

            Não quero reiterar o retorno a essa política dos anos 70, mas acho que nós avançamos para um regime de flexibilidade demais, que coloca o sistema aéreo nacional muito à mercê das grandes empresas de aviação civil, deixando esse regime de liberdade tarifária, em primeira e em última análise, atingir os consumidores de transporte aéreo nacional.

            Voltemos, então, aos anos 70. Nos anos 70, a política do Governo Federal estruturava e incentivava o setor aéreo, regulado pelo chamado Código Brasileiro do Ar, o Decreto-Lei nº 32, de 1966.

            A essa política regulatória, em que tanto o preço como a frequência dos voos eram regulados pelo Estado brasileiro, é atribuído, na época, o fracasso do conjunto de empresas aéreas nacionais nos anos seguintes: a Varig, a Vasp, a Cruzeiro do Sul e a Transbrasil.

            Com a crise, então, dessa política adotada em especial pelos governos militares e com a inflação, nos anos 80, um conjunto de medidas estabilizadoras tornou esse sistema de controle de preços, de controle de passageiros e de controle, inclusive, da frequência de voos inviável.

            Por conta disso, a partir da década de 90 e, em especial, é bom que se diga, devido à pressão das empresas do setor aéreo, veio a ser lançado o Programa Federal de Desregulamentação, o Decreto nº 99.179, de 1990, partindo de um princípio que está na nossa Constituição, o princípio do inciso II do art. 2º, de que a atividade econômica privada será regida, basicamente, pelas leis do mercado. 

            Na primeira fase desse regime, especificamente no ano de 1992, foi implantada uma política de estímulo à chegada de novas empresas aéreas no mercado de aviação civil. Isso estimulou, de fato, a competição e resultou no fim do monopólio das companhias aéreas regionais, mas esse sistema também pôs fim à aviação aérea regional. A intervenção do Governo Federal ainda continuava existindo, mais moderadamente, através da chamada “banda tarifária”, instrumento que estabelecia preços de referência e limites mínimos e máximos de variação das tarifas de transporte aéreo.

            A segunda fase de liberalização ocorre no final dos anos 90. Foram extintas as bandas tarifárias - que, naquele momento, estabeleciam o máximo e o mínimo das tarifas do setor aéreo nacional -, e isso acarretou uma acirrada busca por clientes e uma guerra de tarifas, o que, no entender atual, inclusive da Agência Nacional de Aviação Civil, reduziu o preço médio das tarifas de transporte aéreo.

            A terceira fase dessa liberalização ocorreu há dez anos, quando foi eliminado qualquer resquício de controle do Governo Federal sobre as tarifas do setor aéreo, banda tarifária e qualquer mecanismo de controle. Nessa terceira fase, encontramo-nos diante de novos problemas no setor aéreo nacional. Esses problemas ocorrem, em especial, devido ao fracasso, mesmo com todo o sistema de liberalização, de empresas do setor aéreo nacional, como a Varig e a Vasp.

            Esta atual fase de desregulação, de liberalização do setor aéreo nacional, que vem a partir de 2005, é regida pela Lei nº 11.182, que institui a Agência Nacional de Aviação Civil. Essa Agência, a Anac, passa a deter a competência para regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e infraestrutura aeronáutica e aeroportuária, adotando-se aí o direito atual de que o regime atual de mobilidade das empresas aéreas e de plena liberdade das tarifas e dos bilhetes de transporte aéreo.

            Estamos, então, diante desse sistema. Ao contrário dos anos 70 e dos anos 80, a partir dos anos 90, houve no setor aéreo nacional um acentuado regime de liberalização. Essa liberalização chegou até determinado ponto, nos anos 90, em que ainda havia o regime da chamada “banda tarifária”, ou seja, o governo estabelecia. Pelo menos, não era um sistema e um regime tal qual nos anos 70, mas era um regime em que o Estado brasileiro estabelecia qual era o limite da menor tarifa e o da maior tarifa do sistema aéreo nacional.

            A partir de 2005, em especial com a criação da Anac, houve o fim em definitivo desse sistema. A Anac, repito, argumenta que o sistema atual de liberdade de tarifas propicia uma corrida às melhores tarifas, por parte dos passageiros, e melhores oportunidades no mercado, e, em decorrência disso, a redução da média do menor valor das tarifas.

