Discurso durante a 181ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

– Preocupação com a opinião pública em virtude da celeridade do Senado no agendamento da reunião destinada a sabatinar o Ministro Teori Zavascky; e outro assunto.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • – Preocupação com a opinião pública em virtude da celeridade do Senado no agendamento da reunião destinada a sabatinar o Ministro Teori Zavascky; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 25/09/2012 - Página 50173
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • CRITICA, SUSPEIÇÃO, GOVERNO, AGILIZAÇÃO, INDICAÇÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DEFESA, PROPOSTA, ALTERAÇÃO, PROCESSO, NOMEAÇÃO, AUTORIDADE PUBLICA, JUDICIARIO, OBJETIVO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, COORDENAÇÃO, PODERES CONSTITUCIONAIS.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, o Senador Alvaro Dias trouxe aqui um assunto que considero da maior importância, porque não diz respeito apenas a este momento, é algo que diz respeito a um processo longo das relações entre os diversos níveis da administração republicana. Esse é um assunto que diz respeito ao equilíbrio entre as instituições, o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário. A escolha de um ministro do Supremo é algo quase sagrado, pela importância que isso tem. E vou explicar uma das razões para tal: quando a gente escolhe um deputado, um senador, um presidente, a gente espera mais quatro anos e os tira, Senador Alvaro Dias, mas a gente, quando nomeia um ministro do Supremo, tem de esperar que ele cumpra 70 anos de idade. É um cargo vitalício, que pode durar 35 anos, se ele for nomeado aos 35 anos - menos que isso não pode -, até ele chegar aos 70 anos - mais do que isso não pode.

            A suspeição sobre um parlamentar é algo muito grave para as instituições, mas a suspeição sobre um ministro do Supremo é trágico, é trágico! Nós temos de eliminar qualquer risco de suspeição na hora de escolher um ministro do Supremo. Ele tem de chegar ali ungido, como símbolo de respeito de todos nós, e a pressa ameaça essa sacralidade quando ele coloca suas roupas e decide interpretando a lei.

            Em alguns países, Senador Alvaro, o processo de escolha é parecido. Nos Estados Unidos mesmo, em que há uma tradição de 220 anos de República, é o Presidente quem indica. Mas, em primeiro lugar, cabe lembrar que a sabatina feita pelo Senado reveste-se de uma profundidade que nada tem a ver com a maneira rápida demais - para não usar um termo mais forte - que caracteriza as sabatinas no Senado. Já houve casos nos Estados Unidos de sete meses de sabatina, em que se levanta tudo da vida do candidato, em que se descobre o que ele pensa, quais são as posições dele, para escolher alguém que esteja acima das brigas. Mesmo assim, com 220 anos de tradição, com uma seriedade imensa, não faz muito. Ficou sob suspeição o voto do ministro no que se refere à decisão de recontar ou não os votos recebidos pelo então candidato Bush. Pediu-se a recontagem dos votos em algumas áreas da Flórida. Ele entrou na Corte Suprema para impedir isso, e um ministro deu ganho para ele. Esse ministro foi nomeado pelo pai dele, quando então Presidente George Bush. Esse simples fato permitiu criar uma suspeição sobre uma das figuras mais ilustres da Suprema Corte dos Estados Unidos, pelo fato de ter sido nomeado pelo Presidente que é o pai daquele interessado em não haver recontagem de votos.

            Temos de parar com essa suspeição. E aí há duas coisas: uma é esse caso específico, Senador Alvaro Dias; a outra é o processo de escolha. No que se refere a esse caso específico, creio que, se pesar suspeição, vai ser ainda pior, porque será sobre um dos brasileiros mais respeitados e respeitáveis, que é o Dr. Teori Zavascki. Por tudo que procurei saber, a ideia que passa é a de um jurista da maior seriedade e competência. Tudo o que passa é que dificilmente se poderia escolher um nome melhor, mas a pressa está chamuscando a credibilidade que ele tem. Por que essa pressa, em um momento em que o Supremo julga uma das mais importantes de todas as ações, o Processo nº 470, o do mensalão, que já passou pelas mãos dos juízes ao longo de toda a nossa história? Por que essa pressa? Esse porquê levanta suspeitas. A gente não pode deixar que isso aconteça não apenas por esse caso, mas pelo que ele representa nas relações institucionais da credibilidade da mais alta Corte da República.

            Eu até acho que a Presidenta fez um gesto correto: escolheu um nome da maior credibilidade, seriedade e competência e o mandou para cá, antes que sofresse pressões políticas. É muito possível isso, até porque já se sabia que o ministro que ele sucederia sairia. Já se sabia o dia em que ele seria substituído, por completar 70 anos de idade. A Presidenta podia já estar preparada há meses para fazer essa substituição. Mas, quando aqui chega o Processo, quando, nas carreiras, se faz uma convocação, durante um processo eleitoral municipal que fez com que, nos últimos dois meses, o Senado estivesse voltado - cada um de nós - para as eleições municipais, levanta-se - é triste dizer - uma suspeição.

