Discurso durante a 186ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da autonomia dos estados quanto à criação, fusão, incorporação ou desmembramento de municípios.

Autor
Tomás Correia (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Tomás Guilherme Correia
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • Defesa da autonomia dos estados quanto à criação, fusão, incorporação ou desmembramento de municípios.
Aparteantes
Ana Amélia.
Publicação
Publicação no DSF de 10/10/2012 - Página 53150
Assunto
Outros > DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR (PLP), ESTABELECIMENTO, AUTONOMIA, ESTADOS, CRIAÇÃO, INCORPORAÇÃO, FUSÃO, DESMEMBRAMENTO, MUNICIPIOS, APRESENTAÇÃO, DADOS, DIVISÃO TERRITORIAL, JUSTIFICAÇÃO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL.

            O SR. TOMÁS CORREIA (Bloco/PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Anibal Diniz, Srªs e Srs. Senadores, senhores telespectadores da TV Senado, senhores ouvintes da Rádio Senado, em 2010, em Rondônia, fizemos um plebiscito para a emancipação do Distrito de Extrema do Município de Porto Velho. Naquele plebiscito, a aprovação foi de mais de 90%.

            Nesta última eleição, agora, dia 7 de outubro, fizemos outro plebiscito, para emancipar o Distrito de Tarilândia do Município de Jaru. A aprovação também foi acima de 90%.

            E aí, Sr. Presidente, estamos diante de um impasse. O Tribunal Regional Eleitoral e a Assembleia Legislativa do meu Estado promoveram o plebiscito desses dois distritos, e a população, praticamente por unanimidade, respondeu positivamente, respondeu “sim”.

            Mas existem algumas dificuldades, o que nos leva a lamentar, porque a criação de Municípios no Brasil hoje é um tema praticamente inviável.

            Há, na Constituição Federal, regras que, lamentavelmente, dizem que os critérios para a criação de Município decorrem de lei complementar federal. E apesar das iniciativas tomadas tanto pela Câmara dos Deputados quanto pelo Senado Federal, ainda não foi aprovada essa lei complementar.

            Então, enquanto cumprimentamos aqui a iniciativa da Assembleia Legislativa de Rondônia e do Tribunal Regional Eleitoral de promoverem esse plebiscito que é importante para essas duas regiões, temos que lamentar, de outro lado, por percebermos que essa iniciativa esbarra na legislação, na própria Constituição Federal.

            Mas o interessante é que a Emenda Constitucional nº 57, de 2008, diz o seguinte:

Ficam convalidados os atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios, cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época de sua criação.

            Então, temos uma regra constitucional excepcional. Alteramos a Constituição para, num período x, convalidar os Municípios criados no Brasil.

            E aí eu pergunto: não teria sido mais fácil votar uma emenda constitucional devolvendo aos Estados a competência para deliberarem sobre a criação dos seus Municípios? Obviamente que esse teria sido o melhor caminho. Mas não. Nós criamos um casuísmo, legislamos para atender uma situação emergencial, provavelmente em face de um ou de outro Município criado no Brasil e que não poderia voltar a Distrito. Então, casuisticamente, fizemos uma emenda constitucional para convalidar aqueles Municípios criados até aquela data.

            Enquanto isso, permanece a regra do art. 18, § 4º, da Constituição, que diz que os Municípios, para serem criados, dependem de regras estabelecidas em lei complementar federal.

            Não teria sido muito mais razoável voltar aos Estados a competência para legislarem em matéria de sua responsabilidade no que diz respeito à criação dos seus Municípios? Por que nós, o Congresso Nacional, o Senado ou a Câmara dos Deputados, temos que discutir a criação de um Município lá no Estado de Rondônia? Qual a finalidade disso? Qual o objetivo? Qual a razão, a lógica para que aqui no Senado se fixe critério para criar Municípios nos Estados?

            Dessa forma, estaríamos respeitando a autonomia do Estado prevista na Constituição. Vivemos uma federação de faz de conta. A Federação é composta pelos Estados e Municípios, com autonomia, mas é uma autonomia que não existe, porque o Estado não tem liberdade, não tem autonomia para criar o seu próprio Município, porque depende de uma regra federal.