            Bem, com todo respeito a esse estudo por parte da Anac, mas não é isso que presenciamos, principalmente na Amazônia. Na Amazônia e em Estados como o Amapá, não existe modal ferroviário, não existe modal rodoviário. A única possibilidade de acesso ao Amapá, pelo menos para o restante do Brasil - daqui a pouco teremos ligação terrestre com o platô das Guianas -, a única possibilidade de ligação do Amapá com o restante do Brasil é através do modal fluvial ou do modal aéreo. Na prática, somente o modal aéreo garante a amapaenses o deslocamento para o restante do País no tempo, na comodidade e na segurança que o deslocamento exige.

            Ocorre que, no mês de julho, os amapaenses foram, na prática, privados desse direito. Com a capital, Macapá, tendo a oferta apenas de cinco voos de um duopólio de TAM e de GOL, lá nós encontramos o melhor retrato, o retrato mais claro de que a política de total liberdade tarifária e de nenhum tipo de regulação do Estado para propiciar a integração nacional - porque é disso concretamente que se trata -, nesse aspecto, tem fracassado.

            Esse é um diagnóstico que não faço isoladamente. Trago aqui um estudo do setor de transporte aéreo do Brasil, consolidado por duas instituições do Governo: o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

            Esse estudo faz uma análise do setor de transporte aéreo no Brasil. Um de seus capítulos, sobre serviços de transporte aéreo, recomenda, em primeiro lugar, o seguinte: a manutenção do sistema de regulação doméstica, de implantar regras de liberalização tarifária, tal qual ocorreu de 2005, em especial, até agora. Mas faz uma recomendação - e é esta recomendação que quero exigir do Governo Federal, da Secretaria Nacional de Aviação Civil da Presidência da República, da Agência Nacional de Aviação Civil e de todas as autoridades brasileiras responsáveis pela aviação civil no Brasil. A recomendação desse estudo, repito, feito pelo Governo brasileiro diz o seguinte:

Tendo em vista as dimensões continentais do Brasil e o diferente grau de acessibilidade dos mais de cinco mil Municípios brasileiros, para muitos dos quais o modal aéreo se mostra como única alternativa viável, os objetivos de política pública poderiam compreender a instituição de mecanismos de viabilização de rotas de baixa densidade. Se for este o caso [continua o estudo], recomenda-se a adoção de um modelo de gestão consolidado de rotas subvencionadas em operador privado, com critérios objetivos de elegibilidade de municípios, coparticipação financeira das cidades e Estados beneficiados, restrição orçamentária e total transparência nos custos e benefícios atingidos pelo programa. Especialmente, a exemplo do que ocorre em outros países, um dos principais objetivos a ser almejado é a transformação das rotas antes dependentes de subsídios em rotas plenamente autossuficientes de modo que, passado algum tempo, o programa deixe de ser necessário.

            Ora, o que o estudo do próprio Governo brasileiro aponta é o diagnóstico do que me parece evidente. Em um país com dimensão continental como o Brasil, com 8,511 milhões de quilômetros quadrados, quarto País em dimensão continental do Planeta, uma das maiores geografias da Terra, convenhamos: não se pode deixar, única e exclusivamente, submetido a regras de mercado a liberalização tarifária, o acesso e a integração nacional. É disso que se trata. Dois terços do País, toda a Região Amazônica, depende fundamentalmente do modal aéreo para ter comunicação, para ter integração, para se reunir, para se juntar. Alguns cantos do País - e repito: em especial o Amapá -, para se integrarem nacionalmente, dependem fundamentalmente do modal aéreo, e não podemos colocá-los à mercê do mercado, das regras do mercado, que tem praticado monopólios e oligopólios privados. Ora, é disto que se trata: cria-se uma companhia nacional nova, vem outra que está crescendo e a adquire. É assim que ocorre. A Azul adquiriu recentemente a Trip; a Gol adquiriu recentemente a WebJet.

            Ou seja, essa flexibilização do mercado, em nome de tirar o Estado, para que não intervenha, de deixar o mercado regular-se por si próprio, de deixar ao mercado o excesso das leis de oferta e procura, do famoso princípio dos economistas clássicos - do deixai fazer e do deixai passar -, de deixá-lo à mercê desse princípio, isso significa um prejuízo concreto para a integração nacional; significa um prejuízo concreto de isolamento de regiões do País.