            A gente não pode fazer isso não por razões partidárias, não por ser a favor ou contra o Governo, não por querer condenar ou não condenar os réus, mas, sim, pelo simples fato de que uma instituição como a Corte Suprema - cada um daqueles 11 Ministros - tem de estar acima de todas as querelas. E o Dr. Teori chega como se fosse parte da querela. Pelo que sei daqueles que o conhecem, ele deve estar muito incomodado. Se o nome dele viesse em um momento em que não houvesse julgamento desse calibre, quando o processo de sabatina fosse normal, tranquilo, calmo, ele seria ungido como o grande nome do Tribunal, mas, da maneira como está sendo feita, Senador, nós e o Brasil inteiro - não é uma questão de Senadores - temos razão de ficar em dúvida: “O que é que está por trás da pressa?” O interessante é que não se pergunta o que está por trás do nome. Não é um nome que já foi filiado a partido, como já aconteceu; não é uma pessoa que já teve cargos ligados ao governo do partido A, B ou C. É um nome acima de suspeição, mas num processo cheio de suspeições.

            Por isso, comparto que o Senado precisa tomar cuidado. Com a seriedade que nós temos, com a obrigação que nós temos de zelar pelas instituições, não podemos apressar o processo de sabatina do novo ministro do Supremo. Precisamos ter todo o cuidado não para escolher o melhor apenas, porque pode ser que seja certamente o Dr. Teori Zavascki, mas para que, além de ser o melhor, ele passe a ideia de que, graças ao nosso trabalho, ele é o melhor, sem qualquer sombra de dúvidas e de suspeições sobre a razão, o propósito de seu nome ter aparecido, ter sido lembrado, ter sido indicado, salvo pela sua competência, salvo pela sua seriedade, não porque houvesse outros interesses de manipular o seu trabalho na Corte.

            Estou de acordo que o Senado tem obrigação de ser muito cuidadoso, não, repito, para saber se ele é ou não competente, porque tudo indica que não seria difícil determinar sua competência, sua seriedade, mas para que não pese suspeição de que a única razão da sua escolha foi a sua credibilidade.

            Senador, dito isso relacionado a esse episódio, quero lembrar aqui que dei entrada em uma proposta de reforma à Constituição, com a assinatura do número mínimo de Senadores, sugerindo mudar o critério de escolha dos membros do Supremo. Precisamos de um critério em que não pese suspeição, mas nunca, sobre nenhum deles. A atual Corte Suprema, quase toda, foi nomeada pelo Presidente Lula, mas está se comportando de maneira tranquila, a meu ver, isenta, sem nenhuma pressão, nenhuma gratidão, nenhum beija-mão daquele que indicou.

Mesmo assim há suspeições, mesmo assim, de vez em quando se levanta “foi nomeado por tal presidente”, “foi indicado por tal outro presidente”, e o Senado fez de conta que sabatinava.

            A minha proposta, Senador Alvaro - e gostaria de ter o seu apoio -, é que o critério de escolha seja diferente, que envolva os três Poderes, mas de uma maneira tal que nenhum dos Poderes vai poder dizer que foi ele quem escolheu. Primeiro, ele não se originaria no Poder Executivo. A minha proposta é que o Conselho Superior do Ministério Público, o Conselho Nacional de Justiça, a OAB e o Plenário da Câmara indiquem seis nomes: dois indicados pelo Conselho Superior do Ministério Público, dois indicados pelo Conselho Nacional de Justiça, um pela OAB e um pela Câmara dos Deputados.

            Esses seis nomes iriam para o Presidente da República. Então, não foi o Presidente que escolheu nenhum dos seis. O Presidente da República, depois das análises que achasse necessárias e convenientes, escolheria três nomes, não apenas um. Esses três nomes escolhidos pela Presidência da República entre os seis escolhidos pela comunidade jurídica e a Câmara dos Deputados, esses três nomes seriam indicados ao Senado. E o Senado faria não uma sabatina, mas três sabatinas. E aí a sabatina fica séria, porque cada Senador não vai dizer “sim” ou “não”; ele vai dizer A, B, C ou nenhum deles. Aí a sabatina fica séria. E depois das três sabatinas, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado escolheria um nome que viria para o Plenário. Esse nome já estaria decidido que seria o novo Ministro do Supremo.

            A essa proposta eu dei entrada, e lamento que não haja esta ou outra forma que elimine suspeições de que a indicação foi do Presidente da República, da Presidenta da República, do partido A, do partido B, ou do partido C.

