Pronunciamento de Lídice da Mata em 13/09/2012
Pela Liderança durante a 176ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Expectativa quanto ao trabalho da Comissão Especial para reforma do Código Penal. (como Líder)
- Autor
- Lídice da Mata (PSB - Partido Socialista Brasileiro/BA)
- Nome completo: Lídice da Mata e Souza
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Pela Liderança
- Resumo por assunto
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CODIGO PENAL.:
- Expectativa quanto ao trabalho da Comissão Especial para reforma do Código Penal. (como Líder)
- Publicação
- Publicação no DSF de 14/09/2012 - Página 47878
- Assunto
- Outros > CODIGO PENAL.
- Indexação
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- COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, COMISSÃO ESPECIAL, OBJETIVO, DISCUSSÃO, REFORMULAÇÃO, CODIGO PENAL, REGISTRO, ESFORÇO, SENADOR, RELAÇÃO, TENTATIVA, CORREÇÃO, PROBLEMA, ATUALIDADE, LEGISLAÇÃO PENAL.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco/PSB - BA. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inscrevi-me para usar a tribuna hoje para destacar o importante trabalho que estamos iniciando na comissão especial do Código Penal. O Parlamento brasileiro devia à sociedade brasileira e à Constituinte de 88 essa reformulação do Código Penal.
O Código Penal originou-se no Decreto-Lei nº 2.848, de 1940, nascido no contexto do Estado Novo, de um Brasil ainda rural, que intentava os seus primeiros passos nos rumos de uma intensa industrialização e acelerada urbanização que caracterizaria as décadas seguintes.
Como não poderia deixar de ser fruto de sua época, o Código Penal atual está eivado de uma concepção liberal individualista, de uma sociedade ainda profundamente conservadora, que cultuava a proteção ao patrimônio individual, em detrimento do próprio direito à vida, dos direitos difusos e coletivos.
Constituinte que fui, pude participar da elaboração da Carta que o inesquecível Presidente Ulysses Guimarães alcunhou de Constituinte Cidadã, carta esta que logrou atualizar nosso arcabouço jurídico-constitucional aos novos tempos de uma sociedade moderna e democrática, inserida na velocidade das transformações de um mundo globalizado.
A nova Carta consagra a hegemonia de uma nova concepção, fundada nos direitos sociais, valorizando a vida e a dignidade humana, e conflitava com o velho Código conservador, fazendo com que, a cada dia, esse conflito incontornável resultasse em diversas leis dispersas e setorizadas, visando atender demandas urgentes e pontuais, resultando em prejuízo para a coerência da sistematização de nossos tipos penais e da proporcionalidade das penas.
A insegurança jurídica decorrente dessa situação gerou um sentimento difuso em nossa sociedade, de que as penas são insuficientes, e nosso sistema penal é incapaz de deter a crescente onda de violência que aflige, com especial intensidade, nossas grandes cidades. Esse sentimento de impunidade, Sr. Presidente - V. Exª, como Vice-Presidente da nossa Comissão, é testemunha, e, no seu governo, fez e tem dado contribuição para fazer com que o Acre possa decrescer nos seus índices de criminalidade -, faz, no entanto, com que haja uma expectativa - e talvez isso se reflita também no trabalho de algumas partes desse anteprojeto do Código Penal - de que, aumentando as penas dos crimes, nós estaríamos resolvendo o problema da impunidade no Brasil.
Creio que são dois problemas diferentes que nós teremos que enfrentar nesse novo Código Penal. Teremos, ainda, que ajustar o Código a uma realidade do sistema carcerário brasileiro. E eu, como única mulher dessa Comissão, como única mulher titular nessa Comissão, tenho o dever de ter e de garantir, a esse anteprojeto e a essa discussão da reforma do Código Penal, um olhar mais feminino, um olhar também voltado para a minha militância nos direitos humanos.
Estarei, portanto, nessa Comissão do Código Penal, atenta, para que nós possamos corrigir as distorções que o anteprojeto já demonstra, por exemplo, em contradição com a Lei Maria da Penha e em relação ao Estatuto da Criança e do Adolescente, fazendo com que essas duas leis possam estar integralmente no escopo desse anteprojeto. Além disso, Sr. Presidente, estarei atenta para que a rica discussão que a sociedade brasileira vive hoje a respeito do enfrentamento das drogas no Brasil se faça refletir numa posição mais liberalizante, colocando o usuário de droga sob a guarda da política de saúde pública deste País. Estarei presente também para discutir uma forma de compreensão que faça com que, antes da condenação, possamos investigar a causa daquele crime e as causas sociais que fazem com que aquele crime ocorra.