            Creio que é necessária essa política de liberdade total para o mercado. Essa política de não se submeter ao monopólio do Estado tem sido invertida, para se submeter ao monopólio privado. O que ocorre exatamente hoje, no Brasil, em relação à política da aviação civil, é uma submissão dos interesses do Estado; é uma submissão do sistema aéreo nacional aos interesses privados.

            Por conta disso, é fundamental e urgente o encaminhamento da recomendação presente nesse estudo do próprio Governo brasileiro para os próximos dez anos, que se refere aos serviços de transporte aéreo no Brasil. É fundamental a regionalização, o apoio, o diálogo com governos e com Municípios, inclusive para incentivar a constituição de empresas aéreas regionais. E é fundamental que essas empresas aéreas regionais depois não fiquem à mercê de serem adquiridas pelas grandes empresas aéreas do monopólio privado nacional do setor.

            Sr. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, eu queria aqui, primeiramente, registrar e agradecer a atuação do Ministério Público Federal, Secção Amapá, que, a partir de representação movida por nós, tem atuado, em conjunto conosco, nessa luta para abrir o mercado de aviação civil no Amapá para outras empresas.

            Nesta semana, estivemos em audiência; na semana passada, movemos representação ao Conselho Administrativo de Direito Econômico, à Agência Nacional de Aviação Civil contra o que considero um duopólio praticado pelas duas grandes empresas do sistema aéreo nacional.

            Nesta semana, estive em audiência com o Secretário Nacional de Aviação Civil da Presidência da República e tive inclusive lá a boa notícia do interesse de estruturação de uma empresa regional, com sede em Manaus, para ampliar a oferta de voos para Macapá e para outras cidades da Região Amazônica.

            Nós aprovamos, na Comissão de Meio Ambiente e Defesa do Consumidor daqui, do Senado, um requerimento, de autoria minha e do Senador João Capiberibe e também subscrito pelo Senador Jorge Viana, para fazermos - e espero que a façamos ainda no final deste mês - uma audiência pública nessa Comissão, envolvendo a Anac, Tam, Gol e, em especial, a Secretaria Nacional de Aviação Civil.

            Repito: essas providências são necessárias e espero - e eu quero acreditar - que, no próximo ano, nas próximas férias de julho, no próximo período de férias de janeiro, no período de maior pressão, quando é necessário que amapaenses se desloquem de Macapá para outras cidades do Brasil, não voltemos a viver os dias de drama e de altas tarifas de transporte aéreo que têm sido praticadas no Amapá. É um absurdo por uma passagem, por exemplo, de Macapá-Belém - já concluo, Presidente -, uma passagem de meia hora de voo, ser cobrada uma tarifa de R$1 mil, R$1,2 mil, em nome da chamada oferta e procura.

            Esse é um retrato concreto - e falo isto para concluir, Sr. Presidente - do que significa a política de retirar o Estado de tudo, do que significa o padrão de deixar tudo à mercê do mercado. Aqueles que condenam o Estado, o monopólio estatal, o Estado de praticar monopólio, na verdade, defendem os interesses para que o monopólio mude de mão; para que o monopólio deixe de ser praticado pelo Estado, em função e em favor do interesse público, para que passe a ser aplicado e empregado pelos conglomerados privados. Esse monopólio interessa só para lucro de meia dúzia. O setor nacional de aviação civil, o setor aéreo nacional não pode ser refém de qualquer tipo de monopólio; ao mesmo tempo em que não é mais adequada a política de intervenção dos anos 70, mas também não é adequada a política atual de liberalização total de tarifas de transporte aéreo sem nenhum tipo de acompanhamento ou fiscalização estatal.

            Eu espero que as providências sejam tomadas no sentido de debatermos esse marco regulatório, e que o estudo do próprio Governo seja aplicado no sentido de criarmos empresas regionais de transporte aéreo, possibilitando, de fato, concorrência e o fim desse monopólio de duas ou três empresas no sistema aéreo nacional, no sistema de aviação civil do Brasil.

            Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/08/2012 - Página 40664