            É exatamente o que está no art. 18 da Constituição Federal: “§ 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios far-se-ão por lei estadual...”. Isto é, o Estado, a unidade da Federação, é que vai legislar sobre a criação de seus Municípios, mas não pode criar os critérios. Pode criar, legislar sobre o assunto, tem competência para isso, mas não pode criar os critérios. Por quê? Aqui diz: “...dentro do período determinado por lei complementar federal...”. Isso significa dizer que, para se criar um Município em qualquer unidade da Federação, terá necessariamente de passar pelo Congresso Nacional uma lei complementar federal para criar os critérios, embora quem os crie sejam os Estados. É uma incoerência absoluta, total.

            Com muito prazer, concedo um aparte à Senadora Ana Amélia, do Rio Grande do Sul.

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS) - Caro Senador Tomás Correia, esse tema é relevante. Aliás, amanhã, aqui no Senado - isto vai ser motivo do meu pronunciamento -, haverá uma nova mobilização dos prefeitos do País, depois da eleição, para avaliar a situação dos Municípios, que é preocupante do ponto de vista financeiro. Mas eu queria chamar a atenção para esse aspecto das emancipações e dizer que a criação de novos Municípios é um tema que é muito caro ao Rio Grande do Sul. O Município de Pinto Bandeira, que foi o último Distrito emancipado, desde 2001 - desde 2001, veja só! -, durante dez anos, fez uma demanda judicial junto ao Supremo Tribunal Federal e só agora pode desfrutar da condição de Município. Pinto Bandeira, emancipado de Bento Gonçalves, com a eleição do Prefeito João Pizzio, na eleição do dia 7, de domingo, agora tem a situação tranquilizada pela confirmação do Supremo Tribunal Federal da emancipação e da criação do novo Município. Mas é preciso que haja segurança jurídica para esse aspecto, que envolve não apenas a questão administrativa, mas também questões políticas relevantes e também o próprio desenvolvimento do País. Então, imagino que a Casa da República, o Senado Federal, precisa se debruçar sobre o tema, conforme recomenda, com muita propriedade, V. Exª, ressaltando as incoerências que há entre a lei federal e a lei estadual nessa matéria. Parabéns, Senador Tomás Correia.

            O SR. TOMÁS CORREIA (Bloco/PMDB - RO) - Eu agradeço o aparte de V. Exª, Senadora Ana Amélia, que traz, sem dúvida nenhuma, uma grande contribuição para o meu modesto pronunciamento.

            Mas a situação que demonstro aqui é que a Emenda Constitucional nº 57, de 2008, convalida a criação dos Municípios - portanto, o assunto a que V. Exª se referiu está convalidado -, mas tem que se recorrer à Justiça para o Supremo decidir.

            Isso, como V. Exª bem destaca, vem causando uma total instabilidade jurídica. O art. 57 da Constituição foi para acomodar os 68 Municípios criados até então. Será que daqui a alguns dias teremos que fazer outra emenda constitucional para acomodar os outros Municípios que serão criados? Essa é que é a grande situação. Esse que é o grande problema.

            O Município de Extrema, no Estado de Rondônia, tem mais de 15 mil eleitores. O Senador Anibal Diniz, que é da região, conhece bem o nosso querido Município de Extrema, que foi até objeto de uma polêmica com o meu querido Estado do Acre.

            E é um Distrito que tem 34.000km2; maior, portanto, que o Estado de Sergipe e de Alagoas. E mais, além de ter uma enorme população, três Distritos se agregam a sua volta. O Distrito de Extrema fica a 350 quilômetros de Porto Velho, bem distante e isolado, portanto. E a assistência que Porto Velho dá ao Distrito de Extrema é precária em face das dificuldades até mesmo de locomoção.

            Pois bem, o Distrito de Extrema fez um plebiscito que foi aprovado por mais de 90% da sua população e da população de Porto Velho, que responderam “sim”. Hoje, no entanto, não pode ser transformado em Município porque esbarra na norma estabelecida no art. 18, § 4º, da Constituição Federal.

            O Distrito de Tarilândia também está a mais de 80 quilômetros de distância do Município de Jaru. No dia 7, foi feito um plebiscito naquele Distrito e no Município de Governador Jorge Teixeira. Noventa e quatro por cento da população disse “sim”. Mas agora está dependendo da aprovação, pelo Congresso Nacional, da lei que estabelece critérios para a criação de Municípios.

            De sorte que estamos fazendo plebiscitos em diversos Distritos e Municípios, mas a sua criação depende do Congresso Nacional. E depende também da Presidente da República, que pode vetar ou não o projeto de lei que esta Casa vote.

            Então, temos que lamentar esse quadro. A Federação tem autonomia, e essa autonomia, hoje, está sendo totalmente desconsiderada por essa norma constitucional.