Sr. Presidente, quero dizer da minha alegria de estar nessa Comissão. Certamente, poderei utilizar a tribuna em outros momentos para discutir temas específicos desse rico debate que estamos iniciando, mas quero dar o meu testemunho de posicionamento, ou seja, de que lado eu estarei no aprofundamento desse debate. Estarei, certamente, como defensora das garantias dos direitos coletivos, dos direitos difusos, mas também na garantia total dos direitos humanos para os condenados, para os presos e para a garantia daqueles que estão levados a cometer crimes por falta de um Estado que lhes ofereça oportunidades de uma vida digna.
Portanto, quero agradecer o tempo que V. Exª me deu para ressaltar esses aspectos do Código Penal e dizer que sou a única mulher titular dessa Comissão, que conta com duas mulheres suplentes: a nossa companheira Ana Rita, companheira de luta no enfrentamento da violência contra a mulher, e a companheira Marta Suplicy, que sai agora. Aliás, mais uma vez, nessas mudanças, estamos perdendo a presença feminina no Senado Federal que, de onze passou a ter cinco Senadoras, infelizmente, mas vamos lutar para que mais mulheres possam aqui chegar. Muito obrigada, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco/PT - AC) - Senadora Lídice, quero cumprimentar V. Exª e dizer que a sua presença na Comissão de que tenho a honra de fazer parte, a do Código Penal, e de que sou vice-presidente, tendo como presidente o Senador Eunício e como relator o Senador Pedro Taques, significa, de fato, a pluralidade que buscamos sempre ter nos temas importantes aqui no Senado por conta do compromisso que V. Exª tem com os direitos humanos, com a busca de uma solução para essa situação gravíssima, que é a violência no nosso País, que vem crescendo no Norte e no Nordeste do País. Certamente, o Código, que é de 1940, precisa de um reparo, de uma atualização equilibrada.
Uma questão que se coloca é: “Olha, tem que ser feito tudo muito rápido.” É óbvio que vamos fazer no tempo necessário. O trabalho que foi feito na Comissão Especial não pode ser desprezado, foi um trabalho importante, mas nós temos que usar o tempo necessário para tratar de um tema tão delicado.
Então, cumprimento V. Exª e só lhe passo a informação: ontem, por indicação do Líder Walter Pinheiro, nós decidimos, na bancada, que, com a saída da Senadora Marta para assumir o Ministério, que é daqui a pouco - faço questão de estar lá, daqui a pouco, na posse...
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco/PSB - BA) - Também estarei.
O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco/PT - AC) - ...a Senadora Ana Rita passa a ser titular, para que nós não diminuamos a representação feminina numa comissão tão importante, ainda mais a Senadora Ana Rita, que tem um compromisso também e, certamente, vai dar uma grande contribuição.
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco/PSB - BA) - É uma bela notícia, Sr. Presidente, fico muito feliz. E quero, nesta oportunidade, aproveitar para pedir a V. Exª que dê autorização para que o nosso pronunciamento seja publicado na sua íntegra.
Muito obrigada.
SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DA SRª SENADORA LÍDICE DA MATA
A SRª LÍDICE DA MATA (Bloco/PSB - BA. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srªs e Srs. que nos acompanham pelos órgãos de divulgação da Casa.
Gostaria de parabenizar ao Senador Casildo Maldaner que soube conduzir muito bem uma profícua reunião de nossa Comissão de Assuntos Sociais nessa manhã, quando foram apreciados importantes projetos de lei, dentre eles o Projeto de Lei do Senado nº 621, de 2011, em caráter terminativo, que altera a Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, que regula o Programa do Seguro-Desemprego, o abono salarial e institui o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), para assegurar, às pessoas com deficiência, a reserva de vagas em programas de qualificação profissional.
Quero agradecer ao relator Senador Eduardo Suplicy que assegurou essa aprovação com o seu sempre competente relatório e a todos os meus pares que garantiram a aprovação unânime dessa iniciativa de grande relevância para a inclusão de brasileiros e brasileiras com deficiência ao mercado de trabalho.
Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, o parlamento nacional enfrenta agora uma das suas grandes dívidas para com a Constituinte Cidadã de 1988, débito este para com a própria sociedade civil brasileira.
Finalmente realizaremos uma ampla revisão de nosso Código Penal, originário do Decreto-lei nº 2.848 de 1940, nascido no contexto do Estado Novo, de um Brasil ainda rural, que intentava os seus primeiros passos nos rumos da intensa industrialização e acelerada urbanização, que caracterizaria as décadas seguintes.
Como não poderia deixar de ser, fruto de sua época, o Código Penal atual está eivado de uma concepção liberal-individualista, de uma sociedade ainda profundamente conservadora, que cultuava a proteção ao patrimônio individual, em detrimento do próprio direito à vida e dos direitos difusos e coletivos.
Constituinte que fui, pude participar da elaboração da carta que o inesquecível presidente Ulisses Guimarães alcunhou de Constituinte Cidadã, carta essa que logrou atualizar nosso arcabouço jurídico-contitucional aos novos tempos de uma sociedade moderna e democrática, inserida na velocidade das transformações de um mundo globalizado.
A nova carta consagra a hegemonia de uma nova concepção fundada nos direitos sociais, valorizando a vida e a dignidade humana, e conflitava com o velho código conservador, fazendo com que a cada dia, esse conflito incontornável, resultasse em diversas leis dispersas e setorizadas, visando a atender demandas urgentes e pontuais, resultando em prejuízo para a coerência da sistematização de nossos tipos penais e da proporcionalidade das penas.
A insegurança jurídica decorrente dessa situação gerou um sentimento difuso em nossa sociedade de que as penas são insuficientes e nosso sistema penal seja incapaz de deter a crescente onda de violência que aflige com especial intensidade nossas grandes cidades.
Para enfrentar esse inadiável desafio, por determinação de nosso Presidente José Sarney foi instalada em 18 de outubro de 2011, a partir de requerimento do Senador Pedro Taques (PDT/MT), uma Comissão de Juristas para a elaboração de Anteprojeto de Código Penal,
A referida Comissão de Modernização do Código Penal Brasileiro foi presidida pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp, e teve como principais objetivos a unificação da legislação penal esparsa; a compatibilização dos tipos penais hoje existentes com a Constituição Cidadã de 1988, descriminalizando condutas e, se necessário, prevendo novas figuras típicas; além de tornar proporcionais as penas dos diversos crimes, a partir de sua gravidade relativa; sempre buscando formas alternativas, não prisionais, de sanção penal.
A Comissão desemcumbiu-se de sua tarefa em sete meses. foram realizadas vinte e quatro reuniões nas dependências do Senado Federal, o seu relatório final foi encaminhado em maio de 2012. agora como PLS 236/2012 iniciou sua tramitação em julho do corrente, tendo sido constituída comissão temporária especialmente para sua análise.
A comissão temporária tem prazos exíguos. Até 05 de outubro de 2012 para receber emendas, 20 de novembro para apresentação do relatório do relator geral e 04 de dezembro para aprovação do parecer final da comissão.
Partilho do sentimento de urgência no tratamento dessa questão. mas desconfio de que o prazo seja extremamente exíguo para o devido exame de um código com tamanha complexidade, em ano eleitoral e sem que instituições jurídicas como a OAB e o IAB, assim como a sociedade civil organizada, possam ter asseguradas a sua audiência e participação nos debates dos trabalhos da comissão.
Não sou jurista, nem mesmo advogada, mas como a única Senadora titular da Comissão, resta-me uma responsabilidade redobrada, que é a de assegurar o olhar feminino sobre toda essa problemática ampla e complexa que nos atinge de forma múltipla seja como cidadãs, como esposas e como mães.
Tenho iniciado contatos com entidades da sociedade civil na área de direitos humanos, terapia e controle de drogas, entidades defensoras dos direitos dos afro-descendentes, mulheres, crianças e adolescentes, homosexuais e de dos demais segmentos sociais, visando recolher as primeiras impressões de nossa sociedade sobre esse grande esforço que será dotar o Brasil de um Código Penal a altura de suas contemporâneas necessidades.