            Eu sei que essa é uma proposta que pode ser muito modificada. Já ouvi sugestões de que, em vez do Plenário da Câmara, a OAB deveria indicar dois. Já ouvi sugestões nesse sentido. Já ouvi sugestões de que o Conselho Nacional do Ministério Público e não o Conselho Superior do Ministério Público. Há sugestões diferentes. Busquemos melhorar essa proposta, mas definamos uma maneira tal em que coloquemos a Corte Superior de Justiça do Brasil acima de todas as suspeições de interesses políticos.

            Escolhamos nomes em que, ao vê-los, não vejamos nenhuma cara de político por trás, nenhuma cara do Poder Executivo, nem cara do Legislativo, nem cara do Judiciário, mas do conjunto deles. Num processo aberto, transparente, devagar, cuidadoso e respeitoso.

            Essa proposta está na Comissão de Constituição e Justiça. Se houvesse algo assim, já algumas décadas atrás, hoje, o julgamento da AP 470, ou mensalão, estaria sendo feito sem as discussões que nós vemos, que encabulam, que envergonham a Nação brasileira, de saber quem indicou qual ministro, de saber mais próximo a quem é qual ministro. E até aquele absurdo, que já li, de dizer que um ministro não estava sendo grato pela indicação que recebeu. É uma ofensa muito grave suspeitar disso, e um elogio ao ministro que não se submeteu, por gratidão, a quem o indicou, porque ele não foi indicado por razões políticas. Se foi, foi um erro de quem o indicou. Ele foi indicado pela competência, pelo notório saber, pelas qualidades que tem e que, ao longo de toda a sua vida, até os 70 anos, vai poder exercer.

            A vitaliciedade exige um cuidado especial. Insisto: qualquer um de nós aqui pode ser escolhido erradamente pelos eleitores, mas os eleitores sabem que não vai demorar o dia de prestar contas com esse eleito e de tirar o voto que lhe foi dado. De juiz a gente não pode tirar a nomeação. Juiz é vitalício. Como eu disse, pode durar 35 anos o mandato, até porque a vitaliciedade é na vida, não é para sempre, não é perpétua, não é eterna. Mas ele pode ser nomeado aos 35 e sair aos 70. É muito tempo. Ou aos 40 e sair aos 70. É muito tempo. Ou aos 50 e sair aos 70. É muito tempo. E esse tempo todo exige muito cuidado, muita seriedade.

            Acredito que os fatos que estão acontecendo vão ajudar a que essa proposta que apresentei, já faz algum tempo, não muito, possa avançar, ser melhorada e, no final, conforme ela for aprovada, melhorar para eliminar suspeições, melhorar a maneira como nós escolhemos aqueles que representam a mais alta Corte da Justiça brasileira, aqueles que interpretam a nossa Constituição, aqueles aos quais nós devemos toda obediência, porque, decidido lá, só nos cabe cumprir.

            Aproveitei, portanto, Senador Alvaro, sua fala para tratar dos dois assuntos: o caso específico de hoje, que, a meu ver, deve ser feito com muito cuidado e muita seriedade, para que jamais se imagine, no Brasil, que se nomeou ministro em troca de alguma coisa.

            Veja bem, estou dizendo que “jamais se suspeite”, porque eu não acredito nem posso dizer que tenha havido isso, mas a pressa está colocando, como se diz por aí, uma pulga atrás da orelha. Essa pressa não é favorável à transparência, não é favorável à eliminação de suspeições; ao contrário, essa pressa insufla as suspeições sobre um nome que não merece ser tratado com suspeição. É o processo que está gerando isso.

            E a outra coisa é a proposta, a que já dei entrada, de mudarmos a maneira como nossos ministros são escolhidos, de tal forma que não se trate apenas da vontade de um presidente e do faz de conta de um Senado, mas sim um processo que envolva todas as instituições, iniciando-se lá pelo próprio Poder e as instituições relacionadas com a Justiça, passando pelo Poder Executivo, chegando ao Senado, mas não para dizer “sim” ou “não”, não para balançar a cabeça assim ou assim, mas para vocalizar por que A, por que B ou por que C.

            Essa era a fala que eu queria, Senador Alvaro Dias, deixar aqui registrada.

            O SR. PRESIDENTE (Alvaro Dias. Bloco/PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Cristovam. Meus cumprimentos a V. Exª pela oportunidade e brilhantismo do seu pronunciamento. Quero dizer que sua proposta é inteligente e certamente é o começo de um bom debate nesta Casa para que possamos chegar a um modelo de escolha compatível com a transparência e as exigências da sociedade brasileira para a composição da Suprema Corte, que vive hoje um momento histórico com o julgamento do mensalão, certamente uma marca profunda na vida das instituições públicas brasileiras e, sobretudo, o marco de um novo rumo para a atividade das instituições em nosso País.

            Muito obrigado a V. Exª. Meus cumprimentos. Certamente, é uma contribuição notável que V. Exª oferece a esse debate. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Muito obrigado, Senador.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/09/2012 - Página 50173