            Por que o Estado, para criar o seu Município, depende de um critério que a União vai fixar? Quem sabe é o Estado, pois é no Estado que está o Município, são os deputados estaduais, os vereadores, os prefeitos, o governador, é a classe política do Estado que sabe das condições, dos meios, enfim, da necessidade de se criar ou não um Município. Mas aí os tecnocratas do Governo geralmente dizem que criar Município representa aumento de despesa.

            Ora, hoje somos a sexta economia mundial. O Brasil está se desenvolvendo. Então, é necessário que haja efetivamente uma política de redivisão territorial para que possamos melhorar, descentralizando, a Administração Pública. Não podemos permitir que um Distrito que fica a uma distância de 354 quilômetros da capital permaneça Distrito, ainda que já tenha em torno de 15 mil habitantes.

            De sorte, Sr. Presidente, que eu queria mais uma vez trazer esta preocupação, trazer este debate, trazer esta discussão, porque é inadmissível que o Senado e a Câmara dos Deputados não se movimentem para aprovar os inúmeros projetos de lei que já estão nas Casas, tanto aqui como na Câmara dos Deputados. Há, inclusive, projeto de lei que já foi aprovado pelo Senado e que está na Câmara aguardando decisão daquela Casa.

            No Distrito de Tarilândia, do Município de Jaru - estive lá recentemente, durante a campanha eleitoral -, pude ver o desejo daquela população, a ansiedade daquele povo no sentido de vê-lo transformado imediatamente em Município. No entanto, estão amarrados por uma norma que não permite a criação de Municípios a não ser após a aprovação da bendita lei complementar federal. Então, estamos levando ao povo informações de que podem fazer o plebiscito, mas que não há garantia de que essa decisão se concretizará de forma efetiva. Com isso, termina ficando cada vez mais desacreditada a força política que leva a informação de que vai ser feito um plebiscito, leva a informação de que a Assembleia aprovou, leva a informação de que o Tribunal Regional Eleitoral também mandou fazer o plebiscito. Realiza-se o plebiscito, e, depois, não pode ser convalidado o Município em face da dificuldade, como já disse, em relação à tal lei complementar federal, que nunca é aprovada pelo Senado ou pela Câmara.

            Faço um apelo às bancadas, inclusive às maiores bancadas, para que vejam essa questão como prioritária. Precisamos redividir nosso País, nossos Estados, nossos Municípios, redefinir a nossa geografia, facilitando a criação dos Municípios. Sabemos que a administração de um Distrito depende em tudo da sede do Município, tornando-o praticamente inviável pela falta de autonomia.

            Eu disse, da outra vez, e repito: prefiro um Município pequeno a um Distrito grande, exatamente porque com o Município haverá autonomia administrativa e autonomia financeira, assim como condições de participar do bolo tributário, que é concentrado na União. Dessa forma, esses pequenos Municípios terão oportunidade de crescer e de desenvolver.

            No Estado de Rondônia, dos 52 Municípios existentes, 10 ou 11 foram criados há pouco tempo, antes dessa norma. E todos os Municípios criados estão hoje muito mais desenvolvidos do que se fossem Distritos, exatamente por terem uma administração independente, autônoma e com condições de descentralizar seus atos.

            Dessa forma, Sr. Presidente, quero mais uma vez fazer aqui este apelo e dizer que, no Brasil, não podemos mais conviver com essa situação. Precisamos devolver aos Estados a competência para que legislem. Que não só sejam criados os Municípios, mas que também os critérios sejam criados pelos Estados a fim de que haja condições de desprender, desamarrar, tirar as amarras da criação dos Municípios.

            Existem alguns dados com relação a esse tema. De 2001 a 2010, surgiram apenas 58 Municípios no Brasil, em face da promulgação dessa Emenda à Constituição nº 57, a que me referi há pouco. No período de 1950 a 1960, Sr. Presidente, houve um acréscimo de Municípios no Brasil de 32 %; e na década de 60 a 70, mais 30%.

            Então, hoje, no Brasil, está fechada a criação de Municípios, está barrada pela emenda constitucional a que me referi há pouco, e os Estados não podem, de forma alguma, criar Municípios, em face dessa norma constitucional a que me referi, que é a exigência da lei complementar para fixar critérios para a criação de Municípios.

            Agradeço a V. Exª. E deixo aqui, mais uma vez, minha palavra. Espero voltar a este tema, porque o considero da maior relevância para o nosso Estado e para o nosso País.

            Muito obrigado a V. Exª


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/10/2012 - Página 53150